Acórdão nº 1560/11.6TVLSB.L1.S1-A de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Maio de 2017
Magistrado Responsável | PINTO DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 11 de Maio de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, no pleno das secções cíveis[1]: I.
AA propôs acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra BANCO BB, SA.
Pediu que a ré fosse condenada a pagar-lhe todas as prestações devidas a título de pensão de sobrevivência, subsídio de Natal e 14º mês, desde a data do falecimento de CC, previstas no Acordo Colectivo de Trabalho (ACT) para o sector bancário, bem como o subsídio de funeral.
Como fundamento, alegou que é solteira, tendo vivido em união de facto com CC, divorciado, desde Janeiro de 1995 até 00.00.2010, data da morte deste. Este, trabalhador bancário, encontrava-se reformado e auferia a respectiva pensão de reforma paga pela ré.
A ré contestou, defendendo-se por impugnação e concluindo pela improcedência da acção.
Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, reconheceu à autora a titularidade da pensão de sobrevivência por morte de CC, desde 01 de Janeiro de 2011.
Discordando desta decisão, a ré interpôs recurso de apelação, que a Relação, por maioria, julgou procedente, tendo revogado a sentença recorrida e absolvido a ré do pedido formulado pela autora.
Veio então a autora pedir revista, que foi concedida, tendo sido revogado o acórdão recorrido.
Inconformada, vem agora a ré interpor recurso para o Pleno do STJ, para uniformização de jurisprudência, nos termos dos arts. 688º e segs. do CPC, invocando como fundamento a contradição entre o Acórdão recorrido e o Acórdão deste Tribunal de 05.03.2013 (Proc. nº 2159/10.0TBFAF.G1.S1).
Concluiu assim, em síntese, as suas alegações: 1. A questão fundamental de direito nos presentes autos é a de se decidir (i) se à Autora deveria ser reconhecido, ou não, o direito a uma pensão de sobrevivência, (ii) atento a mesma Autora se encontrar em situação de união de facto com trabalhador bancário à data do falecimento deste, (iii) considerando que à Autora se aplicava um regime especial de segurança social, plasmado no Acordo Colectivo de Trabalho do BANCO BB, SA, e (iv) considerando igualmente o disposto na Lei n.º 7/2001 de 11 de Maio, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 23/2010 de 30 de Agosto.
-
O douto Acórdão fundamento começou por considerar, e bem, que a alteração introduzida pela lei n.º 23/2010 de 30 de Agosto à lei n.º 7/2001 de 11 de Maio, se aplica às situações em que o óbito do beneficiário ocorreu antes da entrada em vigor do novo regime (entendimento que, nesse ponto, é coincidente com o do douto Acórdão recorrido).
-
Contudo, entendeu-se no douto Acórdão fundamento que, na clª em análise (120ª), respeitante aos beneficiários de uma pensão de sobrevivência, não se prevê as situações dos unidos de facto, mas, tratando-se de um regime privativo de segurança social, deverá o mesmo ser aplicado em bloco, até porque mais favorável, na globalidade, do que o regime geral, não fazendo sentido complementá-lo, onde, porventura, seja, pontualmente mais desfavorável, com as regras próprias do regime geral.
-
Acrescenta-se, e bem, que a lei geral da união de facto não confere a virtualidade de, por si só, viabilizar o direito reclamado pela autora, não resultando tal entendimento numa violação do princípio constitucional da igualdade, porquanto não é a simples diferença de tratamento que a determina, mas antes e, apenas, a discriminação arbitrária, a irrazoabilidade e as distinções injustificadas, sendo certo que o regime previdencial dos trabalhadores bancários é o que resulta do respectivo ACT, que os trabalhadores subscreveram, através das suas organizações de classe representativas, sendo que, o que a CRP proíbe é a discriminação arbitrária, e não diferenças de tratamento.
-
Já o douto Acórdão recorrido entende que não se vislumbra justificação para que os unidos de facto com trabalhadores bancários a quem era aplicável o referido ACT tenham tratamento diferente, e que tal se trataria de uma discriminação arbitrária, mais referindo que o princípio da aplicação em bloco de um CCT não impede a combinação de aspectos do regime geral que se revelem mais favoráveis, pelo que, se o CCT nada disser a respeito da tutela dos unidos de facto por morte do seu parceiro, verifica-se uma lacuna de remissão na lei, a qual tem que ser integrada, reconhecendo-se nesses casos a existência de tal direito.
-
Estamos assim perante uma contradição entre dois doutos Acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação (a clª do ACT BANCO BB que regula a atribuição de pensões de sobrevivência, bem como a Lei n.º 7/2001 de 11 de Maio, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 23/2010 de 30 de Agosto), e sobre a mesma questão fundamental de direito já acima indicada (em síntese, e por análise de tais normativos, apurar se o unido de facto tem, ou não, direito ao pagamento de uma pensão de sobrevivência).
-
Com o devido respeito, decidiu-se mal no douto Acórdão Recorrido, tendo sim o douto Acórdão fundamento efectuado, no entendimento do Recorrente, a correcta aplicação do Direito à situação em análise.
-
Ora, da análise ao artigo 3º, al. e), da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 23/2010, de 30 de Agosto, verifica-se assim que, a Lei consagrou de forma expressa – e bem – que os «unidos de facto» tivessem direito a protecção social, através do regime geral de segurança social ou através de regimes especiais de segurança social.
-
Só que o direito à referida protecção social, in casu pagamento de uma pensão de sobrevivência (quer por via do regime geral ou do regime especial), apenas se efectivará caso o unido de facto sobrevivo reúna os pressupostos para a atribuição de determinado subsídio/pensão, pressupostos esses plasmados nos referidos regimes aplicáveis.
-
No caso dos presentes autos, assim como no caso do douto Acórdão fundamento, não é aplicável o regime geral, e o «regime» especial aplicável (ACT do BANCO BB) não prevê a concessão de uma pensão mensal de sobrevivência para o caso de «uniões de facto».
-
Sendo que, com o devido respeito, e é muito, pelo entendimento vertido no douto Acórdão recorrido, é contudo entendimento do Recorrente, à semelhança no douto acórdão fundamento, que o Acordo Colectivo de Trabalho em questão, que tem génese e natureza contratual, é um todo incindível, havendo que aplicá-lo em bloco, sendo que, o facto de determinado regime especial de segurança social ser pontualmente mais desfavorável do que o regime geral, nem por isso faz com que faça sentido complementá-lo com o escopo de normas que não constam do regime especial, mas do regime geral.
-
Não se pode assim manifestamente concordar com o decidido no douto Acórdão recorrido, no sentido de que o princípio da aplicação em bloco não impediria, contudo que fossem aplicados «aspectos do regime geral que se revelem mais favoráveis».
-
Nem por outro lado existe lacuna da Lei, tendo o elenco de beneficiários de pensão de sobrevivência resultado do princípio da liberdade negocial existente entre os Sindicatos e Entidades Patronais, todas subscritoras do referido Acordo. Se até à data dos factos as Partes Outorgantes não abrangeram os unidos de factos como beneficiários, foi por que não o quiseram, não estando obrigadas a fazê-lo sob pena de violação do princípio da liberdade contratual.
-
No presente caso, não oferece igualmente discussão que é aplicável um regime especial de segurança social, in casu dos Bancários, mais concretamente o ACT entre o BANCO BB, S.A. e outros e o Sindicato dos Bancários do Norte e outros (inicialmente publicado no BTE n.º 48, de 29/12/2001, bem como no BTE, N.º 4, de 29/01/2005, BTE n.º 33, de 08/09/2006, BTE n.º 3, de 22/01/2009 e BTE n.º 39, de 22.10.2011.
-
A cláusula em análise nos presentes autos é a 120.ª do supra referido Acordo Colectivo de Trabalho aplicável, sob a epígrafe «Subsídio e Pensão de Sobrevivência em caso de morte no sector bancário», sendo que a cláusula em análise no caso do douto Acórdão Fundamento era a clª 123º do mesmo Acordo Colectivo de Trabalho na versão precedente, sendo que ambos têm redacção absolutamente idêntica, apenas divergindo o número da clª em consequência das alterações/aditamentos de 2011 ao clausulado em questão.
-
Verifica-se, assim, que a referida Cláusula faz depender a atribuição da pensão de sobrevivência, dos seguintes termos: Ao cônjuge sobrevivo, no caso de o casamento durar há mais de um ano, à data do falecimento; Aos filhos, incluindo os nascituros e adoptados plenamente, até perfazerem 18 anos, ou 21 e 24 anos, enquanto frequentarem, respectivamente, o ensino médio ou superior e, sem limite de idade, os que sofrerem de incapacidade permanente e total para o trabalho.
-
O Acordo Colectivo de Trabalho em questão, que tem génese e natureza contratual, é um todo incindível, havendo que aplicá-lo em bloco, e o facto de tal regime especial de segurança social ser pontualmente mais desfavorável do que o regime geral, nem por isso faz com que faça sentido complementá-lo com o escopo de normas que não constam do regime especial, mas do regime geral, não existindo lacuna do CCT, tendo o elenco de beneficiários sido resultado do princípio da liberdade negocial existente entre todas subscritoras do referido Acordo.
-
Por outro lado, a Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 23/2010, de 30 de Agosto, não tem por si só, e sem mais, a virtualidade de, viabilizar o pedido contra o Réu de pagamento de prestações de sobrevivência.
-
Em sede de douto Acórdão recorrido, é invocado que é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade e do direito a uma segurança social universal (arts. 13.º e 63.º, ambos da CRP), a interpretação da versão originária do n.º 3 do art. 3.º da Lei n.º 7/2001, de 11-05, segundo a qual o membro sobrevivo de união de facto não poderia beneficiar da protecção por morte pelo facto de o falecido estar abrangido por um regime especial de segurança social (substitutivo do regime geral)...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO