Acórdão nº 283/2002.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | MÁRIO MENDES |
Data da Resolução | 24 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - AA intentou acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB e mulher CC e contra DD pedindo que lhe seja reconhecido o direito de propriedade sobre o prédio rústico identificado no artº. 6º da petição inicial [sito na freguesia de ..., concelho de ..., nas C... ou P..., de pinhal, com área de 1.200 m2, que confronta de norte com caminho, nascente, sul e poente com BB e outros, inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº. ...]; lhe seja reconhecido à o direito de preferência de haver para si o prédio rústico identificado no artigo 1º da petição inicial [prédio rústico sito na freguesia de ..., concelho de ..., nas C... ou P..., composto de oliveiras, cultura arvense de sequeiro, pomar de macieiras, pinhal, pastagem e vinha, com a área de 20.400 m2, que confronta de norte com EE e outros, nascente com AA e caminho, de sul com caminho e de poente com AA e FF e outros, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº. …] substituindo-se ao 2º. R na respectiva escritura de compra e venda, com as consequências legais daí decorrentes, designadamente, ordenar-se o cancelamento do registo de aquisição a favor do 2º R., o que se requer e sejam os RR condenados a reconhecerem tal direito de preferência.
Alega, em síntese, que por escritura pública outorgada no dia 22/04/2002, os 1ºs. RR venderam ao 2º. R e este comprou, pelo preço de €15.961,53, o prédio rústico sito na freguesia de ..., concelho de ..., nas C... ou P..., composto de oliveiras, cultura arvense de sequeiro, pomar de macieiras, pinhal, pastagem e vinha, com a área de 20.400 m2, que confronta de norte com EE e outros, nascente com AA e caminho, de sul com caminho e de poente com AA e FF e outros, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº. … Indica que é dona e legitima proprietária do prédio rústico, sito na freguesia de ..., concelho de ..., nas C..., de pinhal com a área de 1200 m2 que confronta de norte com caminho, nascente, sul e poente com BB e outros, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ..., descrito na CRP de ... sob o nº. ..., sendo tal prédio confinante, pelos lados nascente, sul e poente com o prédio identificado no parágrafo anterior; Alega também que nem os RR nem qualquer outra pessoa lhe deram conhecimento antecipado do projecto de venda e as cláusulas contratuais, só tendo tomado conhecimento dessa venda e dos seus elementos essenciais, no dia 12/11/2002.
Os réus foram regularmente citados, tendo contestado [e o 2º R. também deduzido reconvenção], por excepção e impugnação, alegando, em síntese que o 2º R. tomou de arrendamento aos 1ºs. RR três prédios rústicos sitos, respectivamente, na Quinta, em C... ou P... e em E... ou S…, tendo o contrato de arrendamento relativo ao primeiro e ao segundo prédios tido inicio em Novembro de 1999 e tendo o contrato de arrendamento atinente ao último prédio tido inicio em 01/08/1999, sendo ambos os contratos celebrados pelo P... de 25 anos, sucessivamente renovável, dando o senhorio autorização ao R. para efectuar as melhorias necessárias para aumentar a produtividade dos prédios, bem como para efectuar as explorações de água que entendesse. Que por contrato celebrado em 08/11/1999, os 1ºs. RR prometeram vender ao 2º R. os três identificados prédios, pelo preço global de Esc. 10.000.000$00, tendo, em 22/04/2002, sido celebrada a respectiva escritura pública de compra e venda, a qual foi rectificada por escritura lavrada em 10/01/2003; Desde o momento em que encetaram negociações ficou estabelecido que o 1º R. marido (vendedor) apenas venderia os ditos três prédios no seu conjunto e o comprador apenas aceitaria o negócio se nele estivessem incluídos os três prédios, que foram avaliados no seu conjunto, como se de uma unidade se tratasse.
A aquisição dos referidos prédios, pelo preço global de Esc. 10.000.000$00, teve como finalidade o preenchimento do requisito essencial à aprovação do projecto do IFADAP a que o 2º R. se candidatou, no que respeita à área mínima, legalmente exigível, acrescendo que tais prédios, apesar de dispersos, formavam uma unidade de cultura tipo familiar; Efectuada como foi a venda dos três prédios no conjunto, sem atribuição de valores a cada um deles, a quem já era arrendatário dos mesmos, não assiste à A. o invocado direito de preferência, exclusivamente sobre o prédio denominado P.... Entretanto, o 2º R. efectuou múltiplas obras e trabalhos no prédio denominado P…. ou C... e que descrimina nos artºs. 76º a 124º da contestação - reconvenção, no que despendeu a quantia de €92.083,32, tendo o 2º R. de continuar a efectuar, no futuro, despesas no tratamento do pomar de macieiras que plantou no identificado prédio; A procedência da acção seria injusta e imoral, sendo o 2º R. um jovem com 21 anos que fez formação profissional como jovem agricultor e que apostou na sua própria exploração agrícola, apresentando o seu projecto ao IFADAP que o aprovou, tendo esta entidade atribuído ao 2º R. Esc. 23.586.364$00 e investindo o 2º R. de capital próprio o montante de Esc. 18.776.276$00, incluindo o aludido projecto, entre outros, o prédio do P..., no qual foi efectuado grande parte do investimento.
Alegam que a A. não tem idade nem formação profissional para prosseguir com um projecto desta envergadura, nem tem sequer conhecimentos para cultivar o P..., nos termos em que o 2º R. o vem fazendo e se propõe continuar a fazer; o terreno da A. é um pinhal que em nada beneficiaria com a aplicação da Lei do Emparcelamento.
Através da presente acção, a A apenas pretende obter para si um prédio que bem sabe ser incapaz de cultivar, agindo de modo indiferente às consequências da sua atitude, destruindo um projecto de vida e que envolve investimentos avultados, actuando a A em flagrante abuso do direito.
Concluem os RR pela improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido e, subsidiariamente, para o caso da acção proceder, em reconvenção pede o 2º R./reconvinte que a A./reconvinda seja condenada: a) A pagar ao R. DD a quantia de €91.275,49 (noventa e um mil duzentos e setenta e cinco euros e quarenta e nove cêntimos) de benfeitorias que realizou no prédio, acrescida de juros legais, a contar da notificação da contestação/reconvenção; b) A pagar todas as despesas e trabalho da manutenção do pomar do P... até ao trânsito em julgado da decisão, em montante a apurar em liquidação de sentença; c) A reconhecer que os contratos de arrendamento celebrados se confundiram na pessoa do R. DD, em virtude da celebração da escritura de compra e venda, condenando a A. a reconhecer o R. DD como arrendatário do P... até ao final do contrato; d) A liquidar o devido imposto de sisa por dele não estar isenta.
A A./reconvinda replicou impugnando os factos alegados pelos RR. - sustentando, em síntese, que os contratos de arrendamento pelos mesmos invocados são negócios simulados e nulos e concluindo pela improcedência das excepções invocadas e do pedido reconvencional e mantendo o pedido formulado na p.i.
O 2º R./reconvinte DD apresentou tréplica reiterando o alegado na contestação/reconvenção e concluindo como nesta.
A autora apresentou articulado superveniente alegando, em resumo, que foi apenas em Abril de 2003, após a apresentação dos articulados, que o R. DD efectuou obras e realizou trabalhos no prédio o P..., pelo que não podem ser invocadas pelo R. como sendo benfeitorias pelas quais tenha direito a ser indemnizado, pois que a citação do réu fez cessar a boa fé do mesmo, no sentido de que actualmente é um mero detentor do imóvel objecto de preferência. Tais factos são extintivos do direito peticionado pelo R./reconvinte, pois que tendo cessado a boa fé do mesmo após a citação, extinguiu-se também o direito de invocar indemnização pelas obras e trabalhos e aplicação de materiais que após a dedução da reconvenção fez no prédio.
O articulado superveniente apresentado pela A. foi admitido, tendo o R./reconvinte DD apresentado resposta, na qual requereu a ampliação do pedido reconvencional.
Foi elaborado despacho saneador, procedendo-se à selecção da matéria de facto assente e organização da base instrutória, tendo o R. DD delas reclamado, o que foi admitido.
O R./reconvinte DD apresentou seis ampliações do pedido reconvencional (sendo a primeira na resposta ao articulado superveniente apresentado pela A.), nos montantes, respectivamente, de €1.436,33, €10.519,02, €3.028,27, €6.982,79, €7.611,14, e €5.728,90, totalizando o pedido reconvencional do valor de €123.361,94, por trabalhos realizados e produtos aplicados no tratamento do pomar, a que tem vindo a proceder, sendo proferidos despachos admitindo tais ampliações, com o consequente aditamento à M.F.A. e/ou base instrutória dos factos pertinentes. Inconformada com as decisões de admissão da primeira, segunda e terceira ampliações do pedido reconvencional, a A./reconvida delas interpôs recurso, que foram admitidos, como de agravo, com subida deferida e efeito meramente devolutivo.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, conforme consta das respectivas actas.
Foi inicialemente proferida sentença, a fls. 1008 a 1039, que (considerando que a A. não provou, nem sequer alegou, que o adquirente do prédio relativamente ao qual pretende exercer a preferência, ora 2º R., não era proprietário confinante do prédio em causa, circunstância que à luz do preceituado no artº. 1380º do CC, constitui requisito essencial para o exercício daquele direito) julgou a acção improcedente, por não provada, com a consequente absolvição dos RR. dos pedidos formulados. Dessa sentença recorreu a A tendo o Tribunal da Relação do Porto proferido acórdão determinando a ampliação da matéria de facto a integrar na base instrutória. Em cumprimento do decidido...
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