Acórdão nº 1524/10.7TBOAZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 08 de Junho de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1.
AA propôs, em 09/07/2010, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra: BB (1.º R.), CC (2.º R.), Fundo de Garantia Automóvel (3.º R.), Companhia de Seguros DD, S.A.(4.ª R.), EE, Companhia de Seguros, S.A. (5.ª R.), e FF Seguros, S.A.(6.ª R.), alegando, em síntese, que: .
No dia 19/08/2007, pelas 15h00 horas, no IC 2 em …, Oliveira de Azeméis, ocorreu um acidente envolvendo quatro veículos, um conduzido pelo 1.º R., propriedade do 2.º R., de matrícula ...-...-NE, outro pelo A., de matrícula ...-EA-..., outro por GG, segurado na 5.ª R., de matrícula ...-...-QG e ainda outro conduzido por HH, segurado na 6.ª R. de matrícula ...-...-MR; .
O acidente foi provocado pelo 1.º R. que, seguindo de forma desatenta, no sentido Sul-Norte, ultrapassou várias viaturas que seguiam à sua frente, entrando na hemifaixa contrária, no momento em que, em sentido contrário, seguia o veículo conduzido por GG, que para evitar o embate frontal guinou para a sua direita, acabando por se despistar e embater no veículo do A., que seguia no sentido Sul-Norte, sendo que este último ainda foi embatido pelo veículo que seguia atrás de si, conduzido por HH; .
Para a hipótese de se apurar responsabilidade na eclosão do acidente por parte dos condutores dos outros veículos envolvidos no acidente demanda as respetivas seguradoras; .
Nem o proprietário nem o condutor do veículo NE tinham seguro válido obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
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Na hipótese de se provar que a culpa pela produção do acidente deverá ser imputada, total ou parcialmente, ao 1.º Réu, condutor do veículo NE, e que tal veículo, à data, circulava sem seguro válido e eficaz, deverão os três primeiros R.R. BB, CC e FGA., ser condenados solidariamente, na medida da culpa apurada, a pagar ao A. a quantia de € 108.886,00, bem como indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais emergentes do acidente, sofridos até à data da entrada da ação e os que surjam após esta data.
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Entretanto, foi determinada a apensação a estes autos do processo ordinário n.º 1850/11.8TBOAZ (Apenso B), em que GG e seus filhos II e JJ, por aquele representados, por si e como herdeiros de KK, mulher de GG e mãe dos seus filhos, falecida em consequência do acidente em causa, demandaram, em 28/07/2011, o Fundo de Garantia Automóvel, BB e CC, pedindo a condenação solidária destes três R.R., a pagar-lhes as seguintes indemnizações: - € 30.000,00, pelo sofrimento da vítima KK no momento do acidente; - € 70.000,00, pela perda do direito à vida da mesma; - € 4.000,00 e € 3.000,00, pelos danos morais próprios, respetivamente, de GG e de II; - € 40.000,00, para cada um dos AA., pelos danos morais pela perda da mulher e mãe; - € 200.000,00, pela perda da realização das lides domésticas, por parte da falecida KK; - € 1.099,09, por despesas de funeral e publicações; - € 212,00 pelos episódios de urgência, por parte do GG e do II; - € 7.000,00, pela perda do veículo QG.
3.
Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 785-822, datada de 18/02/2016, em que, no que aqui releva, se decidiu: «Julgar parcialmente procedente a pretensão deduzida por GG, II e JJ, por si e enquanto herdeiros da herança ilíquida indivisa aberta por óbito de KK, em relação àqueles RR., condenando-se estes a pagarem solidariamente ao primeiro demandante a quantia de € 28.106,00, deduzida a franquia de € 299,28, em relação ao FGA, ao segundo demandante a importância de € 21.606,00, à terceira demandante a importância de € 20.000,00 e à herança a importância de € 86.090,90, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento.» 4.
Inconformados com tal decisão, tanto os referidos demandantes como o Fundo de Garantia Automóvel apelaram para o Tribunal a Relação do Porto que, através do acórdão de fls. 878-923, datado de 25/10/2016, julgou: a) – Improcedente, totalmente, a apelação interposta pelo FGA; b) – Procedente, parcialmente, a apelação interposta por aqueles demandantes, fixando as seguintes quantias: - € 20.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais próprios da falecida KK; - € 30.000,00 e € 25.000,00, a título indemnização, respetivamente a II e a JJ, pelos danos não patrimoniais por eles sofrido com a morte da sua mãe KK; - € 100.000,00, a título de indemnização a GG pelo dano futuro correspondente à perda do contributo da falecida KK para a vida pessoal e familiar. 5.
O Fundo de Garantia Automóvel vem agora pedir revista do desses segmentos decisórios, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - Os critérios plasmados na Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio não podem deixar de se erigir em referente para o julgador, pois reduzem a incerteza e a subjetividade da decisão e asseguram um melhor tratamento igual entre todos os lesados; 2.ª - Os critérios de tal instrumento normativo resultam de uma ponderação prudencial, médico-legal, económica e social e devem, por isso, ser considerados.
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- Havendo uma divergência substancial entre o resultado que se alcançaria pela aplicação da portaria e o resultado da decisão judicial, deve considerar-se que é possível o excesso da decisão judicial e deve a mesma ser sindicada a luz da concreta prova apurada nos autos.
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- A indemnização pelos danos não patrimoniais danos não patrimoniais próprios da falecida deve fixar-se em € 10.000,00, em vez dos € 20.000,00 atribuídos.
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- Não há qualquer dúvida, atenta a gravidade da situação em apreço, que os AA JJ e II devem ser indemnizados a título de danos não patrimoniais pela perda da mãe, contudo entendemos que a indemnização a arbitrar deve fixar-se no valor total de € 32.00,00 (cabendo 16.000,00 a cada um dos herdeiros), ao invés dos € 55.000,00 atribuídos.
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- Tendo ficado provado que a vítima não exercia qualquer atividade remunerada, dedicando-se à lide doméstica, vivendo dos rendimentos auferidos pelo A. marido, é de entender que não se encontram reunidos os pressupostos para que seja fixada uma indemnização pela perda de alimentos.
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- Na verdade, a medida desta indemnização está condicionada aos ganhos produzidos pelo prestador de alimentos.
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- Caso se entenda valorizar, quantificando, o trabalho doméstico desenvolvido pela falecida no lar, sempre se deverá dizer que é justo e adequado fixar a contribuição desta em 50%.; 9.ª - Não basta a convicção de que a vítima não tinha outras atividades, para além das lides domésticas, para que, como fez a Relação do Porto, se determine a contribuição de 75%.
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- O período durante o qual o agregado familiar se compõe de apenas os cônjuges, encontrando-se autónomos os dois filhos do casal, deve sofrer uma desvalorização superior àquela que foi fixada no julgado recorrido, em quantia não superior a € 150,00.
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- É de recusar o critério da esperança média de vida para o cálculo dos danos futuros; 12.ª - Atingida a idade da reforma o lesado deixa de estar inserido no mercado de trabalho e, consequentemente, não está sujeito aos esforços suplementares que justificam a compensação.
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- Sendo-lhe atribuída uma pensão de velhice; 14.ª - Assim sendo, a indemnização, a título de perda de alimentos não deve exceder os € 50.000,00.
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– Ao não julgar da forma assinalada, o tribunal a quo violou os artigos 562.° e 564.°, n.º 2. do CC, tendo incorrido em erro de julgamento.
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Os Recorridos apresentaram contra-alegações a pugnar pela confirmação do julgado. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. II - Delimitação do objeto dos recursos Como é sabido, no que aqui releva, o objeto do recurso é definido em função das conclusões formuladas pelo recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do CPC.
Dentro desses parâmetros, as questões suscitadas circunscrevem-se aos montantes indemnizatórios respeitantes: i) - ao dano não patrimonial pelo sofrimento de KK desde o momento do acidente até à morte; ii) - aos danos não patrimoniais sofridos com essa morte pelos seus filhos II e JJ; iii) - ao dano patrimonial futuro relativo à perda do contributo económico que era proporcionado pela falecida KK ao respetivo agregado familiar.
III – Fundamentação 1. Factualidade dada como provada pelas Instâncias Vem dada como provada pelas instâncias, no que aqui releva, a seguinte factualidade: 1.1.
No dia 19 de agosto de 2007, pelas 15h30m, no Itinerário Complementar n.º 2 (IC2), ao km 262,030, em …, concelho de Oliveira de Azeméis, distrito de Aveiro, ocorreu um embate entre diversos veículos; 1.2 O veículo de marca Chevrolet Klac, com matrícula ...-EA-... era, à data do sinistro, propriedade de AA; 1.3.
Por contrato de seguro titulado pela apólice n.º AU-21…, válido e eficaz à data do sinistro, AA transferiu para a “DD” que incorporou a LL) os danos emergentes da circulação do veículo automóvel com a matrícula ...-EA-...; 1.4.
Por contrato de seguro titulado pela apólice n.º 03…/00…, válido e eficaz à data do sinistro, HH transferiu para a “FF Companhia de Seguros” os danos emergentes da circulação do veículo automóvel com a matrícula ...-...MG; 1.5.
GG era casado, à data do sinistro, com a falecida KK, com quem havia casado sob o regime de comunhão de adquiridos em 22/08/1998; 1.6.
II e JJ, nascidos, respetivamente, em 19 de março de 2000 e 23 de março de 1998, encontram-se registados como filhos de GG e de KK; 1.7.
Na sequência do sinistro em causa correu termos pelo 1.º Juízo Criminal de Oliveira de Azeméis o processo n.º 319/07.0GBOAZ, no qual, em 29/04/2011, foi produzida sentença, já transitada em julgado, conforme documentos de fls. 67 a 96 do apenso “B” e 369 a 382 dos autos principais; 1.8.
KK nasceu a 28 de janeiro de 1974; 1.9.
MM nasceu em 21/08/1997, e está registada como filha de AA e de NN; 1.10.
Na data e cerca da hora em causa nos autos, mais concretamente alguns instantes antes, o R. BB circulou em sentido Norte/Sul, pelo local referido em 1.1, conduzia a viatura com a matrícula ...-...-NE, propriedade do R. CC...
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