Acórdão nº 35457/15.6T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelANA LUÍSA GERALDES
Data da Resolução26 de Outubro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – 1. SITAVA – Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos Instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra: - TAP AIR PORTUGAL Pedindo a condenação desta a: a) Cumprir, em relação aos trabalhadores ao seu serviço, filiados no Sindicato Autor, todas as obrigações legais decorrentes da aplicação da Cláusula 41ª, do Acordo de Empresa celebrado entre a Ré e o SITAVA e Outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª Série, n.º 19, de 22 de Maio de 2007 e, em especial, conceder os descansos compensatórios do trabalho suplementar e do trabalho prestado em dias de descanso semanal e em dias feriados, nos termos constantes desse Acordo de Empresa; b) Pagar-lhes todas as quantias que deixou de cumprir, em violação da Convenção Colectiva de Trabalho aplicável, por não lhes conceder os descansos compensatórios devidos por força do mesmo Acordo de Empresa, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal, até integral cumprimento, a liquidar em execução de sentença.

Alegou, em síntese, que: A Lei n.º 23/2012, de 25-06, procedeu à alteração do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12-02, determinando no seu art. 2º, e entre outras matérias, a revogação dos nºs 1, 2 e 6, do art. 229.º, referente ao descanso compensatório por prestação de trabalho suplementar, mantendo os nºs 3, 4 e 5, e alterando a letra do n.º 7, desse mesmo dispositivo legal.

A partir de 1/Agosto/2012, data da entrada em vigor da referida Lei n.º 23/2012, e ao abrigo do disposto no n.º 2, do art. 7.º, da mesma, cessou a aplicação aos trabalhadores filiados no Autor, da Cláusula 41.ª, referente a descansos compensatórios por prestação de trabalho suplementar.

Todavia, o Acórdão n.º 602/2013, de 20/09, do Tribunal Constitucional, declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas da Lei n.º 23/2012, de 25/06, que consideravam nulas as disposições de regulamentação colectiva de trabalho que conferiam aos trabalhadores abrangidos o direito ao descanso compensatório por trabalho suplementar prestado.

Perante este Acórdão do Tribunal Constitucional, caberia à Ré proceder ao pagamento dos descansos compensatórios devidos por esse trabalho prestado pelos seus trabalhadores, associados do Sindicato Autor, em dias úteis, em dias feriados e em dias de descanso complementar ou ao gozo efectivo desses mesmos descansos compensatórios, nos termos da referida Cláusula 41.ª, do A.E. aplicável.

Algo que a Ré TAP, não obstante instada para o fazer, optou por não proceder de acordo com o decidido pelo Tribunal Constitucional, o que viola o Acordo de Empresa aqui em causa.

  1. O Tribunal de 1ª instância decidiu indeferir liminarmente o pedido formulado pelo Sindicato Autor, sob a alínea b).

  2. A Ré TAP apresentou contestação alegando, em síntese, que: A decisão do Tribunal Constitucional não obrigava nem obriga a conceder aos seus trabalhadores o direito ao descanso compensatório por prestação de trabalho suplementar em dias úteis, em dias de descanso semanal complementar ou em dias feriados, nem, em consequência, a pagar qualquer quantia por uma suposta – mas inexistente – violação de tal direito.

    Acresce que as partes, no Acordo de Empresa, regulamentaram o regime do descanso compensatório por remissão para o Código do Trabalho, pelo que o descanso compensatório só será devido nos termos em que a lei estabeleça, o que já não sucede.

    Conclui, assim, pela improcedência da acção.

  3. Oportunamente foi proferida sentença nos seguintes termos: «Pelo exposto, o Tribunal julga a acção improcedente e, em consequência, decide: 1.

    Absolver a «TAP AIR PORTUGAL» do pedido formulado por «SITAVA – SINDICATO DOS TRABALHADORES DA AVIAÇÃO E AEROPORTOS».

  4. Dar sem efeito a data agendada para a realização da audiência final.

  5. Sem custas».

  6. Inconformado com a sentença da 1ª instância, o Sindicato Autor apelou.

  7. O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu Acórdão, tendo deliberado conforme se transcreve: «Nestes termos, acordam os Juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar a apelação procedente e, consequentemente, revogando a sentença recorrida, condenam a Ré TAP AIR PORTUGAL a cumprir, em relação aos trabalhadores ao seu serviço filiados no Autor “SITAVA – Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos” as obrigações decorrentes da aplicação da Cláusula 41ª do Acordo de Empresa celebrado entre as partes e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª Série, n.º 19, de 22 de Maio de 2007, e em especial, concedendo-lhes os descansos compensatórios aí previstos e devidos por trabalho suplementar prestado em dias úteis, em dias de descanso complementar e em dias feriados.» 7. Irresignada, a Ré “TAP” interpôs recurso de revista tendo formulado as seguintes conclusões: 1. A Doutrina e a Jurisprudência têm defendido de forma unânime, que o sentido e alcance a fixar a uma Cláusula de Convenção Colectiva de Trabalho de conteúdo normativo ou regulativo deve ser encontrado por apelo aos critérios decorrentes do art. 9.° do Código Civil.

  8. O art. 9.°, da Lei n.º 23/2012, de 25 de Junho, revogou, entre outras, as normas dos nºs 1, 2 e 6, do art. 229.°, do Código do Trabalho, suprimindo o descanso compensatório por trabalho prestado em dias úteis (excepto quando impeditivo do gozo do descanso diário - cf.

    o n.º 3), em dias de descanso semanal complementar e em dias feriados.

  9. Apenas se manteve o direito ao descanso compensatório remunerado relativamente ao trabalho realizado nos dias de descanso semanal obrigatório e no período de descanso diário e, ainda, relativamente à actividade normal prestada nos feriados nas empresas isentas de encerrar nestes dias.

  10. Não obstante tal alteração ter sido submetida à apreciação do Tribunal Constitucional, veio o mesmo considerar que as alterações legislativas em causa não eram, só por si, susceptíveis de atentar contra os direitos dos trabalhadores de conciliação da actividade profissional com a vida familiar (cf. art. 59.° da CRP), de desenvolvimento da personalidade (art. 26.°, n.º 1, da CRP), de protecção da família (art. 67.° da CRP) e da saúde (art. 64.° da CRP).

  11. O Tribunal Constitucional entendeu ainda que, por um lado, se manteve o descanso compensatório remunerado naquelas situações que mais directamente colocam em causa o direito ao repouso (casos em que o trabalhador presta trabalho suplementar impeditivo do gozo do descanso diário e quando presta trabalho suplementar em dia de descanso semanal obrigatório).

  12. Considerou, ainda, que a eliminação do descanso compensatório não podia ser encarada isoladamente sem atentar nos demais elementos do regime do trabalho suplementar, já que a lei não restringiu as excepções à sua obrigatoriedade (cf. arts. 59.°, 75.°, 88.° e 227.°, n.º 3), nem alargou os limites temporais, diários e anuais, impostos ao trabalho suplementar (art. 228.°).

  13. A declaração de inconstitucionalidade do art. 7.°, n.º 2, da Lei n.º 23/2012, na parte em que comina com a nulidade e redução as Cláusulas dos IRCTs, que disponham sobre descanso compensatório por trabalho prestado em dias úteis, em dias de descanso semanal complementar ou em dias feriados, proferida pelo Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 602/2013, de 20 de Setembro, não impõe que a Recorrente TAP conceda aos seus trabalhadores o direito ao descanso compensatório pela prestação de trabalho suplementar prestado nesses dias, nem, em consequência, a pagar qualquer quantia.

  14. Na interpretação do regime da Cláusula 41.

    a do A.E. em causa, da sucessão dos regimes legais aplicáveis à matéria, e dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do referido art. 7.°, n.º 2, da Lei n.º 23/2012, de 25 de Junho, importa atender não só à titularidade do direito de Contratação Colectiva e exercício do mesmo, nos termos e dentro dos limites da lei, como à forma de definição do concreto conteúdo dos IRCTs.

  15. O que se discutiu no Acórdão n.º 602/2013, do Tribunal Constitucional, foi a possibilidade de a lei definir o âmbito da Regulamentação Colectiva, ou de apenas poder proceder à sua regulamentação, para estabelecer os limites da intervenção da lei nos concretos regimes convencionais (como aconteceu com o regime do art. 7.°, n.º 2, da Lei n.º 23/2012).

  16. No caso em apreço, o que está em causa é exactamente o contrário, ou seja, saber qual o alcance da remissão constante de um normativo inserto num IRCT que, no exercício da autonomia da Regulamentação Colectiva, remete expressamente, e num concreto aspecto do regime convencional, para "os termos da lei".

  17. Dentro dos limites legais, e ao abrigo do direito à Contratação Colectiva, as partes gozam de uma ampla autonomia relativamente aos termos em que definem o regime previsto nos IRCTs que celebram, podendo reproduzir textos legais, incorporando-os como sendo seus, sem outra referência, remeter para a lei, sem reproduzirem o texto legal, aditando, ou não, ao regime previsto na lei, um regime específico ou, ainda, estabelecer regimes específicos e exclusivamente por si regulados.

  18. A Cláusula 41ª, n.º 2, do A.E., não se insere em nenhum dos casos supra referidos, já que começa por mencionar "Nos termos da lei, ...." para depois descrever um regime convencional, sendo por isso manifesto que as partes contraentes do A.E. não pretenderam regular de forma autónoma as regras relativas ao descanso compensatório.

  19. Na referida Cláusula as partes apenas pretenderam fazer uma remissão para a lei, i.e., para o disposto no Código do Trabalho, devendo o descanso compensatório ser gozado nos mesmos termos e condições que os regulados, em cada momento, na lei.

  20. Pelo confronto com a forma como se encontram redigidas outras Cláusulas do mesmo A.E., resulta inequívoca esta conclusão, ou seja, as partes contraentes quiseram remeter o regime convencional do descanso compensatório por prestação de trabalho suplementar, para o regime legal em cada momento vigente...

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