Acórdão nº 1989/09.0TVPRT.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução12 de Outubro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Em Setembro de 2009, AA instaurou uma acção contra BB e CC (1ºs réus), o Condomínio do Prédio Urbano sito na Rua … …, nº 1…3/2…5, no P…, representado pela administradora, DD - Administração de Condomínios, Lda. (2º réu) e EE - Tecnologias e Produtos para a Construção Civil, Lda. (3ª ré), pedindo a sua condenação solidária a: “a) Reconhecer o direito de propriedade do autor relativamente à fracção urbana” designada pela letra M, correspondente ao 3º andar direito do prédio situado na Rua M… S…, 1…3 a 2…5, P…; “b) Reconhecer, e eliminar, com carácter definitivo, todos os defeitos e vícios respeitantes ao terraço integrante do 4º andar direito do prédio (…), com carácter de urgência, em prazo a fixar pelo tribunal nunca superior a 30 dias; ou, em alternativa, c) Caso não procedam a tal reparação, que seja reconhecido ao próprio autor o direito a ele próprio eliminar o respectivo defeito, a expensas exclusivas dos réus; d) A pagarem ao autor adequada indemnização por todos os prejuízos por este sofridos, ou a sofrer, quanto à parte já liquidada, no valor de 30.333,80 euros, acrescidos do valor de 375,00 euros por mês a contar de Setembro de 2009 até efectiva reparação do terraço do 4º andar do sempre aludido prédio e definitiva reparação da fracção do A., nos termos expostos; e)A pagarem ao autor todos os demais prejuízos, ainda não quantificáveis, a liquidar em execução de sentença; f) A pagarem a título de sanção pecuniária compulsória a quantia de € 150 diários por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação prevista na alínea b) deste pedido; g) A pagarem juros ao autor a contar da citação, até integral pagamento, sobre todas as quantias em que vierem a ser condenados e bem assim o acréscimo previsto no art. 829-A do Código Civil; h) Tudo com custas e demais encargos pelos réus.” Para o efeito, e em síntese, AA alegou que é proprietário desde Fevereiro de 1984 e que reside na fracção M com o seu agregado familiar; que os 1ºs réus são proprietários da fracção P do mesmo prédio, localizada por cima da fracção M, desde Fevereiro de 1989; que, segundo o título constitutivo da propriedade horizontal, é parte integrante da fracção P um terraço que é simultaneamente “cobertura da zona de quartos da fracção” M; que, uns anos antes da propositura da acção, na sequência de obras que os 1ºs réus efectuaram na sua fracção, “começaram a surgir humidades, cada vez mais frequentes, nos tectos e paredes da zona de quartos da fracção/habitação do A (…) e até queda de água” nos quartos cujo tecto corresponde ao referido terraço; que, por contrato de empreitada celebrado entre o condomínio e a 3ª ré em 24 de Julho de 2004, esta empresa obrigou-se a realizar trabalhos destinados à “impermeabilização de todos os terraços e fachadas do prédio (pondo fim aos problemas circunstanciais de humidades e infiltrações de água que se vinham a notar)”, trabalhos que não eliminaram os problemas verificados na fracção M; que a 3ª ré se obrigou, ainda, a reparar o interior da fracção M, o que fez indevidamente, porque os problemas reapareceram repetidamente, como notificaram a ré.

Em resumo: os problemas mantêm-se, sem que os réus assumam as correspondentes responsabilidades e sem que o autor os possa resolver definitivamente, desde logo por não ter acesso ao andar de cima, limitando-se a repetidas reparações na sua fracção e continuando a sofrer prejuízos.

Justificando a demanda de todos os réus, o autor afirmou, a concluir a petição inicial, que “por defeito/avaria de impermeabilização do (…) terraço, resultante de obra nova ou falta de conservação, verificaram-se e verificam-se infiltrações de águas na zona de quartos (…)”, com graves prejuízos. Ora os 2ºs réus, como proprietários da fracção P, “estão obrigados à sua conservação e a utilizá-la por forma a não causar prejuízos nas habitações terceiras”, e a indemnizar quem sofre prejuízos; como, segundo o título constitutivo, o referido terraço integra a fracção P, são responsáveis pelos prejuízos, em primeiro lugar, os seus proprietários mas, em segundo lugar, também o condomínio, porque tal terraço é “terraço de cobertura” e, portanto, considerado por lei como zona comum e, em terceiro lugar, a ré EE, por ter assumido contratualmente a obrigação de reparação dos vícios. A responsabilidade é solidária e corresponde aos montantes acima indicados.

Todos os réus contestaram, separadamente.

O condomínio e a ré EE defenderam-se por impugnação e sustentaram ser partes ilegítimas: o condomínio, por estar em causa uma parte integrante de uma fracção do prédio; a ré EE, por não ter celebrado, nem qualquer contrato com o autor, nem qualquer contrato que incluísse a reparação do interior da sua fracção.

Também CC impugnou e sustentou não ter legitimidade, por se tratar de uma parte comum e porque os condóminos apenas respondem “em proporção do valor das suas fracções” pelas “despesas necessárias à conservação das partes comuns do edifício”.

Por entre o mais, disse não ter acesso à fracção P por estar divorciado da ré BB e nunca ter tido conhecimento dos problemas relatados pelo autor, bem como ser excessiva a indemnização pretendida.

BB considerou-se igualmente parte ilegítima, por se tratar de parte imperativamente comum e que não está exclusivamente afecta à sua fracção, pois também serve de cobertura da fracção de baixo. Invocou a prescrição do direito de indemnização – as obras a que o autor se refere tiveram lugar em 1989 e a acção foi proposta em 9 de Setembro de 2009 – e contestou por impugnação, afirmando, nomeadamente, que “a origem dos alegados danos e prejuízos nada tem a ver com a actuação da 1ª ré contestante”, antes resulta de deficientes trabalhos de impermeabilização que foram desenvolvidos por empresas contratadas pelo condomínio. Disse ainda que, desde que detém a posse efectiva da fracção P, “sempre procedeu à conservação que lhe era exigível”; e requereu a intervenção acessória provocada de FF e de GG, arrendatários da fracção entre Janeiro de 2006 e Outubro de 2009, por hipotético direito de regresso.

O autor replicou e requereu a intervenção principal provocada dos “eventuais proprietários do prédio que foi construído contiguamente ao prédio do autor”, HH - Empreendimentos Imobiliários, S.A. e do “proprietário correspondente ao 3º andar esquerdo do prédio (…), onde alegadamente se realizaram obras”, II (fls. 319).

Pelo despacho de fls. 360 foi admitida a intervenção de FF, de GG, de HH - Empreendimentos Imobiliários, S.A. e de II; todos vieram ao processo pronunciar-se.

Pelo despacho de fls. 586, proferido nos termos do artigo 31º-A, nº 1, do Código de Processo Civil anterior, o autor foi convidado “para vir dizer contra qual dos réus pretende fazer seguir a acção, sob pena de a mesma se vir a extinguir por absolvição de todos os réus da instância”, por não ser admissível a coligação, nos termos formulados.

O autor veio indicar os réus BB e CC, manifestando embora a sua discordância com o despacho.

No despacho de fls. 614, os réus Condomínio do Prédio Urbano sito na Rua M…. S…, nº 1…3/2…5 e EE - Tecnologias e Produtos para a Construção Civil, Lda. e os intervenientes principais II e HH – Empreendimentos Imobiliários, SA foram absolvidos da instância, com fundamento em coligação ilegal.

O autor recorreu; mas o recurso não veio a ser admitido na Relação, por inadmissibilidade de recurso autónomo.

No saneador, julgou-se improcedente a excepção de ilegitimidade oposta por BB e CC e remeteu-se para final o conhecimento da prescrição.

Pela decisão de fls. 1024, foram habilitados CC, JJ e KK como sucessores de BB, entretanto falecida.

  1. A acção foi julgada improcedente pela sentença de fls. 1457. Em síntese, e recordando que a questão a decidir era a de saber se os réus BB (substituída pelos sucessores, como se viu) e CC “estão constituídos no dever de proceder à reparação dos danos patrimoniais e não patrimoniais alegadamente sofridos pelo autor em resultado e infiltrações que se registam no interior da fracção autónoma de que é proprietário”, o tribunal entendeu: – que se trata de uma acção destinada a efectivar a responsabilidade civil extracontratual, na qual a causa de pedir formulada contra estes réus assenta “num duplo fundamento: por um lado, no facto de estes terem levado a cabo obras no terraço da fracção autónoma de que são proprietários (terraço esse que, nos termos do respectivo título constitutivo, integra essa fracção), obras essas que vieram a originar humidades e quedas de água nos quartos da fracção autónoma de que aquele é igualmente proprietário; por outro lado, no facto de tais demandados não terem procedido à devida conservação e utilização do referido terraço, o que igualmente contribuiu para os danos cuja reparação reclama”; – que o autor não fez prova de que “as infiltrações registadas no interior da sua fracção (…) tenham tido na sua génese qualquer acção ou omissão” dos réus; – que não se provou que “essas patologias se tenham verificado a partir do momento em que os réus levaram a cabo obras na sua fracção”; – que a lei em vigor à data da outorga do título constitutivo da propriedade horizontal, 26 de Abril de 1983, – isto é, a redacção originária da al. b) do nº 1 do artigo 1421º do Código Civil, “1. São comuns as seguintes partes do edifício: (…) b) O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso do último pavimento” –, originando embora divergências de interpretação, devia ser interpretada com o sentido que literalmente veio a ser introduzido na referida alínea pelo Decreto-Lei nº 267/94, de 25 de Outubro, ou seja, como considerando imperativamente comuns “os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fracção”; – que essa interpretação implica, no caso, que, não obstante figurar no título constitutivo da propriedade horizontal como integrando a fracção autónoma P, o terraço é imperativamente parte comum: “o ajuizado terraço, ainda que de uso exclusivo da...

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