Acórdão nº 1452/13.4TBAMT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelCABRAL TAVARES
Data da Resolução05 de Dezembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, na 1ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA instaurou a presente acção declarativa, pedindo a condenação de (i) BB, (ii) CC, Lda.

e (iii) o Fundo de Garantia Automóvel (FGA), a pagarem-lhe a quantia de EUR 239.556, acrescida de quantias que se vierem a liquidar, por danos decorrentes de acidente de viação, bem como de juros vencidos e vincendos.

Alegou ter o acidente ocorrido no dia 19 de Abril de 2011, quando o veículo conduzido pelo 1º R., matrícula ...-DT-..., sem seguro válido, saiu de um caminho particular, tendo virado à esquerda e invadido a via de trânsito, indo embater no motociclo, matrícula ...-IU-..., sua pertença e por si conduzido, que aí circulava.

O 3º R. contestou, impugnando toda a matéria e invocando que o acidente dos autos foi também acidente de trabalho, relativamente ao qual o A. foi ressarcido pela respetiva companhia de seguros, pelo que não pode o FGA responder pelos danos alegados.

Os 1º e 2º RR. contestaram, impugnando a dinâmica do acidente, alegando que o Autor seguia em contra-mão e que o embate ocorreu na via de trânsito relativa ao sentido oposto aquele em que o Autor seguia; ainda que assim não fosse, o 1.º R. provinha de uma via equiparada a via pública e apresentava-se pela direita, pelo que o Autor sempre teria que lhe ceder passagem, o que não fez, tendo o acidente ocorrido por culpa exclusiva do Autor.

Proferida, a final, sentença, julgando a ação parcialmente procedente e condenando os RR. a pagarem ao A. as seguintes quantias: «a. €24.220,42 (vinte e quatro mil, duzentos e vinte euros e quarenta e dois cêntimos), já deduzida das importâncias pagas a título de indemnização em sede de acidente de trabalho, acrescida de juros de mora contados à taxa legal supletiva de 4 % ao ano (Portaria nº 291/2003, de 08 de Abril, em vigor desde 01 de Maio de 2003), contados desde 3 de Setembro de 2013; b. €15.996 (quinze mil, novecentos e noventa e seis euros), acrescida de juros de mora contados à taxa legal supletiva de 4 % ao ano (Portaria nº 291/2003, de 08 de Abril, em vigor desde 01 de Maio de 2003), contados desde 3 de Setembro de 2013; c. €17.500 (dezassete mil e quinhentos euros), acrescidos de €35.000 (trinta e cinco mil euros), acrescidos de € 200 (duzentos euros) e de €300 (trezentos euros), acrescidas de juros de mora contados à taxa legal supletiva de 4 % ao ano (Portaria nº 291/2003, de 08 de Abril, em vigor desde 01 de Maio de 2003), contados desde esta decisão e até efectivo e integral pagamento».

  1. Apelaram os RR., além de arguirem nulidades da sentença, impugnando a matéria de facto e os montantes indemnizatórios arbitrados.

    A Relação julgou parcialmente procedentes os recursos e fixou as indemnizações, a serem solidariamente pagas pelos RR., nos seguintes termos: «1. A título de dano biológico a quantia de EUR 12.000,00 (doze mil euros).

  2. a) Relega-se para ulterior liquidação o dano resultante da perda do abono de viagem em motociclo no valor de EUR 365,51 por mês.

    1. Relega-se para ulterior liquidação o dano resultante de perdas salariais durante o período de incapacidade para o trabalho até ao limite do pedido (EUR 15.996,00).

    A estas quantias será deduzida a indemnização já recebida pelo Autor a título de acidente de trabalho, mencionadas no facto provado n.º 72.

  3. A título de danos não patrimoniais, a quantia de EUR 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros).

  4. Revoga-se a sentença na parte em que atribuiu a verba de EUR 300,00 (trezentos euros) a título de pagamento de despesas relativas à contratação de uma terceira pessoa.

  5. Quanto ao resto mantém-se a sentença.

    (…)» 3. O A., bem como os 1º e 2º RR., pedem, agora, revista.

    3.1. Conclui o A. nas suas alegações de recurso: «1.ª – A Incapacidade Permanente Geral de que o recorrente ficou a padecer (6 pontos), sendo fortemente limitativa do exercício da sua atividade profissional, na qual exige esforços acrescidos, mas não implicando perda de rendimentos, deverá ser indemnizada como dano biológico, de natureza extra-patrimonial; 2.ª – Apesar disso, tal indemnização deverá, tal como tem sido entendimento dominante na jurisprudência dos nosso Tribunais, representar um capital que, em abstrato, proporcione a reposição da perda de potencial de ganho do lesado; 3.ª – Ultimamente, tem-se entendido – e bem – que o lesado precisa de manter o nível de rendimento enquanto viver, mesmo para além da idade da reforma; 4.ª – É, com efeito, depois do final da vida ativa que o lesado mais necessidades tem e mais precisa de manter um nível de rendimentos que lhe permita satisfazer essas suas necessidades suplementares; 5.ª – Será adequado, na esteira do que tem sido decidido pelo nossos Tribunais Superiores, que, em casos como o presente, se recorra, como auxiliar de cálculo da indemnização pelo dano material emergente da IPG, à fórmula de cálculo utilizada no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 04/04/1995 – CJ – Ano XX – Tomo II; 6.ª – Esta fórmula, na verdade, tem em conta vários fatores relevantes, tais como a progressão na carreira, a erosão monetária, e o crescimento dos rendimentos salariais; 7.ª – Os valores assim encontrados deverão, depois, ser temperados à luz das circunstâncias concretas de cada caso e da equidade; 8.ª – Através da mencionada fórmula, considerando o salário auferido pelo recorrente, de € 2.193,32, que tinha 49 anos à data do acidente, a incapacidade permanente parcial de 6 pontos, e o período de vida até aos 85 anos e a progressiva baixa da taxa de juro (neste momento e face à realidade atual, inferior a 2%) encontramos um capital de aproximadamente € 47.000,00; 9.ª – Haverá, porém, que levar em conta que é previsível as sequelas de que padece o recorrente se agravem com o decorrer dos tempos; 10.ª – Afigura-se-nos, pois, que será justo e equilibrado, temperar o valor encontrado por aplicação da citada fórmula matemática e atribuir ao recorrente, como compensação pelo dano biológico inerente à IPG de 6 pontos que o afeta dano extrapatrimonial) a indemnização de € 50.000,00; 11.ª – Quanto ao valor fixado para ressarcimento dos danos não patrimoniais (€ 12,500,00) entendemos que o mesmo é manifestamente exíguo, atendendo à gravidade dos danos que o recorrente padeceu e às suas sequelas permanentes; 12.ª – Deve, neste particular, atender-se às consequências físicas e morais que para o recorrente resultaram do acidente, sendo aqui manifestamente relevante que tinha apenas 49 anos à data do evento, ao elevado grau do quantum doloris e à previsibilidade de agravamento sequelar; 13.ª – Recorrendo, pois e uma vez mais, à equidade e tendo em consideração as concretas circunstâncias do caso em apreço, temos que a justa e equilibrada indemnização, adequada a compensar os danos não patrimoniais sofridos, deverá corresponder ao montante de € 40.000,00; 16.ª – O douto acórdão recorrido violou, entre outras normas, os artºs 483.º, 496.º, n.º 1, 562.º, 564.º e 566.º, todos do Código Civil.» 3.2. Os 2º e 3º RR. concluem do seguinte modo: «

    1. O tribunal a quo afastou a presunção de culpa resultante da aplicação do disposto no n.º 3 do art.º 503.º do Código Civil, na sequência do sustentado pelos réus no recurso que interpuseram da decisão proferida pela primeira instância, pelo que a responsabilidade pelo acidente passou a ter de ser apurada com base na culpa efetiva, recaindo sobre o autor o ónus da prova dos factos integradores do seu pretenso direito.

    2. De acordo com o disposto no artigo 487.º n.º 1 do Código Civil, a prova da culpa do lesante na produção do evento danoso incumbe ao lesado.

    3. No caso em apreço, e relativamente à dinâmica da eclosão do sinistro resultou provado que: (a) no local onde ocorreu a colisão entre o motociclo conduzido pelo Autor e o veículo automóvel conduzido pelo 1.º Réu, a faixa de rodagem tem uma largura de 7,10 metros – cfr. alínea 10) dos factos dados como provados; (b) sendo assim, possível fixar o eixo da faixa de rodagem nos 3,55 metros; (c) contudo, o embate deu-se a 2,20m da berma esquerda e a 4,90 metros da berma direita atendendo ao sentido de marcha do motociclo conduzido pelo autor - cfr. alínea 17) dos factos dados como provados - pelo que é forçoso concluir, que o embate se deu em manifesta contramão daquele que era o sentido de marcha empreendido pelo autor.

    4. O acidente deveu-se única e exclusivamente à violação, por parte do autor, das regras do Código da Estrada que o obrigavam à circulação pela metade direita da faixa de rodagem, designadamente do disposto no n.º 1 do art.º 13.º daquele diploma.

    5. Não houve qualquer concurso de risco do veículo conduzido pelo réu BB, que seguia numa correta linha de marcha, ocupando a sua metade direita da faixa de rodagem, o mesmo não sucedendo com o autor que, no momento do embate seguia em manifesta contramão.

    6. O tribunal a quo sustenta uma tese, quanto à dinâmica do acidente, que não tem qualquer suporte na matéria de facto dada como provada.

    7. Nenhum facto dado como provado permite concluir que o autor se tenha desviado da sua trajetória instantes antes do embate e muito menos que o tenha feito por um qualquer motivo alheio à sua vontade.

    8. No que tange à dinâmica do acidente o tribunal a quo apenas podia cingir-se aos factos dados como provados e daí ter extraído as consequências jurídicas, mas aquilo que fez, foi ir mais longe do que os próprios factos o permitem, pois adiantou hipóteses pretensamente justificativas da colisão que os factos provados nem sequer abordam.

    9. Numa via com uma largura de 7,10m e atendendo ao local onde se deu o embate e onde ficaram depositados os plásticos daí resultantes [a 4,90 m da berma] – cfr. factos dados como provados sob os n.ºs 10 e 17 – e não tendo sido dados como provados quaisquer factos relativos aos motivos pelos quais o autor não pôde voluntariamente prosseguir a marcha na sua via de trânsito que estava livre e desimpedida – cabia-lhe fazer a prova de que o embate na sua contramão não resulta de culpa sua. Prova essa que o autor não logrou...

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