Acórdão nº 134/12.9TTMAI.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Junho de 2016
Magistrado Responsável | ANA LUÍSA GERALDES |
Data da Resolução | 16 de Junho de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – 1. AA Intentou a presente acção especial de acidente de trabalho contra: 1. BB – Sucursal em Portugal, com sede em Lisboa, e 2. CC – Prestação de Serviços Técnicos e Aluguer de Equipamentos, Unipessoal, Lda.
Pedindo a condenação de ambas as RR., na medida das suas responsabilidades e do que for apurado, a pagar ao Autor:
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O montante de € 7.151,61, a título de indemnização por ITA; b) A quantia de € 255,00, de despesas com deslocações obrigatórias em viatura própria; c) A quantia de € 73,00, de despesas com consultas médicas e serviços de enfermagem; d) A pensão anual e vitalícia calculada com base na IPP que vier a ser fixada; e) E juros de mora, à taxa legal e até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para o efeito e em síntese, que: Sofreu um acidente de trabalho quando se encontrava no exercício das suas funções de serralheiro mecânico, sob as ordens e direcção da 2ª Ré, a reparar uma anomalia técnica numa máquina industrial e cuja origem só podia ser verificada com a máquina em funcionamento, o que fez.
A máquina não tinha qualquer protecção na parte que atingiu a sua mão, pelo que logo que aproximou a sua mão, esta foi sugada pela ventoinha, do que lhe resultou traumatismo do dedo polegar da mão direita, com esfacelo, tendo sido submetido a uma intervenção cirúrgica.
Foi-lhe sido atribuída uma IPP de 9,79%.
A 1ª Ré recusou a sua responsabilidade e a 2ª Ré não reconheceu o acidente como de trabalho.
Concluiu o Autor no sentido de que tal ocorrência constitui um acidente de trabalho cujos danos devem ser reparados por ambas as Rés.
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O ISS, IP. veio deduzir pedido de reembolso do subsídio de doença que pagou ao A.
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Ambas as Rés deduziram oposição.
3.1.
A 1ª Ré Seguradora não aceita a caracterização do acidente como laboral, porquanto considera que o acidente aqui em causa se ficou a dever a negligência grosseira do sinistrado, pois foi o Autor que ao tentar reparar a máquina onde costumava trabalhar, fazendo de técnico, colocou a sua integridade física em risco, porquanto abriu o compartimento traseiro de acesso ao radiador e ao motor e introduziu a sua mão na zona do motor à procura de um tubo de passagem de água, o qual estaria com uma fuga.
Comportamento temerário, grave e inútil, pois tinha perfeita consciência de que podiam ocorrer lesões corporais graves e actuou à margem de qualquer ordem expressa para que efectuasse a operação em causa, bem sabendo que apenas deveria proceder a operações destas com a máquina desligada, o que não fez.
3.2. A 2ª Ré empregadora contestou alegando, em síntese, que: O A. encontrava-se a verificar e a reparar uma anomalia técnica numa máquina industrial, que consistia numa fuga de água, e para detectar a origem dessa anomalia não é necessário tocar na máquina ou, como o A. fez, colocar a mão perto da ventoinha em funcionamento. E o A. sabia que não podia tocar na máquina quando esta se encontrava ligada.
Acresce que a 2ª Ré sempre proibiu expressamente que tais tarefas fossem executadas mediante a aproximação de qualquer parte do corpo à máquina, quando a mesma está ligada, conforme formação que foi dada, no dia 19/09/2011, e na qual o A. esteve presente. Sabe bem o Autor que após a verificação visual da máquina com o motor ligado teria que ter parado a máquina e bloqueado a mesma com o cadeado.
A máquina tinha dois níveis de protecção: um autocolante, a indicar expressamente que não se pode colocar as mãos quando a máquina está em movimento e uma protecção em metal, que impede os trabalhadores de tocar na ventoinha.
Ao actuar da forma descrita o A. incorreu num erro indesculpável e altamente reprovável, incumpriu as normas de segurança no trabalho e ignorou os procedimentos estabelecidos pela 2ª Ré sua empregadora, sendo o causador exclusivo do acidente.
Por isso estão reunidos os pressupostos da descaracterização do acidente e, caso assim não se entenda, o A. agiu com negligência grosseira, pelo que não pode a 2ª Ré ser responsabilizada pela reparação do sinistro. Conclui pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido, com as consequências legais.
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Saneado o processo efectuou-se a audiência final e foi proferida sentença que absolveu ambas as RR. dos pedidos contra si deduzidos pelo A. (cf. fls. 506 e segts., do 3º Vol.) Para tanto, entendeu o Tribunal de 1ª instância que: “O Autor agiu em violação das condições de segurança expressamente estabelecidas pela empregadora, causando assim, de forma exclusiva, com a sua conduta, o acidente em causa nos autos.
Ocorre, por tal, a descaracterização do acidente de trabalho, conforme estipula o art. 14º da Lei nº 98/2009, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas nos autos.
Improcede assim a pretensão do Autor de ser indemnizado pelos danos sofridos com o acidente”.
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Inconformado, o A. Apelou, tendo o Tribunal da Relação do Porto decidido nos seguintes termos: “Nestes termos, sem outras considerações, na procedência do recurso, acorda-se em revogar a sentença recorrida e, consequentemente, em: - Condenar a Ré Seguradora BB – Sucursal em Portugal, a pagar ao A. AA o capital de remição da pensão anual e vitalícia de € 2.124,57, devida a partir de 19/06/2012, quantia esta acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, a contar desde tal data e até integral e efectivo pagamento; - Julgar parcialmente procedente o pedido de reembolso formulado pelo ISS, IP e, em consequência, condenar a Ré Seguradora BB – Sucursal em Portugal, a pagar ao Instituto da Segurança Social, IP, a quantia de € 7.155,30, a título de subsídio de doença, quantia esta atribuída ao A. a título de indemnização por ITA e que deverá ser entregue àquele, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, a contar desde a data da citação e até integral e efectivo pagamento, e - Em absolver a Ré CC – Prestação de Serviços Técnicos e Aluguer de Equipamentos, Unipessoal, Lda. dos pedidos contra si formulados”. 6. Irresignada, a 1ª Ré Seguradora interpôs recurso de revista em que concluiu, em síntese, que: a) Os factos provados conduzem, de forma evidente, à descaracterização do sinistro por violação do disposto na al. a), do nº 1, do art. 14º, da Lei 98/09, de 4-9.
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Entendeu-se no Acórdão que a matéria de facto provada não pressupõe a descaracterização do sinistro. Aí se invoca que a proibição imposta pela empregadora não constitui regra de segurança, mas um "mero aviso genérico” (cf. pág. 26).
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A matéria de facto provada transmite-nos a certeza de que a proibição emanada pela entidade patronal é muito mais do que um simples aviso genérico e mais sucede que a Lei não traça fronteiras entre um suposto aviso genérico e uma regra de segurança.
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O dito aviso genérico é aquele que não confere ao seu destinatário a obrigação de o conhecer e, por isso mesmo, não tem o estatuto de regra de segurança.
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No caso dos autos provou-se nomeadamente que: o A. sabia que não podia tocar na ventoinha quando a máquina se encontra ligada, para detectar e/ou reparar qualquer avaria técnica; para a verificação da fuga de água não era essencial tocar na máquina em funcionamento; a R. proíbe que qualquer tarefa a executar na máquina seja feita mediante a aproximação de qualquer parte do corpo à máquina, o que é do conhecimento dos seus trabalhadores, entre os quais o Autor; após verificação visual da máquina com o motor ligado o trabalhador teria que ter parado a máquina e bloqueado a mesma com o cadeado.
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Provou-se que a proibição em causa era do conhecimento do A. e igualmente dos trabalhadores da R., e sendo conhecida destes é evidente que se tratava de uma medida de segurança e não de um aviso genérico.
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O risco de sofrer lesões ao tocar no motor de uma máquina em funcionamento pode ser apreendido por uma criança, desde tenra idade, quanto mais por um adulto.
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Existe ainda uma razão especial para o A. ter a plena consciência dessa proibição e do risco associado a este tipo de tarefa: é que o A. era o “responsável pela manutenção da máquina e de outras”, como confessou no art. 3° da douta p.i.
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O A. encontrava-se no exercício das suas funções de serralheiro mecânico e a executar a concreta tarefa de verificação de uma avaria de uma máquina pela qual era, confessadamente, o responsável.
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O A. violou uma regra de segurança da entidade patronal, que tinha especial obrigação de conhecer, dadas as suas especiais atribuições. Deve, por isso, ser revogado o entendimento do Acórdão recorrido.
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Sem prescindir, mesmo que se entenda que a proibição constante do ponto 19) dos factos provados era uma instrução genérica e não uma regra de segurança, sempre o sinistro se deve ter por descaracterizado nos termos do art. 14°, nº 1, al., a), e nº 2, da Lei nº 98/09, de 4-9, e do art. 19° do Dec. Lei nº 50/05, de 25-2, do Regulamento Geral de Segurança e Higiene do Trabalho nos...
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Acórdão nº 3723/18.4T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Setembro de 2020
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