Acórdão nº 2118/13.0PBBRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1. No Tribunal Judicial da Comarca de ... (Instância Central — ...ª secção criminal — ...) foi julgado, em audiência de discussão e julgamento, ao abrigo do disposto no art. 472.º, do CPP, AA e, por acórdão de 17.03.2016, condenado nas seguintes penas únicas: a) no 1.º cúmulo das penas dos processos n.º 816/13.8PAVNG e n.º 379/13.4PIVNG, na pena única de 8 (oito) anos de prisão; b) no 2.º cúmulo das penas dos processos n.º 103/13.1PFBRG e n.º 2118/13.0PBBRG, na pena única de 3 (três) anos de prisão.

Foi ainda decidido que “se recolham amostras biológicas ao arguido, para inserção na base de perfis de ADN, nos termos dos arts. 8.º, n.º 2 e 18.º, n.º 3 da Lei n.º 5/2008, de 12/02, a solicitar à entidade competente, face ao número de crimes que integram o cúmulo e a respectiva natureza.” 2. Inconformado, o arguido interpôs recurso, ao abrigo do disposto nos arts. 432.º, n.º 1, al. c) e n.º 2, do Código de Processo Penal (CPP), para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído a sua motivação nos seguintes termos: «1. O recorrente não concorda com o douto acórdão proferido em 1ª instância no que respeita à integração no segundo cúmulo jurídico de pena de prisão suspensa na sua execução, à medida das penas únicas aplicadas e à não suspensão na sua execução da pena aplicada no segundo cúmulo jurídico.

  1. Conforme resulta do acórdão recorrido, no Pº 103/13.1PFBRG o recorrente foi condenado na pena de dois anos e seis meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, pena essa que se mantém suspensa na sua execução por despacho proferido a 22 de fevereiro de 2016.

  2. A pena com aplicação suspensa é um acto em potência – uma prisão em potência – que pode vir a ser, ou não, uma verdadeira pena de prisão, não podendo assim ter a mesma natureza de uma pena de prisão efectiva.

  3. A pena com aplicação suspensa é uma pena de substituição, estando a sua execução a cargo do Tribunal de Execução de Penas e com regras distintas de execução.

  4. A punição do concurso de crimes tem como efeito prático beneficiar o arguido, já que a pena do concurso é sempre inferior ao somatório das penas parcelares.

  5. A finalidade das penas é, ao lado da protecção de bens jurídicos, a reintegração do arguido na sociedade, pelo que a aplicação da pena do concurso de crimes nunca pode resultar num desfavorecimento da reintegração do arguido como seja o agravamento da punição.

  6. Entende o recorrente que o nº 3 do artigo 77º do Código Penal deve ser interpretado de forma extensiva, no sentido de significar que também constituem penas de natureza diferente as penas de prisão efectiva em confronto com as penas de prisão suspensas, uma vez que estas são formas de punição instáveis porque em constante possibilidade de transformação, interpretação essa que beneficia em concreto o recorrente.

  7. A pena de prisão suspensa na sua execução aplicada no Pº 103/13.1PFBRG poderá vir a ser declarada extinta, em face do decurso do período de suspensão sem notícias de incidentes, daqui a seis meses, não beneficiando o recorrente com o englobamento desta pena na determinação da pena conjunta. 9. Pelo exposto, deve a pena aplicada no Pº 103/13.1PFBRG ser desconsiderada para efeitos de determinação de pena conjunta.

  8. O acórdão recorrido condenou o arguido na pena de oito anos de prisão relativamente ao primeiro cúmulo, e na pena de três anos de prisão relativamente ao segundo cúmulo.

  9. À data da prática dos factos o recorrente encontrava-se desempregado e era consumidor de produtos estupefacientes, visando obter dinheiro para a compra dos mesmos, motivo pelo qual a sua visão do mundo, dos valores e princípios morais se encontrava totalmente distorcida.

  10. O consumo de estupefacientes, como é do conhecimento geral, alterava a capacidade cognitiva e de discernimento do recorrente, impedindo-o de ter noção dos seus actos e das consequências quer para ele quer para os outros.

  11. O recorrente tem dois filhos menores, os quais pretende acompanhar no seu crescimento.

  12. Apesar de se encontrar separado de facto da mulher, o recorrente tem nova companheira e recebe visitas mensais no estabelecimento prisional onde está preso.

  13. O recorrente frequenta, dentro do estabelecimento prisional, cursos de formação educativa e profissional.

  14. O recorrente está seriamente empenhado na sua recuperação, tencionando reorganizar a sua vida e trabalhar logo que cumpra a sua pena.

  15. A condenação do recorrente numa pena única de oito anos no primeiro cúmulo jurídico, e de três anos no segundo cúmulo jurídico, o que perfaz onze anos, não tem em consideração todas as circunstâncias dos factos praticados nem da personalidade do agente, bem como não visa a reintegração e reabilitação social do recorrente.

  16. Uma pena de onze anos é demasiado longa para que no fim do cumprimento da mesma ainda seja possível alcançar a reintegração e reabilitação social do recorrente.

  17. Entende o recorrente ter existido por parte do Tribunal “a quo” uma inadequada ponderação de todas as circunstâncias pessoais e de facto, quer passadas quer actuais, do recorrente, conforme estabelecido no artigo 77º do Código Penal.

  18. Pelo exposto, a decisão do douto acórdão recorrido deveria ter sido no sentido de aplicar ao recorrente, no primeiro cúmulo jurídico uma pena única de valor inferior a oito anos de prisão, e no segundo cúmulo jurídico uma pena única de valor inferior a três anos de prisão.

  19. Entendeu o acórdão recorrido não suspender na sua execução a pena aplicada no segundo cúmulo jurídico, pelos crimes cometidos nos Pº 2118/13.0PBBRG e 103/13.1PFBRG.

  20. A finalidade das penas é, ao lado da protecção de bens jurídicos, a reintegração do arguido na sociedade.

  21. A suspensão da pena de prisão é uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, é uma esperança que a socialização do arguido se consiga realizar.

  22. Tendo o acórdão recorrido condenado o recorrente, no âmbito do primeiro cúmulo jurídico, numa pena única de oito anos de prisão, entende aquele que a suspensão da execução da pena aplicada no âmbito do segundo cúmulo jurídico asseguraria a finalidade da punição, reprovação e prevenção do crime, ao mesmo tempo que asseguraria também a finalidade da reintegração do arguido na sociedade.

  23. O acórdão recorrido violou os artigos 77º e 78º do Código Penal, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que não faça concorrer, no apuramento da pena única, a pena aplicada no Pº 103/13.1PFBRG.

  24. O acórdão recorrido dever ser revogado e substituído por outro que aplique, relativamente ao primeiro cúmulo jurídico, resultante dos crimes cometidos nos Pº 816/13.8PAVNG e 379/13.4PIVNG, pena de medida inferior a oito anos de prisão, e relativamente ao segundo cúmulo jurídico pena de medida inferior a três anos de prisão.

  25. O acórdão recorrido violou o disposto no artigo 50º do Código Penal, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que suspenda na sua execução a pena de prisão aplicada no segundo cúmulo jurídico.» 3. O recurso foi admitido por despacho de 11.04.2016 (cf. fls. 424).

  26. Ao motivado e concluído pelo recorrente, o Ministério Público na Comarca de ... (Instância Central, ... Secção Criminal) respondeu e concluindo nos seguintes termos: «1 – AA, em acórdão de cúmulo jurídico de penas foi condenado nos presentes autos, na pena única de 8 (oito) anos de prisão resultante do cúmulo das penas dos processos n.º 816/13.8PAVNG e n.º 379/13.4PIVNG e na pena única de 3 (três) anos de prisão resultante do cúmulo das penas dos processos n.º 103/13.1PFBRG e nos presentes autos.

    2 - Inconformado com a decisão, veio recorrer restrito a matéria de direito, considerando: - que a pena de prisão suspensa na execução no processo 103/13.1PFBRG não deveria ter sido englobada no cúmulo jurídico efectuado nos autos, pois que a mesma não foi revogada e é uma pena de distinta natureza da pena de prisão efectiva aplicada no outro processo, pelo que o segundo cúmulo jurídico não deveria ter sido efectuado; - que mesmo que assim se não entenda, as penas únicas aplicadas pelo tribunal a quo são manifestamente exageradas, sendo que face ao teor do relatório social, a evolução da personalidade do condenado posterior à prática dos crimes, as penas únicas deveria ser situadas em medida inferior; - que perante as penas aplicadas em cada um dos cúmulos, a pena aplicada no segundo cúmulo deveria ser suspensa na sua execução porque asseguraria a finalidade da punição, reprovação e prevenção do crime ao mesmo tempo que asseguraria a finalidade de reintegração do condenado na sociedade; 3 – Com todo o respeito que nos merece a opinião contrária, comungamos do entendimento do tribunal a quo e daquilo que constitui a jurisprudência maioritária do nosso mais alto tribunal e também de 2.ª instância de que é de incluir no cúmulo jurídico de penas as penas suspensas desde que o prazo da sua suspensão ainda não tenha decorrido ou tenham sido já declaradas extintas; 4 – E na condenação de pena suspensa englobada no segundo cúmulo jurídico realizado nos autos verifica-se que ainda decorre o respectivo prazo de suspensão e cujo termo está previsto ocorrer em 6 de Setembro de 2016; 5 – Na adesão ao entendimento jurisprudencial e doutrinal maioritário, tendo presente o disposto nos artigos 77.º e 78.º do Código Penal, deles resulta que sempre que o arguido cometa diversos crimes que se encontrem em relação de concurso, deve ser condenado numa pena única, sejam todos julgados no mesmo processo ou em diversos processos, não excepcionando penas parcelares de prisão que hajam sido substituídas por outras, naquilo que vemos como motivador da previsão do cúmulo jurídico superveniente e em igualdade com aquilo que se verifica quando o arguido é julgado por todos os crimes em concurso no mesmo processo; 6 – Tendo presente as molduras abstractas de cada um dos cúmulos jurídicos de penas e aquilo que a decisão cumulatória espelha que de “benevolente” se pode apontar sempre às...

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