Acórdão nº 5789/06.0TAVNG.K.P1.S1      de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução19 de Abril de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - RELATÓRIO 1.

AA, e “BB, Lda”, arguidos nos autos supra identificados, vêm interpor RECURSO DE REVISÃO do acórdão do Tribunal da Relação do Porto que confirmou a sentença de 1ª instância e que condenou os recorrentes, nos termos do artigo 449.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal, doravante CPP, e com os seguintes: «FUNDAMENTOS: 1. No 4° Juízo do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, foram julgados CC, DD, AA, “EE, Lda”, e “BB, Lda”, tendo sido proferida Sentença com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto e ao abrigo dos citados preceitos: Condeno a arguida “EE, Lda”, como co-autora e sob a forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelos arts. 7°, n.º 1 e n.º 3 e 103.º, n.º 1, al. c), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 500 (quinhentos) dias de muita à taxa diária de € 30 (trinta euros).

Condeno a arguida “BB, Lda”, como co-autora e sob a forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelos arts. 7°, nº 1 e n.º 3 e 103.º, nº 1, al. c), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 500 (quinhentos) dias de multa à taxa diária de € 30 (trinta euros).

Condeno o arguido CC, como co-autor e sob a forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelos arts. 7°, n.º 1 e n.º 3 e 103.º, n.º 1, al. c), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 2 (dois) anos de prisão, cuja execução se suspende pelo período de 2 (dois) anos, condicionada ao pagamento ao Estado, nesse prazo, da totalidade da quantia equivalente às prestações tributárias e acréscimos legais, que deveriam ter sido entregues, devendo o seu pagamento ser comprovado nestes autos findo esse prazo.

Condeno o arguido DD, como co-autor e sob a forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelos arts. 7°, n.º 1 e n.º 3 e 103.º, n.º 1, al. c), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 2 (dois) anos de prisão, cuja execução se suspende pelo período de 2 (dois) anos, condicionada ao pagamento ao Estado, nesse prazo, da totalidade da quantia equivalente às prestações tributárias e acréscimos legais que deveriam ter sido entregues, devendo o seu pagamento ser comprovado nestes autos findo esse prazo.

Condeno o arguido AA, como co-autor e sob a forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelos arts. 7º, n.º 1 e n.º 3 e 103º, n.º 1, al. c), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 2 (dois) anos de prisão, cuja execução se suspende pelo período de 2 (dois) anos, condicionada ao pagamento ao Estado, nesse prazo, da totalidade da quantia equivalente às prestações tributárias e acréscimos legais que deveriam ter sido entregues, devendo o seu pagamento ser comprovado nestes autos findo esse prazo.

Julgo parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo Estado Português e, em consequência, condeno solidariamente “EE, Lda”, BB, Lda", CC, DD e AA a pagarem àquele a quantia de € 387 565, 97 (trezentos e oitenta e sete mil, quinhentos e sessenta e cinco euros e noventa e sete euros), acrescida de juros de mora desde 31 de Maio de 2002 e até efectivo e integral pagamento, à taxa decorrente do art. 559°, n.º 1, do C. Civil, que até 30 de Abril de 2003 foi de 7 % e desde 1 de Maio de 2003 tem sido de 4 %, absolvendo-os do demais peticionado.».

  1. Dessa Sentença recorreram, além de outros e no que interessa ao presente recurso extraordinário, os condenados AA e a BB, Lda (em requerimento conjunto, igualmente).

  2. Apreciando e decidindo todos estes recursos, o Tribunal da Relação do Porto proferiu Acórdão, julgando-os totalmente improcedentes, e mantendo, na íntegra, a Sentença recorrida.

  3. Esse Acórdão funcionou, no caso, como última Instância, não tendo cabido recurso para o Supremo, como este o veio a decidir.

  4. Sintetizando as condenações dos aqui recorrentes: 6. O Recorrente AA, foi condenado como co-autor e sob a forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelos arts. 7º, n.º 1 e n.º 3 e 103º, n.º 1, al. c), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 2 (dois) anos de prisão, cuja execução se suspende pelo período de 2 (dois) anos, condicionada ao pagamento ao Estado, nesse prazo, da totalidade da quantia equivalente às prestações tributárias e acréscimos legais que deveriam ter sido entregues, devendo o seu pagamento ser comprovado nestes autos findo esse prazo.

  5. A Recorrente “BB, Lda”, foi condenada como co-autora e sob a forma consumada, de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelos arts. 7°, nº 1 e n.º 3 e 103.º, nº 1, al. c), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 500 (quinhentos) dias de multa à taxa diária de € 30 (trinta euros).

  6. Na procedência parcial do pedido de indemnização cível deduzido pelo Estado, ambos os aqui Recorrentes (AA e “BB, Lda”) foram condenados solidariamente (com os restantes arguidos do processo) a pagarem ao Estado a quantia de € 387 565, 97 (trezentos e oitenta e sete mil, quinhentos e sessenta e cinco euros e noventa e sete euros), acrescida de juros de mora desde 31 de Maio de 2002 e até efectivo e integral pagamento, à taxa decorrente do art. 559°, n.º 1, do C. Civil, que até 30 de Abril de 2003 foi de 7 % e desde 1 de Maio de 2003 tem sido de 4 %.».

  7. Após o trânsito em julgado da sentença condenatória, os arguidos aqui Recorrentes decidiram efectuar o pagamento da quantia em que haviam sido condenados.

  8. Assim, o arguido AA decidiu efectuar o pagamento ao Estado do IRC devido pela empresa arguida Esfinge e de acordo com a sentença condenatória.

  9. Para o efeito, dirigiu-se ao Serviço de Finanças competente para efectuar o pagamento do valor de IRC devido por aquela empresa por ocultação do valor de € 922.766,00 (185.000.000$00).

  10. Todavia, de acordo com informação prestada pelo Serviço de Finanças, essa liquidação, por imperativo legal e regulamentar, só poderia ser efectuado desde que, previamente, a empresa BB apresentasse uma declaração modelo 22 de substituição.

  11. Assim foi que, cumprindo essa directriz, a empresa BB apresentou no Serviço de Finanças competente a declaração modelo 22 de substituição, em 15.11.2013.

  12. Nessa declaração pode verificar-se no quadro 225 que a arguida Esfinge fez acrescer a quantia de €922.766,00 – DOC 1.

  13. Assim, a arguida BB passou de um resultado líquido do exercício negativo de € 196.897,54 [como se verifica no quadro 239 da declaração mod. 22 entregue em 31.05.2002 referente ao ano de 2001 (DOC 2)] para um lucro tributável de € 757.512,87 que consta do quadro 240 da declaração de substituição referente ao mesmo ano de 2001 (DOC 1).

  14. Esta alteração originou uma liquidação adicional da AT em 18.11.2013 no valor de € 59.348,94 (DOC 3) que resulta da soma das seguintes rúbricas: IRC - € 35.763,62 Derrama - € 4.075,16 Juros compensatórios: € 19.369,28 Juros de mora: € 140,88 17. O arguido pagou o valor em causa (com acrescidos juros de mora) de forma parcelar (DOC 4) e nas seguintes datas: a) € 10.782,04 em 29.08.2014 b) €30.000,00 em 08.01.2015 c) € 22.188,12 em 19.01.2015 18. O que totalizou € 62.970,16 19. O arguido AA ciente das suas obrigações e condenação, procurou dar cumprimento ao exarado na sentença condenatória.

  15. Diz-se na parte dispositiva da sentença que “com a simulação de preço logrou o arguido AA que a sociedade arguida BB pagasse menos € 295.288,36 relativos ao IRC de 2001, do que a mesma pagaria se tivesse declarado integralmente o preço do negócio”.

  16. Todavia, a verdade é que o imposto que era devido, à data dos factos imputados aos recorrentes e pelos quais estes foram condenados, é o que resultou da liquidação operada pela Autoridade Fiscal, após a arguida Esfinge declarar integralmente o preço de negócio (DOC 1 e 3), tal como foi sentenciado.

  17. Neste contexto, o valor do IRC devido (e acréscimos legais) que deveria ser entregue pela arguida BB, conforme liquidação efectuada pela Autoridade Fiscal (DOC 3), foi efectivamente pago pelo arguido AA (DOC 4).

  18. Não se encontrando nenhum valor em dívida (DOC 4).

  19. Este acto tributário de liquidação tem o nº 2013 2310434193 e é datado de 18 de Novembro de 2013.

  20. Este documento constitui quer um facto novo, quer um meio de prova novo facto novo nos termos e para os efeitos do artº 449º, nº 1 – d) CPP: O RECURSO DE REVISÃO 26. Um dos valores fundamentais do direito é o da segurança das decisões judiciais, consubstanciada no instituto do trânsito em julgado. 27. Mas, como todos os valores, não é um valor absoluto, estando sujeito a limitações, restrições e compensações e inserção em graduação hierárquica de e outros valores hierarquia.

  21. Assim superior a esse valor é o da justiça material que releva nas questões dos direitos fundamentais da pessoa humana.

  22. As condenações penais, onde são, ou podem ser afrontados os direitos à liberdade, à honra e bom nome do condenado, impõem uma derrogação ou limitação à imutabilidade da sentença, característica do caso julgado.

  23. Figueiredo Dias Direito Processual Penal, 44, citado por Maia Gonçalves no Código de Processo Penal Anotado e Comentado, 11.ª edição, págs. 795 afirma que a segurança é um dos fins prosseguidos pelo processo penal, mas que “isto não impede que institutos como o do recurso de revisão contenham na sua própria razão de ser um atentado frontal àquele valor, em nome das exigências da justiça. Acresce que só dificilmente se poderia erigir a segurança em fim ideal único, ou mesmo prevalente, do processo penal. Ele entraria então constantemente em conflitos frontais e inescapáveis com a justiça; e, prevalecendo sempre ou sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma segurança do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos têm de reconhecer não passar de uma segurança aparente e ser só, no fundo, a força da tirania”.

  24. Por isso, o art.º 29.º, n.º 6, da Constituição da República prevê, no domínio dos direitos, liberdades e garantias, sobre a aplicação da lei criminal, que “Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei...

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