Acórdão nº 9/14.7GBAVR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça <> Nos autos de processo comum n.º 9/14.7GBAVR da Comarca de ... – Inst. Central- ...ª Secção Criminal – ..., foram submetidos a julgamento em tribunal colectivo, vários arguidos entre os quais, o arguido AA, com os demais sinais dos autos, que veio a ser condenado- al. F) da decisão - pela prática, em coautoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos artigos 21º, n.º 1, e 24º, alínea i), ambos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, por referência às Tabelas I-A, I-B e I-C, a que alude o art. 2º, n.º 1, daquele diploma legal, anexas ao mesmo, na pena de 9 (nove) anos de prisão; O acórdão decidiu após as condenações havidas (alíneas c) a L) da decisão: “M) – Declarar perdidos a favor do Estado: a) - Os produtos estupefacientes apreendidos, ordenando a destruição das respetivas amostras cofre, a solicitar à Polícia Judiciária; b) - As quantias monetárias, peças em ouro e demais bens apreendidos nas residências dos arguidos, exceto os infra referidos nas als. N) e O); c) - Os telemóveis apreendidos em poder dos arguidos aquando das respetivas detenções e os veículos automóveis com as matrículas: - ...-GH, da marca Opel, modelo Vectra; - ...-JF, marca Opel, modelo Astra; e - OQ-..., de marca BMW, modelo 320 I; N) – Determinar o levantamento da apreensão e restituição: a) - dos demais veículos apreendidos; b) - da quantia de 204,00 € apreendida a BB; c) - do telemóvel apreendido à arguida CC; d) - da faca, da navalha e plásticos (estes encontrados em poder da arguida DD) apreendidos; O) – Determinar o levantamento da apreensão e restituição dos demais bens apreendidos nos autos não expressamente mencionados, com a consequente restituição dos mesmos aos arguidos na posse dos quais foram apreendidos ou a outras pessoas, desde que os reclamem e comprovem ser seus legítimos proprietários, sem prejuízo de, decorrido um ano, serem os mesmos declarados perdidos a favor do Estado;” <> Inconformados com a decisão condenatória dela recorreram vários arguidos, entre os quais o arguido AA, para o Tribunal da Relação do Porto, que, por seu acordão de 28 de Setembro de 2016 negou provimento aos recursos, confirmando a decisão recorrida., e condenou os recorrentes nas custas.

<> Ainda inconformado, vem o arguido AA recorrer para este Supremo Tribunal, concluindo a motivação de recurso da seguinte forma: “I.

O douto acórdão ora em crise condena EE pelo crime de tráfico de estupefacientes , p. e p. pelos artigos 21.º e 24.º, n.º 1, alínea i) do Decreto – lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, ambos do Código Penal, na pena de nove anos de prisão efectiva.

II.

Somos do entendimento, que os factos dados como assentes, sempre consubstanciariam um crime de tráfico , p. e p. no artigo 21.º, n.º 1 do Decreto Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

III.

No caso do EE, ora recorrente, facilmente será de concluir que a conduta é a seguinte: a) Negocia directamente com os consumidores; b) Entrega directamente a droga; c) Recebe o preço da droga; d) Não recorre a intermediários.

IV.

Não se demonstrando, com clareza e certeza, que o arguido EE tenha utilizado menores,V.

Nem que tenha conhecimento da sua utilização e o tenha querido.

VI.

Não se consubstanciando os factos na qualificação do crime de tráfico de droga p. e p. no artigo 2 4.º, alínea i), do Decreto – lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, nem se encontrando preenchido os elementos do tipo da referida qualificação.

Mas mesmo que assim não seja, ou que assim não se entenda, Sempre se dirá que,VII.

O tribunal a quo violou de forma grosseira o preceituado no artigos 40.º, n.º 1 e 2 e 71.ºn.º 1 e 2 do Código Penal.

VIII.

O aresto ora em crise ao aplicar a pena de nove anos de prisão, ultrapassou manifestamente a culpa do agente,IX.

Bem como as exigências da prevenção.

X.

Não relevando na determinação concreta da pena as circunstâncias: XVI.a) O facto do arguido ter participação, em conjunto com a companheira, em 200 vendas ao longo de ano e meio, ou seja cerca de 100 vendas em 538 dias, pouco mais de uma venda por semana; XVI.b) Na maioria das vendas apuradas, negociar e entregar directamente a droga; XVI.c) Apenas quanto a um consumidor, existir a referencia à entrega efectuada por uma criança, sem especificação das circunstâncias em que ocorreu a entrega.

XVI.d) Ter companheira há mais de 25 anos; XVI.e) Sofrer de uma doença infecto-contagiosa (HIV) grave.

XI.

Entendemos, por isso, salvo o devido respeito por opinião contrária, que: XI. 1) Deve ser o arguido condenado, pela prática do crime de tráfico, p. e p. no artigo 21.º, alinea a) do Decreto Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

Caso assim não se entenda, o que se consente, mas não se prescinde, XI. 2) Deve a pena ser reduzida até ao limite mínimo legal.

FAZENDO DESTA FORMA JUSTIÇA! <> Respondeu o Ministério Público através do Exmo. Procurador-Geral Adjunto à motivação de recurso, pugnando pela improcedência do mesmo.

<> Neste Supremo, a Dig.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto Parecer onde refere: “1 - A primeira questão que o arguido coloca, parece-nos merecer alguma atenção, não só relativamente a este como a todos os coarguidos que foram condenados pelo crime de tráfico agravado (arts. 21º e 24º i) da lei nº 15/93) porque os factos provados poderão não ser suficientes para o arguido EE ser condenado pelo crime agravado e quando quase todos foram considerados em coautoria.

Por isso poderão eventualmente desses mesmos ser beneficiados nos termos do art. 402º nº 2 a) do CPP.

1.1 Vejamos pois se além dos factos dados como provados relativamente ao recorrente e que o MP refere também em concreto, haverá outros que complementem estes e que englobem os restantes co-arguidos a que foi aplicada a agravação.

É certo que a alínea i) do art. 24º da lei nº 15/93 dispõe: “i) O agente utilizar a colaboração, por qualquer forma, de menores ou de diminuídos psíquicos;”.

Mas nos factos apurados, quando todos os arguidos vendedores/detentores de estupefacientes foram identificados, quer pelos compradores quer pelos agentes policiais observadores e/ou elementos da investigação com apreensão e autos de buscas, não consta qualquer menor concreto (nome e idade).

No espaço de tempo entre Novembro de 2014 e Outubro de 2015 nunca foi identificado qualquer menor nem qual era a idade (até aos 16 anos).

Os factos provados no p. 45.9 em que o comprador foi identificado no dia 10.02.2015 depois de ter comprado 0,431 gr de heroína, no entanto não identificou qualquer dos vendedores nem qualquer criança (que apenas entregaria).

Igualmente no p. 43.31 são enunciados os nomes de 6 arguidos que entre Novembro de 2014 e Maio de 2015 vendiam “panfletos” de heroína ou cocaína a FF e por fim relativamente ao arguido EE quando este foi o vendedor “nalgumas vezes … era uma criança a entregar-lhe o produzo estupefaciente”.

1.1.1 Também foi dado como não provado que em 15.01.2014 e 13.01.2015 a entrega de estupefaciente e recebimento ao GG tinha por duas vezes sido efectuado por um indivíduo menor de idade do sexo masculino, cuja identidade não foi concretamente apurada.

E igualmente não ficou provado que os arguidos HH e II em 12.12.2014, que transportavam consigo haxixe para vender em vários locais de ... designadamente consumidores da Escola Profissional de ... e que nas circunstâncias do p. 47 se aprestavam à venda a consumidores designadamente alunos da sobredita escola.

Também se levanta outro problema com os factos provados quando em quase todas as circunstâncias relativas ao estupefaciente e à sua compra se diz genericamente heroína/cocaína, já que só existem relatórios de exames toxicológico relativa à quantidade de estupefaciente encontrado nas barracas, anexos, veículos e relativos aos consumidores que uma vez foram “apanhados” a sair do acampamento.

Se qualquer arguido for encontrado com uma quantidade de produto que não for objecto de exame pericial não lhe pode ser atribuído a autoria de um crime de tráfico de estupefaciente ou de consumidor.

Então como se pode dar relevância ao facto de o produto que qualquer consumidor tenha “comprado” em data não determinada, se não fôr feito qualquer relatório de exame toxicológico, juntamente com a falta de identificação do menor? 1.2 Sobre imputações genéricas não podemos deixar de chamar à colação, ainda que a agravação não seja a mesma, o acórdão do Ex.mo Conselheiro Raul Borges de 28/12/2015, proc. nº 10/13.8GAAMT.P1.S1 e citar dois dos acórdãos aqui referidos sobre este mesmo tema nos crimes de tráfico, aqui aplicável segundo nos parece.

a) “Para o acórdão de 26-10-2011, processo n° l9/05.5JELSB.S1-3ª Secção - A agravação do tráfico de estupefacientes supõe uma exasperação do grau de ilicitude já definido e delimitado na muito ampla dimensão dos tipos base — os arts. 21°, 22° e 23°do DL 15/93 — e, consequentemente, uma dimensão que, referenciada pelos elementos específicos da descrição das circunstâncias, revele um quid especifico que introduza uma medida especialmente forte do grau de ilicitude que ultrapasse consideravelmente o círculo base das descrições tipo. A forma agravada há-de ter ,assim, uma dimensão que, segundo considerações objectivas, extravase o modelo, o espaço e o grau de ilicitude própria dos tipos base.

b) No acórdão de 17/4/2013 processo nº 138/09.9LLSB.L1.S1 foi considerado O crime de tráfico de estupefaciente abarca todas as condutas previstas no artº 21º do dec.lei 15/93..

O crime de tráfico como crime de perigo abstrato ,centraliza-se na perigosidade da acção, uma vez que o perigo, não sendo elemento do tipo, se apresenta como “motivo da proibição”, sem que disso resulte qualquer violação do principio constitucional da presunção de inocência.

Nos termos do art. 24° do DL 15/93, de 22-01, a pena prevista no art. 21º é aumentada de um quarto nos seus limites mínimo e máximo, pela verificação de alguma das circunstâncias ali descritas. Não constitui um tipo autónomo, é circunscrito por circunstâncias especiais...

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