Acórdão nº 2835/14.8TCLRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução07 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. 2835/14.8TCLRS.L1.S1 R-550[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça “Associação de Proprietários e Moradores do AA, Zona Norte”, intentou, em 13.5.2014, no Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Loures – Vara de Competência Mista – acção declarativa de condenação sob forma de processo comum – contra: 1. BB 2. CC; 3. DD; 4. EE; 5. FF; 6. “GG-Mediação Imobiliária, Lda.” Alegaram que o primeiro Réu se apropriou de património da Autora e foi condenado em processo-crime a devolver os lotes identificados.

O primeiro Réu passou o património para a 6ª Ré que tinha como sócios os outros réus filhos do primeiro.

Concluiu, pedindo que se julgue procedente a impugnação e declare a ineficácia dos actos de alienação dos 10 lotes em relação à Autora e, ordene a restituição desses imóveis, reconhecendo a possibilidade da Autora executar ou praticar actos de conservação de garantia patrimonial sobre os referidos imóveis na medida do seu direito de crédito no património da 6ª Ré.

Notificados para contestar, impugnaram os factos e invocaram a excepção da litispendência com o processo-crime a correr termos sobre os mesmos factos, além da caducidade da acção.

As excepções foram julgadas improcedentes.

*** Dispensada a audiência prévia, saneados os autos, decididas as excepções, no despacho saneador foi proferida decisão que julgou improcedente a acção.

*** Inconformada a Autora recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por Acórdão de 22.10.2015 – fls. 587 a 602 –, negou provimento ao recurso confirmando a decisão recorrida.

*** De novo inconformada recorreu de revista excepcional para este Supremo Tribunal de Justiça, – que admitiu o recurso por Acórdão de fls.657 a 659 – e, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1. O n.°3 do art. 721° do Código de Processo Civil aplicável ex vi artigo 7.°, nº1, da Lei 41/2013 de 26 de Junho que aprova o Novo Código de Processo Civil consagra a dupla conforme, sendo que é admitido excepcionalmente recurso de revista nos termos do artigo 672.° n.°1 alínea a) do Novo Código de Processo Civil.

2. Para que seja admitida a Revista Excepcional, exige-se que a questão possa entrar em colisão com valores sócio-culturais suscitar alarme social em que, nomeadamente, fique posta em causa a eficácia do direito e a sua credibilidade, por se tratar de casos em que há um invulgar impacto na situação da vida que a norma ou as normas jurídicas em apreço visem regular, ou em que exista um interesse comunitário que, pela sua peculiar importância, pudesse levar ir, por si só, à admissão da revista por os interesses em jogo ultrapassarem significativamente os limites do caso concreto.

3. Com esta decisão o Tribunal da Relação de Lisboa não logrou apreciar a ineficácia dos actos de alienação dos dez lotes, e bem assim determinar a restituição desses imóveis, reconhecendo à Recorrente a possibilidade de executar ou praticar os actos de conservação de e garantia patrimonial obre os respectivos imóveis na medida do seu direito de crédito.

4. Os interesses comunitários aqui em causa visam não só a afectação da comunidade em geral, mas sobretudo a que respeita à associação de moradores do bairro de génese ilegal, composto sobretudo por reformados e pessoas com baixos recursos económicos, atento o reflexo de decisões que resultem de uma parca ponderação de valores e que, naturalmente, implica a degradação de tais interesses, quando não são atendidos os seus direitos.

5. É importante referir que o 1° Recorrido foi presidente da Recorrente e que, por essa via e na qualidade de representante legal, adjudicou e registou a seu favor inúmeros lotes e, acto contínuo, outorgou em dia 27 de Junho de 2002 uma procuração a favor dos 2.° e 3.° Recorridos, conferindo-lhes poderes necessários para vender ou prometer vender os bens dos quais se havia indevidamente apropriado.

6. Nessa sequência foi feita uma denúncia por um grupo de 79 proprietários da Recorrente – com data de 2 de Maio de 2002, na Procuradoria-Geral da República, a qual deu origem ao processo-crime no qual o 1.° Recorrido foi condenado por 1 (um) crime de falsificação e 1 (um) crime de burla qualificada.

7. A verdade é que a partir do momento em que os Recorridos tomaram conhecimento que a transmissão dos lotes para a sua propriedade estava posta em causa, estes gizaram um plano para obstar a que isso viesse a suceder.

8. A Recorrente tem combatido judicialmente, nos estritos termos da lei, para que lhe sejam devolvidos o conjunto de lotes que o 1.° Recorrido, em conjunto com os demais, se apropriaram ilegitimamente, crédito que até à presente data continuar sem satisfazer.

9. Todas estas condutas são reveladoras de que o 1.° Recorrido tudo fez para impossibilitar o cumprimento do crédito, procurando sempre, simultaneamente, engendrar justificações que lhe permitissem, num futuro previsível delapidar todo o seu património, colocando-se numa situação de insolvência premeditada que em tudo lhe impossibilitaria cumprir qualquer decisão judicial.

10. O T.R.L, ao decidir como decidiu, desvalorizou os interesses dos 489 proprietários moradores daquele bairro, que não só se sentem profundamente lesados e enganados na via judicial para acautelar o seu direito de crédito.

11. Por todo o exposto só pode concluir-se que a decisão de improcedência da presente acção terá consequências devastadoras para comunidade de moradores que se sente desacreditada pelas sucessivas decisões judicias que em tudo parecem acompanhar os actos de incumprimento, culposos e ilegais que norteiam o comportamento do 1.º Recorrido e dos demais Recorridos em pleno conluio com aquele! 12. Num estado de Direito como aquele em que vivemos e sobretudo numa altura em que a confiança nos meios judiciais deve ser reforçada, não poderão V. Exas., salvo o devido respeito que é muito, compactuar com tais condutas e deixar na impunidade quem tudo fez para prejudicar seriamente os seus concidadãos! 13. O que pretende a Recorrente com este Recurso é acautelar o seu direito de crédito, impugnando todos os actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito, até porque a assim não ser estaria aberto o “Ovo de Colombo” para todos os devedores poderem dissipar dolosamente o seu património, escudando-se assim de garantir o crédito e satisfazê-lo, o que reveste particular relevância social, atenta a indispensabilidade do credor ver salvaguardado o pagamento do seu crédito, podendo praticar medidas conservatórias que impeçam a dissipação desses bens.

14. A Recorrente não pode concordar com a solução jurídica alcançada no sentido de não proceder o pedido de ineficácia dos actos de alienação dos 10 (dez) lotes e, em consequência ordenar a restituição desses imóveis – o que, ao contrário do que refere o T.R.L, na página 15, faz parte do pedido da Recorrente –, reconhecendo a possibilidade da Autora executar ou praticar actos de conservação de garantia patrimonial sobre os referidos imóveis na medida do seu direito de crédito.

15. O Recurso aqui apresentado cinge-se ao erro de direito decorrente da decisão de mérito quanto a estes pontos, que merece censura pelo raciocínio adoptado na decisão recorrida em violação da lei substantiva, a qual atingiu uma solução injusta em si mesma e violadora das normas respeitantes à ratio da impugnação pauliana.

16. Assim, apresentam-se as alegações infra, as quais sindicam o processo lógico-dedutivo seguido pelo Tribunal que merece uma correcção apta a garantir uma melhor aplicação do direito – que não foi, até agora, alcançada, mas sim contornada pelo T.R.L. sob considerações acerca da possibilidade de “executar” uma decisão penal assente num regime de prova num processo cível (o que não se requereu!).

17. A presente acção advém do crédito que a Recorrente detém sobre o 1º Recorrido, o qual adquiriu, na qualidade e em representação da ora Recorrente, um terreno, sendo que em momento posterior e com recurso à prática de crimes, foi desanexado em diversos lotes tendo o 1.° Recorrido registado a seu favor lotes que não eram seus, aí ficando devedor da Recorrente em € 835.250,00, vendendo posteriormente 10 (dez) lotes, dissipando assim o seu património de forma a frustrar a satisfação do referido crédito.

18. Não pode a Recorrente concordar com a decisão proferida pelo Tribunal de primeira instância e confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, fixando-se desde já o objecto do presente recurso à matéria de Direito, no que respeita à existência de um crédito, crédito esse no valor de € 835.250,00 (oitocentos e trinta e cinco mil duzentos e cinquenta euros) conforme escritura oportunamente junta e datada de 15 de Maio de 2009.

19. Tal como alegado na Petição Inicial o 1.° Recorrido torna-se devedor da Recorrente no momento em que, através da Escritura Pública de Divisão de Coisa Comum decide desanexar dez lotes que adjudicou e registou a ser favor, conforme consta dos factos VI) e VII) dados como provados.

20. Através da apropriação indevida daqueles 10 (dez) lotes, a Recorrente ficou credora do montante de € 835.250,00 (oitocentos e trinta e cinco mil duzentos e cinquenta euros), o qual não só o 1.°Recorrido não procurou cumprir, como, por outro lado, logrou ainda retirar tais lotes da sua propriedade, transferindo-os para a 6.ª Recorrida, da qual são sócios os demais Recorridos, seus filhos, frustrando a satisfação do crédito da Recorrente, 21. Como matéria relevante para a apreciação deste recurso importa desde logo destacar a factualidade que o tribunal de primeira instância deu como provada nos pontos I), II), III), IV), V), VI), VII), VIII), IX), X), XI) e XII) e que servirá de base para o que infra se irá discutir.

22.Andou mal o tribunal a quo ao considerar desde logo, e sem mais, manter a decisão da primeira instância por entender que aquilo que – pensa – formular a pretensão da Autora não consubstanciar em si um direito de crédito.

23. E fê-lo considerar que o direito de crédito da Recorrente não pode ter origem no...

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