Acórdão nº 571/15.7T8EVR-A.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelANTÓNIO JOAQUIM PIÇARRA
Data da Resolução24 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório I – Por apenso à acção declarativa que instaurou contra AA e BB, CC - Agricultura Biológica, Ldª.

requereu o arresto dos bens que relacionou, invocando justo receio da perda da garantia patrimonial do crédito que alegou ter sobre aqueles.

Decretado o arresto, o requerido deduziu oposição e, feita a prova adicional, foi ordenado o levantamento do arresto.

Inconformada, a requerente apelou (impugnando de facto e de direito), sem êxito, tendo a Relação de Évora confirmado o decidido na 1ª instância, e, persistindo inconformada, interpôs recurso de revista excepcional, finalizando a sua alegação, com as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora está em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 01-10-2015, Relatora Ana Luísa Geraldes, quanto ao exercício do ónus de formular conclusões no que respeita à impugnação da matéria de facto; 2. O douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora está em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-07-2015, Relator Fernandes do Vale, quanto ao exercício do ónus de formular conclusões no que respeita a matéria de direito e às consequências do seu incumprimento.

  1. No que diz respeito ao ónus de formular conclusões quanto à impugnação da matéria de facto, o Tribunal a quo entendeu que os artigos 637.°, n.° 2 e 640.°, n.° 1 e 2, a), devem ser interpretados no sentido de que os depoimentos que implicam a alteração da decisão da matéria de facto, bem como as passagens da gravação que sustentam tal entendimento, devem constar das conclusões, o que constitui contradição com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 01-10-2015, que considerou que tais elementos apenas devem constar da motivação do recurso.

  2. No que diz respeito ao ónus de formular conclusões no que respeita à impugnação da matéria de direito e às consequências do seu incumprimento, o Tribunal a quo entendeu que o artigo 639.° deve ser interpretado no sentido de que a consequência da irregularidade das conclusões formuladas pelo recorrente é a improcedência da impugnação da matéria de direito.

  3. Entrando, desta forma, em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-07-2015, que considerou que, em caso de irregularidade das conclusões, deve o Tribunal proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento, ou ainda, se apesar da irregularidade for possível discernir o sentido das conclusões, conhecer da impugnação de direito.

  4. Quanto à questão de mérito, a recorrente discorda do entendimento preconizado pelo Tribunal a quo do conteúdo do ónus de formular conclusões quanto à impugnação da matéria de facto.

  5. Entende a recorrente que os artigos 637.°, n.° 2 e 640.°, n.° 1 e 2, a) do CPC devem ser interpretados no sentido de bastar a menção, nas conclusões, dos concretos pontos da matéria de facto que deviam ter sido objecto de decisão diferente por parte do Tribunal.

  6. Não sendo necessário que se indiquem os concretos meios probatórios que suportam tal entendimento nas conclusões, bastando que tal fundamentação conste da motivação do recurso.

  7. A recorrente discorda igualmente da interpretação efectuada pelo Tribunal a quo do conteúdo do ónus de formular conclusões quanto à impugnação da matéria de direito e das consequências do seu incumprimento.

  8. Resulta do disposto no artigo 639.°, e, em especial, do seu n.° 3, que perante a irregularidade das conclusões do recurso, deve o Tribunal proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento das mesmas.

  9. Não podendo o Tribunal, perante a incapacidade de compreender as conclusões, aceitar conhecer do recurso para se pronunciar no sentido da improcedência da impugnação de direito devido à sua insuficiência.

  10. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou, pelas razões já aduzidas nas presentes conclusões, o disposto nos artigos 637.°, n.° 2, 639.°, em especial 639.°, n.° 3 e 640.°, n.° 1 e 2, ai. a).

  11. Devendo, como tal, o acórdão proferido ser revogado e substituído por outro que convide a recorrente a completar as suas conclusões, no que concerne à matéria de direito, devendo igualmente o Tribunal ad quem pronunciar-se quanto ao conteúdo do ónus de formular conclusões quanto à impugnação da matéria de facto.

Os requeridos não ofereceram contra-alegação e o processo foi presente à formação prevista no art.º 672º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil, que decidiu pela inadmissibilidade da revista excepcional, determinando a sua distribuição como revista normal.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir sobre a invocada contradição de julgados, quanto ao modo de exercício do ónus imposto ao apelante que impugne a decisão da matéria de facto e ainda quanto ao efeito decorrente da insuficiência das conclusões relativas à impugnação de direito.

II - Fundamentação de facto A factualidade inicialmente dada como indiciariamente demonstrada pela 1ª instância é a seguinte: a) À requerente pertence o prédio misto situado na Herdade de …, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Montemor-o-Novo na ficha nº 7…/… da freguesia de Silveiras, inscrito na respectiva matriz sob os artigos 6… (urbano), 4… (urbano) e 1… (rústico), tendo adquirido o mesmo, por escritura datada de 30 de Dezembro de 2011, às suas sócias DD e EE.

  1. A requerente tem como objecto social a exploração da indústria agrícola, a transformação e comercialização de derivados de produtos naturais e a produção de vinho e azeite, tendo a sua sede social na Herdade de …, desde o momento da sua constituição.

  2. A Herdade de … tem uma área de 121,075 hectares, dos quais 36 hectares são de vinha, 20 hectares são olival de regadio, sendo a restante área coberta por sobro e pasto.

  3. No dia 4 de Outubro de 2011, as únicas sócias e gerentes da requerente (DD e EE) e os requeridos celebraram um acordo que denominaram “contrato-promessa de compra e venda” cujo objecto foi o prédio urbano identificado em a).

  4. O acordo referido em d) foi designado pelas partes como “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Prédio Misto, de Cessão de quotas e de Suprimentos, e de Compra e Venda de Activos Imobilizados e Existências” e os requeridos comprometeram-se a, alternativamente: “i) Comprar, livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades, o prédio misto, pelo valor de €600.000,00, a sociedade detida pelas primeiras outorgantes (sócias da ora autora), pelo valor de €1,00, e os suprimentos mencionados no Considerando 4), pelo valor de €299.999,00; ou ii) Comprar, livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades, o prédio misto, pelo valor de €600.000,00, e os activos imobilizados e existências detidos pela sociedade, pelo valor de €300.000,00, valor ao qual não acrescerá qualquer montante a título de Imposto sobre o Valor Acrescentado; ou iii) Comprar, livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades, e em primeiro lugar, a Sociedade detida pelas primeiras outorgantes (sócias da ora autora), pelo valor de €1,00, e os suprimentos mencionados no Considerando 4), pelo valor de €299.999,00, comprometendo-se igualmente as primeiras outorgantes a vender, posteriormente, o prédio misto a favor dessa sociedade, actualmente responsável pela exploração e gestão do mencionado prédio, pelo valor de €600.000,00”.

  5. Nos termos da Cláusula Terceira do acordo referido em d), a escritura pública de compra e venda ou os contratos definitivos deveriam ter sido outorgados até ao dia 31 de Março de 2012.

  6. A escritura supra referida ainda não foi celebrada.

  7. Encontra-se pendente uma acção (de execução específica) proposta pelos ora requeridos que corre os seus termos sob o número 105/14.OTBMMN na Secção Cível – J2 deste Tribunal, cujo objecto do litígio é o cumprimento do acordo referido em d).

  8. Na mesma data (4 de Outubro de 2011), as sócias da requerente (DD e EE) e os requeridos celebraram um acordo que denominaram de “contrato de comodato”.

  9. Nos termos da Cláusula Primeira do acordo referido i), as sócias da requerente comprometeram-se: “Entregar gratuitamente aos Segundos Outorgantes o prédio misto para que estes se sirvam dele até ao mês de Março de 2012, podendo ainda fazer seus os frutos colhidos e colher os pendentes, embora suportando os custos de guarda e conservação do prédio misto, nos termos do artigo 1135º, alínea a) do Código Civil”. Mais acordaram as partes que “nesta medida, os Segundos Outorgantes assegurarão o pagamento das despesas de manutenção do prédio misto, designadamente no que respeita aos salários dos Caseiros e Engenheira Agrícola e despesas de telefone, água e electricidade”.

  10. Os requeridos passaram a usar o referido prédio urbano a partir do mês de Outubro de 2011.

  11. Os requeridos não cuidaram da vinha, pois não recolheram as uvas, não podaram as cepas, não fertilizaram, nem desinfestaram as mesmas.

  12. Permitiram o acesso e livre circulação de diversos ruminantes de grande porte que ali se alimentaram, destruindo grande parte da vinha e o sistema de regadio.

  13. Os requeridos também não cuidaram do olival, pois não recolheram as azeitonas, não fizeram a poda, nem a sua fertilização e desinfestação, o que determinou o perecimento da maioria das árvores existentes.

  14. Desactivaram os sistemas de refrigeração e climatização que asseguravam a conservação do stock de vinho...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT