Acórdão nº 1898/09.2JAPRT-A.P2.S1. de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2017
Magistrado Responsável | PIRES DA GRAÇA |
Data da Resolução | 24 de Maio de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Como consta do relatório do acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido em 10 de Fevereiro de 2016, no recurso penal nº 1898/09.2JAPRT.P1, provindo da Comarca de ... – Inst. Central -... Sec. Criminal- ...
“I. RELATÓRIO .1) Nestes autos foram as arguidas, (1) AA e (2) BB, condenadas, _ a primeira, pela prática, em autoria e na forma tentada, de um crime de homicídio simples, p. e p. pelos Art.os 22.°, 23.° e 131.°, n.o 1, todos do Código Penal, na pena de 5 ( cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, subordinada porém a regime de prova, mediante plano de reinserção social a elaborar pela DGRSP, o qual, uma vez homologado, fará parte integrante deste acórdão; e ainda subordinada ao dever de pagar ao assistente/demandante CC a quantia fixada a título compensatória no montante de €3.750,00 (três mil setecentos e cinquenta euros) no prazo de 2 (dois anos) a contar do trânsito em julgado deste acórdão; e _ a segunda, pela prática, em autoria e na forma tentada, por omissão, de um crime de homicídio simples, p. e p. pelos Art.os 10.°,22.°,23.° e 131.°, n.o 1, todos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, subordinada porém a regime de prova, mediante plano de reinserção social a elaborar pela DGRSP, o qual, uma vez homologado, fará parte integrante deste acórdão; e ainda subordinada ao dever de pagar ao demandante CC a quantia a título da quantia compensatória arbitrada de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros) no prazo de 2 (dois) anos a contar do trânsito em julgado deste acórdão.
Também assim, foi julgado procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo mencionado assistente CC, parcialmente procedente, por parcialmente provado e, em consequência, condenar, solidariamente, as arguidas/demandadas AA e BB, no pagamento da quantia de €5.000,00 (cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora contados à taxa legal, desde a notificação e até integral pagamento.
Não se conformando com este acórdão, recorreram do mesmo as arguidas, o Ministério Público e assistente/demandante.
[…]” Veio então, o Tribunal da Relação a proferir acórdão em 10 de Fevereiro de 2016, após conferência, na 1.º Secção Criminal, , com a seguinte decisão: “IV, DECISÃO Pelo exposto acordam os JuÍzes desta Relação em iulgar providos os recursos interpostos pelas arguidas (1) AA e (2) BB. porque procedentes os fundamentos acima apreciados, revogando-se o acórdão condenatório proferido em l.º instância, e decidindo-se, agora, absolver as mesmas .arguidas da pronúncia da prática. pela primeira. em autoria e na forma tentada, de um crime de homicídio simples. p. e p. pelos Art.os 22.°. 23.° e 131.°. n.o L todos do Código Penal. e, pela segunda, em autoria e na forma tentada. por omissão, de um crime de homicídio simples, p. e p. pelos Art.ºs 10.°,22.°,23.° e 131.°. n.o L todos do Código Penal. bem como. ainda, absolver as mesmas arguidas dos pedidos de indemnização civil deduzidos pelo assistente/demandante CC.
*** Fixa-se a taxa de justiça devida pelo assistente/demandante, que decaiu na parte criminal, com taxa de justiça em 4 UC's, e com custas no pedido de indemnização civil.
Notifique-se.” Inconformado com o acórdão, veio o Assistente CC, identificado nos autos, do mesmo interpor RECURSO EXTRAORDINÁRIO para o SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (artº 446, nº 1 e nº 2, do C.P.P.), “porquanto o Tribunal da Relação do Porto, fundamentou o Acórdão em oposição a Jurisprudência fixada por o Supremo Tribunal de Justiça), apresentando na motivação do recurso, as seguintes CONCLUSÕES: 1ª – Recorre-se do Acórdão Absolutório proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, em Recurso da Decisão da 1ª Instância, porquanto o mesmo tem como fundamentação de Direito, uma posição contrária à Jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, e nesta fase já não são os autos passíveis de Recurso Ordinário, tendo já ocorrido o trânsito em julgado.
2ª – A Questão nuclear submetida a reexame, é saber se o Acórdão recorrido contraria o AUJ de 18-06-2009, devendo, por isso, ser revogado, condenando-se as arguidas nos termos em que o foram em 1ª Instância.
3ª – Por Acórdão proferido pela 1ª Instância, em 28/05/2015, foi julgado que a conduta das arguidas, retratada nos factos provados supra descritos, era integradora da prática de um crime de homicídio na forma tentada, encontrando-se preenchido o conceito de autoria.
4ª – Por Acórdão proferido em 10/02/2016, proferido em Recurso, pelo venerando Tribunal da Relação do Porto, revoga-se o Acórdão condenatório da 1ª Instância e decide-se absolver as arguidas do crime de homicídio na forma tentada, e, consequentemente, o Pedido de Indemnização Civil.
5ª – À data dos factos, o Assistente era casado com a arguida Marta, pelo que, tendo esta tentado tirar a vida ao marido, cremos que a sua conduta merece especial censura, mesmo que se tenha em conta que à data a relação conjugal era disfuncional, tal não afasta a especial censura e perversidade, devendo ser condenada pelo crime de Homicídio qualificado, na forma tentada.
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– Na modesta opinião do Recorrente, urge Revogar/ Anular a Decisão recorrida e condenar as arguidas, nos termos já efetuados no Acórdão da 1ª Instância.
7ª – Entre estes, dois Acórdãos proferidos no âmbito destes autos, verifica-se oposição de julgamento relativamente à mesma questão de Direito, tendo ambos sido proferidos no âmbito da mesma Legislação, isto é, Código Penal, na redação atual.
8ª – Sucede que, a Decisão recorrida contraria o Acórdão de fixação de Jurisprudência proferido por este Venerando Tribunal, Secções do Plano do STJ, em 18-06-2009, in www.dgsi.pt, onde se decidiu: “É autor de um crime de homicídio na forma tentada p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 22, nº 1, 2, al. c), 23, 26, 131, todos do Código Penal, quem decidiu e planeou a morte de uma pessoa, contactando outrem para a sua concretização, que manifestou aceitar, mediante pagamento de determinada quantia, vindo em consequência o mandante a entregar-lhe parte dessa quantia e a dar-lhe indicações relacionadas com a prática do facto, na convicção e expectativa dessa efectivação, ainda que esse outro não viesse a praticar qualquer acto de execução do facto”.
9ª – Na nossa modesta opinião, deve “in casu” seguir-se a Jurisprudência obrigatória Doutamente fixada por este Venerando Tribunal.
10ª – Condenando-se as arguidas pelo crime que estavam pronunciadas e no pagamento do Pedido de Indemnização Civil, tal como consta do Acórdão da 1ª Instância, com o qual concordamos.
11ª – De salientar, que a Decisão recorrida diverge, sem contudo fundamentar convenientemente essa sua divergência, apenas alegando tratar-se de uma “reflexão inovatória”, não estando na nossa modesta opinião, preenchido o artº 445, nº 3, do C.P.P., devendo, pois, e desde logo, declarar-se o Acórdão recorrido nulo, por falta de fundamentação.
12ª – A questão a resolver é se a conduta das arguidas referidas em ambos os Acórdãos preenchem o conceito de autoria, na nossa modesta opinião, a resposta terá de ser necessariamente afirmativa.
13ª – No caso dos autos, a arguida AA, “encomendou” um crime (a morte do Assistente, à data seu genro), “encomenda” essa que era idónea a provocar o resultado (morte do Assistente), esta confiou nos meios e nos contactos por si estabelecidos (contratados), bem como planeou o “modus operandi” e disponibilizou dinheiro (sendo entregue aos contratados) para a realização da sua “encomenda” (morte do Assistente), pelo que, estes atos, integram o conceito de autoria mediata de acordo com o previsto no artº 26, do C.P.
14ª – Assim, a arguida AA encomendou a morte do seu genro (Assistente), contratou terceiros para executar o crime, planeou, acordou em pagar o preço previamente estabelecido para a realização do “serviço”, entregou parte do preço, os contratados receberam o preço, a arguida foi fornecendo informações para a prática do facto, convenceu-se que o facto seria praticado pelos executores e a aguardar a sua execução definitiva (morte do Assistente). A arguida “ab initio” ficou convencida que o “trabalho” seria executado, tendo por tal facto pago parte do preço.
15ª – Tal como consta da matéria de facto provada e quanto à arguida AA, esta formulou o plano de matar o Assistente (seu genro), e nessa sequência contratou DD, que lhe transmitiu que o iria fazer ou alguém a seu mando, ficou esta convencida que os contratados levariam a cabo a tarefa incumbida de pôr termo à vida do Assistente, tendo-lhe entregue, a título de pagamento do “serviço”, quantias em dinheiro e ouro.
16ª – Consta ainda da matéria de facto provada que a arguida Rosa forneceu aos contratados pormenores identificativos da pessoa que teriam de eliminar, agindo sempre com plena intenção de causar a morte do Assistente.
17ª – A morte do Assistente só não ocorreu, por circunstâncias alheias à vontade das arguidas – prisão desta.
18ª – A arguida BB, tinha os deveres de respeito, fidelidade e assistência para com o seu marido (Assistente), pois era sua mulher e vivia em comunhão de mesa e habitação.
19ª – Como resulta da matéria provada, a arguida BB tomou conhecimento do propósito da mãe (arguida AA) de tirar a vida ao Assistente, seu marido, bem como dos contactos que efetuara com os contratados, e nada fez, absteve-se de avisar o marido ou as Autoridades Policiais, do propósito da arguida AA, pôr termo á vida daquele e das diligências já efetuadas para executar o plano criminoso.
20ª – Reforça-se que, atento o desenvolvimento da comunidade atual e o proliferar do “crime por encomenda”, não pode, ao contrário da Decisão recorrida, haver complacência na análise deste fenómeno, quando o que está em causa é o bem supremo a Vida Humana.
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– A conduta das arguidas, e tal como resulta da factualidade provada, era idónea a produzir o...
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