Acórdão nº 605/11.4TTLRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2016
Magistrado Responsável | ANA LUÍSA GERALDES |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – 1. AA Instaurou a presente acção especial de acidente de trabalho contra: SEGURO BB Pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe:
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A pensão anual e vitalícia, anualmente actualizável, a partir de 22.07.2003, calculada com base no salário anual do sinistrado e na I.P.P. de que é portador, em virtude do acidente de trabalho que sofreu, em 17-1-2003; b) Os juros moratórios vencidos e vincendos sobre a pensão que lhe vier a ser reconhecida, devidos desde o dia seguinte ao da alta e até integral e efectivo pagamento; c) A quantia de € 38,00, a título de despesas efectuadas com deslocações obrigatórias ao Tribunal e ao GML.
Alegou, para tanto e em síntese, que foi vítima de um acidente, em 2003, enquanto trabalhava como jogador profissional de futebol, sob as ordens, direcção e fiscalização de “CC – Sociedade Desportiva de Futebol, S.A.D.” À data do sinistro o A. auferia a retribuição de € 150.000,00 (€ 12.500,00 x 12 meses/ano) e a SAD transferiu a sua responsabilidade infortunística por acidentes de trabalho para a Ré Seguradora, sendo, por isso, a Ré responsável pelo pagamento das quantias peticionadas.
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O Autor foi submetido a exame médico na fase conciliatória, tendo-lhe sido atribuída uma incapacidade permanente parcial de 10%.
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Na tentativa de conciliação efectuada, a Ré Seguradora não aceitou pagar-lhe qualquer pensão por entender que, para além de ter caducado o direito de acção, o sinistrado se encontrava curado, sem qualquer desvalorização, desde 21/7/2003.
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Aberto apenso para fixação de incapacidade, o Tribunal proferiu a seguinte decisão: “Nos presentes autos de acção emergente de acidente de trabalho, com processo especial, em que é sinistrado AA e ré SEGURO BB, todos melhor identificado nos autos, foi determinado se abrisse apenso tendo em vista a fixação de eventual incapacidade de que o sinistrado seja portador.
Foi designada data para a realização de exame médico.
Efectuado o exame, conforme fls. 36 a 38, os Srs. peritos médicos concluíram por unanimidade que o sinistrado apresenta instabilidade residual em valgo e amiatrofia da coxa de 1 cm e subjectivos dolorosos do joelho esquerdo, atribuindo-lhe a IPP de 7,5% desde 21.07.2003.
Responderam ainda que, tendo em conta o tipo de actividade do sinistrado, que implica permanente esforço, carga e equilíbrio dos membros inferiores, as sequelas resultantes do acidente determinaram uma diminuição da função necessária e imprescindível ao bom desempenho da sua actividade.
Não existem razões para duvidar da conclusão a que chegaram os Srs. peritos (por unanimidade), sendo que não possuímos conhecimentos ou competências técnico-científicas bastantes que nos habilitem a pôr em causa o laudo pericial.
Decisão: Pelo exposto o Tribunal decide que: - O sinistrado apresenta instabilidade residual em valgo e amiatrofia da coxa de 1 cm e subjectivos dolorosos do joelho esquerdo, sendo de atribuir a IPP de 7,5% desde 21.07.2003.
- Tendo em conta o tipo de actividade do sinistrado, que implica permanente esforço, carga e equilíbrio dos membros inferiores, as sequelas resultantes do acidente determinaram uma diminuição da função necessária e imprescindível ao bom desempenho da sua actividade”.
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Efectuado o julgamento, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva tem o seguinte conteúdo: “Pelo exposto, declaro que o autor sofre da I.P.P. de 7,5%, desde 22.07.2003.
Condeno a seguradora a pagar ao sinistrado: a) a pensão anual e vitalícia, anualmente actualizável, de € 7.875,00, reportada a 22.07.2003; b) os juros moratórios vencidos e vincendos sobre tal pensão, devidos desde o dia seguinte ao da alta, até integral e efectivo pagamento; c) a quantia de € 38,00, a título de despesas efectuadas com deslocações obrigatórias ao Tribunal e ao GML.
Custas pela seguradora Valor da acção: o preceituado no art. 120º do C.P.T”.
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Interposto recurso de apelação, foi revogada a sentença e a Ré Seguradora absolvida do pedido pelo Tribunal da Relação de Coimbra.
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Irresignado, o A. interpôs recurso de revista, no qual formulou as seguintes conclusões: A) O aresto em crise viola, entre outras, as normas constantes na al. f), do nº 1, do art. 59°, da CRP, assim como o disposto no art. 607º, na al. b), do nº 2, do art. 662º, do CPC e, ainda, o disposto nos arts. 341º, 342º e 388° do CC.
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No Acórdão recorrido existiu ofensa de disposição expressa de lei que exigia certa espécie de prova para a existência do facto, assim como de normativo que fixa a força de determinado meio de prova.
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O caso sub judice reporta-se a direitos indisponíveis por emanar de acidente de trabalho (art. 35º, da Lei 100/97, de 13/09).
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De forma a assegurar o Direito Constitucional dos trabalhadores à assistência e justa reparação dos acidentes de trabalho de que sejam vítimas, o legislador regulamentou um processo especial, no qual estão consagradas a realização de duas perícias médicas, uma singular e de carácter obrigatório, e uma colegial.
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A prova pericial assume um papel fundamental nas acções emergentes de acidentes de trabalho, o que se justifica pela especial complexidade da matéria de facto em apreciação, i.e., a avaliação médico-legal de dano corporal.
F)No caso em apreço, a simples análise da posição dos senhores peritos médicos, quer do perito que realizou o exame singular, quer dos três médicos que integraram a Junta Médica, impõe decisão diversa da que foi proferida.
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Todos os peritos médicos que observaram o sinistrado, no âmbito destes autos, sem excepção, consideraram que do acidente ocorrido, em 17/01/2003, resultaram lesões, das quais resultaram sequelas que reduziram a capacidade de trabalho e de ganho do sinistrado.
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Ou seja, reconheceram todos os peritos médicos que realizaram os exames médicos previstos na lei que existe nexo de causalidade entre as sequelas que o sinistrado actualmente apresenta e as lesões resultantes do acidente que sofreu, em 17/01/2003.
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Contudo, o Tribunal da Relação fez tábua rasa da opinião dos peritos médicos, tendo formulado a sua convicção exclusivamente com base no depoimento de uma testemunha apresentada pela Recorrida, Prof. DD, antigo director do IML de Coimbra.
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A falta de fundamentação da posição sufragada pelos peritos médicos não determina que não sejam valoradas as respostas por aqueles formuladas.
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Acresce que a perícia por Junta Médica foi presidida pelo MMº Juiz da 1ª Instância, que teve oportunidade de colocar todas as questões que se lhe afiguraram pertinentes, escutar as respostas e solicitar todos os esclarecimentos necessários à boa decisão da causa.
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Já o Tribunal recorrido não teve tal oportunidade. Tendo constatado a falta de fundamentação, devia o Tribunal da Relação ter ordenado a notificação dos senhores peritos médicos para que fundamentassem as suas respostas, de acordo com o disposto na al. b), do nº 2, do art. 662°, do CPC.
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Ou, poderia ter determinado a devolução dos autos ao Tribunal de 1ª instância, para que este levasse a cabo as diligências necessárias à obtenção da fundamentação das respostas formuladas pelos peritos médicos.
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E assim é porque a Lei atribui ao Julgador, nos processos emergentes de acidentes de trabalho, um especial poder dispositivo com vista ao apuramento da verdade dos factos e da busca da verdade material, uma vez que se tratam de direitos indisponíveis.
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A livre apreciação da prova pericial não significa prova arbitrária.
P)Existindo prova pericial, o Julgador está amarrado ao juízo pericial, sendo que sempre que dele divergir deve fundamentar esse afastamento, exigindo-se um acrescido dever de fundamentação.
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Com o devido respeito, o Tribunal recorrido violou esse dever de fundamentação que se encontra consagrado no artigo 607º do CPC.
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Ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou de igual forma o espírito normativo subjacente aos processos emergentes de acidentes de trabalho.
S)Da violação das citadas normas e princípios resultou a prolação de uma decisão ilegal.
T)Nestes termos, e nos demais de direito, que este Tribunal Superior suprirá, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado o Acórdão recorrido, julgando-se a acção totalmente procedente, ou caso assim não se entenda, ser ordenada a devolução do processo ao Tribunal recorrido para que este ordene a notificação dos peritos médicos, que realizaram o exame singular e a Junta Médica, para que fundamentem as respostas que deram aos quesitos apresentados pela Companhia de Seguros.
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Pela Ré Seguradora foram apresentadas contra-alegações reiterando a posição defendida nos presentes autos, e que se sintetizam nos seguintes termos: a) Contrariamente ao que diz pretender, o Recorrente não pugna pela reparação de qualquer ofensa pelo Tribunal recorrido de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
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O que o Recorrente não aceita é a avaliação da prova que, correcta e justamente, fez o Tribunal recorrido, o que não pode ser fundamento do presente recurso de revista, que, por isso, não pode ser admitido, ou, então, terá de improceder, em consonância com o art. 674º do CPC.
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Inexiste igualmente qualquer violação de normas como as dos arts. 341º, 342º e 388º do C. Civil, 607º e 662º do CPC.
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Foram cumpridas as regras processuais sobre a produção de prova e sobre a repartição do respectivo ónus, cabendo ao sinistrado a prova do nexo de causalidade entre as lesões do acidente e a incapacidade permanente observada mais de dez anos depois.
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Também foi observada a regra da submissão do sinistrado a avaliação por perícia colegial, submetida ao poder de livre apreciação pelo Tribunal, ponderando os diversos elementos disponíveis nos autos.
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Ao fazer uma apreciação conjugada dos depoimentos das diversas testemunhas inquiridas, do relatório pericial da junta médica e da opinião médico-legal trazida aos autos pela entidade responsável, o...
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