Acórdão nº 227/13.5YHLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | NUNES RIBEIRO |
Data da Resolução | 29 de Junho de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: AA, Lda., com sede na Av. …, n.º …, na Maia, instaurou acção declarativa com processo comum contra BB, L.da, com sede Rua …, n.º …, em Braga, e contra o Banco CC, S.A., com sede na Rua …, no Porto, pedindo: I - A condenação de ambos, a indemnizarem-na, em valor a liquidar em execução de sentença, dos danos sofridos, designadamente: a) - O valor referente à diminuição das vendas; b) - O valor referente a encargos tidos com a protecção, investigação, e cessação da conduta lesiva dos seus direitos; c) - O valor referente aos danos morais; d) - Os juros de mora correspondentes.
II - A condenação somente da Ré BB, L.da, a abster-se de usar a marca nacional n° 387881 de que a A. é titular, bem como qualquer outro sinal para identificar produtos ou serviços que contenha a palavra "Eleutério".
Alegou, para tanto, em síntese, que, no decurso do ano de 2010, chegou ao seu conhecimento que a Ré BB vinha fazendo uso abusivo da marca nacional da autora com o n.º 387881 "Eleutério", registada a seu favor, para promoção dos seus artigos, tendo concretamente divulgado tal marca, associando-a às suas peças, no evento Portojóia 2010; que a autora dirigiu-lhe cartas no sentido de obstar ao uso da aludida marca "Eleutério", advertindo-a para a ilegalidade da respectiva conduta e respectivas consequências, ao que a ré não deu qualquer resposta ou adoptou qualquer medida tendente a evitar essa utilização; que, no final do ano de 2012, a autora foi abordada por diversas pessoas, nomeadamente clientes, que a alertaram para a campanha designada de "Joalharia Made in Portugal", lançada pelo ora réu Banco CC, S.A., na qual a ré BB, L.da, era uma das entidades participantes, apresentando alguns dos seus artigos associados à designação "Eleutério Antunes", sendo certo que a ré tentou registar marcas que incluíam o vocábulo "Eleutério", pedidos de registo que foram todos recusados pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI); que ao agir pelo modo descrito a ré BB, L.da aproveitou-se e aproveita-se financeiramente, de forma grosseira e desleal, da marca de que a autora é titular.
Contestaram ambos os Réus.
A Ré BB, L.da, na sua contestação-reconvenção, alegou, resumidamente, que nunca fez uso da marca "Eleutério"; que a expressão "Eleutério Antunes" corresponde à forma abreviada da sua firma, BB, L.da, e ao nome do respectivo sócio-gerente, DD, de que a mesma vem fazendo uso, na sua actividade comercial, pelo menos desde 2000; que após as recusas de registo proferidas pelo INPI diligenciou no sentido de deixar de utilizar tal forma abreviada nos seus documentos comerciais, campanhas e acções de venda, sem prescindir do uso da sua firma, que é anterior ao registo da marca da autora; que a utilização da designação "Eleutério Antunes", na campanha em que participou com o Banco CC, S.A., ficou a dever-se a lapso seu, pois forneceu àquele Banco elementos que serviram em anteriores campanhas similares, efectuadas com outras instituições bancárias; que, de todo o modo, em todos os elementos dessa campanha com o Banco está presente a indicação completa da sua firma, o que permite a qualquer destinatário identificar e reconhecer a empresa envolvida; que o registo da sua firma data de 02-09-1998, pelo que é muito anterior ao registo da marca da A., o qual foi pedido em 04-02-2005 e concedido em 31-03-2006; que é com base nessa firma social e nome do seu sócio-gerente que a ré se identifica, apresenta e distingue no mercado do fabrico e comercialização de artigos e produtos de joalharia e ourivesaria; que o uso que a A. faz da sua marca constitui uma violação do direito ao uso exclusivo da sua firma que goza de prioridade temporal de registo e nessa medida deve ser anulada.
Concluiu pela improcedência da acção e pedindo, em sede de reconvenção, que: - se anule a marca de registo nacional n° 387881; - a autora seja condenada a abster-se de usar a palavra "Eleutério" para designar e assinalar os seus produtos; - a autora seja condenada a pagar-lhe uma indemnização por danos patrimoniais que se estima em valor não inferior a 5% da facturação média anual da Ré; e - a autora seja condenada a pagar-lhe uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de, pelo menos, €20.000,00.
A autora replicou, pugnando pela improcedência do pedido reconvencional formulado pela Ré.
O pedido reconvencional foi admitido. E depois proferido despacho saneador, no qual se fixou o objecto do litígio e os temas da prova.
Foi designado dia para a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual a autora desistiu do pedido formulado contra o réu Banco CC, S.A., desistência que foi homologada por decisão de fls 322 dos autos.
Realizada a audiência final, proferiu-se sentença julgando, tanto a acção, como a reconvenção, totalmente improcedentes.
Inconformada, a Autora apelou para a Relação de Lisboa; tendo a Ré, por sua vez, interposto recurso subordinado.
Por acórdão de 20-10-2016, aquele Tribunal da Relação julgou improcedente o recurso subordinado da Ré e parcialmente procedente a apelação da Autora, condenando a Ré «a abster-se de usar a denominação “Eleutério” no âmbito da sua actividade, salvo quando incorporada na totalidade da aludida firma (BB, L.da)».
Inconformada, a Ré BB, L.da interpôs recurso de revista normal para este Supremo Tribunal, cuja alegação remata com as seguintes conclusões: 1. A discordância da Recorrente relativamente à decisão em crise contende com as seguintes questões: (i) errada qualificação jurídica da factualidade assente no tocante ao enquadramento dos princípios da novidade e da exclusividade, por reporte às regras de prioridade registais, no contexto relacional entre uma firma e uma marca, e (ii) errada apreciação e qualificação jurídica da factualidade assente no que respeita à imputação à Recorrente de uma atuação em abuso de direito, reconduzida à tolerância de uso em relação à existência e utilização pela Recorrida da marca de que é detentora, com o consequente afastamento da viabilidade do pedido de anulação dessa marca; 2. No que concerne à primeira das indicadas questões, cumpre, desde logo, salientar-se que, conforme resulta da matéria de facto dada por assente nos autos, o registo da firma da Recorrente, "BB, Lda.", é muito anterior ao registo da marca da Recorrida, "Eleutério", tendo o primeiro ocorrido em 1998 e o segundo bastante mais tarde, em 2006.
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Significa isto que a existir um confronto e/ou inviabilidade de coexistência entre a firma "BB, Lda." e a marca "Eleutério", a tutela legal desta última soçobrará, pois que a sua constituição remonta a 2006, altura em que a firma "BB, Lda." já se consolidara no mercado, desenvolvendo a sua atividade de fabrico e comércio por grosso e a retalho de artigos de joalharia e de outros artigos de ourivesaria, de forma sólida, constante e reiterada, no âmbito da qual utilizava, individual ou conjuntamente, como símbolos individualiza dores e/ou distintivos da sua empresa, os vários vocábulos e/ou elementos que integram a firma "BB, L.da".
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De resto, desde a sua constituição que a Recorrente vem fazendo uso, no desenvolvimento da sua atividade comercial, da punção que tem como referencial o nome "Eleutério", correspondendo exatamente ao símbolo ou, se se preferir, à composição monogramática ou logotípica que passou a utilizar com o início da sua atividade no ramo - na altura ainda em nome individual do seu sócio-gerente -, em adjunção complementar ou acessória à firma e nome - completo e abreviado - com que identifica e distingue comercialmente a sua empresa e os seus artigos e produtos, maxime junto de clientes e consumidores (BB, Lda., Eleutério José Antunes, Eleutério Antunes, Eleutério).
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Posto isto, uma vez que no versado confronto de sinais distintivos de comércio a Recorrente não só logrou demonstrar a anterioridade do registo da sua firma (1998) - que usa quer para identificar e individualizar a sua atividade quer para distinguir os produtos que comercializa -, como ainda conseguiu provar que, pelo menos desde 2000, utiliza a firma abreviada (Eleutério Antunes), em conjugação ou não com a sua denominação completa, nos produtos que comercializa e na documentação da sua atividade comercial - facto esse que foi dado como assente nos autos -, afigura-se por demais evidente que o cerne da questão reside no facto de a marca de que a Recorrida se arroga titular incluir, como componente principal, o elemento verbal/nominativo "Eleutério", que corresponde ao...
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