Acórdão nº 233/11.4TCGMR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Setembro de 2015
Magistrado Responsável | SALAZAR CASANOVA |
Data da Resolução | 10 de Setembro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.
AA propôs no dia 3-6-2011 ação declarativa com processo comum ordinário contra BB - Comunicações, SA pedindo a sua condenação: - A prestar ao autor, gratuitamente, o serviço de envio de mensagens e chamadas para outros utilizadores da sua rede de telefones móveis; - a pagar ao autor a quantia de 77.520 euros a título de danos patrimoniais causados pelo incumprimento do contrato até à data da apresentação desta ação; - a pagar ao autor a quantia de 120 euros por dia desde o dia seguinte à apresentação desta ação até que se ache restabelecida "para sempre" e gratuitamente o serviço de envio de mensagens e realização das chamadas para outros utilizadores das redes de telefones móveis da ré.
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Alegou que em 28-7-2008 adquiriu cartão para realizar chamadas por telemóvel e enviar mensagens curtas, utilizando a rede de telecomunicações da ré; o carregamento dos cartões permitia-lhe o acesso a utilizadores das redes telefónicas mediante determinado custo por chamada e por mensagem escrita, salvo no que respeita às chamadas de voz e mensagens escritas para outros utilizadores da rede da ré.
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Quanto a estas, a ré proporcionava o acesso gratuito " para sempre" e "sem limites".
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No dia 25-8-2009 a ré deixou de prestar ao autor o aludido serviço gratuito.
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O autor, nessa data, recebeu comunicação, informando-o de que o tarifário tinha sido alterado, passando a ré a cobrar o valor de 0,06 cêntimos por cada mensagem escrita dirigida a outros utilizadores da ré.
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O autor vinha enviando cerca de 2000 mensagens escritas para outros utilizadores da ré.
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O autor ficou impedido de enviar mensagens por não poder suportar o custo.
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A indemnização reclamada de 77.520 euros corresponde ao custo das mensagens diárias correspondentes ao período que decorre de 25-8-2009 a 3-6-2011, data de apresentação da ação.
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A ré, na contestação, considera que as condições gerais do tarifário se encontravam publicadas no site da ré, referindo-se aí no que respeita a "Comunicações entre BB sujeitas a Política de Utilização Responsável" que "a BB" reserva-se o direito de definir uma Política de Utilização responsável aplicável às comunicações entre BB realizadas por clientes com este tarifário. O valor máximo de utilização responsável será definido com base nos perfis de utilização dos clientes particulares com o tarifário em causa e será revisto periodicamente em função da evolução desses perfis. No âmbito dessa política, a BB notificará, mediante o envio de um SMS, os clientes que excederem o nível de utilização razoável do serviço, reservando-se o direito, após esse aviso, de cobrar as comunicações efetuadas para além do nível de utilização razoável".
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O autor não cumpriu essa Política de Utilização razoável pois enviava cerca de 3000 SMS/dia.
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No dia 25-8-2009 o autor foi informado pela ré de que, "dada a situação que tinha excedido o nível e utilização previsto, se ia proceder à alteração do tarifário" 12.
A ré procedeu à alteração do tarifário dando indicação ao autor em 8-10-2009 de que as SMS gratuitas ficavam sujeitas a uma Política de Utilização Responsável de 1500 SMS gratuitas por semana; ultrapassado este limite, as mesmas seriam cobradas a 0,115€/SMS, tarifário residencial e para utilização pessoal de serviço.
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Tal tarifário foi alterado novamente em 28-10-2009 para Livre Base por não ter o autor efetuado a partir de 23-8-2009 os carregamentos a que o Plano de Tarifário obrigava.
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Houve, pois, incumprimento do autor no que respeita à obrigação de cumprimento da aludida Política de Utilização Responsável e os valores reclamados não constituem danos.
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A ação foi julgada parcialmente procedente, condenando-se a ré a prestar ao autor, gratuitamente, o serviço de envio de mensagens e chamadas para outros utilizadores da sua rede de telefones móveis e a pagar ao autor o que se liquidar em execução de sentença relativamente aos prejuízos provocados com a alteração do tarifário desse 25-8-2009 até que se ache restabelecido, para sempre e gratuitamente, o serviço de envio de mensagens e realização de chamadas para outros utilizadores das redes de telefones móveis da ré.
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O Tribunal da Relação do Porto alterou a matéria de facto e, com voto de vencido, julgou parcialmente procedentes as apelações interpostas, condenando a ré a pagar ao autor a título de indemnização por danos não patrimoniais por este sofridos em consequência da atuação ilícita da ré a quantia de 2000 euros, acrescida de juros de mora que venham a vencer-se desde a data da presente decisão à taxa atualmente em vigor ou outra que venha entretanto a vigorar até integral pagamento; confirmou a sentença recorrida na parte em que condenou a ré a "prestar ao autor, gratuitamente, o serviço de envio de mensagens e chamadas para outros utilizadores da sua rede de telefones móveis, relativamente ao cartão com o número 93...43".
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Do acórdão foi interposto recurso pela CC -Comunicações, SA (anteriormente com a designação BB-Comunicações, SA) e também pelo autor.
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A CC considera que se justifica ampliar a matéria de facto aditando-se os seguintes factos:
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As 3000 mensagens enviada diretamente a custo zero pelo autor para outros utilizadores da rede da ré eram feitas com recurso a um sistema informático b) Tais mensagens destinavam-se à divulgação dos serviços de informática que o autor pretendia realizar.
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O tarifário contratado pelo autor à ré era residencial, pressupondo, portanto, uma utilização pessoal 19.
Tais factos, segundo a recorrente, são factos confessados pelo autor, relevando enquanto confissão judicial escrita nos termos do artigo 358.º/1 do Código Civil e resultaram de declaração do autor na sequência de convite que lhe foi dirigido pelo Tribunal após os articulados.
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A CC sustenta ainda que se está em face de um caso de erro sobre as bases do negócio (artigo 252.º/2 do Código Civil) visto que desconhecia, quando celebrou o contrato, porque o autor disso não a informou, que ele iria utilizar um sistema informático (SPAM) para o envio de mensagens, limitado àquelas que eram gratuitas, circunstâncias essas que, por isso, não foram tomadas em consideração pela ré; o serviço não estava a ser utilizado para fins pessoais do autor, mas também para fins comerciais, constituindo esta situação um caso de abuso ou utilização indevida do serviço contratado que originou a excessiva onerosidade económica da prestação devida pela ré que não estava coberta pelos riscos próprios do contrato, devendo imperar a modificação do contrato, ou seja, passando o seu tarifário a ficar sujeito ao pagamento de 0,06 euros por cada mensagem escrita dirigida aos outros utilizadores da rede da ré.
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Considera ainda a recorrente que estão verificados os requisitos exigidos pelo artigo 437.º do Código Civil, atuando, por conseguinte, a recorrente no exercício do direito ao modificar o contrato, o que importa a sua absolvição do pedido, violando o acórdão recorrido os artigos 358.º/1, 252.º/2 e 437.º do Código Civil.
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O autor, por sua vez, interpôs recurso de revista limitado à questão da fixação do montante da indemnização a suportar pela ré pela reparação dos danos causados pelo autor com o seu comportamento ilícito.
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O recorrente discorda do entendimento de que por não se ter demonstrado que, em resultado da conduta da ré, ele acabou por não suportar nenhum custo com as mensagens escritas, a indemnização não é devida, sugerindo esse entendimento que, se acaso tivesse suportado o custo do envio de 2000 mensagens por dia, a indemnização seria fixada de acordo com esse custo.
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Ora uma vez provado que o autor ficou impedido de enviar aquelas mensagens por não ter dinheiro para suportar o custo imposto, não há dúvida de que o autor deixou de beneficiar do valor que o envio das mensagens representa, valor que deve ser fixado por referência ao seu custo, para mais se este for o custo considerado pela própria ré.
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Argumento este que é similar ao que decorre da reparação do dano da privação do uso dos bens que se há de encontrar por referência ao valor locativo das coisas.
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A decisão proferida constitui, para o recorrente, um prémio para o inadimplente, pois não existe justificação legal para exigir do lesado, como condição para haver o valor substitutivo do serviço em falta, a comprovação de que suportou o custo equivalente ou sequer a demonstração do uso que pretendia fazer do serviço em falta e das vantagens isso lhe traria. A recomposição da situação danosa reclama que, pela única via então possível, ou seja, pela atribuição de um equivalente pecuniário, o lesado consiga ser reintegrado "a posteriori".
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Equilibrado se mostra, segundo o recorrente, a fixação dos valores pedidos à razão de 0,06 euros por mensagem que o autor ficou impedido de enviar, o que representa 120 euros por dia, ou seja, uma quantia total de 77.520 euros no que respeita ao vencido até à data de propositura da ação a que acresce a quantia de 120 euros/dia desde o dia seguinte à apresentação da ação até ao restabelecimento do serviço contratado, mostrando-se, assim, violado o disposto nos artigos 566.º/3 e 564.º/2 do Código Civil.
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Factos provados: 1. A ré é uma sociedade anónima que tem por objeto a prestação de serviços de telecomunicações, designadamente de comunicações de voz e dados através de telemóveis.
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Para aquele objetivo, a ré detém uma rede de distribuição de sinal de telemóvel espalhada pelo país.
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Em 28 de julho de 2008, o autor deslocou-se a uma loja da ré na Avenida da Liberdade, da cidade de Braga, pretendendo adquirir um cartão para realizar chamadas e enviar mensagens curtas, utilizando a rede de telecomunicações da ré.
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Ali chegado, e entre outros, a ré, contra o recebimento da quantia de 9,90€ (nove euros e noventa cêntimos), entregava dois cartões de telemóvel com 20.00 (vinte euros) em chamadas, sendo 10,00€ (dez euros) em cada cartão, sendo 5,00€ (cinco euros) de saldo inicial em cada um e outros 5,00€ (cinco euros) após o primeiro...
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