Acórdão nº 4861/11.0TAMTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Julho de 2017
Magistrado Responsável | GABRIEL CATARINO |
Data da Resolução | 05 de Julho de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
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Relatório.
No presente processo, foi proferida a sequente decisão: - a arguida, AA, foi condenada pela prática, em autoria material, e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física grave por negligência, p. e p. pelo artigo 148.º/1 e 3, ex vi do artigo 144.º alínea, a), b) e c) C Penal, em concurso aparente com as contra-ordenações, pp. e pp. pelos artigos 13.º/3 e 17.°/2 do Código da Estrada, na pena de 11 meses de prisão, substituída por 330 dias de multa, à taxa diária de € 5,50, num total de € 1.815,00; - na parcial procedência do pedido de indemnização civil deduzido pela assistente e demandante cível BB foi condenada a demandada cível “N Seguros, SA.”, no pagamento do montante de € 305.500,00 a título de danos patrimoniais, acrescidos do que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença quanto ao valor das obras de adaptação da sua habitação e € 140.000,00 a título de danos não patrimoniais, num total de € 445.500,00, acrescidos de juros vincendos à taxa de 4% desde o trânsito em julgado.
Impugnada a decisão, o tribunal de recurso (de apelação) viria a prolatar a sequente decisão: “conceder parcial provimento aos recursos interpostos pela demandante cível e pela demandada cível, respectivamente, BB e N Seguros, SA., em função do que, se altera o valor das indemnizações devidas a título de: - perda de vencimentos desde a data do acidente até à alta clínica, cuja fixação se relega para eventual liquidação em execução de sentença; - perda de rendimentos futuros do trabalho, cujo valor se fixa em € 52.000.00; - adaptação de veículo, cuja fixação se relega para eventual liquidação e execução de sentença; - substituição da prótese, ajuda técnica e assistência médica, cujo valor se fixa em € 100.000,00; mantendo-se o mais decidido a propósito de, obras de adaptação da habitação, auxílio de terceira pessoa e, danos de natureza não patrimonial.” Inconciliados com a decisão proferida em via de recurso, recorrem os, demandante e demandada civis, tendo concluído as respectivas argumentações de contraposição ao decidido com as sínteses conclusivas que se extractam a seguir. I.a). – QUADRO CONCLUSIVO.
(Da Recorrente por via principal) “a) resulta da factualidade provada que a Recorrente à data do acidente desenvolvia duas actividades, uma como trabalhadora dependente, onde auferia o montante mensal de € 540,00 e outra como prestadora de serviços onde auferia € 500,00.
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E, portanto, é o montante de € 1.040,00 mensais que tem de ser considerado para calculo dos danos patrimoniais futuros e não o de € 540,00, na medida em que, aquele é que concretiza a verdadeira perda futura que a Recorrente deixou de obter, não fossem esses os seus rendimentos mensais à data do acidente.
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O artigo 566.º n.º 3 do CC impunha uma decisão diversa ao n Tribunal "a quo", porquanto, ao resultar provado que a Recorrente auferia, à data do acidente, a quantia mensal de € 1.040,00, impunha-se aquele Tribunal julgar estes danos equitativamente dentro dos limites que tiver provados.
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será de fixar o montante indemnizatório a titulo de dano patrimonial futuro no valor de € 144.000,00 (cento e quarenta e quatro mil euros); Subsidiariamente: e) A considerar-se que apenas o montante de € 540,00 poderá servir para determinar, o dano patrimonial futuro, o que apenas se coloca por uma questão de dialéctica, também a decisão do tribunal "a quo" pecou por defeito; f) será de fixar o montante indemnizatório a titulo de dano patrimonial futuro no valor de € 76.000,00 (setenta e seis mil euros).
(Da Recorrente por via Subordinada) “(…) 2.ª – A demandada civil não se conforma quanto ao valor indemnizatório atribuído e derivado da necessidade de a demandante se sujeitar, para toda a vida a consultas de fisiatria e, bem assim, à necessidade de renovar a sua prótese.
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– Entendemos que não obstante o mérito do assim decidido, continuamos a entender que o Tribunal não dispõe de elementos seguros que permitam, com aquele rigor e cuidado necessários, fixar desde já a indemnização por esta via.
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- Apesar de já se encontrar fixado o custo total de substituição da prótese e que a mesma tem uma durabilidade média de 5 anos, o certo é que não se encontra completamente assente se a demandante, findo cada cinco anos, terá uma necessidade efectiva de mudar a prótese. Aliás, o prazo de garantia é de 3 e de 5 anos e não significa necessariamente que a prótese, findo esse período, têm que necessariamente ser mudadas por outra.
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- Note-se que a demandante não está em fase de crescimento e que a probabilidade de substituir a prótese de cinco em cinco anos é baixa, até porque tal operação envolve a necessidade de adaptação a um novo equipamento, argumento, neste particular, colhido pelo Tribunal recorrido.
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- Deste modo, e até em benefício da própria lesada, seria prudente remeter este custo para liquidação posterior, em função das necessidades concretas que a demandante tiver.
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- Significa que uma decisão de remeter tais danos para liquidação posterior, em função daquelas concretas necessidades, e concretamente apuradas, será mais justa e equitativo e será de molde a reparar efectivamente o dano sofrido.
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- Assim e por se tratar de danos causais ao acidente, entendemos que a requerida deve ser condenada a pagar à demandante os custos com a necessidades de consultas de fisiatria e substituição da prótese que, causais ao acidente dos autos, este tenha necessidade de suportar.
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- Não resultando como provado o montante exacto de tais custos, nomeadamente a sua periodicidade, deve relegar-se a sua liquidação para momento posterior, ou seja, para o exacto memento da verificação dessa mesma necessidade.
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- Caso se entenda de modo diferente, então a indemnização fixada peca por exagerada, devendo antes fixar-se nos 75.000,00 euros.
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- Ao não os interpretar da forma acima assinalada, a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 483°, 562º, 564°, n.º 2 e 566.º, n.º 3, todos do Código Civil.
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– Da mesma forma, a demandada não se conforma com o valor atribuído pelo tribunal a quo e referente aos dos danos de natureza não patrimonial.
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- O montante pecuniário da compensação deve fixar-se equitativamente, tendo em atenção as circunstâncias a que se reporta o artigo 494º do Código Civil (artigo 496º, n.º 3, 1ª parte, do Código Civil). Na determinação da mencionada compensação deve, por isso, atender-se ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e às demais circunstâncias do caso, nomeadamente à gravidade do dano, sob o critério da equidade envolvente da justa medida das coisas (artigo 494º do Código Civil).
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- Daí que não encontramos motivo justificativo para tão elevado valor como aquele arbitrado no douto Acórdão. 15.ª – Atenta a matéria de facto fixada pelas instâncias, sempre orientados num critério de equidade, e sem esquecer a gravidade dos danos sofridos pela demandante, entendemos justo atribuir a indemnização de 90.000,00 euros por danos não patrimoniais (que aqui engloba todas as componentes desse dano: dano biológico, dano estético, quantum doloris. dano sexual, incapacidade, internamento e demais danos morais decorrentes do acidente).
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- Ao assim não decidir, a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 483.°, 562.º e 564.°, n.º 2, todos do Código Civil.
” I.b). – QUESTÃO A RESOLVER.
A irresignação quanto ao decidido, das demandante e demandada civis, radica: a) – no atinente à dissensão da demandante civil, a concreta questão de discrepância prende-se com o montante a atribuir pelos danos futuros, mais exactamente da base remuneratória que servir para o cálculo da depreciação do ganho futuro; b) – no que concerne à demandada civil: b1) – “ao valor indemnizatório atribuído e derivado da necessidade de a demandante se sujeitar, para toda a vida a consultas de fisiatria e, bem assim, à necessidade de renovar a sua prótese”; b2) – “valor atribuído pelo tribunal a quo referente aos danos de natureza não patrimonial.
” II. Fundamentação.
II.A. – DE FACTO.
Após impugnação da decisão de facto, o tribunal de apelação consolidou a matéria de facto que a seguir queda transcrita.
“1º) No dia 20 de Julho de 2011, petas 08h00, a arguida conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros, marca Renault, modelo Laguna, cor cinzenta, com a matricula ...-VC, pela ..., na Senhora da Hora, no sentido Sul- Norte.
2º No mesmo circunstancialismo de tempo e lugar, encontrava-se a circular apeada na zona destinada ao estacionamento de veículos do lado direito, a ofendida BB, no sentido contrário à marcha levada a cabo pelo veiculo da arguida.
3º) A ofendida é titular do n.º de beneficiário da segurança social ....
4º) A ... é uma via com traçado rectilíneo constituída por uma recta, com dois sentidos de trânsito em duas vias sem separadores centrais.
5º) O pavimento é em alcatrão, em bom estado de conservação, sendo o limite de velocidade máximo ao permitido, por placas, 50 Km/hora.
6º) No sentido norte/sul, do lado esquerdo, a via possui nas suas margens uma zona destinada ao estacionamento de veículos, por onde também circulam os peões.
7º) No mesmo sentido de trânsito, do lado direito, a via possui uma zona de estacionamento de veículos seguida de um passeio.
8º) Nas circunstâncias de tempo e lugar supra mencionadas, estava sol, o trânsito de outros veículos era moderado, sendo possível à arguida condutora avistar a faixa de rodagem em toda a sua largura e numa extensão não inferior a 100 metros.
9º) Nessa ocasião, a arguida, quando passava junto ao nº 1710 da mencionada Avenida, em virtude de se ter distraído por razões não concretamente apuradas, perdeu o controlo da marcha da sua viatura, saiu da faixa de rodagem e invadiu a zona destinada ao estacionamento de veículos do lado direito atento o seu sentido de marcha.
10º) Vindo a embater com a parte frontal do seu veículo na ofendida, que af circulava, num local onde não estavam carros estacionados.
11º) Na sequência desse embate, a ofendida...
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