Acórdão nº 2141/13.5TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução01 de Dezembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1-1- AA, S.A.

instaurou a presente acção declarativa de condenação contra BB, alegando, em síntese que, em 29 de Maio de 2007, na qualidade de entidade patronal, celebrou com o R. o acordo de pré-reforma que constitui o documento cuja cópia consta de fls. 19 a 22. No âmbito da cláusula 9ª do referido acordo, o R. deveria requerer à entidade oficial competente a passagem à situação de reforma. Em 17 de Julho de 2008, A. e R. acordaram que a primeira emprestaria ao R., até que a este fosse concedida a passagem à reforma antecipada, o montante de € 1.500 (mil e quinhentos euros) por mês (14 catorze meses por ano). No âmbito do referido contrato, a primeira prestação de empréstimo teria lugar em 01 de Junho de 2008 e o prazo do empréstimo findava na data em que o R. começasse a receber directamente do Centro Nacional de Pensões, a sua pensão de reforma, tendo-se, ainda, o R. comprometido a informar a A. da data na qual começasse a receber tal pensão. Nos termos do já mencionado contrato de mútuo, o reembolso do empréstimo deveria ser integralmente realizado no prazo de 10 (dez) dias a contar da data em que o segundo outorgante recebesse do Centro Nacional de Pensões a importância retroactiva da sua pensão de reforma. A A. emprestou ao R. o valor mensal acordado, de Junho de 2008 a Maio de 2010 (conforme extracto de conta corrente relativa ao R. e recibos de vencimentos de Julho de 2008 a Maio de 2010, aí mencionados), nos montantes mensais que indica. A A., apenas em 23 de Março de 2010, foi notificada pelo Instituto de Segurança Social IP – Centro Nacional de Pensões, do deferimento da pensão de reforma ao R., com efeitos reportados à data de 12 de Março de 2008. Acontece que, ao contrário do que previa a cláusula 9ª do acordo de pré-reforma, o R. não informou a A. em como lhe tinha sido deferido o pedido de pensão a título de reforma. Na ausência de reembolso dos montantes emprestados, o que era devido ao abrigo da cláusula 4ª do contrato de mútuo, nos termos supra expostos, a A. notificou o R. para regularizar o saldo devedor de € 42.000,00 (quarenta e dois mil euros), por meio de carta registada, datada de 19 de Dezembro de 2011, sendo que o R. respondeu, através de carta datada de 9 de Dezembro de 2012, na qual referiu ter procedido à transferência bancária no montante de € 13.496,40 (treze mil quatrocentos e noventa e seis euros e quarenta cêntimos) por conta da dívida para com a A., montante que esta reconhece ter recebido. Ficou, assim, por liquidar, relativamente ao «contrato de mútuo», a quantia de € 28.503,60.

Concluiu pedindo que o R. seja condenado a pagar-lhe o montante de € 34.236,31 (trinta e quatro mil duzentos e trinta e seis euros e trinta e um cêntimos) a título de reembolso de empréstimo» e os «juros de mora vincendos, calculados à taxa legal em vigor para os juros comerciais sobre o montante referido, desde 03/05/2010 até integral e efectivo pagamento do montante relativo ao reembolso do empréstimo, os quais se contabilizam, em € 5.079,99 (cinco mil e setenta e nove euros e noventa e nove cêntimos).

O R. contestou tendo, além do mais, deduzido a excepção dilatória da incompetência material do tribunal, defendendo ser competente o Tribunal do Trabalho de Loures.

Por decisão proferida em 02-1-2014, foi julgada procedente a deduzida excepção da incompetência material, com a consequente absolvição do R. da instância.

1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreu a A. de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa tendo-se aí, por acórdão de 9-7-2015, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

1-3- Irresignada com este acórdão, dele recorreu a A. para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: A. Faz-se notar, antes de mais, que, sobre factualidade muito semelhante (quase idêntica) em sede do Proc. 83/14.6TTLSB.L1 que correu termos no Processo Tribunal da Relação de Lisboa, 7ª Secção e em que eram partes a ora Recorrente e outro ex-trabalhador da mesma, decidiu a Relação (sem votos de vencido) como se segue (ver Doc. 1 que ora se junta): " (...) Dispõe o artigo 85.° da LOFTJ que "compete aos tribunais do trabalho conhecer, em matéria cível… b) Das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho".

A propósito da interpretação do preceito em causa, escreveu-se no Ac. Do STJ de 16.11.2010, P. 981/07.3TTBRG.S1, rel., Cons. Sousa Grandão, in www.dgsi.pt, que "Basta compaginar o teor daquela alínea b) com o da sequente alínea o) para se perceber que "as questões emergentes" ali configuradas não abarcam todas as questões surgidas entre a entidade patronal e o trabalhador; se assim fosse, quedaria injustificado o comando da alínea o), pois que todas elas já seriam integráveis na sobredita previsão antecedente (cfr. Ac. STJ de 3/5/2000, in CJ do STJ Ano VIII, Tomo 2, página 39). Sendo assim, é forçoso reconhecer que as "questões" elencáveis na alínea b) são apenas aquelas que possam integrar o núcleo essencial (que não acessório, complementar ou dependente) da relação de trabalho" (...) A competência do tribunal não depende, pois, da legitimidade das partes nem da procedência da acção. É ponto a resolver de acordo com a identidade das partes e com os termos da pretensão do Autor (compreendidos aí os respectivos fundamentos), não importando averiguar quais deviam ser as partes e os termos dessa pretensão" (...) Tal empréstimo deriva da vontade das partes (mesmo que com várias razões subjacentes) e não de qualquer cláusula contratual ou de AE.

Embora subjacente tenha a relação laboral referida, o crédito invocado na acção, tal como configurado pelo A, não "emerge" dessa relação. O pagamento da prestação de pré-reforma processa-se no âmbito do acordo de suspensão do contrato individual de trabalho [E é processado até à data da reforma].

Já o pagamento das prestações mensais do empréstimo processa-se numa fase em que o R. já requereu a passagem à situação de reforma, vindo a ser reformado, por velhice, com efeitos reportados à data de 31.11.2008.

Não se pode, assim, dizer, que o pedido da A. emerge da relação de trabalho subordinado, por ser o reembolso do montante mutuado, ao abrigo do acordo celebrado, que está em causa.

(...) conclui-se ser o tribunal cível, o competente para conhecer da presente acção. (...)".

B. Já nos autos, o entendimento do Tribunal da Relação partiu do pressuposto de o acordo de pré-reforma e o posterior contrato de mútuo visaram ambos a cessação do contrato trabalho, o que, salvo devido respeito, é errado! C. O que aconteceu é que o contrato de mútuo foi celebrado num determinado contexto factual, no qual, efectivamente, havia sido celebrado um acordo de pré-reforma entre as partes. Nessa sede, o R./Recorrido havia-se obrigado a requerer a passagem da sua situação à reforma até uma determinada data (12 de Março de 2008) de e é apenas após essa data (17 de Julho de 2008) que é celebrado o contrato de mútuo.

D. Mas daqui não decorre que o contrato de mútuo tenha sido celebrado com vista à cessação da relação laboral! Tratou-se, antes - no contexto da vontade que ambas as partes tinham na cessação da relação laboral, expressa no acordo de pré-reforma ao qual se seguiria a passagem à reforma do R./Recorrido - de uma liberalidade da A./Recorrente, no sentido de minimizar os efeitos de não ter sido concedida imediatamente a passagem à reforma do R./Recorrido (cujo pedido era responsabilidade sua, do R./Recorrido - ver cláusula 9.° n.° 1 do dito acordo, junto como Doc. 1 da PI).

E. De facto, encontramo-nos perante a situação descrita no artigo 85.° al) o) da LOFTJ ("(...) Das questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho (...), quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência (...)) embora não se verifique a cumulação desse pedido com outro para o qual o tribunal seja directamente competente - e daí não se aplicar aquela alínea.

F. É que, como foi muito bem observado por esse Digno STJ: "(...) Basta compaginar o teor daquela alínea b) com o da sequente alínea o) para se perceber que "as questões emergentes" ali configuradas não abarcam todas as questões surgidas entre a entidade patronal e o trabalhador: se assim fosse, quedaria injustificado o comando da alínea o), pois que todas elas já seriam integráveis na sobredita previsão antecedente (cfr. Ac. S.T.J. de 3/5/2000 in C.J. do S.T.J; Ano VIII, Tomo 2, página 39) (...) ".

G. Já seria de considerar de outra forma caso decorresse da relação laboral que vinculava as partes a obrigação de a A./Recorrente efectuar adiantamentos da pensão de reforma ao R./Recorrido enquanto a sua passagem à situação de reforma não fosse concedida (quer por meio de IRCT ou de cláusula de contrato individual de trabalho). Aí, estaríamos, efectivamente, perante a situação descrita na alínea b) do artigo 85.° da LOFJT "b) Das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho".

H. No caso em apreço, nem o Acordo de Empresa aplicável, nem o contrato individual de trabalho celebrado entre as partes impunha aquela obrigação, pelo que os empréstimos concedidos pela A./Recorrente ao R./Recorrente foram consequência de uma liberalidade da primeira e não de qualquer obrigação laboral assumida entre as partes.

I. Na verdade, entende-se que, para que se possa analisar a aplicação do Direito ao caso concreto (ou seja, a aplicação do artigo 85°, alínea b) da Lei n.° 3/99, de 13 de Janeiro - LOFTJ - e sua correcção), haverá que analisar três temas: i. O que constitui "causa de pedir"? ii. Qual foi, no caso concreto, a causa de...

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