Acórdão nº 160/13.0GBTMR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | ISABEL PAIS MARTINS |
Data da Resolução | 05 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça I 1.
No processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, do 2.º juízo do Tribunal Judicial da Comarca de ..., sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento, o arguido AA, ..., no mais devidamente identificado nos autos, preso preventivamente à ordem destes autos, no Estabelecimento Prisional Regional de Leiria, imputando-lhe a prática de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal.
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BB e CC, formularam pedido de indemnização cível contra o arguido AA, no sentido de este ser condenado a pagar-lhes: € 1042,10, de indemnização por danos patrimoniais, para ressarcir as despesas do funeral da sua filha DD; € 75 000,00, para cada um dos lesados, a título de compensação por danos não patrimoniais, traduzidos no profundo desgosto e saudade que sentem da sua filha, em resultado do crime de homicídio praticado pelo arguido e de que resultou a morte da mesma; e € 200 000,00, a título de compensação pela perda do direito à vida.
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Realizada a audiência de julgamento, por acórdão proferido a 20 de Janeiro de 2014, foi decidido: – julgar a acusação provada e procedente e, em consequência, condenar o arguido AA, como autor material de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 1 e n.º 2.º, alínea b), do Código Penal, na pena de 18 anos de prisão; – julgar o pedido cível formulado pelos lesados BB e CC parcialmente provado e procedente e, em consequência, condenar o responsável civil AA a pagar àqueles lesados as seguintes quantias: – € 75 000,00, pela perda do direito à vida de DD; – € 25 000,00 à lesadaBB e – € 25 000,00 ao lesado CC, a título de compensação por danos próprios emergentes do desgosto e sofrimento que sentem pela perda da sua filha; e – absolver o mesmo responsável civil do remanescente do pedido.
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O arguido, inconformado, interpôs recurso para a relação e, por acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 25 de Junho de 2014, foi decidido negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA e manter o douto acórdão recorrido.
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Na sequência, veio o arguido AA interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões (transcrição ipsis verbis): «1.- O presente recurso vem interposto do douto acórdão que confirmou a decisão da primeira instância que condenou o recorrente por um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos artigos 131º e 132º n.º 1 e n.º 2 al. b) do C. Penal na pena de 18 anos de prisão, bem como manteve o montante indemnizatório em que foi condenado; «2.- Atenta a limitação legal do presente recurso à matéria de direito, conforme estatui o artigo 434º do CPP, porém, não pode a defesa deixar de invocar que o acórdão recorrido persiste na nulidade prevista no artigo 379º, nº 1, al. c) do CPP.
«3.- O douto Tribunal recorrido considerou que não se verifica a nulidade prevista no artigo 379º, nº 1, al. c) do CPP invocada pelo arguido, porquanto considerou que não acrescentaria nada à defesa aditar aos factos dados como provado alguns pormenores dessa versão, que resulta até prejudicada dos factos dados como provados, designadamente os pontos 7 a 34, 40 e 41, «4.- Acrescentando o acórdão recorrido que tendo o arguido limitado-se a oferecer o merecimento dos autos na contestação e não tendo suscitado em audiência qualquer questão que tivesse ficado sem decisão, não se verifica a invocado omissão de pronúncia.
«5.- Com todo o respeito por mais douta opinião, considera-se que o Tribunal “a quo”, não avaliou, nem decidiu correctamente a nulidade invocada, já que não obstante toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento e demonstrada em sede de recurso sobre a matéria de facto para o Tribunal da Relação de Coimbra, este Tribunal a quo não os analisou, nem se pronunciou sobre os mesmos, não vertendo esses factos para os factos provados ou não provados, como podia e devia fazer conforme estatui o artigo 431º, als. a) e b) do CPP.
«6.- Contrariamente ao referido naquele acórdão recorrido tal matéria acrescentaria muito à defesa do arguido porquanto se trata de matéria relevante para a decisão da causa, designadamente para a subsunção jurídica e para a determinação da medida concreta da pena, até porque a o Tribunal tem de atender a todas as circunstâncias que, mesmo não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor do arguido.
«7.- Sendo tais circunstâncias inquestionavelmente relevantes para a decisão, o Tribunal recorrido tinha de expressamente pronunciar-se sobre ela e não é pelo facto de não ter sido expressamente alegada na contestação que altera a substância das coisas, como aliás, tem vindo a ser decidido por esse Venerando Supremo Tribunal de Justiça.
«8.- O cumprimento do artigo 374.º, n.º 2 não impõe a enumeração dos factos provados e não provados que sejam irrelevantes para a caracterização do crime e/ou para a medida da pena mas essa irrelevância deve ser vista com rigor em função do factualismo inerente às posições da acusação e da defesa e bem assim aos contornos das diversas possibilidades de aplicação do direito ao caso concreto – seja quanto à imputabilidade, seja relativamente à qualificação jurídico-criminal dos factos, seja quanto às consequências jurídicas do crime, designadamente quanto à espécie e medida da pena –, tendo em conta os termos das referidas posições assumidas pela acusação e pela defesa e os poderes de cognição oficiosa que cabem ao tribunal.
«Já que em sede de recurso pode vir a ser considerado pelo Tribunal ad quem que o facto sobre o qual o Tribunal recorrido não se pronunciou por entender ser irrelevante, é afinal relevante para a decisão, o que determinará a necessidade de novo julgamento, ainda que parcial.
«9.- O Tribunal recorrido tinha de indagar os factos que são interessantes de acordo com o direito plausível aplicável ao caso, dão-se como provados ou não provados os factos conforme a prova produzida.
«A pronúncia deve ser inequívoca: em caso algum pode ficar a dúvida sobre qual a posição real do tribunal sobre determinado facto, no caso em apreço, não há pronúncia expressa, já que o Tribunal recorrido limitou-se a dizer que tal factualidade nada acrescentaria à defesa; «10.- O que não é verdade, já que da prova produzida nos autos, nomeadamente em sede de julgamento, e submetida ao escrutínio do Tribunal da Relação de Coimbra, ficou demonstrado que o arguido era agredido psicologicamente e fisicamente pela companheira DD, «11.- Da prova documental e pericial carreada para os autos resulta que no dia dos factos o arguido apresentava lesões físicas e que no local havia sangue do arguido no chão e no sofá.
«Não obstante toda esta prova pericial nem o tribunal da 1ª Instancia, nem o Tribunal recorrido se pronunciou sobre tal matéria, não vertendo esses factos para os factos provados ou não provados, «12.- O que ao contrário do referido no douto arresto recorrido tal matéria é essencial à defesa do arguido, por ser de vital importância, designadamente, para o Tribunal aferir o estado de espírito, aferir se alguma emoção e que tipo e intensidade dominou ou não o arguido no momento da pratica dos factos, «13.- Pois, só dessa forma poderá determinar a culpa, fazer a subsunção dos factos ao direito e determinar a medida da pena.
«No arresto recorrido foram considerados irrelevantes factos como: «- O arguido era agredido pela DD, com nomes, chapadas, arranhões; «- Na quinta-feira anterior aos factos o arguido tinha sido agredido pela vítima, tendo o ora recorrente sido visto por várias pessoas (que foram ouvidas como testemunhas) com arranhões na cara e pescoço; «-Cerca dez e meia, foram ao café onde a DD trabalhava, beberam café e estiveram com os amigos.
«- Foram convidados para ir jogar matraquilhos para a Associação da terra.
«- O arguido declinou o convite, sendo que DD ficou aborrecida, «- Tendo o arguido referido, “Olha, se quiseres vai tu”, sendo que a DD também não quis ir sem a companhia do arguido.
«- Regressaram a casa, tendo a DD ficado aborrecida com o arguido; «- Ambos vestiram o pijama, tendo o arguido ficado deitado no sofá que fica de frente para a porta do quarto, com um cobertor por cima, a ver televisão.
«- Decorrido algum tempo a DD levantou-se a abeirou-se do arguido dizendo: «“Então quer dizer, querias ir para a cama e agora estás aí no sofá a ver televisão?!”, “Também já não vês mais televisão”.
«- E em acto contínuo arrancou a ficha que ligava a televisão à corrente eléctrica.
«- Acto contínuo proferiu as seguintes expressões ao arguido: “Não vales nada, és uma merda,” «- Nesta sequência o arguido referiu “Mas tu estás a gozar comigo?”, “Começas assim vou-me embora para casa” «- Nesta sequencia a DD foi em direcção à porta que dá para a rua para fechar [a] porta à chave, tendo partido a chave, dizendo ao arguido: “Olha, estás a ver, já não sais de casa. Tens a porta fechada; a chave já se partiu”.
«- Gerou-se uma discussão na sala e a DD agarra numa jarra e atirou-a em direcção ao arguido, só não tendo magoado porque o arguido se virou de costas.
«- Não tendo conseguido atingir o arguido, a DD pegou num ferro de engomar tendo arremessado à cabeça do arguido, fazendo-lhe um golpe na testa que deitou sangue.
«- Dirigiu-se de novo ao quarto de vestir para se calçar e DD, com o arguido de cócoras, arranhou-o na cara.
«- Em consequência das agressões de que foi alvo o arguido apresentava as seguintes lesões ao exame objectivo: “Face: na metade esquerda da região frontal, escoriação obliqua infero-lateralmente, medindo 2 cms de comprimento; - escoriação aproximadamente longitudinal, na região naso-labial direita, medindo 2 cms de comprimento; - escoriação de formato curvilíneo de abertura superior, na face cutânea do hemilábio infeiror esquerdo medindo 05, x 0,3 cms; - escoriação na região nasolabial esquerda, obliqua infero-lateralmente medindo 3 cmx0,3 cm de comprimento cada; No Pescoço: - escoriação aproximadamente...
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