Acórdão nº 220/13.8TAMGR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Maio de 2015
Magistrado Responsável | JOÃO SILVA MIGUEL |
Data da Resolução | 27 de Maio de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam em conferência na 3.ª secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal coletivo, acima identificados, do 3.º juízo criminal da comarca de Leiria, foi submetido a julgamento e condenado, por acórdão de 11 de março de 2014: AA, nascido em ..., filho de ... e de ..., ..., residente, antes de preso, na ..., pela prática dos factos constitutivos dos crimes e nas penas adiante descritas, relativas a cada uma das vítimas seguintes: a. BB: i.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea b), e 177.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal (CP), na pena de 10 meses de prisão; ii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de 5 anos de prisão; iii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea a), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 1 ano de prisão.
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CC: i.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea b), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 10 meses de prisão; ii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea a), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 1 ano de prisão; iii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea b), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 8 meses de prisão.
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DD: i.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea b), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 10 meses de prisão; ii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea b), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 8 meses de prisão; iii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 3 anos de prisão; iv.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 3 anos de prisão; v.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 5 anos de prisão; vi.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 5 anos de prisão; vii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 5 anos de prisão; viii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea a), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 1 ano de prisão; ix.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 5 anos de prisão; x.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 5 anos de prisão; xi.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 3, alínea b), e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 10 meses de prisão; xii.
Um crime p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do CP, na pena de 3 anos de prisão.
Operando o cúmulo jurídico das penas antes mencionadas, foi condenado na pena única de 11 (onze) anos e 6 (seis) meses de prisão.
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Do assim decidido, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, questionando, além do acerto da decisão proferida sobre a matéria de facto, também a matéria de direito, relativamente à qualificação jurídico-criminal e à medida das penas.
Por acórdão de 12 de novembro de 2014, foi negado provimento ao recurso, e confirmada a decisão recorrida.
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Inconformado, recorre agora para o Supremo Tribunal de Justiça, pedindo a revogação do acórdão recorrido, formulando as seguintes conclusões: «1 – O acórdão recorrido, ao sustentar a sentença proferida pelo Trib. da Comarca de Leiria violou o princípio “ne bis in idem” princípio, com assento no artigo 29.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, que dispõe que “Ninguém pode ser julgado (condenado) mais do que uma vez pela prática do mesmo crime”, ao condenar o Arguido em três crimes perpetrados na pessoa da DD numa garagem junto a sua casa, já que segundo a prova junta aos autos, é manifesto que nesse local apenas praticou um deles, cujo modo operandi se encontra devidamente descrito.
2 - O acórdão recorrido, ao sustentar a sentença proferida pelo Trib. da Comarca de Leiria violou o art. 171º nº 1 do CP ao interpretar e condenar o comportamento do Arguido como um acto sexual de relevo o facto daquele ter tocado no sexo da ofendida DD quando a ensinava a nadar.
3 - O acórdão recorrido, ao sustentar a sentença proferida pelo Trib. da Comarca de Leiria violou o art. 171º nº 1 do CP ao interpretar e condenar o comportamento do Arguido como um acto sexual de relevo o facto daquele colocar a mão na perna da DD. 4 - O acórdão recorrido, ao sustentar a sentença proferida pelo Trib. da Comarca de Leiria violou o art. 171º nº 1 do CP ao interpretar e condenar o comportamento do Arguido como um acto sexual de relevo o facto daquele ter tocado na DD quando com ela se cruzou em casa do padrinho.
5 - O acórdão recorrido, ao sustentar a sentença proferida pelo Trib. da Comarca de Leiria violou os arts. 40º, 70º e 71º do C. Penal já que não teve em conta a culpabilidade do Arguido e a ilicitude dos actos que cometeu, por um lado, e as exigências de medidas de prevenção por outro, ao aplicar as penas ao Arguido e ao efectuar o cúmulo jurídico.» 4. No Tribunal da Relação de Coimbra, o Senhor Procurador-Geral Adjunto, na resposta à motivação do recurso, depois de considerar que «é duvidoso se, com as penas parcelares aplicadas, será admissível o recurso para o STJ, sendo-o apenas em relação à pena unitária, se questionada», formula as seguintes conclusões: «A) - O douto acórdão recorrido não padece de falta de fundamentação, insuficiências, erro de apreciação ou qualquer irregularidade ou nulidade; B) - As pretensões do Recorrente, AA, carecem de fundamento, pelo que devem ser julgadas improcedentes e negado provimento ao recurso; C) - O acórdão recorrido é correcto, não violou qualquer dispositivo legal, nem os direitos de defesa do arguido, pelo que, não merecendo censura, deve ser mantido e confirmado nos seus precisos termos.» 5. Neste Supremo Tribunal, o Senhor Procurador-Geral Adjunto, depois de destacar as questões a analisar – «Violação do princípio ne bis in idem», sustentando o recorrente que não poderia ser condenado por «três crimes perpetrados na pessoa da DD numa garagem junta a sua casa, já que segundo a prova junta aos autos, é manifesto que nesse local apenas praticou um deles…»; «Qualificação como actos sexuais de relevo», alegando o recorrente que «ter tocado no sexo da ofendida DD quando a ensinava a nadar», «colocar a mão na perna da DD» e «ter tocado na DD quando com ela se cruzou em casa do padrinho» não são «actos sexuais de relevo»; e «medida das penas parcelares e da única», defendendo o recorrente que «as penas não são demasiadamente gravosas[1], fazendo apelo atenuante à sua idade de 75 anos» –, emitiu parecer no sentido de ser «inadmissível o recurso relativamente às penas parcelares (e questões relacionadas com os correspondentes crimes), perante a confirmação condenatória da 1.ª instância e o facto de as penas não serem superiores aos 8 anos de prisão» e, quanto ao mérito, de ser negado provimento do recurso, invocando que a questão relativa aos atos sexuais de relevo assenta em premissas falsas, e, quanto à idade avançada, se, em geral, pode conduzir a uma maior benevolência para com os idosos, há, porém, «comportamentos criminosos, em que as exigências de prevenção especial, ao contrário de se diluírem com a idade, aumentam, tal como em sede de prevenção geral, em que a comunidade não compreende nem aceita uma menor censura do facto», tanto mais que «os crimes em causa estão normalmente associados a características da personalidade do agente, com (...) evolução… habitualmente crónica [-], sendo acrescidas as exigências de prevenção especial».
Conclui, referindo que, não obstante se tratar de uma «pena severa, certo é que, em concreto, a ponderação conjunta do ilícito global e personalidade do arguido, com um desvio no domínio sexual, projectada nos crimes praticados, conduz-nos, dentro da moldura de concurso, a pena única idêntica à fixada, por ser adequada à sua culpa e exigências de prevenção geral e especial, muito elevadas»[2].
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Dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal (CPP), o recorrente não respondeu.
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Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o recurso é apreciado em conferência [artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP].
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As questões, cuja reapreciação é requerida, tal como resultam das conclusões formuladas, nessa medida repisando as suscitadas no recurso para o Tribunal da Relação e que não obtiveram sucesso, respeitam, no essencial, ao reexame da matéria de facto (conclusão 1.ª), à sua qualificação jurídica (conclusões 2.ª, 3.ª e 4.ª), e à medida das penas, parcelares e única (conclusão 5.ª).
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Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
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Fundamentação a. Admissibilidade do recurso 1. O Senhor Procurador-Geral Adjunto suscita a questão da inadmissibilidade do recurso.
Constitui jurisprudência assente que, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, relativas aos vícios da decisão quanto à matéria de facto, a que se refere o n.º 2 do artigo 410.º do CPP, e às nulidades, a que alude o n.º 3 do mesmo preceito, é pelo teor das conclusões apresentadas pelo recorrente, onde resume as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se define e delimita o objeto do recurso.
Em matéria de recursos, o artigo 432.º do CPP, com a epígrafe «Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça», estabelece na alínea b) do n.º 1, que recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça, de «decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em...
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