Acórdão nº 4594/05.6TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelTÁVORA VICTOR
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

1. RELATÓRIO.

Acordam na 7ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça.

AA, S.A.

”, intentou acção declarativa de condenação contra “BB - Associação de Distribuidores de Propano Canalizado” e CC, pedindo: a) que seja proferida decisão que iniba os Réus de procederem à distribuição de documentos (como os n°s 1 e 2 por si juntos, ou de conteúdo análogo) bem como de proferirem afirmações, junto da comunicação social ou dos consumidores, (com o teor do documento n° 3 e n° 10, outro similar ou essencialmente análogo); b) A prolação de decisão no sentido da inibição dos Réus de produzirem as seguintes afirmações: - “Não é verdade que o gás natural seja mais seguro que o gás propano”; - “Os gases natural e propano e butano têm características semelhantes, pelo que não se poderá concluir que qualquer um deles seja mais ou menos ecológico”; - “O gás natural não é mais barato do que o gás propano”; - “O gás natural é mais caro que o gás propano”; - “O propano é o único que pode chegar a todos os clientes, independentemente de onde habitem”; - “A Autora utiliza argumentos falsos, enganosos ou fraudulentos na sua actuação e na sua publicidade”; c) A condenação dos Réus no pagamento à Autora e ao Estado, a título de sanção pecuniária compulsória, da quantia de 50.000 Euros por cada vez que os Réus desrespeitem a condenação aludida em b), relativamente a cada uma das afirmações aludidas; d) A condenação dos Réus a pagar solidariamente à Autora a quantia de 150.000 Euros, a título de indemnização pelos danos causados pelos Réus ao bom nome, crédito comercial, imagem e clientela da Autora com os documentos n°s. 1 a 3 por si juntos.

e) Valores esses acrescidos de juros à taxa legal para os créditos de que são titulares comerciantes, a contar da citação e até integral pagamento.

A Autora alegou, em suma e para o efeito, dedicar-se ao fornecimento e distribuição de gás canalizado, natural e propano e que os Réus iniciaram uma campanha contra o consumo de gás natural mediante o recurso a práticas reprováveis e que afectam a imagem da Autora e do produto por esta fornecido; que do exposto são exemplos os documentos referidos, por conterem afirmações não verdadeiras quanto as características e preço do gás natural e que afectam o bom nome e imagem da demandante, atentando contra os direitos dos consumidores e daquela, em violação de vários preceitos do Código da Publicidade, por se entender tratarem-se de mensagens publicitárias.

Pugna ainda pela recondução dos actos descritos a concorrência desleal e, por tal, à fixação de uma indemnização pelo prejuízo ao seu nome.

Contestando - por impugnação e por excepção - vieram os Réus arguir as excepções dilatórias de ineptidão da petição inicial e de ilegitimidade do segundo Réu, e ainda a de prescrição do direito da demandante, e que tem sido a demandante a tentar angariar os clientes dos distribuidores de propano, associados ou não da primeira Ré.

Mais alegaram que os documentos em causa nos autos apenas visaram prestar um esclarecimento aos consumidores relativamente a factos incorrectamente divulgados pela Autora.

No mais, impugnaram na generalidade, os factos alegados pela demandante, concluindo pela absolvição do pedido.

A Autora pugnou, em sede de réplica, pela improcedência das excepções arguidas.

Foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes as excepções dilatórias (ineptidão da p. i. e ilegitimidade do segundo Réu) e indeferiu a suspensão da instância - por alegada existência de causa prejudicial - relegando para a sentença o conhecimento da excepção de prescrição do direito da Autora.

A Autora requereu a realização de prova pericial, cujo relatório consta de fls. 745 a 748.

Corridos os subsequentes termos processuais, foi proferida sentença a condenar a Ré BB no pedido referido em a) e b) e a pagar à Autora a quantia de 75.000 euros a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, quantia acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal vigente desde o trânsito e até integral pagamento.

Foi ainda condenada, por cada infracção referida nas alíneas b) e c), numa sanção pecuniária compulsória de 2000.00 euros.

O Réu CC foi absolvido do pedido.

Inconformada apelou a Ré BB, tendo a Relação de … julgado a acção improcedente e revogando o acórdão recorrido absolveu a Ré do pedido.

Recorre agora a Autora AA, S.A. terminando por pedir que seja revogado o acórdão da Relação e assim repristinado a sentença de 1ª instância.

Foram para tanto apresentadas as seguintes, Conclusões.

1) Em 24 de Fevereiro de 2014, foi proferida sentença do Tribunal de primeira instância a qual, e bem, salvo melhor opinião em contrário, decidiu julgar a acção parcialmente procedente, por provada e, consequentemente, condenou a ora Recorrida BB.

2) Contrariamente, por acórdão proferido em 12 de Maio de 2016, o douto Tribunal da Relação de … decidiu dar provimento ao recurso apresentado pela Recorrente, aqui Recorrida, e, em consequência, foi a Ré, ora Recorrida, absolvida do pedido.

3) Ora, salvo o devido respeito, que é muito, não pode a ora Recorrente conformar-se com a decisão proferida pelo mui ilustre Tribunal da Relação, nomeadamente no entendimento de que a conduta da aqui Recorrida não consubstancia a prática de actos de concorrência desleal e práticas comerciais desleais por publicidade (enquanto acção) enganosa.

4) Note-se que, porém, bem andou o Tribunal a quo, ao referir-se aos documentos juntos aos autos como sendo parte integrante de uma campanha publicitária, indo aqui ao encontro do já decidido pelo Tribunal de primeira instância a qual integrava a divulgação dos referidos documentos e ideias no conceito de publicidade ínsito no artigo 3.°, n.° 1, do Código da Publicidade].

5) Porém, com o devido respeito, que é muito, mal andou o Tribunal a quo, ao não qualificar a actuação da ora Recorrida como actos de concorrência desleal.

6) Em suma, o Tribunal da Relação entendeu que não praticou qualquer acto, seja publicitário ou concorrencial, que ofenda as normas legais em vigor e que no caso concreto as afirmações proferidas pela Recorrida não consubstanciavam altos censuráveis à luz dos normativos em apreço. Tal decisão foi fundamentada na falta de prova das vantagens e desvantagens de um gás em relação ao outro.

7) No entanto, note-se que a decisão do Tribunal de primeira instância, não viu a sua decisão sobre a matéria de facto ser objecto de alteração, a qual foi devidamente sustentada nos factos dados como provados, os quais, o Tribunal da Relação optou por não dar especial relevo.

8) Atenta a factualidade dada como provada, e é vasta, não restam dúvidas à ora Recorrente que a conduta da Recorrida é censurável à luz do direito e, por esse motivo, sancionável. I. A sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância faz uma correcta subsunção dos factos ao direito aplicável, não merecendo, assim, qualquer reparo.

9) Entendeu, porém, o Tribunal da Relação que não resultou da matéria de facto provada que estejamos perante actos de publicidade comparativa ilícita, por enganosa e com o propósito de denegrir ou desacreditar o gás distribuído e comercializado pela Autora e que a mesma promoção fosse desonesta.

10) Porém o Tribunal a quo veio, e bem, afirmar que da leitura dos textos elaborados e veiculados pela recorrente pode concluir-se que têm uma vincada (senão única) componente publicitária, uma vez que se destinam a excelência do gás propano, perante o gás natural distribuído pela recorrida.

11) Neste ponto específico bem andou o Tribunal da Relação, ao referir-se aos documentos juntos aos autos como sendo parte integrante de uma campanha publicitária, indo aqui ao encontro do já decidido em primeira instância, que integrava a divulgação dos referidos documentos e ideias no conceito de publicidade ínsito no artigo 3.°, n.° 1, do Código da Publicidade.

12) Porém, com o devido respeito, que é muito, mal andou o Tribunal a quo, ao não qualificar a actuação da ora Recorrida como actos de concorrência desleal.

Ao contrário, em primeira instância, a convicção do julgador foi formada em sentido inverso, baseando o seu juízo subjectivo de forma válida e por referência aos factos dados como provados.

13) Nos termos dos artigos 6.° e 10.° do Código da Publicidade, a publicidade rege-se por princípios da i) licitude, ii) identificabilidade, iii) veracidade e iv) respeito pelos direitos do consumidor.

14) Com efeito, dos factos provados nos presentes autos e que o Tribunal da Relação não alterou, consta efectivamente que a ora Recorrida prestou informações falsas e informações enganosas que pretendiam, única e exclusivamente, desacreditar o produto da ora Recorrente.

15) Assim, e tendo presente a decisão do Tribunal de primeira instância, não se afigura compreensível a peremptoriedade do Tribunal a quo em considerar que as ora Recorridas não empreenderam em nenhuma campanha contra o consumo de gás natural, mas ao invés encetaram, apenas, campanhas de elucidação dos cidadãos, com vista a chamar a atenção dos consumidores para, alegadamente, potenciais perigos e desvantagens económicas deste produto o qual, choque-se, é concorrente do produto desenvolvido pelas ora Recorridas, o gás propano - informações que nem sequer eram verdadeiras e que apenas pretendiam induzir o consumidor em erro.

16) De facto, ficou demonstrado e consta da matéria dada como provada, bem como da fundamentação aduzida pelo tribunal de primeira instância, que a ora Recorrida procedeu a uma divulgação/distribuição maciça da documentação junta aos autos, durante vários anos, tendo os documentos sido distribuídos pelos Consumidores pelo menos até 2012, os quais pretendem claramente denegrir a imagem e bom nome da aqui Recorrente e desacreditar o produto por esta comercializada junto do consumidor, que assim se vê compelido a não recorrer ao gás natural.

Na verdade, não se atinge a ratio por detrás da decisão do Tribunal a quo, o qual não considera que a acção da aqui Recorrida se...

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