Acórdão nº 17/16.3YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelISABEL PAIS MARTINS
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I 1. AA, Juíz ..., apresentou recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 168.º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais [EMJ][1], da deliberação do plenário do Conselho Superior da Magistratura [CSM], de 20 de Outubro de 2015, que, julgando improcedente a reclamação, por si, apresentada, manteve a deliberação do conselho permanente que lhe aplicou a pena única disciplinar de advertência registada, em cúmulo de três penas autónomas de advertência, pela prática de três infracções ao dever de correcção, uma na pessoa do Sr. Juíz ... BB, outra na pessoa da Sra. Juíza ... CC e, finalmente, por conta do alargamento do objecto do procedimento disciplinar, ainda uma outra na pessoa do Sr. Juiz Presidente da Comarca de ..., Juiz DD, por factos ocorridos, respectivamente, no dia 07/09/2014, entre o dia 8 e o dia 12 de Setembro de 2014 e no dia 07/04/2015.

Alegou, no que releva destacar: «(…) «III. Da Nulidade por violação dos direitos fundamentais de audiência, de defesa e de contraditório «III.1 «36. Como se antecipou, e oportunamente se alegou na reclamação apresentada da deliberação do Conselho Permanente, foram dados como não provados pelo Sr. Juiz Instrutor (logo também por essa deliberação) todos os factos carreados para os autos pelo Sr. Juiz arguido relativamente aos três incidentes que motivaram a sua responsabilização disciplinar.

«37. Isto é, e é esta a leitura que, em substância, se faz daquela deliberação, que reproduziu o relatório final, em face de um confronto de versões, diametralmente opostas, decidiu o Sr. Instrutor (logo também o Conselho Permanente) desconsiderar a versão apresentada pela defesa.

«38. Assim aconteceu pela pretensa inexistência de prova ("total inexistência de prova", fls. 386 do p.a.) que permitisse sustentar o "defendido pelo Sr. Juiz arguido" e não por se ter entendido que, uma vez apreciada, tal prova não seria idónea a evidenciar os factos sustentados pela defesa.

«39. Escreveu-se o seguinte, a este propósito, no Relatório Final {fls. 386): "Já quanto aos factos não provados, essa convicção decorreu da inexistência de prova que, com a suficiente robustez, os permitisse ter por adquiridos, valendo, no essencial, a este propósito, as circunstâncias de; “- a total inexistência de prova quanto ao defendido pelo Sr. Juiz arguido quanto aos termos em que decorreu, quer o demais relativo ao incidente com o Dr. BB, quer o relativo ao incidente com a Sra. Dra. CC; “- a inexistência de prova quanto ao defendido pelo Sr. Juiz arguido quanto à forma como decorreu o incidente com o Sr. Dr. DD no dia 07 de Abril de 2015 (que divirja do dado como provado e que decorre do que acima se referiu), sempre se acrescentando a manifesta falta de apoio quanto à inexistência de um cumprimento prévio, pois que, não apenas o campo de visão do Dr. DD lhe teria permitido constatar esse cumprimento, como, se tal tivesse ocorrido, não teria o Sr. Juiz arguido deixado de interromper a marcha e dizer ao Sr. Juiz Presidente que já lhe tinha dado as boas tardes." «40. Em face de uma tal alegação, pronunciou-se a instância a quo (Conselho Plenário), e assim decidiu, no sentido de se tratar de uma falsa questão, resultante de uma incorrecta leitura, por parte do Juiz arguido, das palavras do Sr. Juiz instrutor.

«41. Disse-se, em síntese, a este propósito, que "dos citados trechos [precisamente aqueles que aqui se transcreveram] resulta à saciedade, a ponderação e valoração da versão dos factos apresentada pelo arguido (...), importando, desde logo, ter presente que todas as alusões realizadas ã inexistência de prova no trecho agora citado não podem, obviamente, deixar de ser contextualizadas nos exactos termos da primeira destas alusões, ou seja, de que a convicção quanto aos factos não provados decorreu da inexistência de prova que, com a suficiente robustez, os permitisse ter por adquiridos" (p. 32 e s. da deliberação recorrida).

«Continuando, disse-se ainda: «42.

"Com efeito, mostram-se claros os motivos pelos quais a versão, naturalmente, interessada, do Exmo. Sr. Juiz arguido, no tocante a tais factos considerados não provados, se mostrou insuficiente para firmar uma convicção positiva sobre a ocorrência de tais factos. (...) a versão do arguido não foi suficientemente robusta para assumir preponderância ou sequer neutralizar a convicção resultante da apreciação conjugada dos depoimentos que sobre os mesmos incidentes foram prestados, de um modo que pareceu ao Sr. Instrutor sério e isento", pelos demais intervenientes {p. 33 da deliberação ora impugnada).

«Enfim, «43. Quer com isto a instância a quo convencer que, lido o Relatório Final como um todo, se conseguirá retirar que as declarações do arguido foram, afinal!, consideradas e ponderadas, como/ enquanto meio de prova, apenas não tendo apresentado força suficiente para contrariar a convicção de responsabilidade inculcada pelos meios de prova carreados pela acusação.

«44. Claro está que, no rigor das coisas, era isto que devia ter acontecido, mas não aconteceu.

«45. Não é pelo simples facto de, no texto do Relatório, se nomear ou aludir às declarações (do arguido) que se pode assumir, sem mais e automaticamente, que o seu conteúdo, a sua substância, foi ponderada aquando da apreciação crítica da prova.

«46. Era imprescindível que do próprio texto resultassem, sem margem para dúvida, os motivos determinantes para a sua (des)consideração, bem como os justificativos da sua força probatória ou falta dela, da sua (ir)razoabilidade.

«47. Portanto todo um (verdadeiro) juízo valorativo que evidenciasse uma sua consideração além do puramente formal.

«48. Não se duvida que o Sr. Juiz Instrutor soubesse que aquelas declarações deviam ter sido apreciadas como meio de prova, assim se justificando a sua alusão, en passant, no relatório.

«49. Sucede que, como bem sabe a instância a quo, o respeito e cumprimento dos princípios e direitos aqui enunciados (da audiência, de defesa e de contraditório) não se coaduna com simples alusões ou apreciações genéricas, em jeito de clichet! «50. Não se vislumbram no Relatório Final (nem nas deliberações que o acompanharam) os tais motivos que, de modo claro, terão justificado a desconsideração da versão "naturalmente interessada do Exmo. Sr. Juiz arguido"; nem mesmo resulta qualquer "ponderação e valoração dos factos apresentada pelo arguido, por escrito e em declarações documentadas em auto " (pág.32) - menos ainda "à saciedade "!!! «51. O que se vê, isso sim, é uma ponderação unilateral dos factos carreados pela acusação, e uma apreciação crítica das motivações dos vários co-intervenientes pretensamente visados pela conduta do A.

«52. Nada mais… «53. Como se o procedimento disciplinar fosse impermeável aos argumentos da defesa.

«54. Tanto assim é que os poucos (e insignificantes) argumentos invocados para pretensamente justificar o descrédito das declarações do Sr. Juiz arguido surgem apenas agora, ex novo, na decisão impugnada, continuando, ainda assim, a assentar em puras considerações genéricas, formais, e sem substância.

«55. Porque é que a versão do Juiz arguido, é naturalmente interessada? Com base em quê se formou essa convicção? «56. Afinal, as contra-partes, enquanto visados, também tinham interesse directo na contenda; também terão estado envolvidos nos vários episódios aqui em apreço; e nem por isso as suas declarações foram tidas como interessadas e deixaram de ser valoradas! «57. Ao que se julga saber, as convicções (sobretudo as que se convertem em decisões!) são obrigatoriamente fundamentadas (seriamente fundamentadas), de modo a permitirem o contraditório, o que inequivocamente não aconteceu no procedimento disciplinar em causa nos autos, e a satisfazerem as demais exigências constitutivas da legitimidade formal e (sobretudo) material da decisão condenatória inerentes ao dever de fundamentação constitucionalmente imposto (art. 208.º-3 da CRP).

«58. O Relatório Final é um vazio no que concerne às declarações do arguido, como/ enquanto meio de prova - não explorando, nem esgrimindo as suas motivações, as suas perspectivas, as suas intenções -, limitando-se a formular, quanto a elas, puras referências ou alusões genéricas.

«59. Por fim, importa referir, em resposta à alegação da instância a quo, que nem mesmo é suficiente (para dar cumprimentos aos direitos de audiência, de defesa e de contraditório) uma motivação por excepção.

«60. Isto é: nem mesmo é suficiente uma motivação que, assentando na apreciação crítica de uns meios de prova, presuma – e conclua – que os demais, ainda que não especificamente valorados, são irrelevantes.

«61. A verdade é que a decisão do Conselho Plenário, ora impugnada, não afasta as evidências já denunciadas: as declarações prestadas pelo Sr. Juiz arguido, aqui A., nessa qualidade, não foram consideradas no processo de ponderação / valoração de prova, não tendo sido encaradas como / enquanto verdadeiro meio de prova, com violação dos direitos, constitucionalmente garantidos, de audiência, de defesa e de contraditório.

«Facto é que, «62. Apesar das referências fornais a que agora se alude, do ponto de vista do Sr. Instrutor (logo também da decisão condenatória) nenhuma prova terá sido produzida que corroborasse a matéria factual carreada para os autos pela defesa ou que contrariasse as imputações constantes das acusações.

«63. Sucede, todavia, que compulsadas todas as diligências de prova realizadas logo se percebe que não assiste razão ao Sr. Instrutor.

«64. Afinal, pelo menos o Sr. Juiz arguido prestou declarações sobre todos os pontos das acusações que lhe foram dirigidas, e bem assim sobre cada um dos pontos que compõem as suas defesas (cf. fls. 22 a 25; e 262 a 266), dando a conhecer, pela sua própria voz, a sua posição sobre os factos que lhe foram imputados nas acusações contra si formuladas e nas contestações por si apresentadas.

«65. Declarações essas que foram reduzidas a auto e juntas...

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