Acórdão nº 1336/13.6JAPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução19 de Abril de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

RECURSO PENAL[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO 1. No processo comum, com intervenção do tribunal coletivo, nº1336/13.6JAPRT da Comarca de ...- Instância Central- ...ª Secção Criminal –..., foi proferido acórdão, em 10.10.2016, que decidiu: « julgar a acusação parcialmente procedente, por provada, pelo que, consequentemente: 1. Condenam o arguido AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punível pelos artigos 171.º, n.º 1 e 177.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; 2. Condenam o arguido AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abuso sexual de menores dependentes agravado, previsto e punível pelos artigos 172.º, n.º 1 e 177.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; 3. Condenam o arguido AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punível pelos artigos 143.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa à taxa diária de € 7,00 (sete euros), perfazendo o montante de € 420,00 (quatrocentos e vinte euros); 4. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares impostas nos pontos 1º a 3º deste dispositivo, condenam o arguido AA: - na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão; e - na pena de 60 (sessenta) dias de multa à taxa diária de € 7,00 (sete euros), perfazendo o montante de € 420,00 (quatrocentos e vinte euros).

  1. Absolvem o arguido da requerida aplicação das sanções acessórias de proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual e de proibição de confiança de menores e inibição de responsabilidades parentais (arts. 69º-B e 69º-C do Código Penal na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 103/2015, de 24 de Agosto).

  2. Absolvem o arguido da prática de um crime de violência doméstica, na forma consumada, previsto pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea d), e n.º 2 e punível pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea d), n.º 2, n.º 4, n.º 5 e n.º 6, todos do Código Penal.

  3. Julgam ainda parcialmente procedente por provado o pedido de indemnização civil deduzido pelo Ministério Público contra o arguido, condenando-o no pagamento à ofendida BB da quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros); 8. Custas Criminais: Condenam o arguido no pagamento das custas do processo, com quatro UCs de taxa de justiça, ao abrigo do disposto nos arts. 374º, nº 4; 513º, nº s 1, 2 e 3; 514º, nºs 1 e 2 e 524º, todos do CPP, bem como nos termos dos art. 8º, nº 9 do Regulamento das Custas Processuais (em conjugação com a Tabela III).

  4. Custas Cíveis: Vai ainda ao arguido condenado nas custas referentes ao pedido cível na proporção do respectivo decaimento – art. 527º, n.ºs 1 a 3 do C.P.Civil ex vi do art. 523º do C.P.Penal».

  5. Inconformado, o arguido, AA, interpôs recurso deste acórdão, terminando as motivações com as seguintes conclusões: «1 – O Supremo Tribunal de Justiça é competente para decidir o presente recurso, de matéria de direito, nos termos do artigo 432º, nº 1, alínea c) do C.P. Penal.

    2 – O recorrente não se conforma com a pena de prisão efectiva de 5 ( cinco ) anos e 6 ( Meses ) que lhe foi aplicada em cúmulo jurídico e de cuja decisão se recorre, devendo a pena aplicada ao crime p. e p. pelos artigos 172º, nº 1, alínea b) do CP, ser reduzida para 4 ( quatro ) anos de prisão.

    3 – Entende o recorrente como justa, adequada e equilibrada, que, a mesma seja reduzida por 5 ( cinco ) anos, em cúmulo jurídico e suspensa na sua execução pelo mesmo período, sob a condição de o mesmo se submeter a acompanhamento, nos termos a definir pelo Tribunal de 1ª Instância, em consultas da especialidade de Psiquiatria e / ou Psicologia direccionadas a perturbação de cariz sexual.

    4 – O recorrente confessou no final da audiência de discussão e julgamento os factos constantes da douta acusação pública, sendo de se admitir estar o mesmo arrependido dos actos cometidos, não devendo interpretar-se como não estando só pelo facto de ter afirmado, quando questionado porque razão só o fazia naquela altura ter respondido singelamente “ para beneficiar da atenuante “.

    5 – O artigo 61º, nº 1, alínea d) do CPP concede ao arguido o “ direito ao silêncio”, o qual não pode ser de modo nenhum valorado como indício ou presunção de culpa ( Anotação ao artigo 61º do C. P. Penal de Maia Gonçalves, 10ª Edição, pág. 190 ), tanto mais que qualquer pena aplicada com base numa presunção de culpa, é inaceitável face à CRP, cujo artigo 32º, nº 2 há muito baniu do Processo Penal.

    6 – Pena adequada é aquela que é proporcional à gravidade do crime cometido. Em sede do princípio da proporcionalidade, torna-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade do facto e a gravidade da pena pois que é certo que, ao cometer um crime, o agente incorre na sanção do Estado no exercício do seu direito de punir igualmente é exacto que esta sanção importa uma limitação da sua liberdade.

    7 – O Tribunal a quo não valorou as declarações prestadas pelo recorrente, tendo-as entendido como não representando qualquer arrependimento.

    8 – O Tribunal a quo não atendeu aos factos que abonavam a favor do recorrente e que constam do Relatório Social e estão plasmados nos pontos 47º a 66º dos factos dados como provados, no acórdão de que se recorre.

    9 – O recorrente é delinquente primário e está socialmente bem integrado, quer no âmbito escolar quer no familiar, sendo considerado no meio social onde reside como pessoa pacata.

    10 – O recorrente padece de instabilidade psico-emocional, tendo, por tal, recorrido a apoio clínico especializado em Julho de 2013, manifestando consciência crítica quanto a factos contrários ao normativo legal e nomeadamente quanto aos factos pelos quais se encontra condenado.

    11 – A pena visa a protecção de bens jurídicos, tendo também em vista a reintegração do agente na sociedade e não a sua exclusão. A culpa é a razão de ser da pena, e também o fundamento para estabelecer a sua dimensão.

    12 – A reinserção do delinquente na sociedade é hoje entendido como uma das traves mestras de todo o sistema punitivo, daí a preferência declarada do legislador por medidas não detentivas, do mesmo passo que os sistemas penais do passado assentavam na privação da liberdade.

    13 – As informações dadas pelas escolas onde leccionou e continua a leccionar descrevem o arguido recorrente como um professor empenhado e com relacionamento cordial e adequado com os alunos, nada havendo a salientar de anómalo ( ponto 51 dos factos provados ).

    14 – O recorrente, como professor de informática aufere mensalmente a quantia de 1.100,00 € tendo obrigações mensais de 270,00 € + 290,00 € + 200,00 € + 30,00 € + 30,00 €, num total de 820,00 €, pelo que, qualquer pena privativa de liberdade porá em causa tudo isto, e mais, não terá possibilidades de continuar a suportar a prestação alimentícia mensal ao seu filho menor de 9 anos, nem tão pouco as prestações bancárias com os empréstimos que lhe foram concedidos, quer em regime de compropriedade quer individualmente.

    15 – Reafirma-se que a questão suscitada no presente recurso – a de a pena unitária pode vir a ser suspensa na sua execução – por igual período de 5 ( cinco ) anos, envolve um dos eixos fundamentais do direito penal que é o da finalidade da pena, colocando-se tal problemática no seguimento específico da admissibilidade da pena de substituição. Por outras palavras, a decisão a emitir pressupõe a ultrapassagem de uma fase de determinação da pena concreta e implica uma definição do equilíbrio entre prevenção geral e especial na aceitação daquela pena de substituição.

    16 – O Tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa ou de uma pena de substituição quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária, ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas, o que não é o caso em análise.

    17 – Dispõe o artigo 50º, nº 1 do CP que “ o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura de facto e a ameaça de prisão realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. “ Sic.

    18 – Devia o Tribunal a quo, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime, fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido recorrente no sentido de que a ameaça da pena serão paliativos suficientes para o afastar provavelmente da prática de novos crimes, mediante um processo de renovação de um projecto de vida compatível com o respeito, que é o seu dever, pelos valores cuja ofensa integra crimes, e com a possibilidade, como é seu interesse, de uma realização pessoal e comunitária positiva ( Cfr. STJ de 25 / 05 / 2001, Pº 01P1092 ( www.dgsi.pt ).

    19 – O arguido recorrente mantém uma adequada inserção social, familiar e profissional, pelo que, sempre se justifica, in casu, a suspensão da execução da pena nos termos do artigo 50º do C. Penal.

    20 – A aplicação de uma pena de substituição – aqui pena suspensa – é suficiente, não só para evitar que o agente reincida, como também para realizar o limiar mínimo de prevenção geral de defesa da ordem jurídica, tudo conforme melhor resulta dos factos provados dos pontos 47º a 66º e do teor do Relatório Social junto aos autos, sendo a mesma compreensível e admissível perante o sentido jurídico da comunidade.

    21 – Verá o arguido recorrente como adequada a pena conjunta da 5 ( cinco ) anos de prisão suspensa na sua execução ao abrigo do disposto no artigo 50º do CP. ex. vi. Artigo 77 do mesmo diploma legal, porquanto não obstante a gravidades que, em abstracto, reveste este tipo de actos para o comum dos cidadãos, o certo é que a...

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