Acórdão nº 1183/15.0JAPRT. P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução06 de Abril de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.

Na Comarca do Porto (Tribunal de Vila do Conde— Inst. Central — ....ª Secção Criminal — ...), no âmbito do processo comum coletivo n.º 1183/15.JAPRT, foi julgado e condenado o arguido AA, pela prática, em concurso de crimes, de - um crime de ameaça agravada [arts. 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal (CP)], na pessoa de BB, na pena de 1 ano de prisão; - um crime de detenção de arma proibida [arts. 86.º, n.º 1, als. c) e d), por referência ao art. 2.º, n.º 1, als.m), p), q), s), ae), aj), aq), ar), ax), e aad), e art. 3.º, n.ºs 1 e 2, al. e), n.º 5, al. e) e n.º 6, al. c), todos da Lei n.º 5/2006, de 23.02], na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; - um crime de uso e porte de arma sob efeito de álcool ((art. 88.º, n.º 1, da lei n.º 5/2006, de 23.02), na pena de multa de 180 dias à taxa diária de 10 euros; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. h), e j), todos do CP], na pessoa de CC, na pena de 15 anos de prisão; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. h), e j), todos do CP], na pessoa de DD, na pena de 16 anos de prisão; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. e), h), e j), todos do CP], na pessoa de EE, na pena de 17 anos de prisão; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. b), e), h), e j), todos do CP], na pessoa de BB, na pena de 19 anos de prisão; Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado em 25 anos de prisão e em 180 dias de multa, à taxa diária de € 10,00.

  1. Inconformado, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 19.10.2016, julgou parcialmente provido o recurso, tendo eliminado dos factos provados os respeitantes ao crime de detenção de arma proibida em que havia sido condenado, e consequentemente absolveu o arguido deste crime e decidiu apenas manter a condenação nos restantes.

    Assim vem o arguido condenado nos seguintes termos — pela prática: - um crime de ameaça agravada [arts. 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal (CP)], na pessoa de BB, na pena de 1 ano de prisão; - um crime de uso e porte de arma sob efeito de álcool ((art. 88.º, n.º 1, da lei n.º 5/2006, de 23.02), na pena de multa de 180 dias à taxa diária de 10 euros; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. h), e j), todos do CP], na pessoa de CC, na pena de 15 anos de prisão; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. h), e j), todos do CP], na pessoa de DD, na pena de 16 anos de prisão; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. e), h), e j), todos do CP], na pessoa de EE, na pena de 17 anos de prisão; - um crime de homicídio qualificado [arts. 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. b), e), h), e j), todos do CP], na pessoa de BB, na pena de 19 anos de prisão; Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 25 anos de prisão e, em acumulação material, na pena de multa de 180 dias à taxa diária de € 10,00.

  2. Ainda inconformado, veio agora o arguido recorrer deste último acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça (cf. fls. 2224 e ss), tendo apresentado as seguintes conclusões: «1. Entende o recorrente, que, face à factualidade dada como provada em 1.ª e 2.ª instância, e ao Direito aplicável, a pena aplicada revela-se exagerada e desproporcional, violou normas jurídicas e fez uma interpretação incompleta e incorreta do direito, nos termos do artigo 412, n.º2, alínea a) e b), do CPP.

    Em pormenor, 2. O Tribunal recorrido violou normas jurídicas e fez uma interpretação consequentemente incorrecta de uma norma que deveria ter sido aplicada, nos termos do artigo 412, n.º 2, alínea a) e b) do CPP, na justa medida que condenou o recorrente à prática do crime de ameaça agravada, nos termos dos artigos 153.º, n.º1 e 155.º, n.º1 alínea a) do CP, com base no facto dado como provado no ponto 2.9 do douto acórdão.

  3. Diga-se, em abono da verdade que o recorrente não quis atemorizar BB, nem coarctar a liberdade pessoal, apenas demonstrar desagrado com o conflito, algo que não despoletou à BB qualquer medo, receio ou temor uma vez que continuou a manter contacto com o recorrente dentro dos parâmetros normais.

  4. A factualidade dada como provada e vertida no ponto 2.9 não é suficiente para o juízo conclusivo do ponto 2.64 dos factos provados, na justa medida que não se sabe em juízo o que aconteceu de facto em 04 de Abril, nem o contexto nessa data, nem o arguido confessou qualquer ameaça não se tendo produzido prova adicional sobre isso para além da mera transcrição das mensagens nos autos.

  5. Na verdade, o que existe é prova indirecta e só circunstancial, mesmo com as mensagens escritas enviadas a 04 de Abril de 2015, a Justiça deve procurar a verdade processual, isto é, a que resulta da legalidade e do valor objectivo dos meios de prova, pois a busca de qualquer outra "verdade" pode conduzir a um sério e irreparável erro judiciário.

  6. Porém, essa possibilidade está limitada aos casos em que a mesma seja voluntariamente consentida por quem tiver a disponibilidade ou o controlo desses dados – desde que o consentimento prestado fique, por qualquer forma, documentado – ou, nos casos de terrorismo, quando haja fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco o vida ou a integridade de qualquer pessoa.

  7. Não existiu qualquer junção voluntária aos autos e a prova pericial às sms guardadas no telemóvel do recorrente e da vítima BB não dispensava a intervenção do Juiz de Instrução Criminal, pelo que estamos perante um caso de prova proibida.

  8. A intervenção do juiz é obrigatória, tal como dispõe os artigos 17.º, 16.º, n.º3 da Lei do Cibercrime (Lei n.º 109/2009, 15 de Setembro) e n.º 3, 2.º parte do artigo 179.º do CPP, para aferir a legalidade/licitude da junção aos autos do conteúdo sms's.

  9. A falta desta intervenção torna esta prova recolhida nos telemóveis nula, não podendo por isso ser utilizada, nos termos do artigo 126.º, n.º3,e 179.º ambos do CPP.

  10. Em suma o arguido deve ser absolvido do crime de ameaça agravada na pessoa BB, uma vez que foi utilizado um método proibido de prova, sendo nula e consequentemente não poderá ser utilizada, nos termos do artigo 126.º, n.3 do CPP.

    Subsidiariamente, sem prescindir, 11. Mesmo que assim não se entenda, a prova que foi junta aos presentes autos e que imputa o crime de ameaça agravada ao arguido, padece também de erro de julgamento na livre apreciação da prova, na justa medida que carece de fundamentos suficientes.

  11. O tribunal violou o disposto no artigo 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, porque condenou o arguido com base em meras presunções quando, de facto e nos termos expostos, se não verificou o requisito concreto de receio pela vida da BB.

  12. À luz das regras da lógica e da experiência comum, da vivência e convivência da nossa sociedade, quem, a sério, receasse pela vida não denunciava a situação de estar sozinha e nunca lançaria desafio à comparência do arguido nesse mesmo momento da troca de mensagens.

  13. Em súmula, o douto acórdão presumiu um temor com base em critérios de um destinatário médio, quando na realidade a BB, em concreto e no dia das sms`s, demonstrou não ter esse temor, receio ou medo pela sua integridade física, nas mensagens trocadas com o arguido nessa noite de 04 de Abril, olvidando também o tribunal que o texto das mensagens é igualmente passível de diferentes interpretações igualmente plausíveis no cenário de um desentendimento entre cônjuges.

  14. A condenação do arguido no crime de ameaça agravada violou também o princípio in dubio pro reo porque, sendo o texto e atitudes de ambos os ex-cônjuges passíveis de várias dúvidas e interpretações, levou à condenação do arguido em vez da sua absolvição; 16. O recorrente não se conforma, nem entende que o Tribunal aprecie e valore provas carreadas no processo em detrimento de outras, de forma a exclusivamente a prejudicar o recorrente.

  15. A decisão recorrida não obedece ao princípio da livre apreciação da prova, na justa medida que o processo lógico-dedutivo alcançando assenta numa convicção meramente subjectiva, tendo por base "um destinatário médio" (sic), não fazendo uma análise racional de acordo com todo o circunstancialismo fáctico concreto, quando existiam elementos objectivos que conduziam a uma correcta procura pela verdade material.

  16. A decisão recorrida será nula, porque na condenação do arguido pelo crime de ameaça agravada na pessoa da BB, existiu uma flagrante violação ao princípio da livre apreciação da prova e também porque na decisão deveria conhecer as circunstâncias concretas e não se pronunciou, nos termos da alínea c), n.º1 do artigo 379.º, do CPP.

  17. Ou seja, a violação do princípio da livre apreciação da prova constitui um vício na decisão recorrida, na justa medida que existe um erro notório na apreciação da prova quanto ao crime de ameaça agravada na pessoa de BB, nos termos do n.º2, alínea c), do artigo 410.º, do CPP.

  18. Com efeito, o arguido deve ser absolvido do crime de ameaça agravada, por não preencher os pressupostos do crime de ameaça, nos termos do disposto no n.º1 do artigo 153.º, do CP.

    De novo, subsidiariamente, e, sem prescindir, 21. Caso V. Ex.as assim não o entendam, defende o recorrente que a escolha da espécie de pena prevista para o crime de ameaça agravado de acordo com o artigo 70.º do CP, deveria ter como critérios a adequação e suficiência da finalidade da pena, o que no caso não aconteceu...

  19. Tendo em conta o contexto em que os factos ocorreram, as pesadas penas de prisão efectiva de que foi objecto, a pena de multa é suficiente para acautelar, as necessidades de prevenção especial do recorrente, nos termos do disposto no artigo 70.º do CP.

  20. Face ao contexto, e à ausência do nexo de causalidade da troca de mensagens com o fatídico dia 28...

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