Acórdão nº 1181/05.2TBFND.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelTÁVORA VICTOR
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO.

    Acordam na 7ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça.

    AA e mulher BB, residentes na Rua …, n.º …, A…, propuseram a presente acção contra EDP Distribuição – Energia SA.

    , com sede na Rua …, …, Lisboa, pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 155.000,00, acrescida de juros desde a citação até efectivo pagamento.

    Os Autores pretendem com a presente acção efectivar a responsabilidade civil da Ré pela morte do filho daqueles, CC, ocorrida em 13 de Setembro de 1999. Em abono da sua pretensão alegaram, em síntese: 1. Que a morte do seu filho foi causada por um choque eléctrico, quando ele caminhava sobre os ferros de uma latada para entrar na sua casa de habitação; 2. Que a latada tinha corrente eléctrica dado que naquele local existia uma ligação deficiente da linha área de baixa tensão que abastece de energia eléctrica a casa dos Autores; 3. Que o fio, que passava junta à latada e ao postalete estava partido, o que permitia a passagem de tensão para aramada da parreira; 4. Que a Ré era responsável porque não fiscalizou devidamente as linhas eléctricas por si exploradas e por não detectar a tempo a deficiência num dos fios da instalação da rede aérea de baixa tensão que abastece a energia eléctrica da casa dos Autores. 5. A quantia pedida visa ressarcir as dores e agonia da vítima (€ 25.000,00), os danos morais sofridos pelos Autores com a morte do filho (€ 30.000,00 para cada um) e a perda da vida do filho (€ 70 000).

    A Ré contestou. Na sua defesa começou por excepcionar a prescrição do direito de indemnização invocado pelos Autores. De seguida, apresentou uma versão dos factos diferente da dos Autores. Alegou que a rede eléctrica, quer no seu traçado principal, quer no ramal, encontrava-se, à data do acidente, em bom estado de conservação e exploração; que a ter existido qualquer tensão eléctrica na latada ela não teve origem na rede eléctrica; que a ter existido tensão na latada ela só poderia ter tido origem na instalação de consumo; que o filho dos Autores sofreu traumatismo da coluna cervical que foi causa da sua morte; que o acidente correu por culpa exclusiva da vítima e dos seus pais.

    Os Autores responderam à matéria da excepção.

    No despacho saneador, o tribunal julgou improcedente a alegação de que o direito invocado pelos Autores estava prescrito.

    O processo prosseguiu os seus termos e após a realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a Ré do pedido.

    Os Autores interpuseram recurso de apelação.

    O Tribunal da Relação de …, por acórdão proferido em 11 de Dezembro de 2012, anulou parcialmente a decisão recorrida, por considerar contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto e por considerar indispensável a ampliação desta.

    Após a repetição do julgamento, foi proferida nova sentença que, julgando procedente a acção, decidiu condenar a Ré a pagar aos Autores: 1. A quantia de € 70.000,00, a título de indemnização pela perda do direito a vida de CC; 2. A quantia de € 25.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos por CC antes de morrer; 3. A quantia de € 60.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelos autores com a morte do filho, CC; 4. A quantia respeitante aos juros de mora que se vencerem sobre as quantias discriminadas em 1), 2) e 3), à taxa legal desde a data do trânsito em julgado da sentença até ao efectivo pagamento.

    A Ré não se conformou com a sentença e interpôs recurso de apelação, pedindo se revogasse a sentença em conformidade com as conclusões.

    Debruçando-se sobre a sentença apelada a Relação julgou a apelação procedente por provada e assim revogou a sentença de 1ª instância e absolveu a Ré do pedido.

    Por seu turno inconformados recorrem os AA., tendo pedido a anulação do acórdão recorrido substituindo-se por outro, de harmonia com o propugnado nas conclusões da sua alegação.

    Foram para tanto apresentadas as seguintes, Conclusões.

    1 - A decisão é nula por excesso de pronúncia, com todas as consequências legais, designadamente a manutenção da condenação decidida na lª Instância.

    2 - Isto porque o Acórdão recorrido pronunciou-se sobre a questão da inexistência de uma acção da Ré que a lei presume como culposa.

    3 - Sucede, todavia, que essa questão não foi trazida à colação pela própria Ré; isto é, o Tribunal analisou e decidiu uma questão que não consta, ainda que implicitamente, das conclusões recursivas da Ré.

    4 - A não ser assim entendido, não é possível a solução jurídica do pleito por contradições na decisão da matéria de facto (art.º 682º, 3 do CPC).

    5 - Reportamo-nos à flagrante contradição entre a matéria provada constante dos pontos 8, 9 e 35 e a dos pontos 10 e 11.

    6 - Não pode decidir-se correcta e rigorosamente o pleito se, por um lado e em bom rigor, se reconhece a existência de tensão na latada e, por outro lado, se nega essa existência.

    7 - Face ao que antecede, deve, com o devido respeito, ser ordenada a baixa do processo ao Venerando Tribunal da Relação para que elimine as apontadas contradições na decisão da matéria de facto (cfr. artigo 482º, n.º 3 do CPC), com todas as consequências legais.

    8 - Se naufragarem os fundamentos de recurso supra alegados, os AA. pugnam pela manutenção da condenação da Ré, estribando-se para o efeito na matéria de facto dada como provada pelo Venerando Tribunal da Relação.

    9 - É que, mesmo após a alteração das respostas à matéria de facto operada pela Relação e para o que ora releva, os factos provados são de molde a decidir-se pela procedência da acção.

    10 - A Ré deve, assim, ser condenada a indemnizar os AA. nos montantes constantes da sentença de 1ª instância, exactamente com os mesmos fundamentos ali invocados (deficiência da linha aérea de baixa tensão por causa imputável à ré), considerando-se, ainda assim, a alteração às respostas quanto à matéria de facto realizada pela Relação, sendo que os factos permitem a aplicação ao caso concreto do disposto no art.º 483º, n.º 1 do C. Civil ou, subsidiariamente, do regime prescrito no art.º 493° do mesmo Diploma legal.

    11 - Se os Srs. Conselheiros considerarem que a matéria de facto dada como provada é insuficiente para a prosseguida condenação da Ré, devem, então, os factos resultantes da reapreciação da prova e que se formaram na convicção dos Srs. Juízes Desembargadores, mas que, segundo aqueles, não podem ser levados em consideração, ser atendidos e julgada a acção com base neles.

    12 - O que resulta do acórdão recorrido de uma forma clara e até surpreendente é que os AA. têm razão para ser indemnizados pela ré pela morte do CC, por omissão grave desta, mas, por uma questão meramente formal, essa indemnização não pode ser arbitrada.

    13 - Entendemos, porém, que os sobreditos factos, que são efectivamente instrumentais ou complementares, podem e devem ser considerados na decisão, a qual, como se reconhece no próprio Acórdão recorrido, deve ser no sentido da condenação da Ré nos montantes já arbitrados...

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