Acórdão nº 1415/14.2JAPRT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução14 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: O tribunal de 1ª instância, em colectivo, proferiu acórdão condenando o arguido AA, nascido em ...: -a 14 anos de prisão, pela prática de um crime de homicídio, p. e p. pelo artº 131º do Código Penal; -a 8 anos de prisão, pela prática de um crime de homicídio, na forma tentada, p. e p. pelos artºs 22º, 23º, nºs 1 e 2, 73º, nº 1, alíneas a) e b), e 131º do CP; -a 1 ano e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artº 86º, nº 1, alínea c), da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro; e, -em cúmulo jurídico, na pena única de 18 anos de prisão.

Foi ainda o arguido condenado a pagar indemnizações civis a lesados.

Julgando recursos interpostos pelo arguido e pelo MP, a Relação de Guimarães, por acórdão de 30/11/2015: -alterou a decisão de 1ª instância, considerando que tanto o crime de homicídio como a tentativa de homicídio são qualificados nos termos do artº 132º, nºs 1 e 2, alíneas e) [motivo torpe] e i) [meio insidioso], do CP, aplicando por aquele e por esta as penas de, respectivamente, 18 anos de prisão e 6 anos de prisão; -manteve a decisão de 1ª instância na parte referente ao crime de detenção de arma proibida; e, -em cúmulo jurídico, fixou a pena única de 21 anos de prisão.

Ainda inconformado, o arguido interpôs recurso do acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo a sua motivação nos termos que se transcrevem: «I - A douta sentença dada pelo Tribunal da Relação é nula, tal como a sentença do Tribunal da Primeira Instância, pois omitiram pronúncia sobre factos articulados e não ter produzido diligências requeridas ao longo do julgamento e tendo dado como provados factos sem que se vislumbre nos acórdãos fundamento para tal.

II - Foram indeferidas diligências, tal como vem referido nas conclusões do recurso atrás enunciado, que se reputavam essenciais, para a descoberta da verdade material e cuja omissão constitui nulidade nos termos das disposições conjugadas no art. 340°, n° 1 e art. 120°, n° 1, aI. c) do C.P.P.

III - Logo era pertinente e importante para a descoberta da verdade material que os Senhores Peritos, tivessem sido ouvidos em audiência de julgamento, ou que acrescentassem em relatório a resposta ao quesito formulado no ponto A3, do requerimento da Perícia na contestação.

IV - Também, nos doutos acórdãos, teriam que tais factos ser levados em linha de conta, na aplicação da pena concreta das penas parcelares e única e não foi feito.

V - Logo, não tendo sido produzida a prova pericial relativa ao quesito formulado e requerido, não houve resposta dos Peritos Médico-Legais ao mesmo, tendo sido omitida uma diligência essencial à descoberta da verdade material quanto à imputação subjectiva dos factos ao arguido.

VI - Ao longo do julgamento, todas as testemunhas ouvidas e que estiveram no local nesse dia com o arguido disseram, afirmaram que o arguido estava a cair de bêbado; tal matéria e a sua resposta era essencial para a imputação subjectiva do facto, o juízo de culpa e consequente aplicação da pena, pois o Meritíssimo Juiz deu tal facto como não provado e todas as testemunhas, supra referidas, foram unanimes em reafirmar o estado de embriaguez do arguido, tendo algumas ido mais longe, afirmando que tinham bebido diversas bebidas com ele e se não estivesse com álcool, ele não fazia aquilo; VII - O Tribunal fez disso tábua rasa e deu como facto não provado, louvando-se no relatório pericial transcrito no acórdão para descredibilizar o depoimento dessas testemunhas.

VIII - Logo no acórdão recorrido da Primeira Instância, pouco se diz sobre os factos articulados na contestação, aliás o mesmo aconteceu com os factos alegados na acusação pública.

IX - Por outro lado, aparecem factos dados como provados, sem que se dos acórdãos se extraia em que se baseou a convicção do Tribunal, para tal.

X - Logo, fica assim sem se saber se alguma matéria foi, ou não, ponderada, descriminada e especificadamente, já que não se diz se a mesma foi ou não provada e dito de outra forma, houve omissão de pronúncia sobre os factos articulados na contestação. E outra não se sabe em que se baseou a convicção do Tribunal, para os dar como provados.

XI - Houve, ainda, por um lado, omissão de exame critico das provas para dar como provados determinados factos da acusação e dar como não provados alguns factos da contestação, e por outro, foram omitidas diligências essenciais à descoberta da verdade material, ou seja, não foram questionados os Senhores Peritos, sobre o quesito formulado pelo arguido e cuja resposta pelos Senhores Peritos Médico-Legais requereu, para serem levados em linha de conta no douto acórdão no sentido de uma correcta decisão sobre a imputação subjectiva, o juízo de culpa e o consequente fundamento para aplicar a pena ao arguido, omissões que, também, se encontram na decisão da Relação; XII - Tais omissões constituem nulidade nos termos das disposições conjugadas dos artigos 340°, n° 1, 368°, n° 2, 374°, nº 2, 379°, nº 1 al. a) e 410°, n°s 2, aI. a) e 3, por referência ao artigo 120°, n° 1, aI. d), todos do C.P.P. e 72° do C.P. com a consequência expressamente prevista no n° 1 do artigo 122° do C.P.P.

XIII - Tal circunstância implica o reenvio do processo para a realização de novo julgamento, nos termos do artigo 426° e 436° do C.P.P., perante o Tribunal de Categoria e Composição idêntica à do Tribunal Recorrido, ou a repetição do julgamento.

XIV - O Tribunal conclui, pela ocorrência dos crimes da forma referida, incorrendo num erro notório, na apreciação da prova, pois acreditou, pura e simplesmente, na versão dos ofendidos, desprezando toda a restante prova testemunhal, valendo-se do teor do relatório pericial que transcreveu, mas que não tem a virtualidade de, por si, pôr em causa a credibilidade dos depoimentos de tais testemunhas.

XV - Ostentando a sentença recorrida uma manifesta e insanável contradição entre a fundamentação e a decisão - art. 410°, n° 2, al. b) do C.P.P.

XVI - E, por isso, também, por esta via de análise, sempre a sentença recorrida, e a da Primeira Instância, estarão enfermas de vícios notórios, na apreciação da prova, vícios esses que resultam dos textos das sentenças, por si só e também conjugados com as regras da experiência comum - art. 410°, n° 2 al. c) do C.P.P.

XVII - O douto acórdão recorrido padece de insuficiência da prova, erro notório na apreciação da prova e manifesta contradição entre essa prova e a decisão.

XVIII - O Meritíssimo Juiz a quo, não fez uma correta aplicação da lei à matéria dada como assente, quer por insuficiência da prova, quer por erro notório da sua apreciação, quer ainda, por manifesta contradição entre essa prova e a decisão; XIX - Foram, assim, violados, também os artigos 368°, n° 2, 374°, n° 2 e 379°, n° 1, aIs. a) e c), todos do C.P.P.

XX - O que implica, por um lado, repetição do acto nulo e dos que dele dependem e por ele são afectados, nos termos do n° 1 do art. 122°, do C.P.P., ou o reenvio do processo para novo julgamento, nos termos do art. 410°, n° 2, aI. a), 426°, todos do C.P.P.

XXI Ainda que, assim não se entendesse, como por hipótese se concede, sempre o douto acórdão da Primeira Instância merece reparo quanto à medida da pena aplicada ao arguido, a qual é manifestamente excessiva, se conjugada com a matéria dada por assente.

XXII - Perante a matéria dada como provada e que atrás se descreveu, não podem os Senhores Juízes Desembargadores alterar de homicídio simples para qualificado, muito menos o homicídio de forma tentada também para qualificado.

XXIII - Existe uma nítida violação e contradição entre as normas aplicadas e os factos provados em audiência de julgamento, que também atrás se enunciaram.

XXIV - Assim, existe por parte da douta sentença do Tribunal da Relação uma nítida contradição.

XXV - Deve a douta sentença do Tribunal da Relação ser alterada e ser o arguido condenado em homicídio simples e tentada, de homicídio simples e perante isso as penas serem revogadas, e aplicadas próximas dos limites mínimos.

XXVI- Mesmo que assim não se entendesse, que não se concede, a pena única aplicada é deveras pesada, terá a mesma que ser revogada, pois existe nítida violação do vertido no art. 77° do C.P .

XXVII - Pois existe um nítido erro da fundamentação apontado no douto acórdão, para transformarem o homicídio e a tentativa em qualificados.

XXVIII - Perante isto o acórdão da Primeira Instância é nulo, tal como o do Tribunal da Relação.

XXIX - A qualificação dos crimes está erradamente feita no douto acórdão.

XXX - As medidas parcelares e a matéria das penas não estão correctamente fixadas em concreto.

XXXI - Pois para haver homicídio qualificado era necessário que se tivesse provado que a conduta do arguido mostrasse que ele quis o resultado verificado.

XXXII - Matéria sobre a qual, os doutos acórdãos são completamente omissos, verificando-se assim, insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

XXXIII - O erro notório na apreciação da prova consiste em se ter dado como provado (ou não provado) algo que, notoriamente, está errado, que não pode ter acontecido, sendo o erro de apreciação detectável por qualquer pessoa.

XXXIV - Só circunstâncias excepcionais, que o douto acórdão não refere, permitiriam justificar que, perante os factos dados como assentes, o arguido possa ter deixado de representar, como consequência possível da sua conduta, a morte da vítima, conduzindo na ausência das mesmas às regras da experiência comum à conclusão que pelo menos essa representação se teria verificado.

XXXV - Uma vez que a matéria dada como provada leva às doutas sentenças, resultando a desqualificação do crime de homicídio consumado e o na forma tentada, as penas deveriam estar próximas aos limites mínimos.

XXXVI - Face à matéria apurada, ao caracter do Recorrente, às circunstâncias temporais do crime, ao tipo do dolo, ao grau de culpa e ao estado do arguido, que terá a ver com as circunstâncias...

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