Acórdão nº 10/04.9TBSTB.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução22 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça SEGURO AA, S.A., actualmente SEGURO AA, S.A. instaurou, em 31.12.2003, no Tribunal Judicial da Comarca de …, acção declarativa, com processo ordinário, contra: 1.

BB, Lda.

, e; 2.

SEGURO CC, S.A., actualmente, “SEGURO CC, S.A.” Pedindo que as Rés sejam condenadas a pagar-lhe a quantia de € 17.721,48, acrescida de juros vencidos calculados sobre o capital em dívida, a contar desde a citação até integral pagamento e, ainda, as pensões que se vencerem e que forem pagas na pendência da acção, mais as pensões que se vencerem no futuro, a liquidar em execução de sentença.

Alegou, em síntese, que, no exercício da sua actividade seguradora, celebrou com a sociedade DD, Lda. um seguro de acidentes de trabalho.

O trabalhador dessa empresa, EE, estava abrangido pelas garantias da apólice respectiva, sucedendo que, no dia 4 de Dezembro de 2001, nas instalações da 1ª Ré e quando estava ao serviço da sua entidade patronal, o referido EE sofreu um acidente do qual resultou a sua morte, imputando a autora a ocorrência desse acidente à 1ª ré.

Mais alegou que, no âmbito de contrato de seguro celebrado com a entidade patronal do mencionado trabalhador, pagou a terceiros e aos familiares do falecido várias quantias, nomeadamente despesas médicas e pensões, das quais se quer ver reembolsada.

A “DD, Lda.” requereu a sua intervenção principal ao lado da autora contra as mesmas rés, alegando, no essencial, os mesmos fundamentos da autora e pedindo que as rés sejam condenadas a pagar-lhe: - a quantia de € 19.859,39 acrescida de juros vincendos calculados sobre o montante em dívida, a contar da citação até integral pagamento; - as pensões que se vencerem e que forem pagas na pendência da presente acção; - as pensões vitalícias a pagar à viúva que se vencerem no futuro; - as pensões futuras a pagar aos filhos menores até perfazerem 18, 22 ou 25 anos; - todos os encargos bancários presentes e futuros, relacionados com garantia bancária prestada, tudo a liquidar em execução de sentença.

A SEGURO CC, S.A. (2ª ré), com a actual denominação de SEGURO CC, S.A. contestou, afirmando que a culpa do acidente se deveu à conduta da ré BB (1ª ré), que não implementou no local as medidas de segurança necessárias a evitar o acidente, pelo que os danos decorrentes daquele acidente estão excluídos da cobertura do seguro celebrado entre si e aquela ré.

A 1ª ré contestou, dizendo ser parte ilegítima por o valor do pedido estar abrangido pela cobertura do seguro celebrado com a 2ª ré, alegando não ter qualquer responsabilidade na ocorrência do sinistro.

Pediu a intervenção principal de FF, Lda., afirmando que esta se encontrava a executar uma obra no local e que era à mesma que cabia a implementação das medidas de segurança necessárias a evitar a ocorrência de acidentes.

Terminou, pedindo pela improcedência da acção no que a ela respeita.

Foram admitidas as intervenções de “DD” e de “FF”, tendo esta contestado e declinado qualquer responsabilidade na ocorrência do acidente em discussão nos autos.

Na audiência preliminar, a 1ª Ré desistiu da invocação da excepção da sua ilegitimidade, o que foi admitido.

Saneado o processo e discriminados os factos assentes e os controvertidos, prosseguiu aquele a sua tramitação, vindo a realizar-se audiência de julgamento com decisão da matéria de facto controvertida.

*** Foi proferida sentença em cujo dispositivo se consignou o seguinte: “Nos termos que se deixam expostos, condeno solidariamente as Rés e Interveniente, respectivamente, BB, Lda., SEGURO CC, S.A. e FF, Lda., esta representada pelos seus sócios GG e HH a pagar à Autora SEGURO AA, S.A.

a quantia total de € 52.074,45 (cinquenta e dois mil, setenta e quatro euros e quarenta e cinco cêntimos) (80% da soma: 58.669,48+4010,28+1908,07+505,23) e à Autora DD, Lda.

a quantia de € 15.916,28 (quinze mil, novecentos e dezasseis euros e vinte e oito cêntimos) (80% da soma 14.555,34+ 514,37+2.760,66+2.064,99).

Sobre as quantias acima referidas são devidos juros de mora vencidos e vincendos, calculados desde a citação até integral pagamento relativamente ao pedido inicial e desde a notificação respetiva relativamente à ampliação do pedido, à taxa vigente para os juros civis.

Os sócios da extinta FF, Lda. respondem pela dívida da sua representada na medida do que receberam na liquidação dessa sociedade.

Custas na proporção de decaimento”.

*** Inconformadas, a 2ª Ré e as Autoras apelaram da sentença, para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 17.12.2015 – fls. 1183 a 1206 – sentenciou: “Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedentes os recursos da Ré SEGURO CC, S.A. e da Autora DD e improcedente o recurso da autora SEGURO AA, S.A. e, em consequência, alteram a sentença nos seguintes termos: a) Condenam-se solidariamente as rés e interveniente, respectivamente, BB, Lda., SEGURO CC, SA e FF, Lda., esta representada pelos seus sócios GG e HH, a pagar à Autora SEGURO AA, S.A. a quantia total de € 52.074,45 [80% da soma de 58.669,48+4010,28+1908,07+505,23], deduzindo-se a franquia de € 4.978,98 relativamente à ré SEGURO CC; b) Condenam-se solidariamente as mesmas rés e interveniente a pagar à Autora DD, Lda. a quantia de € 15.916,28 [80% da soma de 14.555,34+ 514,37+2.760,66+2.064,99], deduzindo-se a franquia de € 1.591,63 relativamente à ré SEGURO CC, bem como as pensões vencidas e pagas na pendência da presente acção, as pensões vitalícias a pagar à viúva que se vencerem no futuro, as pensões futuras a pagar aos filhos menores até perfazerem 18, 22 ou 25 anos e todos os encargos bancários presentes e futuros, relacionados com garantia bancária prestada, tudo a apurar em incidente de liquidação.

c) Manter no mais a sentença recorrida.

Custas pelas partes, na proporção do respectivo vencimento, tal como resulta deste acórdão, em ambas as instâncias.” *** Inconformada a Ré SEGURO CC, S.A. (que anteriormente num primeiro momento se denominou SEGURO CC, S.A. e num segundo, SEGURO CC, S.A.), recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, e alegando, formulou as seguintes conclusões: 1- O contrato de seguro celebrado entre a Recorrente SEGURO CC, S.A. e a Ré BB, Lda., não foi celebrado no cumprimento de um dever legal de segurar, antes correspondendo ao exercício, por parte da entidade tomadora do seguro, de uma faculdade que lhe não é imposta lei; 2- A lei não, e muito menos relativamente a contrato de seguro cuja celebração não releve da obrigação de segurar, a delimitação do âmbito das coberturas, e a definição do que fica coberto e do que resta excluído da garantia de seguro, podendo as partes estipular o que a tal título pretendam 3- O contrato de seguro “sub judice” em vigor à data do acidente que nos autos se discute, era um contrato formal, na medida em que a redução a escrito do mesmo era, ao tempo, uma exigência legal condicionante da legalidade do mesmo.

4- A exclusão da cobertura, constante da al. b) do n°1 do art. 4° das Condições Gerais da apólice de seguro que titula o contrato de seguro referido na conclusão 1, releva do princípio da liberdade de contratação e estipulação próprias do direito privado, estando reduzida a escrito.

5- A referida alínea, interpretada de um ponto de vista sistemático e tendo em consideração a totalidade das cláusulas (artigos) do mencionado contrato de seguro não pode ser interpretada como dizendo respeito (e muito menos dizendo somente respeito) a acidentes sofridos por empregados da entidade tomadora do seguro/segurada, pois que a exclusão de tal tipo de sinistros se encontra expressamente prevista na alínea i) do n°1 desse mesmíssimo artigo contratual; 10 - Em sentido contrário ao acabado de referir e, nomeadamente a interpretação restritiva que o douto acórdão recorrido faz da alínea b) do n° l do art. 4° das Condições Gerais do seguro “sub judice”, a o texto contratual de tal modo que, a prevalecer, a declaração negocial dele constante deixaria de ter um mínimo de correspondência com o clausulado escrito, do contrato: 7- O acidente que nos autos cabe no âmbito da alínea b) do nº1 do art. 4º das Condições da apólice, estando por isso excluído da cobertura de seguro; 8 - Ao assim não ter entendido o douto acórdão sob recurso violou o disposto nos arts. 236º, n º1, e 238º, nº1, do Código Civil; 9- A exclusão constante da alínea b) do n°l do art. 4° das Condições Gerais do contrato de seguro, não esvazia o objecto da cobertura de seguro, não ofende a boa fé contratual e muito menos pode ser considerada uma cláusula abusiva; 10 - Ao assim não ter entendido o douto acórdão recorrido violou o disposto nos arts.10º e 11º do Dec.-Lei n° 446/85 de 25 de Outubro: 11 – Atenta a matéria de facto assente a comparticipação culposa da vítima deveria ter sido valorada na proporção de metade; 12 - Ao assim não ter entendido o douto acórdão recorrido violou o disposto no art. 571º, n°1, do Código Civil[2].

13- Deve por isso ser dado provimento à revista deduzida pela ora Recorrente, considerando que, face à matéria de facto assente e ao direito aplicável, o acidente que nos autos se discute cai na previsão da exclusão da cobertura de seguro constante da al. b) do nºl do art. 4° das Condições Gerais e Especiais da apólice absolvendo-se a Ré ora recorrente, e na totalidade, do pedido; 14 - Caso assim se não entendesse, o que só por mera hipótese de raciocínio e dever de patrocínio se aduz, sempre a Ré ora recorrente só poderia ser condenada a pagar 50% do valor arbitrado, deduzido que ao mesmo ainda fosse o montante de € 4.897,98 correspondente à franquia contratual.

Justiça.

A recorrida SEGURO AA, S.A., contra-alegou sustentando ser o recurso parcialmente inadmissível por existir dupla conforme quanto à percentagem de divisão de culpa, entre o sinistrado e as Rés, facto que a recorrente aceitou, pese embora o erro ao referir que tais percentagens que são de igual proporção – 50%. Na verdade, as instâncias consideraram ser de 20% para a vítima e 80% para...

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