Acórdão nº 3390/13.1TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMELO LIMA
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I Relatório 1.

AA instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo especial, de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra BB – …, SA, opondo-se ao despedimento promovido pela Ré.

  1. Teve lugar a audiência de partes e, gorada a conciliação, foi a R. notificada para apresentar o articulado de motivação do despedimento.

    A Ré apresentou o referido articulado, alegando, em suma: · O A. tem a categoria profissional de empregado de balcão de 1ª, exercendo as suas funções no ponto de venda pertencente à R., no aeroporto de Lisboa; · No dia 6 de maio de 2013, durante o seu período normal de trabalho, no ponto de venda “N...

    ”, o A. abandonou o seu posto de trabalho, entre as 21.00 e as 21.30 horas, para assistir ao jogo de futebol entre o Benfica e o Estoril; · O jogo estava a ser transmitido num televisor na cafetaria H...

    , que se situa a cerca de 150 metros do local de trabalho do A.; · Para conseguir assistir ao jogo, o A. encontrava-se de costas para o seu local de trabalho; · O ponto de venda possui produtos e matérias primas de fácil acesso a qualquer pessoa, bem como valores monetários; · O tempo de ausência impossibilitou a realização de vendas dos produtos do “N...

    ”, tendo os potenciais clientes que ali se deslocaram nesse período optado por ir a outros estabelecimentos comerciais da concorrência; · O comportamento do A. causou uma má imagem junto de potenciais clientes da Ré, que se deslocaram ao ponto de venda e se depararam com o mesmo vazio; · Durante o período em causa, o A. não se encontrava devidamente fardado, faltando-lhe o boné; · No dia 8 de maio de 2013, o A., durante o seu período normal de trabalho, no ponto de venda “N...

    ”, entre as 20.15 horas e as 20.30 horas, encontrava-se sentado em cima do balcão, de perna cruzada, e de lado para os passageiros que passavam junto do estabelecimento, o que ofereceu uma péssima imagem da R. aos seus clientes; · Do registo individual do A. consta uma sanção disciplinar de 15 dias de suspensão com perda de retribuição.

    Concluiu pela existência de justa causa de despedimento.

  2. O A. contestou, impugnando os factos alegados pela R. e, deduzindo Reconvenção, pediu: · A anulação da decisão que lhe aplicou 15 dias de suspensão, com a devolução da quantia de € 377,38, que lhe foi descontada; · A sua reintegração no posto de trabalho, com a categoria e antiguidade reportadas à data do despedimento; · A liquidação de todas as retribuições que se vencerem desde a data da propositura da acção, bem como todas as retribuições vencidas até que seja determinada a reintegração na Ré; · Juros legais.

  3. A R. respondeu à reconvenção, pedindo a sua rejeição liminar quanto ao primeiro pedido, e defendendo a improcedência dos demais.

  4. Foi admitida a reconvenção e proferido despacho saneador, o qual conheceu da validade e regularidade da instância.

  5. Dispensadas a realização da audiência preliminar, a fixação da matéria de facto assente e da base instrutória, procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, tendo o trabalhador mantido a opção pela reintegração.

  6. O Tribunal respondeu à matéria de facto sem reclamações, proferindo depois, a sentença em que, na parcial procedência da ação, deliberou: «I.

    Anula-se a pena de quinze dias de suspensão, com perda de retribuição, aplicada ao autor trabalhador, e por este cumprida entre 23-01-2013 a 06-02-2013, ordena-se a eliminação da mesma do registo disciplinar do autor trabalhador e condena-se a ré empregadora a reembolsar-lhe a quantia correspondente à retribuição perdida, no montante de 377,38€ (trezentos e setenta e sete euros e trinta e oito cêntimos), acrescida dos respetivos juros, à taxa legal, desde a data de citação da ré empregadora e até efetivo e integral pagamento e II.

    Declara-se a licitude e regularidade do despedimento do A. trabalhador, julgando-se improcedentes os pedidos por este formulados contra a R. empregadora, em consequência do seu despedimento.» 8.

    Inconformado, o A. interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.

  7. Por acórdão, de 8 de outubro de 2014, este Tribunal deliberou: «Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar procedente o presente recurso de apelação interposto por AA, revogando-se a sentença recorrida, e, em consequência 1. Declara-se a ilicitude do despedimento do A., AA.

  8. Condena-se a R., BB – …, SA, a 2.1. Reintegrar o A., sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade; 2.2. Pagar ao A. as retribuições que este deixou de auferir desde a data da propositura da presente ação, até ao trânsito em julgado da sentença, com as deduções a que se refere o art. 390º nº 2 do CT, remetendo-se o seu apuramento para liquidação posterior.

    3.3. Pagar ao A. juros, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada prestação, até integral pagamento.» 10. Irresignada, recorre a R., de Revista, para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando a respetiva alegação com as seguintes conclusões: ([1]) «I. O A., ao abandonar o seu posto de trabalhado mais do que uma vez, facto que, juntamente com os demais, motivou e justificou a decisão de despedimento proferida pela R., demonstrou total desinteresse pela sua relação laboral e pelas funções que lhe foram atribuídas e, bem assim, pela sua Entidade Empregadora e pela atividade que esta desenvolve, revelando, ademais, manifesta indiferença pelo cumprimento dos deveres laborais a que bem sabia encontrar-se obrigado, e manifesta aquiescência face às eventuais consequências que tal comportamento, com toda a certeza, lhe acarretariam.

    1. Diretamente relacionado com tal desinteresse repetido e continuado no cumprimento dos deveres inerente à sua função - deveres tais que bem conhecia e bem sabia que estaria obrigado ao seu cumprimento estrito, tanto mais não seja pela sua antiguidade e inerente experiência na empresa da Ré -; o Autor causou prejuízos sérios à sua Entidade Patronal, aqui R. Recorrente, em matéria de vendas, produtividade, bem como, de bom nome e imagem.

    2. Tais circunstâncias determinaram, sem margem para dúvidas, a total perda de confiança por parte da Ré, posto que violados princípios substanciais que subjazem a qualquer vínculo laboral – artigo 128º, nº1, alíneas c), e), g) e h) do CT.

    3. O A., com o seu comportamento grave e culposo, pôs em crise a permanência da confiança em que se alicerçava a relação de trabalho e que, insubsistindo, torna imediata e praticamente impossível a respetiva manutenção, que não é razoável exigir à Entidade-Empregadora, verificando-se, assim, justa causa para o despedimento, nos termos do artigo 351º, nº 1, do Código do Trabalho.

    4. Assente a relevância disciplinar dos comportamentos assumidos pelo A. e descritos no presente articulado, a apreciação da sua gravidade, mormente para efeito de ponderação da justa causa de despedimento que fora decidida e aplicada pela Ré, deverá aferir-se em função de todo o circunstancialismo que os rodeia, nunca descurando todo o historial e o registo disciplinar do trabalhador em causa na empresa.

    5. Sendo que as condutas reiteradas do Autor vindas de referir quebraram de forma irreparável a relação de confiança entre as partes que é essencial à relação de trabalho, tornando inexigível a sua manutenção, integrando por tal motivo, e como decidiu a R. em sede de exercício do poder disciplinar, justa causa de despedimento.

    6. Incontestavelmente, aquando da decisão final proferida pela Ré no sentido do despedimento do A., foram corretamente valorados os antecedentes disciplinares do trabalhador, posto que a sanção disciplinar de suspensão do trabalho ainda não tinha sido anulada pelo Tribunal.

      VIII.

      Nessa senda, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa violou os artigos 328º e 329º, na medida em que restringiu de forma injustificada os legítimos poderes de direção, fiscalização e disciplinar que recaem sobre o empregador no âmbito de qualquer relação laboral; bem como, tal decisão do Tribunal da Relação fez uma incorreta aplicação do disposto no artigo 330º, posto que a sanção disciplinar ora aplicada pela R. deveria pois considerar-se proporcional e adequada à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator.

      IX.

      Ao que acresce que o prazo de impugnação da sanção disciplinar conservatória prescreve num ano contado da comunicação da aplicação de tal sanção, mesmo que o contrato não haja cessado, não violando tal previsão o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, uma vez que tal prazo não é desadequado ou desproporcional de modo a dificultar gravemente o exercício desse direito impugnatório.

    7. Não pode a decisão do TRL aqui em crise desconsiderar a infração disciplinar anterior e que, à data da decisão de despedimento com justa causa, foi corretamente valorada como agravante.

      XI.

      Razão pela qual, considerando o Tribunal da Relação de Lisboa a ilicitude do despedimento, posto que, no seu entender, não se mostrava provada e verificada a justa causa de despedimento, violou o disposto no artigo 351º, nº1, do CT.

    8. Por fim, e contrariamente ao vertido na decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, e no domínio dos créditos laborais alegadamente devidos ao A., importa ter em conta que, em virtude da condenação da R. no pagamento da quantia por força da anulação da pena de 15 dias de suspensão, cumprida pelo A. entre 23.01.2013 e 06.02.2013, pagou aquela ao A. a quantia de € 387,18 (trezentos e oitenta e sete euros e dezoito cêntimos), conforme se comprova pela análise da Declaração de Quitação datada de 19 de maio de 2014, devidamente assinada pelo A. em 13 de outubro último. (Doc. 1) XIII. Sem prescindir tudo quanto antecede, sempre deveria ser aquele Tribunal da Relação de Lisboa questionado sobre se a sua decisão seria mantida caso, no momento e que o A., no exercício das suas funções e durante o seu horário de trabalho, o posto tivesse sido assaltado por terceira...

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