Acórdão nº 2377/12.6TBABF.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Dezembro de 2017
Magistrado Responsável | FERNANDA ISABEL PEREIRA |
Data da Resolução | 20 de Dezembro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório: AA, Lda., intentou, em 6 de Novembro de 2012, a presente acção declarativa, na forma de processo comum, contra BB, CC e mulher DD, EE e mulher FF, formulando os seguintes pedidos: a) Ser declarada a nulidade, por simulação, do contrato-promessa celebrado entre os réus, datado de 30-04-2004, relativo ao prédio urbano destinado a habitação que aí identificou, sito em …, concelho de Albufeira e descrito na respectiva Conservatória do Registo Predial sob o n.º 02…6; b) Ser decretado o cancelamento das inscrições efectuadas ou que, no futuro, o venham a ser, a favor do réu BB; c) Ser o réu BB condenado a pagar-lhe uma indemnização, no valor de € 4.926,15, a título de danos patrimoniais em consequência dos prejuízos causados no referido imóvel, com excepção dos identificados no artigo 91.º da petição inicial; d) Ser o réu BB condenado a pagar-lhe uma indemnização a título de danos patrimoniais a liquidar em execução de sentença, correspondente ao montante necessário para ressarcimento do prejuízo decorrente da reparação do tecto da sala de estar a que se refere o artigo 91.º da petição inicial; e) Ser o réu BB condenado a pagar-lhe juros de mora, à taxa legal, sobre as importâncias referidas nas alíneas c) e d), a partir da citação e até efectivo e integral pagamento.
Para alicerçar as suas pretensões, alegou, em suma, ter corrido termos contra os 3.ºs réus, EE e mulher FF, uma acção executiva intentada por GG, no âmbito da qual foi penhorado o direito daqueles sobre o prédio urbano descrito sob o n.º 02…6 na Conservatória do Registo Predial de Albufeira, sito em Vale da …, lote A15, …, freguesia e concelho de Albufeira, tendo, na sequência de negociações encetadas com a aí exequente, acordado que, em pagamento da quantia exequenda, transmitiriam para a aqui autora AA, Lda., a propriedade do referido prédio, livre de ónus ou encargos, o que veio a concretizar-se por escritura pública celebrada em 24-07-2007, na qual os 3ºs réus outorgaram também como procuradores dos 2.ºs réus, CC e mulher DD, desistindo, em contrapartida, a exequente da execução.
A partir dessa data a autora ficou investida na posse do referido prédio, com a entrega das chaves, e passou a praticar, ininterruptamente, tal como os antepossuidores o vinham fazendo há mais de vinte anos, todos os actos inerentes à posse, tendo registado a transmissão a seu favor no dia 27-07-2007.
Mais alegou ter vindo a apurar que alguns dias antes da celebração da aludida escritura o 1.º réu, BB, intentara uma acção, registada em 06-07-2007, com vista à execução específica de um contrato-promessa de compra e venda, alegadamente celebrado em 30-04-2004, na qual foi declarado transferido para o aí autor, BB, o direito de propriedade sobre o imóvel, sendo, porém, tal contrato-promessa nulo por simulação, já que os réus se conluiaram com o intuito de prejudicar a autora.
Para fundamentar os restantes pedidos, alegou, em suma, que, em 12-07-2012, o 1.º réu ocupou o imóvel em causa, substituiu a respectiva fechadura e iniciou aí obras, causando estragos no mesmo, estando, portanto, obrigado a ressarcir a autora desses danos em montante equivalente ao da sua reparação.
Apenas o 1.º réu, BB, apresentou contestação, na qual se defendeu por excepção e por impugnação, invocando a ilegitimidade da autora, a ineptidão da petição por contradição entre o pedido e a causa de pedir e negando que a autora desconhecesse, aquando da celebração da escritura pública de compra e venda, a acção destinada a obter a execução específica do contrato-promessa que já se mostrava nessa data registada.
Replicou a autora, pugnando pela improcedência das excepções e mantendo o já alegado.
Realizada audiência prévia, na qual a autora foi convidada a aperfeiçoar a petição por forma a concretizar a vontade real dos outorgantes no contrato-promessa que pretende ver declarado nulo por simulação, convite a que acedeu, foram julgadas improcedentes as excepções dilatórias de ilegitimidade processual da autora e de ineptidão da petição inicial.
Procedeu-se à audiência de julgamento, assegurando-se no seu decurso o contraditório relativamente à possibilidade de o Tribunal conhecer da excepção de caso julgado em face do decidido, com trânsito em julgado, na referida acção (processo n.º 1631/07.3TBLLE), vindo a ser proferida sentença, em 12-02-2015, na qual: a) Foi declarada a excepção dilatória de caso julgado relativamente ao pedido formulado pela autora sob a alínea a); e b) Foram julgados improcedentes os restantes pedidos, deduzidos sob as alíneas b) a e), deles se absolvendo os réus.
Inconformada com o assim decidido, apelou a autora, tendo o Tribunal da Relação de …, por acórdão de 26-01-2017, julgado improcedente o recurso e confirmado a sentença impugnada.
Novamente inconformada, interpôs a autora recurso de revista excepcional, que foi admitido com fundamento na previsão contida na alínea a) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil.
Na respectiva alegação aduziu, no que agora releva, as seguintes conclusões (sic): «13. Nas suas alegações perante o Tribunal Recorrido, a aqui Recorrente alegou na sua petição inicial outros factos - para além dos que foram considerados provados e não provados na sentença de 1ª instância -nomeadamente os constantes dos art°s 32° a 66° da p.i (para além de outros posteriormente classificados como 62-A a 62-F) e respectivos documentos, para demonstração da simulação do contrato-promessa em causa.
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Esses factos, aliás, praticamente todos suportados por documentos não impugnados, constituíam parte do núcleo essencial da causa de pedir formulada nos presentes autos (declaração de simulação do referido contrato-promessa).
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Na decisão de 1a instância, na indicação dos factos considerados provados e não provados, não foi efectuada qualquer referência aos referidos outros factos e documentos.
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Relativamente a esta questão, o acórdão recorrido considerou (cfr. parte final da pág. lie início da pág.12; parte final da pág. 12 e início da pág. 13) que o facto da sentença de 1a instância não ter feito qualquer referência aos factos referidos pelo Recorrente na sua alegação de recurso não gera nulidade mas antes a sua anulação.
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Sucede que a Recorrente, invocara expressamente nas suas alegações de recurso que se procedesse "à alteração e/ou anulação da decisão do Tribunal recorrido sobre a matéria de facto supra indicada" (cfr. conclusão n° 54 das suas alegações de recurso).
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Razão pela qual, não se pode aceitar que o acórdão recorrido apenas tenha anunciado, sem mais, a possibilidade de anulação da decisão sem de facto ter optado, consequentemente, por efectivamente declarar tal decisão de anulação.
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Ao assim proceder, não decidindo pela anulação da decisão conforme requerido nas alegações de recurso da Recorrente, incorreu em nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto na alínea d). n° 1. do artigo 615° do CPC.
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Por outro lado, relativamente à mesma questão, o mesmo acórdão considerou que o que origina a nulidade é o facto de o Tribunal não responder aos pedidos deduzidos e também o facto de não apreciar causas de pedir invocadas (cfr. parte final pág. lie início pág. 12; parte final pág. 12 e início pág. 13).
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Ora, os factos cuja omissão de pronúncia se reclamou eram factos correspondentes à prova da invocada simulação do contrato-promessa em causa nos autos, isto é, factos justamente referentes à causa de pedir invocada pela Recorrente na sua petição.
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Por isso que, o acórdão recorrido, ao considerar que o que origina nulidade é o facto de o Tribunal não responder aos pedidos deduzidos e não apreciar causas de pedir invocadas, quando o que estava cm causa no recurso era justamente o facto de o Tribunal não ter apreciado a causa de pedir invocada como fundamento de invalidade do contrato-promessa em causa, incorreu em nulidade, por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do disposto na alínea c). n° 1. do artigo 615° do CPC.
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Confirmou o acórdão recorrido a sentença de 1ª instância que considerou verificada a excepção dilatória de caso julgado relativamente ao pedido formulado sob a alínea a), a ris. 22 (no qual se solicitou que fosse decretada a nulidade, por simulação, do contra to-promessa de compra e venda, "na dimensão da autoridade de caso julgado" (cfr. pág. 91 da douta sentença de Ia instância).
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Quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade de caso julgado (…) comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão anterior: (Quem o escreve é MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, in Objecto da Sentença e Caso Julgado Material, publicado no BMJ n° 325, pág. 49 ss.).
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Ora, nos presentes autos, não se vislumbra que se corra qualquer risco de repetição do conteúdo da decisão anterior, nem qualquer contradição com o conteúdo da decisão anterior, designadamente em face da notória não coincidência simultânea de sujeitos, causa de pedir e pedido, mas sobretudo porque o objecto de cada uma das acções é diferente num e noutro processo.
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Na verdade, a questão da simulação do contrato promessa (causa de pedir nos presentes autos) nunca foi abordada, nem fazia parte da causa de pedir do processo anterior - por isso não há coexistência da relação material subjacente aos presentes autos com aqueloutra do processo anterior.
Por outro lado, 27. A regra geral aplicável à eficácia subjectiva do caso julgado é a de que este só produz efeitos em relação às partes: só relativamente às partes que intenderam ou tiveram possibilidade de intervir no processo. para defender os seus interesses e para alegarem e provarem os factos informativos do seu direito.
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