Acórdão nº 3248/09.9TBVCD.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução03 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA intentou acção contra Companhia de Seguros BB, S.A.

e CC Seguros - Companhia de Seguros de Vida, S.A..

Alega a A. que, juntamente com o seu marido (falecido em 10/05/2007), celebrou com o DD, S.A. (actual Banco CC, S.A.), um empréstimo, destinado a pagar o preço de uma fracção autónoma, que passou a ser a sua residência diária até ao presente. Na mesma data da celebração desse contrato entrou em vigor o contrato de seguro de vida celebrado com a EE, correspondente à apólice Vida Grupo nº 30-97…/48…, tendo aquela, por carta de 24 de Agosto de 2000, informado que tinham sido aceites no seguro de vida do grupo, sendo eles as pessoas seguras e beneficiário o DD, quer em caso de morte, quer de vida, e que passaria a debitar mensalmente o valor do prémio de oito mil trezentos e cinquenta e nove escudos na conta bancária que abriram, e com o nº 001/4…, no estabelecimento bancário de Monte Córdova do Banco FF, S.A.

Adianta a A. que, nos termos do referido contrato de seguro, a EE, em caso de falecimento de qualquer uma das pessoas seguras e desde a data dessa ocorrência, obrigava-se a pagar ao DD, S.A. o valor integral das prestações vincendas do contrato de mútuo supra indicado. Porém, ainda segundo a mesma, com efeitos a 1 de Agosto de 2001, sem conhecimento e/ou autorização da A. e marido, a R. EE transferiu a apólice de seguro ramo vida, para a Seguradora CC Central Hispano Seguros - Companhia de Seguros de Vida, S.A., sendo que tal alteração não lhes foi comunicada, nomeadamente pelo DD, pela EE ou pela CC Central Hispano Seguros. Sustenta a A. que esta e o marido provisionaram com regularidade e suficiência a referida conta bancária, à excepção de um período que decorreu no ano de 2003, mas que regularizaram em 10/12/2003, após comunicação da subgerente do Banco FF, através do depósito na sua conta do montante de € 850,00, reforçada por mais três depósitos em Janeiro de 2004, do valor respectivamente, de € 370,00, € 600,00 e € 437,45, retomando por consequência a plena normalidade, a partir de Janeiro de 2004, de todas as prestações de mútuo, incluindo prémios de seguro. Afirma ainda a A. que o DD, por sua vez, também contactou o seu falecido marido, em princípios do ano de 2004, a pedir aquelas prestações de prémios de seguro em atraso, o qual informou aquele banco que já não havia qualquer prestação de prémio de seguro em atraso. Acrescenta a mesma que, face ao silêncio dos bancos, ficaram convencidos de que os prémios de seguro estavam a ser pagos à respectiva seguradora, tendo o irmão do falecido e fiador, GG, por contacto telefónico com a subgerente do Banco FF ficado a saber que o seguro de vida se extinguira, pelo que a Seguradora não era obrigada a pagar ao banco as prestações vincendas. Com base no circunstancialismo relatado formula pedido de que se declare que, à data do falecimento do HH, se encontrava em vigor o contrato de seguro de vida celebrado entre a EE, por um lado, e a A. e o seu falecido marido, por outro, e, em consequência, seja a R. BB Seguros condenada a pagar-lhe as prestações por si pagas até à data da interposição da acção, no valor de € 9.455,77, bem como as que venha a pagar ao Banco CC, emergentes do contrato de mútuo com este celebrado, bem como todas as restantes até amortização integral do valor em dívida.

Subsidiariamente pede que se declare que o mesmo contrato de seguro de vida se transmitiu à R. CC Central Hispano Seguros – Companhia de Seguros de Vida, S.A. (actual CC Seguros), mantendo-se em vigor à data do falecimento do HH e, em consequência, se condene esta R. a pagar-lhe as prestações nos moldes assinalados no pedido principal.

Na contestação, a R. Companhia de Seguros BB, S.A.. alega que não celebrou ou subscreveu com a A. ou com o seu falecido marido o invocado contrato de seguro, a que corresponde a apólice n° 97…, o qual foi antes celebrado entre a Companhia de Seguros EE, S.A. (actualmente, Companhia de Seguros BB, S.A.) e a Companhia Geral de DD, com data de 26/05/1998. Alega que, em 04/01/2001, seguradora e tomadora de seguro estabeleceram cláusula que permitia a esta anular ou transferir a apólice desde que aquela fosse notificada de tal facto com a antecedência mínima de 30 dias, mantendo-se as demais condições em vigor em 31/12/2000 para a anuidade compreendida entre 01/01/2001 e 31/12/2001. Por carta de 26/06/2001, a II Serviços - Sociedade Correctora de Seguros, Lda. comunicou à Companhia de Seguros EE, S.A. que o tomador do seguro e segurado (Companhia Geral de DD) havia ordenado a transferência do contrato da apólice 97… (entre outros) para a CC Central Hispano Seguros Companhia de Seguros de Vida, S.A., com efeito a partir de 01/08/2001, tendo sido remetida a esta toda a documentação relativa às subscrições, pelo que o dito contrato cessou com a contestante, que nele deixou de ser entidade seguradora. Com esse fundamento, pede a sua absolvição do pedido.

O R. CC Seguros (CCS) também contestou, referindo que contactou o banco mutuante, o Banco CC, S.A., dando-lhe conta de que pretendia declarar a resolução do contrato de seguro de vida face à situação de mora em que o pagamento dos prémios de seguro se encontravam, pelo que, com o prévio acordo do banco mutuante, o CCS procedeu à dita resolução. Mais refere que a A. e o fiador sabiam da transferência do seguro da EE para a CCS, sabendo ainda estes e o falecido marido da A. que o CCS resolvera o contrato de seguro em Maio de 2004.

Na réplica a Autora pugna pela validade do contrato de seguro, e pede a intervenção provocada com pedido subsidiário contra o Banco CC, S.A., alegando que, se provado ficar o bom fundamento da resolução, então esta se deveu a omissão culposa de uma obrigação que o Banco assumiu para com a A. e falecido marido, de debitar a sua conta pelos prémios de seguro, desde que a mesma tivesse provisão, e ainda de debitar, em caso de mora, as prestações mais antigas e não as mais recentes. Invoca a existência de prejuízo igual ao valor do pedido formulado contra as RR.

Admitida a intervenção do Banco CC, S.A., (BCC) por despacho de fls. 135, veio este contestar, afirmando tratar-se de um contrato de seguro de vida, contributivo, sendo que o prémio, fixado pela seguradora, era devido a esta e não ao banco. Acrescenta que, apesar de ser titular de um interesse na manutenção do seguro, pois é beneficiário do mesmo, não tem qualquer direito próprio ao recebimento do prémio desse seguro. Refere que a resolução do seguro de vida foi operada pela seguradora por falta de pagamento de prémios de seguro devidos, sendo o banco alheio a esse facto pois não podia nem tinha que proceder ele próprio à regularização dessa dívida, concluindo que o banco não violou qualquer obrigação legal ou contratual que fosse causa da resolução do contrato, pelo que não pode ser responsabilizado pela mesma.

Por sentença de fls. 415, foi a acção julgada totalmente improcedente e, em consequência, foram os RR. e o Interveniente Principal absolvidos de todos os pedidos.

Inconformada, a A. interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto. Por acórdão de fls. 585, foi decidido proceder, oficiosamente, à alteração da matéria de facto, eliminando o ponto 15º dos factos provados e, quanto ao mais, foi julgada a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.

  1. Veio a A. interpor recurso de revista excepcional para o Supremo Tribunal de Justiça com fundamento na alínea c), do nº 1, do art. 672º, do Código de Processo Civil. A fls. 731, por acórdão da Formação a que alude o nº 3 do mesmo artigo, não se admitiu a revista excepcional por não se verificarem os respectivos pressupostos, ordenando-se a remessa dos autos à distribuição como revista normal para a eventualidade de não se verificar dupla conforme.

    Da decisão de não admissão da revista excepcional interpôs a A. recurso para o Tribunal Constitucional. Por acórdão do Tribunal Constitucional de fls. 792, foi confirmada a decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso.

  2. Devolvidos os autos a este Supremo Tribunal, por despacho de fls. 845 ordenou-se a notificação das partes para se pronunciarem acerca da questão prévia da possível verificação de dupla conforme.

    A R. BB, S.A. pugnou pela irrecorribilidade do acórdão recorrido.

    A A. apresentou as seguintes alegações: 1ª - Reanalisados os Acórdão da Relação e a sentença da 1ª instância, de facto, detetam-se as seguintes diferenças substanciais na fundamentação acolhida pelo la em relação à 2ª.

    1. – A 1ª diferença diz respeito ao regime jurídico do contrato de seguro ramo vida, cuja subsistência ou não estava em causa nos presentes autos.

    2. - Disse a sentença da 1ª instância o seguinte: " ... Sucede que no dia 1 de Janeiro de 2009 entrou em vigor o DL nº 72/2008, de 16 de Abril, rectificado pelas Declarações de Rectificação nºs 32-A/2008, de 13 de Junho e 39/2008, de 23 de Julho, que aprovou o regime jurídico do contrato de seguro (artºs 1 e 7 daquele diploma legal).

      O mesmo diploma revogou expressamente, entre outras normas, as constantes dos artºs 425 a 462 do Código Comercial, aprovado por Carta de Lei de 28 de Junho de 1888 e dos artºs 1 a 5 e 8 a 25 do DL nº 176/95, de 26 de Julho (artº 6).

      Ora, de harmonia com as normas de direito transitório da nova lei, ela é aplicável ao conteúdo de contratos celebrados em data anterior que subsistam à data do seu início de vigência e relativamente aos contratos de seguro com renovação periódica, a partir da primeira renovação posterior à data da sua entrada em vigor (artºs 2 nº 1 e 3 nº 1 do Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril. E por força das ditas normas de direito intertemporal da lei nova, de acordo aliás com os princípios gerais de aplicação da lei no tempo, o estatuto do contrato de seguro - as condições da sua validade (capacidade, vícios do consentimento, forma etc.) bem como os efeitos da sua invalidade - é regulado pela lei vigente ao tempo em que foi celebrado (art. 120...

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