Acórdão nº 1074/16.8JAPRT.P1. de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução05 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

RECURSO PENAL[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO 1. No processo comum, com intervenção do tribunal coletivo, nº 1074/16.8JAPRT.P1, da Comarca do ...Instância Central – Secção Criminal – ..., foi proferido, em 20.12.2016, acórdão que decidiu: « a) julgar a assistente (então ofendida) carecida de legitimidade para deduzir acusação particular à data em que a formulou (porquanto não se encontrava constituído como tal) e, consequentemente, desta não tomar conhecimento; b) condenar o arguido AA, pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 22º, nº1 e 2, al. b) 23º, 73º, nº1, als. a) e b) e 131º e 132º, nº2, al. j) do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão, consequentemente o absolvendo pela prática do mesmo ilícito integrado na al. b) do tipo agravado tentado, pelo qual vinha acusado.

c) julgar parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante BB e em consequência, condenar o arguido ao pagamento da quantia de €20.000 (vinte mil euros), acrescida de juros de mora à taxa de legal em vigor, desde a notificação para contestar o pedido até integral pagamento, absolvendo-se o demandado do mais peticionado; d) Julgar totalmente procedente, por provado, o pedido indemnização civil deduzido pelo Centro Hospitalar ... E.P.E. e em consequência, condenar o arguido/demandado ao pagamento da quantia de €1.493,24 (mil quatrocentos e noventa e três euros e vinte e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a notificação para contestar o pedido até integral pagamento; c) Condenar o arguido nas custas da parte criminal com taxa de justiça que se fixa em 5 (cinco) Ucs art. 513º, 514º do C. P. Penal e art. 8º, tabela anexa III do RCP, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que goza; f) Condenar demandante e demandado nas custas da parte cível, na proporção do decaimento sem prejuízo do decidido quanto ao requerido benefício de apoio judiciário de que gozam ambos - 527º, nºs 1 e 2 do C.P. Civil, ex-vi art. 523º do C.P. Penal.

g) Manter a medida de coacção de prisão preventiva a que o arguido se encontra sujeito; h) Declarar perdidos a favor do Estado, as facas e os fragmentos de vaso de cerâmica apreendidos nos autos (art. 109º do Código Penal), determinando-se a sua destruição; i) Determinar a restituição ao arguido da camisa e cinta apreendidas – art. 186º, nº1 a 4 do C. P. Penal.

j) Ordenar a recolha de amostras de ADN do arguido, para inserir nas bases de dados de perfis de ADN, em obediência ao disposto no art. 8º, nº 2, da Lei nº 5/2008, de 12/02, após o trânsito em julgado da presente decisão».

2. Inconformado, o arguido, AA, interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal da Relação do Porto, que, atento o disposto nos arts. 432º, nº1, al. c) e 434º do CPP, remeteu os autos a este Supremo Tribunal de Justiça.

3. O arguido terminou as motivações de recurso com as seguintes conclusões: «1ª No douto acórdão recorrido não se ponderou devidamente o facto de o arguido, ora recorrente, ser portador de uma personalidade psicopática e que agiu em estado de exaltação emocional em circunstâncias que diminuem a culpa.

  1. As circunstâncias qualificativas do crime de homicídio voluntário previstas no artigo 132º, nº2, do código penal não são de funcionamento automático, constituindo apenas índices reveladores da especial censurabilidade ou perversidade que está na base da qualificação do crime de homicídio (ver nº1 desse preceito).

  2. Resultaram dos factos que do meio empregue para a prática do crime não resultou perigo do ponto de vista médico-legal para a vida da assistente, nem a afetaram de forma grave, nem existiram para a mesma consequências permanentes.

  3. Tendo isso em conta, justifica-se uma redução da medida da pena por alteração da qualificação para homicídio simples na forma tentada com a consequente condenação do arguido em pena não superior a cinco anos de prisão.

  4. Mesmo que se venha a entender que os factos enquadram um crime de homicídio qualificado na forma tentada, nem, por tudo quanto se deixou dito, deve ao arguido ser aplicada pena não superior a cinco anos de prisão.

  5. A suspensão da execução da pena de prisão configura-se na nossa lei penal (art. 50º do código citado) como um poder estritamente vinculado e portanto, nesta conceção, como um poder-dever.

  6. Atendendo à personalidade do arguido e às circunstâncias de facto pelo qual o mesmo está condenado, à ausência de perigo para a vida da assistente, à ausência de consequências graves e permanentes para a mesma assistente, pode o tribunal concluir por um prognóstico favorável relativamente ao seu comportamento futuro do ponto de vista criminal, para efeitos do disposto na parte final do nº1 do referido artigo 50º.

  7. Para a formulação desse juízo de prognóstico favorável, é justificado que o Tribunal faça acompanhar a medida de suspensão da execução da pena de prisão que ao arguido falta cumprir/descontada que seja o tempo de prisão preventiva a que o arguido está sujeito desde 31 de Março de 2016, da imposição de deveres e (ou) regras de conduta, ao abrigo do disposto nos artigos 51º e 52º do citado código.

  8. É o que acontece, designadamente, com o pagamento da indemnização arbitrada a favor da ofendida e assistente em prazo razoável a fixar, com a proibição de contactar com a mesma durante todo o prazo de suspensão da execução da pena e, com sujeição do arguido, obtido que seja o seu consentimento prévio a tratamento médico de que ele necessite, em instituição adequada, tendo em conta a avaliação psiquiátrica de depressão de que ele sofre.

  9. Como parece justificado ainda que o Tribunal determine que os serviços de reinserção social apoiem e fiscalizem o arguido no cumprimento dos deveres ou das regras de conduta a ele impostas.

  10. Ao decidir doutra forma quanto à qualificação jurídica, medida da pena de prisão aplicada ao arguido e ao não suspender a execução dessa mesma pena como se disse nas conclusões anteriores, o Tribunal recorrido violou, por erro ou omissão da aplicação, o disposto, entre outros, nos artigos 71º, 50º nº1, 51º nº1, a) e 4, 52º, nº1, 3 e 4 do código penal.

    Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, de forma a alterar-se a qualificação jurídica quanto ao tipo legal de crime praticado pelo arguido, reduzir-se a medida de pena de prisão aplicada face a essa alteração em pena de prisão não superior a cinco anos e suspender-se a sua execução.

    Ainda que se entenda não ocorrer justificação fáctica para alteração da qualificação jurídica deverá à mesma, em face das circunstâncias expostas ao longo da presente alegação, reduzir-se a pena aplicada a prisão não superior a cinco anos e suspender-se a sua execução nos termos expostos com o que se fará a acostumada Justiça!».

    3. O Ministério Público no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, Penafiel-Juízo Central Criminal de Penafiel, respondeu, concluindo nos seguintes termos: «1 – Em face da matéria de facto dada como provada a conduta do arguido integra a prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos art.º 22, n.º 1 e 2, al. b), 23, 73, n.º 1, als. a) e b) e 131 e 132, n.º 2, al. j) do Código Penal.

    2 – Em face dos elementos que importa ter em conta para a determinação da medida concreta da pena cfr. art.º 71, n.º 2 do C. Penal a pena de seis (6) anos de prisão aplicada pelos M.ºs Juízes “ a quo” mostra-se adequada e justa, uma vez que, não excedendo a medida da culpa, satisfazem plenamente as exigências preventivas, gerais e especiais.

    3 - Dado que defendemos que a pena aplicada, ou seja, seis (6) anos de prisão, se apresenta como justa e adequada fica a possibilidade de suspensão de execução da pena prejudicada porquanto aquela pena de substituição apenas pode ser equacionada em penas concretas até cinco anos de prisão, o que não se verifica no caso concreto.

    4 – Em todo o caso sempre se dirá que, na situação sub judice, caso se equacionasse uma pena susceptível de suspensão não se pode formular relativamente ao agente dos factos um juízo de prognose favorável no sentido de que aquele em face da simples censura dos mesmos e a ameaça da prisão será afastado da prática de novos factos delituosos e que dessa forma se realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».

    Termos em que pugnou pela manutenção do acórdão recorrido.

    4. Neste Supremo Tribunal, a Exmª Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, do qual transcrevemos os seguintes segmentos: «(…) 2.2.1. O recorrente levou às conclusões extraídas da respectiva motivação de recurso as seguintes questões de direito: → Os factos dados como provados integram o crime de homicídio simples na forma tentada e não um crime de homicídio qualificado na forma tentada (conclªs. 2ª e 3ª).

    → O arguido é portador de uma personalidade psicopática e agiu em estado de exaltação emocional em circunstâncias que determinam a diminuição da culpa (conclª. 1ª).

    → A pena a aplicar deve ser a de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução (conclª. 3ª).

    → Mesmo que se entenda ter o arguido cometido o crime de homicídio qualificado na forma tentada, a pena não deve ser superior a 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, com imposição de deveres e/ou regras de conduta, ao abrigo dos arts. 51º e 52º do CP, com apoio e fiscalização dos serviços de reinserção social (conclªs. 4ª e 5ª, 6ª, 7ª, 9ª e 10ª).

    2.2.2. O MP respondeu, defendendo a manutenção do Acórdão recorrido, que procedeu a uma correcta qualificação jurídico-penal dos factos criminosos praticados pelo arguido, mostrando-se a pena de 6 anos de prisão em que foi condenado adequada e proporcional.

    3. Questão prévia: O Acórdão recorrido não se mostra devidamente assinado pelos Srs. Juízes que integraram o respectivo Tribunal Colectivo, dele constando, na primeira folha, o registo das assinaturas...

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