Acórdão nº 406/12.2TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelOLINDO GERALDES
Data da Resolução02 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO A AA - Materiais de Construção, Lda., instaurou, em 21 de fevereiro de 2012, na então 6.ª Vara Cível da Comarca de … (Juízos Centrais Cíveis de Lisboa, Comarca de Lisboa), contra BB e CC - Compra e Venda de Imóveis, Lda, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que fosse declarado resolvido o contrato-promessa de compra e venda relativo à fração autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao 3.º andar do prédio sito na Rua …, n.º s 25, 27 e 29, em …, que a Autora tem direito a fazer seu o sinal prestado pelo Réu, no valor de € 30 000,00, que o Réu fosse condenado a pagar-lhe a quantia mensal de € 600,00, desde novembro de 2011, acrescida dos juros de mora desde a citação, e a desocupar e restituir de imediato, livre de pessoas e bens, a fração, e que a Ré fosse condenada a pagar-lhe a indemnização a liquidar em “execução de sentença”, acrescida dos juros de mora, à taxa comercial, desde a citação até integral e efetivo pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que, com a R., é legítimo proprietário da fração, que prometeram vender ao R., tendo este, que prometeu comprar, pago sinal e a restante parte do preço a ser paga na data da escritura pública, a realizar trinta dias após o levantamento do embargo da obra pela Câmara Municipal de …, podendo, entretanto, a fração ser usada pelo R; este recusou-se a celebrar a escritura e, em outubro de 2011, enviou-lhe uma carta a resolver o contrato-promessa, por falta de interesse na compra da fração, que a A. não aceitou, tendo marcado a escritura, para a qual os RR. não compareceram.

Contestou a R., por exceção e impugnação, concluindo pela improcedência da ação.

Contestou também o R., por impugnação, concluindo pela improcedência da ação. Em reconvenção, pediu ainda que fosse reconhecida a resolução do contrato-promessa e que a A. fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 60 000,00, acrescida de juros, vencidos desde outubro de 2010 até efetivo e integral pagamento, alegando, para o efeito, o incumprimento do contrato-promessa, imputável às promitentes vendedoras e o direito a receber o dobro do sinal prestado.

Replicou a A., respondendo, por um lado, à matéria de exceção e, por outro, contestando, por exceção e impugnação, a reconvenção.

Treplicou ainda o R., para responder à matéria de exceção.

Foi proferido despacho saneador, julgando-se improcedentes as exceções alegadas, e foi organizada a base instrutória, da qual houve reclamação, com parcial êxito.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 29 de agosto de 2014, sentença, que julgando a ação improcedente, absolveu os Réus do pedido, e a reconvenção procedente, reconheceu a resolução do contrato-promessa e condenou a Autora a pagar ao Réu a quantia de € 60 000,00, acrescida de juros, desde outubro de 2010 até efetivo e integral pagamento.

Inconformada, a Autora apelou para o Tribunal da Relação de …, que, por acórdão de 14 de fevereiro de 2017, dando procedência ao recurso, revogou a sentença, declarando resolvido o contrato promessa, reconhecendo à Autora o direito a fazer seu o sinal prestado, no valor de € 30 000,00, e condenando o Réu a pagar à Autora a quantia mensal de € 300,00, desde novembro de 2011 até à efetiva desocupação e restituição da fração, acrescida dos respetivos juros de mora, desde a citação, e a desocupar e restituir, de imediato, livre de pessoas e bens, a fração, e ainda declarando improcedente a reconvenção.

Inconformado, foi agora o Réu que recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:

  1. Decidiu mal a Relação ao atribuir ao Recorrente a culpa pela resolução do contrato, porquanto a sua conduta não preenche os requisitos do instituto do abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

  2. Ainda que assim não fosse, nunca poderia ser condenado à perca do sinal, mas antes devia ser restituído em singelo e condenado apenas a pagar um valor correspondente a € 300,00 por mês, desde a entrada da ação até à desocupação da fração, a título de compensação pela ocupação.

  3. Tendo sido válida e eficaz a resolução do contrato operada pelo Recorrente, deve ser reconhecido como válida e eficaz a detenção da fração pelo Recorrente, no exercício do direito de retenção que lhe assiste.

  4. O acórdão recorrido errou na interpretação dos factos, o que motivou o erro na determinação da norma aplicável – art. 674.º, n.º 1, do CPC.

  5. A decisão recorrida deve ser revogada, porquanto aplica erradamente a lei aos factos, violando os arts. 441.º, 442.º, n.º 2, 801.º, 808.º e 755.º, n.º 1, alínea j), do Código Civil, e aplicando erradamente o art. 334.º do CC Com a revista, o Réu pretende a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição pela decisão da 1.ª instância.

Contra-alegou a Autora, no sentido da improcedência do recurso.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Neste recurso, está essencialmente em discussão o incumprimento de contrato-promessa de compra e venda de imóvel.

II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. No acórdão recorrido, foram dados como provados os seguintes factos: 1.

A A. e a R. são donas e legitimas proprietárias, cada uma de 1/2 da fração autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao 3.º andar do prédio urbano, sito na Rua …, n.º s 25, 27 e 29, em …, freguesia de …, e descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.º 42.

  1. O R. é, desde 23 de maio de 2005, sócio gerente da R., tal como o seu irmão.

  2. A A. e a R. adquiriram o edifício referido em junho de 2005 e iniciaram, no mesmo, obras de restauro.

  3. Em 10 de abril de 2006, a A. e a R. prometeram vender ao R., que aceitou e prometeu comprar, o imóvel referido, nos termos e condições constantes do documento junto a fls. 118 a 121.

  4. Nos termos desse contrato, a venda foi prometida realizar mediante o pagamento de € 230 000,00.

  5. No acto da celebração do contrato promessa, foi pago, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 60 000,00, tendo € 30 000,00 sido entregues à A. e € 30 000,00 à R.

  6. A restante parte do preço seria paga no ato da outorga da escritura de compra e venda.

  7. Por força do embargo da obra por parte da Câmara Municipal de …, registado na Conservatória do Registo Predial de …, ficou acordado que a escritura seria outorgada 30 dias após o cancelamento do registo do embargo.

  8. Nos termos do disposto na cláusula quarta, a marcação da escritura deveria ser efetuada pelo...

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