Acórdão nº 806/12.8TBVCT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução25 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA intentou no dia 13-3-2012 ação declarativa com processo comum contra BB - Mútua de Seguros e contra BB - Mútua de Seguros Sucursal em Portugal pedindo (a) a condenação solidária das rés no pagamento da indemnização global líquida de 88.873,24€, acrescida de juros de mora vincendos, contados à taxa legal de 4% ao ano desde a citação até efetivo pagamento e (b) a indemnização ilíquida que, por força dos factos alegados nos artigos 164.º a 177.º da petição inicial, vier a ser fixada em decisão ulterior (artigo 564.º/2 do Código Civil) ou vier a ser liquidada em execução de sentença (artigo 661.º/2 e 805.º - atual artigo 378.º/2 do CPC).

  1. Os danos emergem de acidente de viação ocorrido em Espanha no dia 6-4-2009 entre o veículo auto pesado de mercadorias, de matrícula portuguesa, e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula espanhola que invadiu a faixa de rodagem em que circulava o pesado.

  2. O condutor do pesado, que contava à data do acidente 45 anos de idade, reclamou 20.000€ a título de danos não patrimoniais considerando os ferimentos sofridos, a sua gravidade e o tempo de recuperação dos mesmos; considerando um vencimento mensal de 1.1000€ e o tempo de incapacidade temporária absoluta para o trabalho entre 6-4-2009 e 16-3-2010 e ainda os trabalhos que efetuava em terrenos que amanhava para consumo próprio de onde obtinha um rendimento nunca inferior a 250€/mês, o autor deixou de receber 17.409,34€ (12.100€, produto de 1100€ x 11meses, + 367€, produto de 1100€ x 10 dias, + 2108,34€, proporcional dos subsídios de férias e de Natal, + 2834€, produto de 250€ x 11 meses e 10 dias correspondente ao rendimento do agricultor).

  3. Alegou o autor que nunca mais vai poder exercer as suas funções de motorista e de agricultor, que vai continuar a ser medicado com analgésicos até ao fim da vida, que das lesões lhe adveio uma IPP de 8,92‰; assim, considerando um período laboral de 30 anos (dos 45 aos 75 anos) a indemnização por danos futuros, deve contabilizar-se em 50.000€.

  4. Reclama ainda 375€ de despesas várias e 1088,90€ com a perda de objetos de uso pessoal.

  5. O pedido ilíquido deduzido tem em vista as despesas médicas e sessões de fisioterapia a realizar.

  6. As rés, na contestação, para além de impugnarem o montante pedido a título de indemnização, sustentaram a falta de personalidade judiciária da 2ª ré considerando que os factos alegados pelo autor não têm nenhuma relação com a 2ª ré, enquanto sucursal da 1ª ré, dispondo sobre esta matéria o artigo 7.º/1 do CPC que as sucursais, agências, filiais ou delegações podem demandar ou ser demandadas quando a ação proceda de facto por elas praticado, não existindo no caso nenhuma relação entre os factos alegados e a demandada sucursal.

  7. O A. sustentou que a seguradora responde em consequência do contrato de seguro titulado pela apólice n.º 30..., respondendo igualmente a sucursal por ser, como correspondente, representante da seguradora em Portugal, tendo sido com ela que o autor estabeleceu contactos e tendo ela assumido a responsabilidade pelas consequências danosas emergentes do acidente; sustentou ainda que, caso o segurador tenha correspondente em Portugal, constitui-se este em verdadeiro responsável pelo pagamento da indemnização aos lesados como resulta do Despacho Normativo n.º 20/78, de 24 de janeiro, que prescreve no n.º 3 que " no caso de a companhia inscrita no gabinete emissor do certificado ter em Portugal um 'correspondente', ao abrigo do artigo 4º da Convenção Tipo Intergabinetes, a Secção da Carta Verde abandonará a instrução do processo e a liquidação dos sinistros ao referido 'correspondente'".

  8. A exceção foi julgada improcedente na 1ª instância por se entender que a responsabilidade da ré advém do disposto no artigo 7.º/2 do CPC na medida em que está em causa uma obrigação indemnizatória ou de ressarcimento contraída junto de um cidadão português.

  9. A ação foi julgada parcialmente procedente condenando-se as rés no pagamento à autora de 38.257,13€ a título de danos patrimoniais e 10.000,00€ a título de danos não patrimoniais com juros desde a citação até integral pagamento no que respeita a danos patrimoniais e desde a data da sentença até integral pagamento no que respeita a danos não patrimoniais.

  10. O referido montante de 38.257,13€ resulta do somatório da quantia de 5.797,32€ (resultado da diferença entre a quantia que o autor não recebeu de vencimento e subsídios, considerando o valor anual de vencimento de 13.853,98€ e o valor diário de 37,95€ e 345 dias de incapacidade para o exercício da profissão, e a quantia de 7.295,43€ que lhe foi paga pela seguradora a título de adiantamento) com a quantia 750,00€ de despesas de vestuário inutilizado no acidente e outros gastos e ainda com a quantia de 31.701,98€ (resultado da diferença entre 35.000,00€, valor equitativo de perda de capacidade aquisitiva pela incapacidade permanente de 6 pontos que o passou a afetar tendo em vista esperança de vida entre 75/80 anos deduzidos quantias recebidas no âmbito do processo laboral de 2.632,67€ e 657,52€).

  11. O A. defendeu, na apelação, que a indemnização por danos futuros deve ser aumentada para 50.000€ e que o valor de indemnização a título de danos morais deve ser aumentado para 20.000,00€ 13.

    Por sua vez as rés, na apelação, defendem que a personalidade judiciária conferida às sucursais se destina a assegurar a representação da sociedade cuja sede é domiciliada no estrangeiro só que, no caso vertente, a ação foi intentada desde o início contra a própria sociedade pelo que a sociedade não pode estar em juízo por si própria e simultaneamente através do seu representante, não tendo o autor querido, quando optou por demandar a sociedade, prevalecer-se da faculdade que a lei lhe conferia de demandar a sucursal, impondo-se, assim, a absolvição da instância da 2ª ré, sucursal da 1º ré.

  12. No que respeita aos danos as rés defendem que dos recibos de vencimento do autor resulta que a sua retribuição bruta era de 13.433,88€ sendo, líquida de descontos para IRS e segurança social de 11.884,99€; a retribuição mensal líquida por 14 meses era de 849,93€; impugnam igualmente a matéria de facto considerando que o autor sofreu uma ITA (incapacidade temporária absoluta) de 250 dias e uma ITP (incapacidade temporária parcial) de 50% durante 30 dias, de 35% durante 26 dias e de 40% durante 39 dias. As suas perdas salariais são de 9.478,14€ a que importa deduzir 7295,43€, sendo, assim, devida apenas a indemnização de 2.182,71€ a que se impõe reduzir as verbas recebidas a título de subsídio de férias e remuneração de férias pelo que o valor de indemnização a considerar é de 1138,71€.

  13. Quanto ao valor a atribuir pela perda de capacidade aquisitiva, considerada a retribuição anual líquida e a incapacidade de 6 pontos, o valor a atribuir é de 13.535,19€ atenta uma taxa de capitalização de 3% e, por isso, deduzido o já recebido, o valor indemnizatório deve ser fixado em 10.245,00€, considerando as rés, no recurso subordinado que interpuseram para o STJ, que esse valor devia ser fixado em 12.000,00€.

  14. No que respeita a danos morais deve este ser reduzido para 7.000,00€, pretensão que reafirmaram no recurso subordinado interposto para o STJ.

  15. O Tribunal da Relação julgou procedente a exceção dilatória de falta do pressuposto da personalidade judiciária e de legitimidade da 2ª ré que absolveu da instância; julgou parcialmente procedente a apelação dos RR no que respeita ao valor de indemnização por danos patrimoniais, condenando a 1ª autora a pagar a quantia de 18.598,52€ somatório de 1.138,71€ de perdas patrimoniais com 16.709,81€ de perda de capacidade aquisitiva e com os 750€ de despesas, mantendo-se a condenação de 10.000,00€ a título de danos não patrimoniais e o demais decidido.

  16. O autor interpôs recurso de revista finalizando a minuta de recurso com as seguintes conclusões: Vem o presente recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação na parte em que pelo mesmo se determinou, além do mais, a revogação da sentença de primeira instância e julgamento dos recursos interpostos nos seguintes aspetos: a) procedência da exceção dilatória de falta de pressuposto de personalidade judiciária e legitimidade da 2ª ré, com a consequência absolvição da instância da mesma; b) improcedência total da apelação deduzida pelo Autor, ora recorrente; c) procedência parcial do recurso interposto pelas RR. no que concerne o valor da indemnização por danos patrimoniais a pagar ao A., reduzindo a mesma do valor originalmente fixado de 38.257,13€ para 18.598,52€;

    1. Das exceções dilatórias Entendeu o Tribunal da Relação, quanto a esta matéria, que assiste razão às recorrentes quando as mesmas defendem que não podia o Autor ter demandado, simultaneamente, a lª Ré, sociedade mãe do grupo AMA, e a 2ã ré, sucursal em território português do referido grupo e pessoa coletiva.

      Entendendo que a ação em apreço nos autos já havia sido intentada, originalmente, contra a sociedade, e estando esta representada devidamente por advogado, não podia esta ré estar em juízo "por si própria e, simultaneamente, através do seu representante", aqui entendido como sendo a sucursal 2ª ré.

      Toma assim o Tribunal recorrido a posição de que o disposto no art. 7º, n.

      º 2 do CPC se configura como uma opção que o Autor tem de tomar quanto à demanda da sociedade propriamente dita ou da sucursal sua representante, em regime estrito de alternativa de legitimidade passiva.

      Nesta interpretação, o Autor teria de escolher demandar ou uma (a sociedade) ou outra (a sucursal), mas nunca as duas em simultâneo, designadamente porque seria "incompatível o prosseguimento da ação contra a devedora e a entidade que dela é mera representante." Defende o Tribunal no acórdão recorrido que a mera "circunstância de a ação ter sido intentada contra a própria sociedade (...) impede que seja reconhecida personalidade judiciária e legitimidade à sua sucursal, por se tratar de uma a mesma pessoa...

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