Acórdão nº 6301/13.0TBMTS.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]: AA e BB, residentes na Rua … nº …, ...., ...., propuseram a presente acção com processo comum contra “...., SA”, com sede na zona industrial da ...., Sector …, Lote …, ...., ...., pedindo que, na sua procedência, a ré seja condenada a pagar-lhes, na qualidade de únicos herdeiros de DD, a quantia global de €85.000,00, a título de dano moral da própria vítima e dano da morte [a], a ambos os autores, por direito próprio, a quantia global de €28.651,59, a título de danos patrimoniais [b], à AA, a quantia de €40.250,00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, ao BB, a quantia de €40.150,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, contados sobre cada uma das quantias supra peticionadas, à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, em consequência de um acidente de viação, ocorrido a 8 de Outubro de 2011, na EN nº 14, em que intervieram o ligeiro de passageiros, matrícula -JB-, propriedade e conduzido por EE, e o cicolomotor, de matrícula -HM-, propriedade do autor BB e conduzido pelo filho dos autores, DD, que circulava pela meia faixa de rodagem correspondente ao sentido Porto-...., tendo sido embatido, na sua traseira, pela frente lateral direita do veículo ligeiro, cujo condutor seguia desconcentrado e desatento, e a velocidade nunca inferior a 120 Km/h, em consequência do que sobrevieram resultados danosos, objectivados nos montantes pecuniários constantes do pedido.

Na contestação, a ré aceita a responsabilidade do seu segurado quanto à dinâmica do acidente, entendendo que os autores não têm direito a dano patrimonial futuro e que os valores reclamados são, manifestamente, desajustados.

A sentença julgou, parcialmente, provada e procedente a acção, e, em consequência, condenou a ré a pagar aos autores a quantia global de €108.801,59, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais, decorrentes do acidente dos autos, quantia esta actualizada na data da sentença, e que vence juros de mora, apenas, após o trânsito da mesma, contados à taxa supletiva legal de 4%.

Desta sentença, os autores interpuseram o presente recurso de revista «per saltum», e a ré recurso subordinado, para este Supremo Tribunal de Justiça, terminando as alegações com as seguintes conclusões que, integralmente, se transcrevem: O RECURSO INDEPENDENTE DOS AUTORES 1ª - Os presentes autos fundam-se na responsabilidade civil extracontratual da Seguradora recorrida, e emergente de acidente de viação.

  1. - Não se conformam os recorrentes com o ajuizado na douta decisão aqui posta em crise, e no que diz respeito a três questões, as quais constituem o objecto do presente recurso: a. Não atribuição, aos recorrentes, da peticionada indemnização a título de dano patrimonial decorrente da perda futura de ganho; b. Valor indemnizatório atribuído aos recorrentes a título de danos não patrimoniais próprios, o qual se reputa desadequado, por manifestamente reduzido, face aos factos provados e aos critérios equitativos, reais e objectivos determinados na lei e seguidos em termos Jurisprudenciais; c. Momento fixado como início do cômputo dos juros de mora associados às compensações por danos não patrimoniais; 3ª - Do acidente de viação em apreço, e cuja responsabilidade, a título de culpa exclusiva, foi desde logo aceite pela Seguradora recorrente, resultou, como consequência directa e imediata o infeliz decesso do filho dos AA, ora recorrentes.

  2. - Imbuídos da qualidade de únicos e legítimos sucessores do seu filho e bem assim de directos lesados, vieram os AA., entre o demais, e para o que releva nesta instância recursiva, que lhes fosse concedida uma indemnização a título de dano patrimonial futuro decorrente de perda futura de ganho por se verem privados, além do mais, do contributo que o seu filho solteiro e com eles residente, prestava para ao encargos quotidianos do agregado familiar, e que computaram em nunca menos de Euro 30.000,00, pedido esse que foi julgado improcedente.

  3. - Com relevo para a apreciação desta questão, resultou provado que: 30 - " À data do acidente, vivia na casa dos seus pais " 31 - "Estava desempregado e auferia, mensalmente, o montante de Euro 189,00 a título de rendimento social de inserção" 31- "Do qual contribuía com montante não concretamente apurado, para ajudar no pagamento dos encargos do agregado familiar, tais como alimentação, água, luz e telefone".

    6ª - Salvo o devido respeito por diverso entendimento, não podemos sufragar a posição vertida na douta sentença recorrida a este propósito, pois que o Mmo. Tribunal "a quo" faz aqui uma errada interpretação e aplicação da lei, não tendo tido em consideração, como devia, o preceituado nos arts. 564° e 566° do Cód. Civil.

    7ª - É que este direito indemnizatório terá sempre cabimento, e assistirá aos recorrentes, se visto do prisma do verdadeiro direito patrimonial futuro, na vertente de lucro cessante (e não como um puro direito a alimentos, conforme foi entendimento do Mmo. Tribunal a quo).

    8ª - Neste caso o que está em causa é o ressarcimento do prejuízo económico que os AA/Recorrentes irão sofrer por virtude da frustração de ganhos futuros, da perda absoluta e definitiva de rendimentos de trabalho que seria realizado pelo filho que com eles vivia não fosse a sua morte, directamente previsto nos arts. 562° e 564° do Cód. Civil.

    9ª - Perante o elenco dos factos provados, constata-se que a vítima, filho dos recorrentes, com este residente, os ajudava financeiramente, contribuindo mensalmente no pagamento dos encargos do agregado familiar, tais como alimentação, água, luz, telefone, embora não se tenha logrado apurar qual o concreto montante entregue mensalmente por DD aos seus pais.

    10ª - Impunha-se considerar que os ora recorrentes têm efectivamente direito a ser ressarcidos pelos apontados danos patrimoniais futuros decorrentes da perda de ganho em apreço.

  4. - E, na falta de concretização do valor com que o malogrado DD contribuía para o agregado familiar, sempre deveria o Mmo. Tribunal "a quo" ter relegado a liquidação deste quantitativo para ulterior incidente de liquidação, nos termos do disposto no art. 609° n.° 2 do NCPC, e com o limite do pedido a este titulo formulado, que se quedou em Euro 30.000,00 (Cfr. art. 609° n.° 1 do NCPC).

  5. - Ao contemplar diverso entendimento, a douta sentença proferida incorreu em séria violação do disposto nos arts. 564° e 566° do Cód. Civil, e 609° do Cód. Proc. Civil.

  6. - Deverá, assim e nessa parte, ser revogada e substituída por outra, e nos termos supra expendidos.

  7. - Consideram ainda os recorrentes que a douta sentença recorrida fixou um montante indemnizatório a título de danos não patrimoniais próprios dos recorrentes que, e sempre com a devida vénia, peca pela sua escassez, mostrando-se totalmente desadequado perante os factos provados e os concretos danos decorrentes para os recorrentes do infeliz, inesperado e inultrapassável decesso do seu filho.

  8. - A este respeito, entendeu o Mmo. Tribunal "a quo" fixar em Euro 20.000,00, para cada um dos recorrentes, a compensação dos danos morais próprios pela perda prematura do seu filho.

    16º - Consideram, contudo, os recorrentes como adequada a fixação e peticionado, a este título, um valor nunca inferior a Euro 40.000,00, para cada um.

  9. - A douta sentença recorrida, a este título, e sempre com o devido respeito por diverso entendimento, mostra-se um tanto quanto telegráfica, e na fundamentação que apresenta.

  10. - Sempre com o máximo respeito, estamos em crer que na fixação deste "quantum" não atentou o Mmo. Tribunal a quo, de forma cabal, ao elenco da factualidade assente.

  11. - E nem sopesou todos os elementos atinentes às circunstâncias concretas do caso em apreço.

  12. - Na verdade, sempre deveria ter sido em consideração pelo Mmo. Tribunal "a quo", e neste particular aspecto, a extrema e invulgar brutalidade do acidente em apreço (note-se que o veiculo onde seguia a vitima mortal foi colhido e esmagado pelo veiculo seguro na Recorrida, foi arrastado durante 209 metros, a vitima foi projectada durante 60 metros, cfr, alíneas 16°, 17°, 19° dos factos provados); a total ausência de culpa para a ocorrência do mesmo por parte da vitima; a desmesurada imprudência do condutor do veiculo seguro na recorrente (sobretudo evidenciada na velocidade de que vinha animado); a idade da vítima (31 anos); a circunstância da vítima viver com os seus pais, com os quais mantinha uma relação afectuosa e pautada pela dedicação; o facto da A. mulher ter ficado a padecer de síndrome depressivo reactivo, necessitando de medicação regular; as intensas crises de choro protagonizadas pelo A. marido; e bem assim, o facto dos AA. visitarem a sepultura do seu filho todos os dias.

  13. - Temos que, ao não contemplar tais circunstancialismos, o Mmo. Tribunal "a quo" afrontou, de forma manifesta, as regras de boa prudência, bom senso, justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida.

  14. - Face ao supra expendido, afigura-se-nos justo, adequado e suficiente a fixação de uma compensação por danos não patrimoniais próprios sofridos pelos AA., e merecedores de tutela jurídica, no montante de Euro 40.000,00, para cada um, perfazendo o valor global de Euro 80.000,00, e em substituição daquela que foi fixada na 1a instância.

  15. - Salvo o devido respeito por diversa opinião, na fixação do montante da compensação a título de danos não patrimoniais, a douta sentença ora posta em crise violou, entre o demais, o disposto no art. 496° do Cód. Civil.

  16. - Pelo que, deverá a mesma ser revogada e substituída por outra, e nos termos supra expendidos.

  17. - Não se conformam, igualmente os recorrentes com o momento fixado para o inicio do computo dos juros de mora relativamente às quantias arbitradas em sede de danos não patrimoniais.

  18. - Com efeito, é Jurisprudência unânime deste Venerando Supremo Tribunal de Justiça, com...

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