Acórdão nº 7461/14.9T8SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução08 de Junho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA - Empreendimentos Imobiliários, S.A.

."intentou a presente ação com processo comum, contra BB - Sociedade Imobiliária e Turística, S.A.

", pedindo que fosse declarado o incumprimento definitivo, por parte da Ré, do contrato - promessa de compra e venda celebrado em 12-05-2008 e, consequentemente, a ré condenada a restituir à Autora o sinal em dobro, no montante de 300.000,00€ (trezentos mil euros); e que a ré fosse condenada a pagar à A. os juros de mora, à taxa legal aplicável aos créditos comerciais, já vencidos no montante de 147.459,86€ (cento e quarenta e sete mil quatrocentos e cinquenta e nove euros e oitenta e seis cêntimos) ou, subsidiariamente, de 647.057,26€ (quarenta e sete mil e cinquenta e sete euros e vinte e seis cêntimos), bem como dos juros de mora que, à mesma taxa legal, se vencerem sobre o capital em dívida até integral e efetivo pagamento.

  1. A ação foi julgada improcedente na 1ª instância com o fundamento de que quando a A., promitente compradora, comunicou à ré, promitente vendedora, por carta de 17-11-2008 que considerava prazo essencial o prazo de 60 dias para outorga da escritura de compra e venda e, por isso, a não realização da escritura nesse prazo implicava incumprimento definitivo a impor a resolução do contrato-promessa celebrado no dia 12-5-2008 com a consequente devolução do sinal dobrado, tal resolução determina a cessação do vínculo.

  2. Tal resolução sendo, no entanto, ilícita porque não se verificaram os respetivos pressupostos legais - ou seja, de que era termo fixo, essencial ou absoluto o aludido prazo - não é inválida ou ineficaz e, por isso, ela importa a cessação do vínculo, extinguindo-se o contrato-promessa.

  3. Ainda segundo a sentença, a circunstância de a promitente vendedora ter ulteriormente procedido no dia 22-2-2013 à venda a um terceiro do imóvel prometido vender não permite imputar à promitente vendedora o incumprimento definitivo do contrato, pois, com a resolução e consequente extinção do contrato-promessa, libertou-se a promitente vendedora da obrigação assumida por via do aludido contrato-promessa.

  4. Inexistindo incumprimento definitivo da ré em 2008 e produzindo efeitos a resolução, inexiste incumprimento definitivo da ré em 2013, impondo-se, assim, a absolvição do pedido de condenação da ré no valor do sinal dobrado.

  5. A A. recorreu para o Tribunal da Relação, sustentando que a resolução, porque infundamentada, deveria ser considerada ineficaz, mantendo-se consequentemente o contrato; ora a promitente vendedora, não aceitando a declaração resolutiva, assume a vigência do contrato. Não pode, assim, em contradição com a sua prévia declaração de que o contrato estava em vigor e de que pretende recorrer à execução específica, alienar o imóvel prometido vender.

    7.

    O Tribunal da Relação considerou que a promitente compradora, com a declaração infundada de resolução, recusou o cumprimento; tal resolução, porque não precedida de interpelação admonitória, traduz-se numa antecipatory breach of contract; por sua vez a promitente vendedora com a venda do imóvel colocou-se numa situação de incumprimento definitivo. Ou seja, o incumprimento é imputável a ambas as partes por cada uma ter resolvido o contrato sem fundamento legal. Por isso, atento o disposto nos artigos 442.º/1 e 570.º do Código Civil e sendo certo que nenhum dos outorgantes pretende a manutenção do contrato, inviabilizada pela venda, justifica-se, porque as culpas não são exuberantemente diferentes, repor os promitentes na situação anterior à outorga do contrato-promessa, condenando-se a ré a restituir à A. a quantia entregue a título de sinal (150.000,00€).

  6. Do acórdão interpôs recurso de revista para o STJ a ré que concluiu a minuta nos seguintes termos.

    1 - Perante a matéria de facto provada no ponto 26 - a autora desinteressou-se do prédio objeto do contrato promessa -, perante a falta de comparência da autora à escritura de compra e venda designada pela ré, perante a resolução ilícita do contrato levada a cabo pela autora, perante o silêncio da autora em face da missiva da ré de 10 de dezembro de 2008, perante a inexistência de qualquer ação, contacto ou iniciativa da autora durante 6 anos, é patente que a autora incumpriu culposa e definitivamente o contrato.

    2 - A propositura da presente ação configura um flagrante ventre contra factum proprium, uma violação da boa fé e um abuso de direito.

    3 - O não exercício de quaisquer direitos durante o tempo decorrido impede a autora de o exercer neste momento.

    4 - A prevalecer a tese do Tribunal da Relação, a autora poderia continuar a vigiar a ré e a aguardar pela possibilidade de esta vender o imóvel indefinidamente, beneficiando da devolução do sinal não obstante o seu comportamento contraditório.

    5 - O contrato extinguiu-se logo após a remessa pela autora da sua missiva de resolução do contrato.

    6 - Essa declaração de resolução é ilícita - por não haver mora ou incumprimento definitivo da ré, não gerando quaisquer direitos para a autora e permitindo à ré fazer seu o sinal.

    7 - Essa declaração constitui uma declaração antecipada de não cumprimento definitivo.

    8 - Independentemente da solução técnica da questão jurídica da eficácia extintiva de uma declaração de resolução injustificada, a autora, como emitente dessa declaração, perdeu o direito de vir invocar o contrário do que nela consta e de, assim, 6 anos depois, ressuscitar o contrato, argumentando que a ré se mantinha obrigada ao cumprimento do mesmo.

    9 - Imediatamente após o recebimento da declaração de resolução oriunda da autora, conjugada com a sua falta de comparência à outorga do contrato definitivo e com a perda de interesse desta no negócio, operou-se a extinção do contrato, configurando o comportamento da autora um incumprimento definitivo do mesmo.

    10 - Nesse momento, a autora havia perdido o interesse na celebração do negócio nos termos provados no ponto 26 da fundamentação de facto.

    11 - A ré não estava obrigada a desenvolver adicionais, tendo-se formado na sua esfera jurídica o direito de fazer seu o sinal.

    12 - A ré não se obrigou a nada por causa da sua missiva de dezembro de 2008, nem essa missiva teve como efeito conservar a vigência do contrato.

    13 - Essa carta tem natureza pós-contratual e é inócua.

    14 - Inexistiu incumprimento da ré em 2008 e inexistiu incumprimento da ré ao alienar o imóvel em 2013 a um terceiro.

    15 - Deve manter-se a condenação da autora como litigante de má fé.

    16- Termos em que, por não os interpretar da forma assinalada, o tribunal recorrido violou os artigos 224.º, 334.º, 436.º, 442.º, 762.º/2 e 808.º do Código Civil.

  7. Factos provados 1 - A Autora é uma sociedade comercial que se dedica, entre outras atividades, à compra e venda de imóveis e ao desenvolvimento de empreendimentos imobiliários e sua comercialização.

    2 - A ré é uma sociedade comercial que se dedica à compra e venda de imóveis.

    3 - Em 12 de maio de 2008, Autora e ré celebraram um contrato que denominaram "contrato promessa de compra e venda de bem futuro", através do qual a Autora prometeu...

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