Acórdão nº 4527/14.9T8FNC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução17 de Janeiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I J, intentou contra N, LDA, ação declarativa pedindo a anulação do contrato de trespasse comercial entre ambos celebrado a 26 de Setembro de 2014, alegando para o efeito que o mesmo foi subscrito com erro essencial ou dolo.

A Ré contestou e reconveio, pedindo a improcedência da acção e a condenação do Autor a pagar-lhe a quantia de € 17.000,00 (dezassete mil euros), acrescida dos juros vencidos e vincendos desde 31 de Janeiro de 2015, e sanção pecuniária compulsória prevista no nº 4 do artigo 829º- A do CCivil e ainda a condenação daquele como litigante de má fé.

A final foi produzida sentença onde foi julgada a ação totalmente improcedente e procedente o pedido reconvencional tendo-se condenando o Autor/reconvindo a pagar à Ré/reconvinte a quantia de € 17.000,00 (dezassete mil euros) acrescida dos juros à taxa de 5% ao ano desde a data do trânsito em julgado da sentença, bem como ainda, acrescida (aquela quantia) dos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal civil sucessivamente vigente desde 1 de Fevereiro de 2015 até integral e efetivo pagamento, tendo-se absolvido o mesmo do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Inconformado com o assim decidido, o Autor interpôs recurso de Apelação, o qual veio a ser julgado procedente, tendo sido declarada a anulação do contrato celebrado entre as partes em 26 de setembro de 2014 e, em consequência, determinou-se a entrega à Ré/Apelada, do estabelecimento comercial dele objecto, situado no rés-do-chão do prédio urbano, sito na Rua …, ao abrigo do contrato de arrendamento celebrado a 7 de Abril de 2006, com a condenação da Ré/Apelada a entregar ao A./Apelante a quantia de € 3.000,00 que lhe tinha sido entregue por este último na data da assinatura do contrato acima mencionado, tendo sido julgado improcedente o pedido reconvencional deduzido pela Ré/Apelada, absolvendo-se do mesmo o Autor/Apelante.

Irresignada, vem agora a Ré interpor recurso de Revista, apresentando as seguintes conclusões: - O acórdão de que se recorre considera como provados factos que não foram dados como tal em sede de audiência de julgamento da 1ª Instância, ignorando outros ou não os valorizando devidamente.

- No contrato celebrado em 26 de Setembro de 2014 as partes declaram expressamente que "O estabelecimento é entregue com todos os bens existentes no seu interior, bens esses próprios da actividade de restauração exercida pela primeira outorgante, conforme lista anexa ao presente contrato que será por todos rubricada e fará parte do presente contrato." ponto 3 da Cláusula Segunda.

- E ainda na Cláusula Terceira "O segundo outorgante aceita o presente acordo, declarando ter conhecimento das condições em que se encontra o estabelecimento e os bens constantes da lista anexa." - A assinatura do contrato foi antecedida dias antes de três visitas realizadas pelo A. e pela filha, pelo que o Autor estava consciente do estado em que se encontrava o estabelecimento.

- A ora apelante nunca garantiu que o estabelecimento poderia ser aberto e funcionar de imediato, nem que os equipamentos existentes no estabelecimento estavam todos eles em óptimo estado e a funcionar plenamente.

- Nem nunca omitiu o estado dos mesmos, muito pelo contrário, solicitou que fosse a própria filha do Autor a deslocar-se ao estabelecimento e a fazer ela própria o inventário dos equipamentos, tomando assim conhecimento direito de que equipamentos existiam no local e em que estado estavam.

- Ao contrário do que entendeu o tribunal no recurso de apelação, não ouve qualquer comportamento omissivo por parte da Ré. Mesmo antes da assinatura do contrato, o Autor e filha dirigiram-se ao estabelecimento objecto do contrato mais do que uma vez, tendo visto tudo quanto quiseram ver, nada sendo escondido.

- Tanto o autor como a sua filha, intermediária no processo negocial e pessoa que iria assumir a exploração, viram e verificaram o estado do estabelecimento e recheio, pelo menos três vezes, tendo a própria elaborada uma lista com os bens que existiam no mesmo e chamou os técnicos da empresa "A" para verificarem o estado das instalações, tudo antes da assinatura do contrato.

- Pelo que todos tinham conhecimento das exactas condições do local.

- Por via da assinatura daquele contrato o Autor declarou ter conhecimento das condições em que se encontrava o estabelecimento e os bens constantes da lista anexa ao contrato, conforme cláusula terceira do contrato junto aos autos.

- O Autor nunca demonstrou, quer tácita, quer expressamente, que se o locado não se encontrasse de um determinado modo não celebraria o negócio.

- O tribunal da Relação, ao contrário do decidido em primeira instância, e até em contramão de toda a prova produzida e com a sua própria posição quanto aos factos dados como provados e não provados, veio a considerar, que era exigível à Ré/Apelada, que mostrasse e informasse concretamente o Autor do real estado do estabelecimento objecto do contrato de trespasse.

- Quando ficou provado em 1ª instância que a Ré mostrou e informou o Autor do estado do estabelecimento, tendo até reduzido o preço do negócio pelo facto do estabelecimento ter estado fechado cerca de um ano e precisar de adaptações ou reparações, de € 30.000,00, para € 20.000,00.

- Esta redução do preço do negócio é um dos factos dados como provados e que foi, erroneamente desconsiderado no acórdão da relação.

- Além deste, outros factos importantes como a elaboração do inventário, o conteúdo exacto do relatório técnico junto pelo autor, os depoimentos das partes e das testemunhas e tentativa de renegociação do preço também não foram correctamente analisados.

- Estes são factos importantíssimos para averiguar da existência ou não de erro essencial na elaboração do contrato.

- Ao contrário do entendimento expresso no acórdão, que conclui não se sabe de onde ou com que factos para tal, que a Apelante renegociou o preço e não anulou logo o negócio, porque não queria ir logo litigar para Tribunal (?!), a renegociação do preço, feita após a outorga do contrato, é um facto demostrativo de que o autor queria manter o negócio válido. Caso assim não fosse, quando foi feita ligação eléctrica o autor em vez de proceder a limpeza do espaço e a reciclagem e alguns bens teria desde logo pedido a anulação do contrato, o que não o fez.

- O que só demonstra que o autor não estava em erro sobre o objecto do negócio pois sabia antemão em que estado estava o estabelecimento e os bens.

- Também não resultou provado nos autos que o Autor tinha comunicado à Ré que pretendia abrir de imediato o estabelecimento e que se aquele não estivesse em condições de o fazer seria motivo para não lhe interessar o negócio em causa.

- Por tudo o acima exposto não se verifica qualquer comportamento doloso da Ré, ou sequer negligente, activo ou omissivo, susceptível de tornar anulável o negócio.

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