Acórdão nº 2603/10.6TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Junho de 2016
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 02 de Junho de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) intentou ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, em 29/11/2010, junto das então Varas Cíveis de Lisboa, contra a Companhia de Seguros CC Portugal, S.A., (R.), alegando, no essencial, que: .
Em 18/06/2010, pelas 07h55, a A., ao atravessar uma passadeira para peões na …, na Freguesia da Ameixoeira, no Município de Lisboa, foi atropelada pelo veículo automóvel de matrícula ...- BX - ..., pertencente a CC e conduzido por DD, cuja responsabilidade civil de circulação se encontrava transferida para a R.; .
Com tal embate, a A. sofreu diversos traumatismos e fraturas que a obrigaram a submeter-se a operações cirúrgicas, ficando internada desde a data do acidente até 25/06/2010, sendo-lhe dada indicação médica para seguir um programa de reabilitação; .
Porém, não iniciou tal programa por não dispor de condições para tal nem a R. as ter proporcionado, apesar de reconhecer a responsabilidade pelo acidente, desconhecendo se ficará com alguma incapacidade; .
Em virtude das lesões sofridas, a A. suportou despesas com transportes, assistência de terceira pessoa de que necessitava para si e para apoio das filhas menores; .
À data do acidente, a A. trabalhava para o Centro Paroquial da …, auferindo o salário mensal bruto de € 528,00, acrescido de subsídios de alimentação mensal de € 66,00 e de transporte de € 27,50, que deixou de receber desde o acidente, bem como de efetuar descontos para a Segurança Social.
Concluiu a pedir que a R. fosse condenada a pagar-lhe as seguintes indemnizações: a) – a quantia de € 35.743,54, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, compreendendo € 2.620,04, por perda de vencimento durante 167 dias de incapacidade temporária absoluta, € 323,50 por despesas com medicamentos e transportes, € 2.800,00 por despesas com uma empregada doméstica e € 30.000,00 por danos não patrimoniais; b) – quantia a liquidar relativamente aos salários brutos vincendos, incluindo descontos para a Segurança Social; c) – quantia a liquidar relativa aos danos futuros pela incapacidade que lhe venha a ser atribuída; d) - quantia a liquidar pelas despesas que tenha de efetuar com assistência médica, medicamentos, tratamentos e transportes; e) – juros vencidos e vincendos sobre tais quantias.
2.
A R. contestou, assumindo a responsabilidade pelo acidente, mas impugnando as indemnizações peticionadas.
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Findos os articulados, foi fixado o valor da causa, proferido despacho saneador tabelar e selecionada a matéria de facto tida por relevante com organização da base instrutória (fls. 48-52).
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Após produção da prova pericial, a A., na decorrência do respetivo resultado, veio deduzir a fls. 283-289, em 20/08/2014, a ampliação do pedido inicial para a quantia de € 347.197,59, compreendendo o valor de € 24.777,13, respeitante a perdas salariais até à data da consolidação à incapacidade, em 26/09/2013, de € 273.417,00 relativo aos danos patrimoniais pela incapacidade absoluta e € 50.000,00 por danos não patrimoniais, remetendo para liquidação ulterior a indemnização por futuras intervenções cirúrgicas, medicamentos e tratamentos. A R, por sua vez, deduziu oposição aos novos valores peticionados, concluindo como na contestação.
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Realizada a audiência final, com gravação da prova, foi proferida sentença a fls. 333-365, datada de 24/02/2015, na qual foi inserida a decisão de facto e a respetiva motivação, tendo a ação sido julgada parcialmente procedente com a condenação da R.: i) – a pagar à A. o montante de € 99.564,71, a título de danos patrimoniais, integrado pelas parcelas de € 22.461,67, correspondente à perda de rendimentos de 18/06/ 2010 a 26/09/2013, e de € 77.103,04 pela desvalorização sofrida, a que devem ser deduzidos os adiantamentos de vencimento e de renda mensal atribuídos em sede de procedimento cautelar, com juros de mora, à taxa anual de 4%, desde a citação; ii) – a pagar à mesma A. a quantia de € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais, já atualizada à data da sentença, acrescida de juros de mora, à referida taxa, a contar, dessa data; iii) – a suportar os danos, a liquidar posteriormente, decorrentes das intervenções cirúrgicas a que a A. se venha a submeter por virtude das lesões sofridas.
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Inconformadas com essa decisão, dela apelaram ambas as partes para o Tribunal da Relação de Lisboa que, através do acórdão de fls. 407-420, datado de 02/07/2015, com a versão retificada de fls. 431-444, negou provimento ao recurso da A. e concedeu provimento parcial ao recurso da R., fixando a indemnização pela incapacidade para o trabalho em € 63.000,00 e mantendo o valor de € 25.000,00 pelos danos não patrimoniais, acabando por condenar a R. no pagamento do capital total de € 110.461,67.
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Desta feita, mais uma vez inconformada, veio a A. recorrer de revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - Vem o presente recurso interposto do acórdão que só condenou a R. a pagar à A. a quantia de € 110.461,67, enquanto em 1.ª instância as quantias fixadas tinham sido as seguintes: € 77.103,04 a título de danos patrimoniais (€ 63.103,04 pela desvalorização sofrida e € 14.000,00 pela compensação de redução da pensão de reforma a que a A. venha a ter direito por força do período de tempo sem descontos) e a quantia de € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidos, ambos, de juros desde a citação, até integral pagamento de cada um dos referidos valores; 2.ª - Porém, entende a A. não terem razão quer a 1.ª Instância quer a Relação, incorrendo em manifesto lapso que determinou uma incorreta aplicação do direito aos factos apurados e que, caso não se tivesse verificado, teria conduzido a uma solução conforme aos interesses da ora Recorrente; 3.ª - O âmago de uma das divergências da A. relativamente à sentença recorrida, por um lado, é quanto à forma como foi calculado, quer o valor referente à incapacidade, quer o valor de redução da pensão; por outro, é relativo ao valor fixado a título de danos não patrimoniais; 4.ª - Da nulidade da sentença nos termos das alíneas c), d) e e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC: A A. peticionou na ampliação e remeteu para liquidação de sentença os danos referentes a futuras intervenções cirúrgicas, despesas hospitalares, médicas, medicamentosas e de recuperação, bem como danos não patrimoniais decorrentes desses tratamentos, que, sendo previsíveis, não eram determináveis; 5.ª - A necessidade de realização de futuras intervenções cirúrgicas constam dos factos provados; 6.ª - Ora, da sentença só consta que foi remetida para liquidação os danos decorrentes das intervenções cirúrgicas, nada sendo mencionado quanto às despesas hospitalares, médicas, medicamentosas e de recuperação, nem quanto aos danos não patrimoniais decorrentes das intervenções cirúrgicas e tratamentos; 7.ª - Assim, o tribunal deixou de se pronunciar sobre pedidos formulados, ou de os remeter para liquidação; 8.ª - Claro que, havendo a necessidade de a A. vir a ter de se submeter a futuras intervenções cirúrgicas, é da experiência comum que terão de existir custos com despesas hospitalares, médicas e medicamentosas e de recuperação, bem como é evidente que os danos não patrimoniais serão mais graves, pela necessidade da A. ter de se submeter a tais intervenções cirúrgicas e tratamentos, com as inerentes dores que tal implica sempre; 9.ª - Perante tais considerações, sendo que foi dado como provado, e o tribunal “a quo” até o considerou na sentença, que as futuras intervenções cirúrgicas são remetidas para liquidação, ao concluir nos termos supra enunciados e não tomando em conta os factos que acima salientámos, não explicitando quais os danos que estarão abrangidos caso a A. venha a ser submetida às referidas intervenções cirúrgicas, enferma da nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC, de outro modo, teria necessariamente de condenar a R. nos termos peticionados e a liquidar em execução de sentença; 10.º - Por outro lado, o Tribunal de Relação, no acórdão que foi notificado à parte, não se pronunciou sobre tal matéria, evidenciado ter existido manifesta ambiguidade, pois da cópia que foi notificada constam duas páginas como número 10 e nenhuma com o número 9, sendo que as duas páginas com o referido número são iguais; 11.ª – É evidente que terá sido abordada a questão, pois foi proferida decisão julgando improcedente a arguição de nulidade da sentença. Contudo, não são conhecidos quais os respetivos fundamentos, o que impossibilita a parte de se poder pronunciar sobre os mesmos; 12.ª - Tal facto consubstancia um vício previsto no art.º 666.º, sendo nulo o acórdão, nos termos da al. c) do n.º 1 do art.º 615.º, ambos do CPC, o que se alega; 13.ª – Quanto aos valores da condenação pelos danos patrimoniais decorrentes da IPP, está inequivocamente demonstrado que a A. está impossibilitada de exercer a respetiva atividade profissional; 14.ª - Ainda que tenha sido considerado provado que as sequelas que a A. sofreu, sendo incompatíveis com a profissão que vinha desenvolvendo, são compatíveis com outras na sua área técnico-profissional (relembrando que a mesma só possuía a instrução primária), não se pode concordar que a indemnização a fixar só venha a considerar o desvalorização “tout court” e não as consequências das sequelas na vida profissional da mesma; 15.ª - A área técnico-profissional da A. está limitada à sua diminuta formação escolar; 16.ª - Seria bom questionar quais as áreas técnico-profissionais que a A. está habilitada a exercer com a impossibilidade de pegar em acamados ou fazer esforços físicos, sendo que não pode fazer uso do seu membro superior esquerdo; 17.ª - Ou seja, estão excluídas todas as atividades que exijam esforços físicos ou pegar em pesos, ou mesmo que exijam a utilização dos dois membros superiores (e não só de um), o que, atenta a formação escolar da A. não são deixadas quaisquer alternativas; 18.ª - Seguindo o raciocínio plasmado no acórdão, então só nas...
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