Acórdão nº 2884/11.8TBBCL.G1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelTÁVORA VICTOR
Data da Resolução23 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO.

    Acordam na 7ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça.

    AA, residente na Rua Senhora …, n.º …, freguesia de …, concelho de Barcelos, intentou a presente acção, com processo comum sob a forma ordinária, contra “BB Seguros, S.A..”, com sede na Rua …, n.º …, em Lisboa, pedindo que esta seja condenada, com base num contrato de seguro de responsabilidade civil, com a cobertura de danos próprios, a pagar-lhe a quantia de € 56.230,32, a título de indemnização pela perda total do veículo seguro, decorrente de um sinistro em que foi interveniente, e bem assim as seguintes quantias: - A quantia que for devida pela antecipação do vencimento das rendas no contrato de locação financeira celebrado com a CC, S.A., a remeter para liquidação em execução de sentença; - O valor das rendas e prémios de seguro suportados desde a data do acidente até à decisão final, a liquidar em execução de sentença; - Uma indemnização pelo incumprimento atempado do contrato de seguro em função da privação do uso do veículo, à razão diária de 30 €, até que sejam colocadas à sua disposição as quantias reclamadas a título de perda total e rendas; - O valor referente à resolução do contrato de leasing e o que se venha a apurar em sede de execução de sentença; - A quantia de € 1.000,00 por danos patrimoniais sofridos aquando do acidente; - A quantia de € 2.500,00 a título de danos morais; - Os juros à taxa de 8% ao ano, nos termos do disposto no art.º 43.º, n.º 2, do Dec.-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, contados desde a data da citação e até efectivo pagamento.

    A Ré contestou, reconhecendo a existência e condições do contrato de seguro, mas impugnando a ocorrência do sinistro descrito na petição inicial e as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que o mesmo pretensamente ocorreu, defendendo inclusive que os danos que o veículo apresenta são inconciliáveis com as características do local.

    Impugnou, também, os danos reclamados e os montantes em que foram avaliados, defendendo que a perda total do veículo é incompatível com o alegado dano emergente da privação de uso do veículo.

    Terminou, pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido e requerendo a intervenção principal provocada da locadora “CC, S.A.”, como associada do Autor.

    Admitido o chamamento e efectuada a competente citação, a chamada apresentou articulado próprio, formulando um pedido de condenação da Ré a pagar-lhe: - No caso de se tratar de sinistro com perda parcial, sendo o bem reparável, os custos dessa mesma reparação; - Se o sinistro tiver inutilizado definitivamente apenas uma parte do bem, podendo manter-se a locação quanto à parte restante, caso o locatário o deseje e o locador o consinta, deverão as rendas vincendas e o valor residual ser recalculados com base na indemnização paga ao locador por essa inutilização que em sede de execução de sentença se liquidará.

    - No caso de perda total do bem locado, o valor do capital ainda não recuperado, acrescido de todos os débitos vencidos e não pagos, bem como dos juros correspondentes ao período que mediar entre o momento em que o contrato se considerar resolvido e o efectivo pagamento, calculada a taxa do contrato, e ainda eventuais prejuízos resultantes da legislação fiscal e despesas administrativas, que liquidou em € 15.689,59; - No caso de não se provar a existência de qualquer sinistro, mas provando-se a alegada perda total do bem locado por destruição, o montante equivalente à perda total do bem locado, que liquidou em € 15.689,59.

    Notificados, a Ré e o Autor responderam, reiterando o alegado nos respectivos articulados.

    Corridos os trâmites legais, procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, no início da qual a interveniente declarou que o contrato de locação financeira celebrado com o Autor se encontrava totalmente liquidado desde 09 de Março de 2015, motivo pelo qual desistiu do pedido formulado, desistência essa que foi homologada por sentença, tendo ainda as partes acordado em dar por assente que tais pagamentos foram efectuados.

    Foi proferida sentença que, julgando parcialmente procedente a acção, condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 71.690,00, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal de 4% ou outra que estiver em vigor, desde a citação até integral pagamento, bem como a quantia que se vier a fixar em decisão ulterior relativa ao dano da privação do uso do veículo do Autor, desde a presente data até ao efectivo pagamento da indemnização arbitrada, no montante diário de € 15,00, e, bem ainda, a quantia que se vier igualmente a fixar em decisão ulterior referente aos prémios de seguro pagos pelo Autor desde a data do sinistro.

    Apelou a Ré sendo certo que a Relação de … confirmou a sentença em crise.

    De novo inconformada a Ré recorre de revista excepcional. No fim de tudo quanto alegou nesta sede, pediu a Autora que se revogue o decidido proferindo-se decisão de harmonia com a posição que expende no corpo das suas alegações.

    Contra-alegou o Autor entendendo que a revista da Ré não é admissível e, de todo o modo, sempre a mesma deverá improceder caso passe pelo crivo da admissibilidade.

    A Formação supra-referida admitiu o recurso excepcional sendo certo que tal admissão é definitiva, à luz do estatuído no artigo 672 nº 3 e 4.

    No termo da sua alegação a recorrente produziu, no que agora nos interessa considerar, as seguintes, Conclusões: Do objecto do recurso: 1) Vem o presente recurso interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal a quo que, negando provimento à apelação deduzida, manteve o decidido na 1ª instância.

    2) A Seguradora Apelante não pode concordar com os fundamentos que sustentam o acórdão recorrido.

    3) Sendo que o âmbito do presente recurso se cinge à apreciação da problemática seguinte: "Da inexistência do dever de indemnizar o dano da privação do uso da coisa segura fundado no retardamento, pela Seguradora, da realização da prestação indemnizatória a que se vinculou por força do contrato de seguro de danos, e quando tal cobertura não foi expressamente convencionada".

    4) Constitui facto incontornável nos presentes autos que foi entre as partes celebrado um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, incluindo a vertente facultativa de seguro de danos (cobertura de "choque, colisão ou capotamento").

    5) E que a presente acção se estriba, justamente, na dita vertente facultativa de seguro de danos.

    6) Afigura-se igualmente indubitável que o contrato de seguro em causa não abrangia a cobertura facultativa de veículo de substituição ou privação do uso, porquanto não foi expressamente contratada pelo aqui recorrido.

    7) Igualmente assente está o facto de que a Seguradora recorrente não procedeu ao pagamento da indemnização devida pela perda total, e pelos fundamentos melhor escalpelizados nos presentes autos.

    8) Tendo visto, no entanto, a sua pretensão e versão dos factos ser-lhe negada, fruto da factualidade apurada em sede de audiência de julgamento e ulteriormente confirmada pelo Tribunal da Relação.

    9) A questão que importa apurar é a de saber se o facto da Recorrente não ter procedido ao pagamento imediato da indemnização devida pela perda total do veículo seguro (na sequência do evento danoso que se veio a dar como provado), se traduz na violação de deveres acessórios de conduta associados ao princípio da boa fé, plasmado no art. 762° do Cód. Civil, e se tal violação constitui a Seguradora na obrigação de indemnizar o recorrido pelo dano emergente da privação do uso, cujo ressarcimento não foi expressamente convencionado e, portanto, não está abrangido pelo contrato de seguro.

    10) Salvo o devido respeito por diversa opinião, cremos que a resposta a conferir a tal questão, ante o concreto circunstancialismo dos autos, há que ser negativa.

    11) Desde logo porque não ocorreu qualquer violação, por parte da Seguradora recorrente, dos citados deveres acessórios de condutas determinados pelo principio geral da boa fé na execução dos contratos.

    12) A Seguradora recorrente não cumpriu, isso sim, a obrigação principal para si adveniente do contrato, que se subsome à obrigação de pagar a indemnização contratualizada em caso de sinistro coberto pela apólice.

    13) Sendo que a consequência jurídica do incumprimento de uma obrigação pecuniária - como a que existe ao abrigo do contrato em causa - é a constituição em mora, e a obrigação de pagamento de juros legais daí adveniente.

    14) A este propósito e por facilidade, permitimo-nos recordar o raciocínio expendido no acórdão-fundamento, e que tão bem espelha a tese por nós propugnada, e de onde se destaca o seguinte trecho: "Simplesmente, não parece que no caso haja espaço para debater o problema da violação, pela apelante, de um qualquer dever acessório, dado que - segundo a alegação mesma do recorrente - não está em causa a ofensa de um dever daquela espécie -...

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