Acórdão nº 448/11.5TBSSB-A.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução29 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA e BB instauraram acção declarativa de condenação contra CC, com endereço postal em 00045 ..., ..., tendo a demandada, na respectiva contestação, para além do mais, arguido a excepção da prescrição.

No saneador o Mº Juiz conheceu da arguida excepção peremptória, julgando-a improcedente.

1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreu a R. CC para o Tribunal da Relação de ..., tendo-se aí julgado procedente a apelação e, consequentemente, revogou-se a decisão impugnada, julgando-se procedente a excepção peremptória da prescrição, absolvendo-se a R. do pedido.

1-3- Irresignadas com este acórdão, dele recorreram as AA. para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

As recorrentes alegaram, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões:

  1. Não decorre das regras do Regulamento CE nº 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho - aplicável em matéria de citações e notificações de actos judiciais e extra judiciais em matéria civil e comercial nos Estados Membros da Comunidade Europeia - a exigência de que a citação por via postal seja acompanhada de comunicação ao citando da tradução para a língua deste, quer da petição inicial, quer dos documentos com esta juntos.

  2. Da mesma forma se dizendo no que respeita ao direito ordinário português, no tocante a tal exigência na citação por via postal de estrangeiros residentes ou sedeados no estrangeiro.

  3. Não constituindo, assim, qualquer obrigação imposta aos requerentes da citação, antes e outrossim uma mera faculdade.

    Por isso que, d) Desde logo em tal quadro legal não seja censurável a omissão de tal tradução por parte das AA., ora Recorrentes, no tocante à citação da R./Recorrida.

  4. Sendo até certo que, não constituindo tal omissão fundamento de recusa do cumprimento do acta - antes e somente constituindo causa de recusa de recepção do mesmo - e constituindo também a exigência dessa tradução uma mera faculdade concedida ao destinatário, que este pode ou não exercer, tal como resulta do artigo 8° do Regulamento aplicável.

    No entanto, f) Do exercício de tal faculdade não resulta que a citação se não verifique (ou se deva ter por não verificada), mas tão só que se venha a completar, corrigida "mediante citação ou notificação ao destinatário de uma tradução do acto" (considerando 12 in fine do mesmo diploma).

  5. É, por conseguinte, certo que, tal como até decorre do disposto no nº 2 do art. 9° do Regulamento, nada obsta a que as Recorrentes se possam prevalecer do prazo ficcional de 5 dias previsto no artigo 323º nº 2, do C.Civil.

  6. Não lhes cabendo a obrigação - ou mesmo o ónus - de promover inicialmente a tradução em causa.

  7. Sendo até certo que, previamente à questão da recusa por falta de tradução do acta a citar até houve outra carta remetida para citação da Recorrida que foi devolvida por causas totalmente estranhas às Recorrentes e que, por lhes não serem imputáveis, nada obsta a que estas possam prevalecer-se do prazo ficcional previsto no supra referido art.323°, nº 2, do C.Civil, j) Tanto mais que a questão da tradução somente após a data da recusa por falta da mesma se poderia suscitar, inexistindo anteriormente qualquer fundamento para que as Recorrentes o fossem requerer a Tribunal ou este disso tomasse a iniciativa.

    Em qualquer caso, k) Certo é que as AA./Recorrentes litigam com apoio judiciário, estando dispensadas de suportar a taxa de justiça, bem como os demais encargos do processo, circunstância que deriva da sua total ausência de meios económicos para aceder a juízo na defesa dos seus direitos.

  8. A tradução do acto a citar constitui um encargo do processo, tal como decorre do disposto na alínea d) do nº 1 do art.16° do Regulamento das Custas Processuais, do qual as AA./Recorrentes estão dispensadas, por virtude do apoio judiciário com que litigam.

  9. E só surge, enquanto tal, após a propositura da acção, donde que o entender-se que às AA./Recorrentes coubesse promover a tradução - até previamente a essa propositura - então, pura e simplesmente, estariam estas impedidas por razões de índole económica de aceder a juízo e, logo, por ausência de meios, de aceder ao direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos.

  10. Sendo, além do mais, certo que nem sequer sobre as AA./Recorrentes impendia a promoção dessa tradução - tal como o pretende a decisão recorrida - pois que, em presença do benefício do apoio judiciário com que litigam, a promoção da tradução recai sobre o Estado, através do próprio Tribunal em que a acção foi proposta, tal como, de resto, se veio a verificar.

    Ora, o) A decisão recorrida por completo ignorou que as AA./Recorrentes litigam com apoio judiciário - nem sequer tendo conhecido da questão que a tal propósito foi invocada por aquelas na alínea g) das suas conclusões de resposta à alegação da R., então Recorrente - e que, também por tal razão, lhes não pode ser imposta a promoção da tradução em causa, pelo que a respectiva omissão em circunstância alguma possa ser-lhes censurável.

  11. Ao decidir em contrário, não só violou a decisão recorrida os normativos legais supra invocados, quando pretende caber às AA./Recorrentes a promoção da tradução em causa, como, não tomando em conta que se tal lhes fosse exigível previamente à propositura da acção, as estaria a negar, em razão da sua situação económica, a possibilidade de acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e legítimos interesses, por tal forma frontalmente violando, com o entendimento perfilhado, também o normativo constante do art.20° da C.R.P.

    Deve, por conseguinte, ser concedida...

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