Acórdão nº 10160/08.7TBVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução16 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - No âmbito do processo de expropriação por utilidade pública em que é expropriante EP – Estradas de Portugal, S.A. (agora, Infra-Estruturas de Portugal, S.A.) e expropriada AA, foi realizada a arbitragem, tendo sido interposto recurso por parte da Expropriante para o tribunal de 1ª instância.

Após peritagem e outras diligências, o tribunal judicial proferiu sentença fixando a indemnização em € 551.762,50, actualizada, a partir da data de declaração de utilidade pública (30-9-97) até 4-6-10 e, a partir desta última data e até ao trânsito em julgado. Para o efeito, classificado o prédio como “solo apto para construção”.

Dessa sentença recorreu a Expropriante, tendo a Relação alterado o valor da indemnização para € 141.920,47, considerando que o prédio deveria ser avaliado como “solo para outros fins” e não como “solo apto para construção”.

Do acórdão da Relação a Expropriada veio interpor recurso de revista, invocando uma contradição entre o acórdão recorrido e outro acórdão da Relação do Porto sobre a mesma questão fundamental de direito, nos termos do art. 629º, nº 2, al. d), do CPC.

Cumpre apreciar em primeiro lugar a existência da alegada contradição, passo essencial para que possa ser apreciada a presente revista.

II – A declaração de expropriação do prédio dos autos data de 16-10-97, quando ainda estava em vigor o Cód. das Expropriações de 1991.

Para efeitos de classificação do prédio como “solo para outros fins” considerou-se no acórdão recorrido que segundo o Plano Director Municipal de Vila Nova de Gaia de 1994 que na ocasião vigorava estava integrado em “área não urbana de transformação condicionada”. Observou-se ainda o que dispunha o art. 35º desse PDM, nos termos do qual tal qualificação abarcava “as áreas delimitadas na Planta de Ordenamento e designadas por NÃO URBANAS E NÃO URBANIZÁVEIS que correspondem na generalidade a áreas agrícolas não classificadas ou a áreas com uso florestal, sem implantação legal de construções de qualquer tipo para além das de apoio agrícola e em relação às quais não há a previsão de redes municipais de infra-estruturas”. Assim, as construções admissíveis eram apenas as previstas nos arts. 36º e 37º.

Mas uma vez que o prédio tinha a área de 4.625 m2 (inferior a 5.000 m2, área mínima para, segundo o art. 36º do referido PDM, ser permitida construção unifamiliar de apoio a actividade agrícola), considerou-se que, em face do art. 26º do Cód. de Exp. 1991, o prédio apenas poderia ser avaliado como “solo para outros fins”. Foi ainda ponderado o que se dispunha no art. 24º, nº 5, nos termos do qual, “para efeitos de aplicação do presente Código é equiparado a solo para outros fins o solo que, por lei ou regulamento, não possa ser utilizado para construção”. Por outro lado, considerou-se que não era possível aplicar a norma do art. 26º, nº 12, do Cód. das Exp. de 1999, porque este diploma não regia para a concreta expropriação cuja DUP foi publicada quando ainda vigorava o Cód. das Exp. de 1991, sendo que jamais poderia aplicar-se esse preceito ou mesmo o art. 26º, nº 2, do Cód. de 1991, uma vez que o prédio expropriado não estava destinado pelo PDM nem a “zona de lazer”, nem a “espaços verdes”.

Para sustentar o recurso foi invocado como fundamento um acórdão da Relação do Porto que incidiu sobre uma DUP publicada em 8-8-03, altura em que já estava em vigor o Cód. das Exp. de 1999 e não o Cód. de Exp. 1991.

A ausência neste Cód. de 1999 de um preceito como o do art. 24º, nº 5, do Cód. de Exp. de 1991, permitiu que se qualificasse o prédio como “solo apto para a construção” com base numa argumentação que atribuiu relevo à “potencialidade edificativa”.

Esta potencialidade edificativa foi afirmada relativamente a metade do prédio que estava integrado em Zona RAN e Zona REN (numa solução que, agora, se defrontaria com a doutrina oposta firmada no AUJ nº 6/17, nos termos do qual “a indemnização devida pela expropriação de terreno rústico integrado na Reserva Ecológica Nacional e destinado por plano municipal de ordenamento do território a «espaço-canal» para a construção de infra-estrutura rodoviária é fixada de acordo com o critério definido pelo art. 27º do Cód. das Expropriações, destinado a solos para outros fins, e não segundo o critério previsto no art. 26º, nº 12”). Considerou-se ainda no acórdão fundamento que, relativamente à outra metade, a potencialidade construtiva não era impedida pelo facto de corresponder, segundo o mesmo PDM de Vila Nova de Gaia, a uma “Área não Urbana de Transformação Condicionada”. Para este efeito assinalou-se precisamente que o Cód. de 1999 “não dispõe de norma idêntica à prevista no art. 24º, nº 5, do Cód. de 1991”, o que, na tese do aresto, permitiu valorizar a referida potencialidade construtiva.

Argumentou-se também com o facto de o prédio dispor de “rede de abastecimento de energia eléctrica, de água e saneamento e de acesso rodoviário, com características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir. Por outro lado, insere-se em aglomerado urbano existente”. E referiu-se que “a possibilidade de afectar o prédio à construção não constitui uma simples possibilidade abstracta, porque o próprio PDM integra parte do prédio em Zona de Área não Urbana de Transformação Condicionada – afecta à construção da via que justifica o processo de expropriação”.

Ademais, considerou-se que “a própria lei, nas condicionantes que estabelece, ao permitir a construção, por destaque, numa área de 1.000 m2, cria expectativas legítimas ao proprietário no sentido de ser possível a construção naquele local”.

Com essa argumentação e ainda com apelo aos princípios constitucionais, concluiu-se no acórdão fundamento que “a parcela expropriada deve ser classificada como solo apto para a construção”.

III – A admissibilidade especial do recurso de revista em sede de processo de expropriações salvaguardada pelo art. 66º, nº 5, do actual Cód. das Exp., em conjugação com o art. 629º, nº 2, al. d), do CPC, está condicionada pela verificação de uma contradição entre o acórdão recorrido e outro acórdão das Relações, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito e do qual não caiba recurso ordinário por...

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