Acórdão nº 299/14.5T8VLG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Abril de 2016
Magistrado Responsável | MÁRIO BELO MORGADO |
Data da Resolução | 21 de Abril de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I.
1.
AA instaurou contra BB, LDA.
, a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento.
2. Na 1.ª Instância foi proferida sentença: - A julgar lícito o despedimento e, assim, improcedente a ação; - Julgando parcialmente procedente a reconvenção deduzida pelo trabalhador (na contestação do articulado do empregador), a condenar a R. a pagar ao A. a quantia de € 25.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal, a título de compensação por danos não patrimoniais (embora se tenha considerado inverificado o assédio moral invocado pelo A.).
3.
Interposto recurso de apelação pelo A., foi o mesmo julgado parcialmente procedente pelo Tribunal da Relação do Porto (TRP),que decidiu: - Eliminar o ponto EE) da matéria de facto e alterar o ponto BBB); - Julgar ilícito o despedimento do A., condenando, consequentemente a R. a pagar-lhe: · A indemnização de antiguidade correspondente à quantia de € 4.789,33, por cada ano completo ou fração de antiguidade, contada desde 08.03.2015 e até ao trânsito em julgado do acórdão, acrescida de juros de mora, até integral pagamento; · As retribuições (incluindo subsídios de férias e de Natal) referentes ao período compreendido entre 16.10.2014 e a data do trânsito em julgado do acórdão, no montante unitário de € 7.184,00, acrescido de juros de mora, até integral pagamento, deduzindo-se as importâncias que o recorrente tenha auferido, no mesmo período temporal, a título de subsídio de desemprego.
- Considerar verificado o assédio moral invocado pelo A. e, consequentemente, aumentar, para € 35.000,00, o valor da indemnização fixada a título de danos não patrimoniais, condenando ainda a R. a pagar àquele juros de mora, desde 20.05.2015 e até integral pagamento.
4.
Do assim decidido, interpôs a R. a presente revista, dizendo, em síntese, nas conclusões da sua alegação: - Ao defender que sobre o Recorrido não impendia um acrescido dever de lealdade, que o exercício das funções de direção comercial pressupunha, e indo até mais longe, dizendo entender que o Autor não tinha nenhum dever de exclusividade perante a Ré, o Acórdão proferido dá como assentes factos que não aconteceram, esquece parte substancial da matéria dada como provada e contém, por simples consequência, erros de julgamento.
- Defendendo o conceito de "lealdade relativa", através de uma específica interpretação do conceito, que entende ser mitigado pelo princípio da proporcionalidade, o Acórdão recorrido faz apelo aos factos que esclarecem as circunstâncias que rodearam a decisão de despedimento e ao conceito de modelo objetivo do empregador razoável. Na primeira vertente, considera factos em tudo contrários à realidade que os autos espalham; na segunda, faz com que a razoabilidade apenas seja exigível a uma das partes.
- Sobre o Recorrido, durante toda a existência do seu contrato de trabalho, impendia um dever absoluto de exclusividade, sendo que tal dever não se limitava a uma mera disponibilidade de tempo, antes em si encerrava também a exclusividade de interesse, sendo-lhe exigível que não tivesse situações de conflito de interesse com a sua entidade patronal.
- O incremento do valor indemnizatório fixado pela 1.ª Instância baseia-se na ideia conceptual de que o Autor terá sido vítima passiva de mobbing, o que não ocorre no caso vertente.
5.
A A. contra-alegou, pugnando pelo improvimento do recurso.
6.
O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, sustentando ser lícito o despedimento do trabalhador e, por outro lado, que é de manter o decidido pelo Tribunal da Relação, a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Notificadas as partes, apenas o A. respondeu, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
7.
Inexistindo quaisquer outras de que se deva conhecer oficiosamente (art. 608.º, n.º 2, in fine, do CPC[1]), em face das conclusões da alegação de recurso, as questões a decidir são as seguintes:[2] - Se o apurado comportamento do A. constitui justa causa de despedimento; - Se, por estar indemonstrada uma situação de assédio moral, a indemnização por danos não patrimoniais não deve ultrapassar o valor fixado na 1.ª Instância.
E decidindo.
II.
9.
A matéria de facto fixada na decisão recorrida é a seguinte:[3] A) A ré BB, Lda., (…) tem o seguinte objeto social: “importação, exportação, comércio por grosso e a retalho de grande variedade de mercadorias: CC”; B) Possui três estabelecimentos de CC: no Porto, em … e em …; C) O trabalhador foi admitido em 08.03.2005; D) Tem a categoria profissional de diretor comercial; E) No dia 02 de julho de 2014, a mulher do arguido, DD, com ele casada no regime de comunhão de adquiridos, constituiu uma sociedade comercial por quotas unipessoal, com a firma Supermercado EE, Unipessoal, Lda., (…) com o objeto comercial de comércio a retalho em supermercado, comércio a retalho de carnes e produtos à base de carnes, de que é sócia e gerente, com sede na Rua …, n.º …, ..., ...; F) A sociedade deu início de atividade fiscal no dia 09 de julho de 2014; G) A mulher do arguido registou-se como cliente e comerciante na empregadora e em 06 de agosto de 2014 passou a adquirir mercadoria na loja de …/…; H) O supermercado EE tem em exposição e em folheto e vende mercadorias que a empregadora não fornece, nomeadamente sumos G..., P..., água P…, ovos Q... tamanho L, indo portanto abastecer-se às empresas concorrentes da empregadora desses produtos, nomeadamente a A..., os V…., B… L… e produtos frescos da M...; I) O supermercado EE tem seis trabalhadores: um cortador, um empregado de charcutaria, dois caixas e dois operadores; J) (…) K) Os fornecedores da empregadora conhecem o trabalhador; L) A ré não tem aberto, nem nunca teve, pelo menos a partir do ano de admissão do autor, em 2005, qualquer estabelecimento de venda a retalho; M) No dia 04 de julho de 2014 realizou-se uma reunião entre o autor e o gerente da ré, tendo este dito ao autor que ou vendia o estabelecimento ou teria de se demitir; N) A D. FF, por virtude das funções de chefe dos serviços administrativos que exerce, tem conhecimento, ou pelo menos acesso, aos preços praticados pela ré aos seus fornecedores; O) Os preços e condições de aquisição praticados pela ré são iguais para todos, constam de prospetos de distribuição ao público e das tabelas de preços que são elaboradas diariamente pelos serviços centrais; P) Durante os anos de 2009 a 2011, houve na ré uma disputa entre os sócios que também exerciam funções de gerência, que provocou a exoneração de gerentes, providências cautelares e ações judiciais e que terminou no ano de 2011 com o controlo societário por parte do sócio BB; Q) No ano de 2011, em setembro, foi dito ao autor pelo gerente da ré, BB, que iria ser destacado para a loja CC no Porto, porquanto a mesma se encontrava muito desorganizada; R) A loja do Porto era gerida por dois responsáveis, o Sr. GG e o Sr. HH, que reportavam e continuaram a reportar diretamente à gerência da ré; S) Em setembro de 2013, o autor foi transferido novamente para a loja de CC de Famalicão, loja esta que continuou a ser gerida pelos Senhores II e JJ, que mantiveram as mesmas funções; T) A partir de setembro de 2011, o autor passou a assinar as guias de remessa/receção de mercadoria e conferir mercadoria; U) A sociedade constituída pela mulher do trabalhador instalou um estabelecimento comercial de supermercado na sua sede, denominado EE e iniciou a exploração em agosto de 2014; V) (…) W) (…) X) O supermercado EE funciona em concorrência com os clientes da empregadora, que são também mercearias, supermercados e estabelecimentos do mesmo género e se dedicam a atividade comercial semelhante; Y) O supermercado EE fica na mesma localidade de outro supermercado cliente do comércio integrado da empregadora, o Supermercado KK, Unipessoal, Lda.; Z) Os clientes da empregadora abastecem-se nas lojas da empregadora, sabendo o trabalhador, ou podendo saber, as condições negociais que lhes são concedidas, nomeadamente do Supermercado KK, que visitou e acompanhou, no exercício das suas funções na empregadora; AA) O A. participa e colabora na exploração do supermercado EE, dela beneficiando e tirando proveito; BB) O A. esteve, no mês de agosto de 2014, no supermercado EE, preparando a inauguração e depois atendendo ao público e tratando do serviço corrente do supermercado, recebendo clientes e fornecedores e mostrando o estabelecimento; CC) No seu perfil do Facebook, que é público e de acesso irrestrito por qualquer pessoa registada no Facebook, o A. explicou no dia 29/07/2014 a origem do nome do supermercado e anunciou o estabelecimento nos dias 6, 7, 14 e 18 de julho de 2014; EE) (…)[4] DD) Este tipo de negócio exige e pressupõe um conhecimento atualizado e minucioso dos preços, promoções e descontos dos produtos, praticados pelos grossistas fornecedores e pelos concorrentes, e uma presença contínua e sistemática na direção do negócio, para aproveitar as oportunidades e gerir e participar na atividade comercial do estabelecimento, em cada momento; FF) A mulher do trabalhador esteve desempregada nos últimos catorze anos; GG) O trabalhador é e foi essencial para o lançamento e prossecução da atividade do supermercado: ele é que tem o conhecimento do negócio, dos produtos, dos preços, dos clientes, dos fornecedores, das margens, pela sua vasta experiência ao serviço da empregadora e anteriormente noutras empresas para que trabalhou, no mesmo ramo, nomeadamente a LL, dos supermercados MM, do Algarve, de onde veio para a empregadora; HH) O trabalhador comporta-se/ aparece perante os fornecedores como sendo a imagem e o dono e gestor do estabelecimento; II) Além dos fornecedores da empregadora, os clientes desta também conhecem o trabalhador; JJ) A entidade empregadora faz atualmente parte da NN e da OO (central de compras) que por sua vez faz parte da EMD, uma das maiores centrais de compras europeias, e tem hoje ao seu serviço 189 funcionários; KK) A...
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