Acórdão nº 539/05.1TBCBC.G2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | SALAZAR CASANOVA |
Data da Resolução | 06 de Outubro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.
AA, Lda. intentou no dia 28-7-2005 ação declarativa com processo ordinário contra BB e CC pedindo a condenação dos RR no pagamento de 90.823,00€, capital e juros de mora vencidos, acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal até efetivo pagamento.
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Alegou que celebrou com os RR empreitada para construção de casa de habitação pelo preço de 162.109,32€ acrescido de IVA à taxa em vigor a pagar no decurso da obra e até ao seu termo; a obra iniciou-se em junho de 2000 e a construção prosseguiu ininterruptamente até finais de novembro de 2002; foram pedidos trabalhos a mais no montante de 11.685,80€.
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Quando a obra já estava quase finda, os trabalhos não puderam prosseguir porque os réus em dezembro de 2002 mudaram as chaves das portas de acesso à obra, não mais permitindo o acesso à obra. Esta prosseguiu com outro empreiteiro contratado pelos donos da obra.
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A A. reclama, face ao incumprimento definitivo do contrato, os gastos de trabalho e o valor do proveito que poderia tirar da execução da obra (artigo 1229.º do Código Civil). Segundo a autora, os RR pagaram 117.802,18€; devem a quantia de 39.622,45€ respeitante a trabalhos realizados e não pagos, para além do indicado valor de 11.685,80€ de trabalhos a mais, num total de 51.308,25€; os juros de mora vencidos contam-se do incumprimento definitivo do contrato em dezembro de 2002. No tocante à indemnização respeitante ao proveito da obra, considera a A. o valor de 24.316,90€ correspondente a 15% do total contratado, percentagem que corresponde à margem de lucro habitual neste tipo de obra.
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Os RR, por sua vez, alegam que o preço da empreitada integrava o valor de IVA e que efetuaram pagamentos no montante de 117.217,54€; estava previsto que o termo da construção ocorreria em junho de 2001, mas os trabalhos atrasaram-se por falta de pessoal; já efetuado o pagamento de 9.975,96€ em 10-5-2002, o réu enviou carta datada de 7-10-2002 onde referia que a obra estava abandonada há mais de 8 meses e que, quando foi entregue o último cheque, foi prometido pela A que a obra acabaria até ao fim de outubro corrente; mais referia que há mais de um mês que não anda ninguém na obra que está abandonada e, por isso, fixava à A. o prazo máximo de 3 dias após receção da carta para " retomar os trabalhos com intuito de os acabar rapidamente" sob pena de se considerar que a obra foi definitivamente abandonada, forçando-se a sua entrega a outro empreiteiro com inerente pedido de indemnização por todos os prejuízos causados; mais tarde, em 21-11-2002, os RR enviaram outra carta à A. declarando que verificaram que ela estava abandonada e sem fim à vista, ocorrendo abandono da obra e, por conseguinte, rescindido o contrato, declarando ainda que os trabalhadores da autora ficaram proibidos de entrar na obra cuja conclusão iria ser entregue a outro empreiteiro. A esta carta respondeu a A. em 27-11-2002 referindo que o réu estava em falta com o pagamento das prestações acordadas e com os trabalhos a mais, que não acatava a proibição de entrar na obra e que continuaria a sua execução ao ritmo permitido pelas suas capacidades financeiras face à falta de pagamento de algumas prestações e trabalhos a mais. Há ainda uma carta do réu dirigida à A. em 18-2-2003 onde refere que " não tendo surtido efeito prático as cartas que vos enviamos em 7-10-2002, 31-10-2002 e 21-11-2002 já que a obra continua abandonada e sem fim à vista. Apesar de termos levado em consideração o pedido do v/ advogado através da sua comunicação, chegamos à conclusão que V. Exªs não pretendem honrar o contrato para conclusão da empreitada. Assim sendo, pela última vez vimos informar V.Exªs que se no prazo máximo de 5 dias (cinco) não nos enviarem uma declaração/contrato com data para conclusão da empreitada, vamos recorrer a tribunal para exigir uma indemnização pelos prejuízos que voluntariamente nos causaram".
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Deduziram os RR reconvenção pedindo a condenação da A. no pagamento de 73.801,00€ com juros de mora desde a citação até integral pagamento. Os réus consideraram que faltava liquidar ao empreiteiro 44.893,00€ (diferença entre o preço da empreitada de 162.110€ e os pagamentos feitos no montante de 117.217€).
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Segundo os réus, na conclusão da obra gastaram 106.694€ e, por isso, tiveram um prejuízo de 61.801,00€ correspondente à diferença entre o que teriam de liquidar à A. se esta tivesse concluído os trabalhos e o que acabaram por gastar com a conclusão da obra (106.694-44.893); por danos morais reclamaram 10.000€; reclamaram ainda 2000€ de custos com gasolina, deslocações no acompanhamento de obras e aquisição de materiais decorrentes da nova empreitada.
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Foi proferida sentença (fls. 577/590) em que se considerou que a pretensão da autora pressupunha a prova de que as obras executadas, incluindo os trabalhos a mais, importavam um custo superior ao valor já recebido de 117.216,60€; tão pouco ficou provado qual o lucro que a autora retiraria do negócio; no que respeita ao incumprimento do contrato, considerou a sentença que a sujeição, por parte da autora, do bom andamento da obra à realização de mais um pagamento por parte dos réus carece de cobertura legal e a laboração em ritmo lento por falta de pessoal suficiente e por paragens temporárias configura uma situação de mora no cumprimento da obrigação de conclusão da obra (artigo 1207.º e 1208.º do Código Civil). Não tendo a autora concluído a obra nem mesmo depois da carta de 18-2-2003, a autora entrou novamente em incumprimento definitivo da sua prestação contratual.
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Improcedeu também o pedido reconvencional considerando que o valor suportado pelos RR para a conclusão dos trabalhos foi de 17.359,94€ a que acrescem custos no montante de 900,00€ num total de 18.269,54€, valor que está aquém do montante que teriam de pagar à autora por conta dos trabalhos da empreitada; não existindo, assim, prejuízo indemnizável, não se justifica indemnização autónoma no caso vertente a título de danos não patrimoniais.
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O Tribunal da Relação por acórdão de 10-4-2012 julgou parcialmente a apelação da autora alterando a resposta do quesito 3º para provado - "O preço acordado para a execução da obra referida na alínea B) da matéria assente foi de 162.109,32€" (quesito 2 provado) a que acrescia IVA à taxa legal em vigor (quesito 3)"; anulou o julgamento para ampliação da matéria de facto considerando que " é de essencial importância apurar se a autora já tinha efetuado obras em valor superior àquele que foi pago pelo réu, ou seja, se o réu restava em dívida para com a autora, designadamente em maio e novembro de 2002, quando esta condicionou a continuação da obra ao pagamento das prestações em falta".
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A razão de ser da anulação da sentença para ampliação da matéria de facto fundou-se no facto de a autora no artigo 18.º da petição ter reclamado a quantia de 39.622.45€ e a quantia de 11.685,80€ de trabalhos extra considerando que tais valores respeitavam " a trabalhos realizados e não pagos", ou seja, importava analisar, face ao alegado, se a autora tinha prestado trabalhos em montante superior ao valor que os réus tinham pago. A pretensão da autora tinha improcedido porque a sentença tinha considerado que constituía premissa essencial da afirmação do direito da autora a "prova de que a obra por si realizada - nesta incluídos os trabalhos extra que executou - vale mais do que o valor por si recebido por conta da mesma - o que não resulta dos autos".
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No que respeita à apelação dos réus, o acórdão de 10-4-2012 julgou-a improcedente na parte que foi possível conhecer de imediato - impugnação da matéria de facto (pedido de alteração das respostas aos quesitos 24, 25 e 26) e pedido de condenação em danos morais em quantia não inferior a 10.000 euros - que não ficou prejudicada pela anulação do julgamento.
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Os réus interpuseram recurso de revista que não foi admitido, por decisão do relator no STJ, considerando-se que não releva processualmente " o decidido na Relação que extravasa do mencionado âmbito (anulação do julgamento), não havendo, pois, ainda e sequer, qualquer relevante decisão da 1ª instância a legitimar correspondente tomada de posição por parte da Relação e, pois, interposição de recurso para este Supremo".
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Os réus requereram que se efetivasse prova pericial sobre o quesito 24 respeitante aos gastos dos réus com a conclusão da obra.
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Foi proferida nova sentença, após julgamento efetuado na sequência da anulação do julgamento, julgando-se parcialmente procedente por provada a ação, condenando-se os réus a pagar a quantia de 51.894,43€ (40.208,63€+11.685,80€) e a de 702,60€ (lucro indemnizável fixado na base de uma taxa de 15% em termos de equidade sobre o montante dos trabalhos cuja conclusão faltava terminar), acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, absolvendo-se do mais contra si peticionado sendo devidos juros sobre o capital desde a citação até efetivo pagamento à taxa legal; julgou-se improcedente por não provada a reconvenção.
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A decisão considerou que a condenação na aludida quantia se impõe uma vez provado trabalhos realizados e não pagos; no que respeita ao incumprimento, salientou-se que não estava fixado prazo certo para o cumprimento da empreitada, impondo-se interpelação fixando prazo razoável para a conclusão dos trabalhos (artigo 777.º/1 e 2 do Código Civil); face à mora, a sua conversão em incumprimento definitivo imporia a fixação de prazo para a conclusão do contrato (artigo 808.º/1 do Código Civil) o que não se verificou em nenhuma das cartas enviadas pelos réus.
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O Tribunal da Relação por acórdão de 14-4-2016 julgou improcedente a apelação confirmando-se a sentença.
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Interposta revista deste acórdão para o STJ os réus sustentam o seguinte:
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Que o acórdão recorrido incorre em nulidade porque tinha de se pronunciar sobre a questão da interpretação da...
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Acórdão nº 2472/18.8T8STR.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Abril de 2022
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...… Cabeceiras de Basto. Na petição inicial foram alegados, com relevo, os seguintes factos: “1.º Por Sentença já transitada do STJ n.º 539/05.1TBCBC.G2.S1, 7ª, datada de 6/10/2016, uma vez que a Reclamação para o Tribunal Constitucional não foi atendida, o ora A. foi condenado a pagar à ora ......
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