Acórdão nº 128/08.9TBMFR.L1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA e BB intentaram no dia 21-1-2008 ação declarativa com processo comum contra Construções CC, SA pedindo a condenação da ré nos seguintes termos: 1 - Que a ré seja condenada a executar todas as obras de reparação objeto de denúncia nos presentes autos, bem como aquelas que vierem a ocorrer no período legal de garantia.

2 - Que a ré seja condenada no pagamento aos AA de todas as despesas que estes se virem compelidos a suportar tendo em vista a fundamentação técnica do presente pedido, nomeadamente custos de relatórios juntos aos autos e despesas com advogados o que até ao momento está compulsado em 8.471.45€, assim discriminados: a) despesas com advogados 3.500€; (b) relatórios técnicos: b1) check-house 1285,14€; b2) acusticontrol 3.327.51€; c) correio: 39,16€; d) fotocópias e encadernações: 90,67€; e) custos documentos câmara: 136,36€; f) conservatórias e notário: 32,11€.

3 - Que, em sede de perícia que a seu tempo se requererá, para ajuizar das perdas efetivas de área em cada fração, seja a ré condenada a deduzir ao preço de venda das frações dos AA o valor resultante da equação valor metro quadrado vezes área efetivamente perdida, como ainda, e sempre através de perícia, seja condenada a indemnizar os AA pelo valor que vier a ser julgado ajustado, não só em termos de qualidade de vida nas duas frações, bem como em função das deficiências não reparáveis, tal é o caso, por exemplo, das discrepâncias apontadas nos relatórios por exemplo ao nível das espessuras das paredes 4 - Que a ré seja condenada no pagamento a cada um dos AA de um montante a título de indemnização por danos morais, valor esse que compense de toda a angustiante experiência vivida, dos incómodos resultantes das obras e o consequente e forçado afastamento dos seus lares, para o que desde já se alvitra um mínimo de 5.000 euros a cada um dos AA.

  1. Os AA adquiriram as respetivas frações à ré em 23-3-2006 e 14-3-2006 pelas quantias, respetivamente, de 140 mil euros e 128 mil euros.

    Verificaram, pouco tempo depois da aquisição, defeitos na construção, a saber: a) Deficiente isolamento acústico; b) falta de acabamentos em pinturas; c) falta de reparação de teto falso; d) falta de reparações em portas; e) problemas com o escoamento de águas pluviais; f) anomalias elétricas; g) rutura na parede da garagem; h) problemas de antenas de TV; i) problemas com o vídeo porteiro; j) fenda aberta na escada; k) problemas de humidade estando em condições apenas um dos 3 quartos da habitação do primeiro autor.

  2. Houve intervenção da ré tendo em vista a reparação dos defeitos, verificando-se, após intervenção, um conjunto de deficiências que persistiam em regularizar, a saber: a1) saliências nas paredes de pladur tanto na sala como na cozinha; a2) riscos e outras deficiências no soalho da sala; a3) pavimento cerâmico da cozinha com zonas estaladas; a4) impossibilidade de usar o suporte da TV que anteriormente estava instalado na cozinha e devido à perda de área daquela divisão ali não pode montar.

  3. Mais alegaram os AA que tanto estas, como as demais anomalias a seguir indicadas, não foram objeto de reparação sendo que as reparações que a ré entretanto assegurou deram lugar a uma real diminuição do valor das frações objeto do presente litígio, atenta a diminuição das respetivas áreas, isto porque a introdução de paredes de pladur externamente às existentes como forma de uma melhor proteção contra os ruídos, e portanto dando origem a uma dupla parede, a tal deu causa, pretendendo os AA ser ressarcidos, na justa proporção do espaço perdido.

  4. No que respeita às anomalias não solucionadas pela ré nas frações dos AA, são elas: Fração do autor AA b1) falta de pintura no gradeamento da varanda da cozinha não resolvida pela intervenção efetuada; b2) fenda na parede junto da escada de acesso ao 3º piso do duplex, situação também já intervencionada pela 2ª vez, mas que voltou a abrir no mesmo local e com a mesma aparência; b3) fenda na parede da casa de banho do 2º piso da fração duplex; b4) fenda na parede da lareira, deficiência surgida já após as reparações levadas a cabo pela ré; b5) imperfeições no soalho flutuante, umas anteriores, outras posteriores às reparações levadas a cabo pela ré no domicílio do autor AA; b6) imperfeições no teto falso do 2º piso da fração, imperfeições já intervencionadas pela ré mas que continuam com o mesmo aspeto após reparações; b7) deficiente isolamento de vários interruptores de luz, estores e termóstato do piso radiante, o que condiciona o seu bom funcionamento e origina entradas de ar vindas do exterior; b8) deficiente isolamento das caixas de estores onde não existe uma caixa de isolamento, o que condiciona o seu bom funcionamento e origina entrada de ar vindo do exterior; b9) quanto ao isolamento térmico o que o A. AA constata é que a casa é demasiado quente no verão e demasiadamente fria no inverno, mais concretamente ao nível do 2º piso da fração, situação a que acresce uma anormal condensação de água patente nas zonas de caixilharia; b10) anormal ruído proveniente dos tubos das quedas de águas, situação já intervencionada pela ré, mas ainda não solucionada, com as consequências ao nível do repouso do A.

    Fração do autor BB c1) deficiências no soalho do corredor e da sala, deficiências que se agravaram após a intervenção da ré; c2) ruídos ao nível dos tubos de queda de águas pluviais, deficiência que já foi objeto de intervenção na habitação do autor AA mas que não resolveu o problema e na fração do autor BB ainda não foi objeto de intervenção; c3) condensação anormal em todas as zonas onde existem caixilharias; c4) entrada de ar pelos interruptores que estão colocados nas paredes que confinam com o exterior; c5) entrada anormal de ar pelas zonas de caixa de ar, o que condiciona o normal funcionamento do piso radiante; c6) deficiente isolamento das caixas de estores; c7) fraco sinal de TV 6.

    Os AA referiram ainda deficiências posteriores à intervenção corretiva da ré e consequências negativas de tal intervenção: d1) agravamento dos defeitos acima denunciados no soalho da sala; d2) irregularidades nas paredes de pladur colocadas para correção acústica; d3) quebras nas juntas de piso cerâmico da cozinha; d4) perca efetiva de área útil da casa após colocação das já referidas paredes de pladur por consistirem efetivamente numa parede dupla; d5) piso radiante na sala de jantar que não funciona.

  5. Na contestação a ré refere que não deve ser condenada no pagamento dos pedidos 8.471,45€ pois não lhe cabe suportar o pagamento dos honorários de advogado; que providenciou pela elaboração do ensaio e nunca se furtou à sua responsabilidade; que a A., se recorreu a empresas para verificação dos defeitos, fê-lo por sua iniciativa, não sendo despesas necessárias à denúncia dos defeitos; não merecem tutela os invocados danos morais pois o seu alojamento no hotel foi necessário para efetivação das reparações, não bastando a afirmação genérica da angustiante experiência com incómodos resultantes das obras e os defeitos foram objeto de reparação, tendo os AA, após reparação aceitado receber as frações em perfeitas condições de habitabilidade.

  6. O Tribunal julgou a ação parcialmente procedente condenando a ré a executar todas as obras de reparação dos defeitos enunciados nos artigos 51 relativos à fração do autor AA, 52 relativos à fração do autor BB e no artigo 53 dos factos provados no prazo de 90 dias a contar do trânsito em julgado da sentença; condenou a ré no pagamento aos AA das despesas que estes se viram compelidos a suportar no montante de 3.327,51€ absolvendo-se do demais peticionado a título de danos patrimoniais; condenou a ré no pagamento a cada um dos AA da quantia de 2.500€ a título de indemnização por danos não patrimoniais, absolvendo-se a ré do demais peticionado a título de danos não patrimoniais; condenou a ré a deduzir ao preço da venda das frações dos AA o valor resultante da equação valor metro quadrado vezes área efetivamente perdida, no montante total de 89.120,00€.

  7. O Tribunal da Relação negou provimento ao recurso da ré embora com fundamento jurídico não inteiramente coincidente.

  8. O Tribunal da Relação considerou em sintonia com a recorrente que o contrato em causa não devia qualificar-se de empreitada, entendimento da sentença recorrida, mas de compra e venda; considerou ainda, fundando-se em jurisprudência que indicou, que, na compra e venda de coisa defeituosa, o comprador, para além do direito de obter do vendedor a reparação dos defeitos nos termos do artigo 914.º do Código Civil, deve ver-lhe reconhecido o direito de indemnização fundado no incumprimento da obrigação de entrega de um bem sem defeito, sendo admissível a cumulação, mesmo em caso de reparação, de outros prejuízos que subsistam.

  9. Referiu o acórdão que " a sentença recorrida, ressalvado o segmento atinente à qualificação do contrato, fez correta ponderação dos factos provados e aplicou bem o direito, quer no que respeita ao incumprimento da ré, que nos 'quanta' indemnizatórios apurados, razão pela qual tem de ser confirmada".

  10. E mais referiu: " e nem se alegue, como faz de passagem a recorrente, que o dano moral não é ressarcível na responsabilidade contratual, mas apenas na aquiliana. Assim não é, os requisitos dos dois tipos de responsabilidade são os mesmos, sendo que o único presumível é a culpa e os restantes de quase idêntica dogmática".

  11. A ré recorre para o STJ, concluindo a sua minuta de recurso nos seguintes termos: i. O Tribunal da Relação confirmou a sentença proferida na primeira instância, tendo, todavia, qualificado o contrato dos autos como contrato de compra e venda.

    ii. Os efeitos jurídicos do cumprimento defeituoso do contrato de empreitada e do contrato de compra e venda são distintos, não tendo tal diferença de regime sido levada em conta pelo Tribunal da Relação que incorreu em erro de julgamento ao confirmar a procedência parcial da sentença, pois a disciplina do contrato...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT