Acórdão nº 4363/04.0TBSTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução07 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA instaurou, em 29/11/2004, acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra BB, formulando os pedidos de condenação do R. a reconhecer: a) Que a mãe da A., CC, é pessoa incapaz de reger o seu património, pois sofre de atraso mental e de enfermidade psíquica congénita; b) Que seja declarada nula e de nenhum efeito, face à incapacidade da mandante CC para entender o sentido e o alcance do acto praticado, a procuração que outorgou em 21 de Maio de 1998 no 2º Cartório Notarial de ..., pela qual constituiu procurador o R., bem como qualquer acto de disposição patrimonial que tenha sido outorgado com base na referida procuração ou em qualquer outra outorgada pela mãe da A., ordenando-se o cancelamento de quaisquer registos eventualmente realizados com base nela, tudo com as legais consequências.

Alega para tanto, em síntese, que a sua mãe, CC, que foi declarada inabilitada e de quem foi nomeada curadora, sofre de anomalia psíquica notória que a incapacita de reger o seu património, o que já sucedia em Maio de 1998, data em que outorgou uma procuração irrevogável a favor do R., através da qual lhe concedeu poderes para vender, por qualquer preço e condições, todos os imóveis de que era proprietária, tendo o R., com base nessa procuração, adquirido por compra e venda todos os aludidos imóveis, por preço bastante inferior ao seu valor real.

Contestou o R., que apresentou defesa por excepção, em que invoca a ineptidão da petição inicial, e por impugnação, aduzindo que a mãe da A., apesar de iletrada, entendeu perfeitamente o conteúdo e alcance das procurações que outorgou, quer a favor dele, quer da filha DD, e que a procuração que emitiu a seu favor se destinou a formalizar o contrato de compra e venda dos imóveis que com ela acordou, cujo preço, de Esc. 2.200.000$00, pagou, os quais posteriormente, no uso dos poderes que lhe foram conferidos na referida procuração, vendeu a terceiros.

Conclui pela procedência da excepção e pela improcedência da acção, com as legais consequências, deduzindo o incidente de intervenção principal de CC.

Tendo a A. respondido a reafirmar o inicialmente alegado e opondo-se ao incidente de intervenção deduzido pelo R., concluindo como na petição inicial, foi proferido despacho a admitir o incidente de intervenção principal provocada de CC e a convidar o R. a deduzir o incidente de intervenção principal provocada das pessoas a quem vendeu os imóveis, convite a que o R. acedeu, chamando aos autos EE e marido, FF, GG, HH, II e mulher, JJ, e KK e marido, LL.

Posteriormente, deduziu a A. o incidente de intervenção principal provocada de MM, com o fundamento de que o interveniente HH havia alienado a favor do chamado os imóveis que havia adquirido, que foi admitido.

Regularmente citados, contestaram, separadamente: a) Os intervenientes EE e marido, FF, GG, HH, II e mulher, JJ, e KK, que apresentaram contestação idêntica à do R., mais invocando a ilegitimidade dos intervenientes HH e KK, com o fundamento de que os mesmos não eram os actuais proprietários dos imóveis que adquiriram ao R., em virtude de os terem dado em pagamento ao interveniente MM; b) O interveniente MM, afirmando desconhecer as circunstâncias em que os imóveis haviam sido adquiridos pelas pessoas que lhos alienaram, pede a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido e deduz pedido reconvencional em que peticiona a condenação da A. a pagar-lhe os prejuízos que a impossibilidade de alienar os imóveis lhe acarreta, em montante a liquidar no respectivo incidente.

Tendo a A. respondido às excepções deduzidas pelos intervenientes e impugnado a factualidade alegada em sede de reconvenção pelo interveniente MM, pugnando pela sua improcedência, foi proferido despacho saneador, desatendendo as excepções invocadas pelo R. e intervenientes, admitindo o pedido reconvencional deduzido pelo interveniente MM, e fixando à causa o valor de € 44.866,97, em consequência do que a acção passou a seguir os termos do processo ordinário.

Instruída a causa, habilitados os herdeiros da entretanto falecida CC - a A. e a irmã DD - e junta certidão do registo da acção datado de 24/9/2007, procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença, que julgou procedente a acção e improcedente a reconvenção, decidindo, a final, nos seguintes termos: “Condeno o R. e os chamados a reconhecer que CC é pessoa incapaz de reger o seu património, pois sofre de notório atraso mental e de enfermidade psíquica congénita; - Declaro anulada e de nenhum efeito, face à incapacidade da mandante CC para entender o sentido e o alcance do acto praticado, a procuração que outorgou em 21 de Maio de 1998, pela qual constituiu procurador o R., bem como qualquer acto de disposição patrimonial outorgado com base na referida procuração, ordenando-se o cancelamento de quaisquer registos realizados com base nela: Julgo o pedido reconvencional improcedente e em consequência absolvo a Autora do pedido.” Inconformados, o R., os intervenientes EE e outros, e o interveniente MM interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do …, pedindo a reapreciação da decisão de direito.

Por acórdão de fls. 796 foi proferida a seguinte decisão: Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta Secção Cível do Tribunal da Relação do … em julgar parcialmente procedentes as apelações interpostas pelo R. e pela interveniente EE e outros, e improcedente a interposta pelo interveniente MM, e, no mais a mantendo, em alterar a sentença recorrida, condenando as herdeiras habilitadas da falecida CC a restituir ao R. o contravalor em Euros de Esc. 2.200.000$00 (Dois milhões e duzentos mil escudos).

  1. Vem o interveniente MM interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões: A- A douta sentença não se fundamentou correctamente nos factos alegados e dados como provados estando arredada do melhor direito aplicável.

    B- Dos autos resulta e para o que ora nos interessa o provado nos pontos 17 e 18, todos da matéria dada como provada, e que em resumo se pode concluir que o chamado celebrou as ditas escrituras de dação em cumprimento em 21/11/2005 e 19/10/2006 e que as mesmas foram registadas em 20-02-2006 e 19-10-2006, respectivamente.

    C- Provado também que as escrituras públicas de compra e venda outorgadas pelo Réu, com base numa procuração, em representação de CC, foram outorgadas todas em 31 de Julho de 1999.

    D- Não ficou provado nos autos que o chamado/recorrente BB, tinha pleno e perfeito conhecimento de tudo quanto se alega na petição inicial, e não consta da matéria provada que o mesmo tivesse conhecimento que à data das escrituras de dação em cumprimento, a presente acção já se encontrava proposta.

    E- O aqui recorrente desconhecia e não estava obrigado a conhecer que a acção foi registada em 24/09-2007, por não foi notificado do mesmo, por outro lado só com o chamamento à acção é que teve conhecimento da acção de inabilitação, muito tempo depois das escrituras de aquisição dos Imóveis., e que foram registadas ames do registo da acção.

    F- O recorrente é um adquirente a titulo oneroso e de boa fé, e beneficia da fé pública de um registo preexistente, tendo feito essa a sua aquisição confiando nesse registo.

    G- Decorre do Artº 7º do CR Predial que "o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.

    H- Face aos princípios gerais do C.C. podemos concluir que a presunção derivada do registo, nos termos do Artº 7º do CR. Predial é susceptível de admitir prova em contrário designadamente, nos casos de invalidade registral ou invalidade substantiva, e a invalidade registral pressupõe o seu reconhecimento por via da competente acção judicial transitada em julgado, não podendo todavia ser provada por força da lei, em relação a terceiros que reúnam as seguintes condições: estejam de boa fé, tenham adquirido o direito em causa a título oneroso, tenham registado o seu direito á data em que foi registada a acção de nulidade e tenham agido com base no registo prévio.

    I- Essa e a situação do chamado BB, aqui recorrente, ou seja na data em que adquiriu de forma onerosa os referidos prédios, era um terceiro de boa fé e que agiu com base nos elementos existentes no registo ou seja não estava pendente qualquer ónus ou encargo sobre os aludidos prédios, tendo este convencido de que a sua aquisição voluntária estava livre de quaisquer tipo de ónus ou encargos, até porque a presente acção só foi registada depois do registo dos prédios.

    J- A nulidade prevista no Artº 17º do C R.Predial, com a epígrafe declaração de nulidade estipula que " 1- A nulidade do registo só pode ser invocada depois de declarada por decisão judicial com transito em julgado. 2-A declaração de nulidade de registo não prejudica os direitos adquiridos a titulo oneroso por terceiros de boa fé, se o registo dos correspondentes factos for anterior ao registo da acção de nulidade.

    K- Por outro lado o Artº 291º do C Civil prevê que "1-A declaração de nulidade ou de anulação do negocio jurídico que respeite a bens moveis ou a imóveis, ou a moveis sujeitos a registo, não prejudica os direitos adquiridos sobre os mesmos bens, a título oneroso, por terceiros de boa fé, se o registo da aquisição for anterior a registo da acção de nulidade ou anulação ou ao registo do acordo entre as partes acerca da invalidade dos negócios 2- Os direitos de terceiros não são porem reconhecidos se a acção for proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio.

    L- Este normativo tem o seu especifico âmbito de aplicação cingido às invalidades substantivas, precisamente quando o terceiro de boa fé não tenha agido com base no registo, ou seja quando o negocio jurídico nulo, anulável ou inválido não tenha sido ou esteja registado.

    M- Assim é licito concluir que para as invalidades registrais se deve aplicar apenas o Artº 17° do C R. Predial porque tendo...

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