Acórdão nº 2313/13.2TXLSB-H.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelSOUSA FONTE
Data da Resolução26 de Outubro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório 1.1.

O condenado AA, identificado nos autos, requereu, no processo em epígrafe, do ...Juízo do Tribunal de Execução de Penas do ..., a concessão de liberdade condicional que lhe veio a ser negada pela sentença de fls. 110 e segs..

1.2.

Inconformado, recorreu para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo acórdão de 24.02.2016, fls. 134 e segs., negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida.

1.3.

Ainda inconformado, invocando o disposto «nos artigos nºs 629º, nº 2, al. b) do Código de Processo Civil “ex vi” art.º 4º, 399º, 432º, nº 1 b) do Código de Processo Penal, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, de cuja motivação, fls.155 e segs., extraiu as seguintes conclusões que transcrevemos: «1 – O Arguido AA, aqui Recorrente, não se pode conformar com a decisão de negação de provimento ao recurso interposto pelo Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do Proc. n.º 2313/13.2TXLSB-H.P1, 1ª Secção, pois que como aqui se demonstrará, tal decisão não faz correcta apreciação da verificação dos requisitos previstos no art.º 61.°, n.º 2 do Código Penal.

2 – Inconformado com o sentido vertido na Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, nos autos à margem referenciados, pelo qual foi decidido negar provimento ao recurso interposto pelo Arguido e, consequentemente, improceder a revogação pretendida da decisão de primeira instância de não colocar o Recorrente em liberdade condicional no cumprimento de metade da pena, interpõe agora o presente recurso.

3 – Em grosso modo, o objecto do presente recurso consistirá tão só na reapreciação das conclusões finais alcançadas pelo tribunal a quo para não terem julgado verificados todos os pressupostos substanciais exigidos e consagrados no art.º 61° do Código Penal, na medida em que a par dessa decisão foi proferido um outro Acórdão, dessa mesma Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, que decide de forma contraditória ao que foi decidido no caso sub judice.

4 – Concretamente, referimo-nos ao Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 2314/13.0TXLSB-H.P1, pelo Tribunal da Relação do Porto, 4.ª Secção, em 24/02/2016, onde, por sua vez, os Meritíssimos Senhores Juízes Desembargadores decidiram - e bem - julgar provido o recurso interposto pelo recluso recorrente e; em consequência disso, entre o mais; colocá-lo em liberdade condicional. Acórdão este, que ora se junta certidão para todos os devidos efeitos legais.

5 – Posto isto, a premissa de que partimos para desencadear a motivação do presente recurso, ressalvando claro está o devido respeito - que é muito - por opinião contrária; é a de que: andou mal o Tribunal ad quo na interpretação e aplicação do estatuído no art.º 61° do Código Penal no caso do ora Recorrente, ao contrário e por contraposição ao que fez no caso do Recorrente dos supra identificados autos, na medida em que tais situações, como ao adiante se demonstrará, em tudo se assemelham e; ainda assim, levaram a decisões totalmente díspares e opostas.

6 – Antes de mais e antes de tudo, importa desde já enumerar e salientar as circunstâncias coincidentes entre o caso do ora Recorrente e o caso do acórdão em contraposição, nas quais assentaram uma e outra decisão proferida.

7 – Resulta dos presentes autos com relevância para sustentar a decisão que ora se pretende ver modificada, nomeadamente o seguinte: 8 – o Recorrente tem actualmente 51 anos de idade; foi condenado pela prática de um crime de tráfico internacional de estupefacientes; consubstanciando na importação de 203,46kg de cocaína; condenado à medida concreta da pena em cumprimento de 7 anos de prisão efectiva; pena esta que está actualmente a cumprir no Estabelecimento Prisional Regional de Vale do Sousa; 9 – atingiu o meio da pena em 06/08/2015; para além da referida condenação, nada mais consta do Certificado do Registo Criminal do condenado, seja a que título for; 10 – ao longo de todo o seu percurso prisional nada consta do seu Cadastro Disciplinar, sendo o seu comportamento em reclusão prisional bastante positivo, designadamente, encontra-se a laborar na biblioteca do Estabelecimento Prisional onde se encontra a cumprir pena com bom desempenho, participando ainda activamente em várias actividades lúdicas e pedagógicas desenvolvidas e pelo referido Estabelecimento Prisional; 11 – beneficiou de 4 (quatro) licenças de saída jurisdicional, sem qualquer registo de incidentes; beneficiou de 2 (duas) licenças de curta duração, igualmente isentas de incidentes; encontra-se em RAI (regime aberto para o interior) desde 23/03/2015 e RAE (regime aberto para o exterior) desde Fevereiro de 2016; 12 – possuiu um contexto familiar estável e favorável constituído pelo cônjuge e o filho mais novo do casal e ainda um filho mais velho que se encontra emigrado na Suíça, mas do qual é igualmente próximo, que estão totalmente ao dispor para o auxiliar a uma boa integração neste contexto; 13 – em meio livre, apresenta como perspectiva laboral séria, concrecta e imediata de trabalhar como administrativo no instituto de línguas da sua cunhada, conforme documento comprovativo de promessa de trabalho já junta aos autos; 14 – ao longo de todo o processo a sua postura sempre se pautou e denotou um forte e sincero arrependimento pela prática deste acto isolado que o conduziu à sua condenação; do mesmo modo, revelou de forma inequívoca a interiorização dos efeitos nefastos das drogas para as vítimas do narcotráfico, salientando o facto de ter uma família, filhos e sobrinhas e hoje ter consciência que a droga é algo muito grave, em parte graças aos testemunhos que ouviu durante o seu percurso de reclusão que o levaram a compreender a gravidade do seu comportamento, pelo qual interiormente se penitencia; 15 – dos relatórios dos serviços prisionais resulta que o condenado "evidencia vergonha pelos atos praticados e possui nivel intelectual capaz de efetuar critica efetiva ao cometimento dos ilícitos. Tem noção das vitimas provocadas”.

16 – resulta ainda do relatório da DGRS que "AA assumiu um posição crítica socialmente espectada face ao crime pelo qual cumpre pena; revelando capacidade para refletir sobre as vítimas que daí decorreram, num discurso adequado ao normativo vigente. Expressou remorsos face ao impacto provocado pela reclusão nos seus familiares, com especial destaque para os seus filhos, tendo, a este nivel, expressado culpa por sujeitá-los a esta provação. Manifestou, ainda, sentir vergonha da sua reclusão relativamente à sua comunidade vicinal:".

17 – Assim, dos factos ora expostos já anteriormente dados como provados e, por isso, tidos em conta para a fundamentação das duas decisões antecedentes nos presentes autos que, ainda assim, negaram provimento à libertação condicional do aqui recorrente, se conclui que além de primário (neste ou em qualquer outro tipo de crime), o recorrente apresenta um percurso de reclusão exemplar, exímio de qualquer reparo, bem como, com todos os objectivos propostos para este momento da execução da pena totalmente cumpridos. Quer seja a nível do arrependimento presente na sua conduta ab initio, quer seja pela consciencialização evidenciada da gravidade do crime praticado e das consequências para os demais que o tipo de crime acarreta, quer ainda pela cumulação das condições socioprofissionais e familiares que se encontram todas elas devidamente reunidas.

18 – Todavia, analisados os factos que ora se acabaram de transcrever à luz da realidade legal prevista no art.º 61º n.º 2 do Código Penal, a fim de apurar a verificação dos pressupostos ali exigidos para a concessão da liberdade condicional do recorrente, o Tribunal a quo decidiu manter a decisão da 13 Instância, no sentido de não se terem verificados preenchidos os requisitos materiais, nomeadamente a satisfação das finalidades preventivas especiais e gerais da pena.

19 – Por sua vez, no que diz respeito aos factos verificados no processo que levou à deliberação contida no acórdão n.º 2314/13.0TXLSB-H.P1, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, 4.ª Secção, em 24/02/2016, que desde já se adianta ser em tudo coincidente com o caso do presente recurso, temos os seguintes: 20 – o ali Recorrente tem actualmente 65 anos de idade; foi condenado pela prática de um crime de tráfico internacional de estupefacientes, consubstanciando na importação de 214 kg de cocaína; condenado à medida concreta da pena em cumprimento de 7 anos de prisão efectiva; pena esta que se encontrava a ser cumprida no Estabelecimento Prisional Regional de Vale do Sousa; atingiu já o meio da pena; 21 – para além da referida condenação, nada mais consta do Certificado do Registo Criminal do condenado, seja a que título for; 22 – a nível profissional, dedicou-se ao trabalho a partir dos 15 anos de idade; a nível familiar, tem uma boa integração, tendo continuado a beneficiar de todo o apoio, mesmo durante a sua reclusão; 23 – assume um comportamento bastante positivo ao longo do seu percurso em reclusão prisional; as saídas jurisdicionais de que beneficiou, foram sempre bem sucedidas, sem quaisquer incidentes a registar; ademais, demonstrou uma aparente interiorização dos efeitos nefastos das drogas para com as vítimas do narcotráfico.

24 – Destarte, ao contrário do que aconteceu na decisão ora recorrida, neste acórdão, a Relação do Porto decidiu que “…é possível emitir um juízo de prognose favorável e afirmar que o condenado está em condições de poder beneficiar, desde já, da liberdade condicional ...

", pág. 22 do Acórdão n.º 2314/13.0TXLSB-H.P1, sublinhado nosso.

25 – Ora, chegados aqui, importa debruçarmo-nos sobre algumas conclusões que podemos retirar do até aqui exposto. Desde logo, da correspondência (praticamente total) das circunstâncias de ambos os casos aqui referidos. Concreta e fundamentalmente: no tipo de crime praticado, na medida da pena aplicada, no percurso prisional (exemplar) de ambos...

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