Acórdão nº 66/15.9YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução27 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I M, Juíz de Direito, notificada da deliberação do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 15 de Abril de 2015, que decidiu negar provimento ao incidente de impedimento por si deduzido contra a Exma. Senhora Inspectora Judicial Juíz Desembargadora Dra. …, vem da mesma interpor recurso contencioso ao abrigo do disposto nos artigos 168º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais, aprovado pela Lei nº 21/85, de 30 de Julho, com os seguintes fundamentos: - Pela deliberação recorrida foi decidido, na sequência de pedido formulado pela Requerente, não dar provimento ao incidente de impedimento suscitado.

- Por despacho do Exmo. Senhor Vice-Presidente do CSM, homologado por deliberação do Conselho Plenário do CSM de 11.03.2014, foi aprovado o Mapa de Inspecções Judiciais para o ano de 2014, tendo a inspecção ordinária classificativa ao serviço da Requerente, enquanto juiz titular do (extinto) Tribunal do Trabalho de …, sido inscrita nesse mesmo Mapa, relativamente ao período compreendido entre 08.10.2010 e a data de instalação dos serviços de inspecção (por outro não ter sido expressamente indicado).

- Assim, em 10 de Setembro de 2014 a A. recebeu uma carta subscrita pelo Exmo. Senhor Secretário de Inspecção, a informar que “a partir de 15 de Setembro de 2014 dar-se-[ia] início à Inspecção Ordinária ao (…) serviço prestado no ex Tribunal do Trabalho de …, [sendo a A.], no cumprimento do disposto do art. 17º nº 1 al. g) e nº 2 do RIJ, convid[ada] a apresentar (…) trabalhos (…) reportados ao período de 08 de Outubro de 2010 a 31 de Dezembro de 2013”.

- A A., considerando tratar-se um de mero lapso de escrita, e cumprindo com o ordenado, remeteu à Exma. Senhora Inspectora Judicial Juíz Desembargadora Dra. …. um memorando e demais elementos reportados ao período de inspecção legalmente estabelecido, ou seja, de 08.10.2010 até 31.08.2014.

- Uma vez recebido o referido memorando e respectiva documentação, a Exma. Senhora Inspectora Judicial nada disse, tendo a A. firmado convicção que, de facto, o período sob inspecção seria o de 08.10.2010 a 31.08.2014.

- Contudo, e para sua surpresa, veio a A. a verificar que a inspecção que estava a ser efectuada ao seu serviço apenas reportava ao trabalho desenvolvido até ao dia 31 de Dezembro de 2013.

- Perante tal facto, a A., em 29 de Outubro de 2014, pediu esclarecimentos à Exma. Senhora Inspectora Judicial quanto ao limite temporal da inspecção, peticionando a final o seu alargamento até 31 de Agosto de 2014.

- Em 30 de Outubro de 2014, a Exma. Senhora Inspectora Judicial respondeu ao pedido de esclarecimentos da A., tendo, na sequência, informado que o período sob inspecção judicial apenas abarcaria o serviço prestado até ao dia 31 de Dezembro de 2013.

- Na sequência do decidido, suscitou a A., em 4 de Novembro de 2014, incidente de suspeição junto do Exmo. Senhor Vice-Presidente do CSM.

- Em 5 de Dezembro de 2014 veio a A. apresentar queixa-crime contra a Exma. Senhora Inspectora Judicial, por considerar que a sua conduta é criminalmente punível.

- A apresentação da referida queixa deu origem aos autos de inquérito nº….

- A Exma. Senhora Inspectora Judicial, no âmbito da apreciação do incidente de suspeição suscitado pela A., prestou esclarecimentos sobre esta matéria, tendo ficado a conhecer que contra si corria inquérito com vista ao apuramento da sua responsabilidade criminal.

- Entretanto, e face à omissão de pronúncia quanto à suspeição suscitada, veio a A. reclamar para o Conselho Plenário do CSM, em 27 de Abril de 2015, peticionando a extensão do período a inspeccionar e a declaração da nulidade do acto administrativo da Exma. Sra. Inspectora Judicial que fixou o termo do período objecto da Inspecção Judicial Ordinária constante do Mapa de 2014.

- Por outro lado, uma vez que a Exma. Senhora Inspectora Judicial não se declarou impedida, a Requerente, em 28 de Janeiro de 2015, suscitou junto do Exmo. Senhor Presidente do CSM, impedimento legal, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 44º, nº 1, alínea f), 45º, nºs 1, 2 e 3, 46º, nº 1, e 47º, nº 1, todos do Código de Procedimento Administrativo (CPA), alegando, entre o demais, que: «a Exma Sra. Inspectora Judicial …, nos Serviços de Inspecção que desenvolveu, de facto, a partir de meados de Outubro de 2014 no extinto TT das …, encurtou de “mottu próprio” o período temporal do serviço objecto da inspecção judicial ordinária ordenada pelo CSM, e reportou-se apenas a processos e decisões proferidas até 31/12/2013, contrariando o disposto no art. 6º do Regulamento das Inspecções Judiciais.

(…) E recusou-se expressamente a incluir no âmbito da Inspecção Judicial em curso o trabalho realizado pela ora, Requerente no período de 01/01/2014 até 31/08/2014, e que não foi ainda objecto de classificação; num total de 8 meses, ou seja, 1/6 do período de serviço objecto de uma inspecção ordinária a 4 anos de serviço.

Em face de tal recusa, para além do mais, em 05/12/2014 a ora requerente viu-se forçada a apresentar participação criminal nos Serviços do Ministério Público junto do Colendo Supremo Tribunal de Justiça contra a Exma. Sra. Desembargadora Inspectora … ».

- Em 20 de Abril de 2015, a A. foi notificada da douta deliberação do Conselho Plenário do CSM, resultando da mesma, e para o que aqui interessa, que: “É nessa linha de preservação da prossecução do interesse público e de neutralidade da administração, indispensável a criar no público a confiança na administração pública, que se insere a previsão legal de impedimentos respeitantes à participação em procedimento administrativo de órgãos ou agentes que tenham um interesse pessoal na decisão do caso. E entre essas situações integráveis nos casos de impedimento, previstos pelo artigo 44º, 1, do CPA, conta-se aquela em que contra o titular ou agente administrativo corre acção judicial proposta por um interessado no procedimento ou pelo respectivo cônjuge.

A Senhora Juíz, interessada no procedimento inspectivo já iniciado ao serviço por si prestado, comprova a pendência de um inquérito, nos serviços do Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça, com origem numa denúncia por si apresentada contra a Exma. Inspectora Judicial que realiza a inspecção.

(…) Para além do disposto nos artigos 29º e 30º, o Regulamento das Inspecções Judiciais (RIJ) não prevê para o procedimento inspectivo todos os mecanismos de garantias de imparcialidade. (…) Donde resulta que aos impedimentos, recusa ou escusa, no que falta regular, se aplicam as normas do CPA. E, como se referiu, à luz do predito artigo 44º, 1, f), do CPA, nenhum titular de órgão ou agente da administração pode intervir em procedimento administrativo quando contra ele, seu cônjuge ou parente em linha recta esteja intentada acção judicial proposta por interessado ou pelo respectivo cônjuge. Donde decorre que, no caso de impedimento, está sempre vedada a intervenção do órgão ou agente no procedimento em todas as situações elencadas na norma, relativamente às quais o legislador optou pela sua enumeração taxativa.

(…) A propósito e em paralelismo, o novo Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente ao processo nos tribunais administrativos (artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), estatui que nenhum juiz pode exercer as suas funções em jurisdição contenciosa ou voluntária «[Q]uando seja parte na causa pessoa que contra ele propôs a acção civil para indemnização de danos, ou que contra ele deduziu acusação penal, em consequência de factos praticados no exercício das suas funções ou por causa delas (..) desde que a acção ou a acusação já tenha sido admitida»[artigo 115º, 1, g)].

(…) Donde o entendimento jurisprudencial que, embora o artigo 44º,1, f), do CPA, pareça ser menos exigente do que o processo civil no que respeita aos pressupostos do impedimento resultante da pendência de processo penal, não pode afirmar-se que a mera apresentação da denúncia opera como causa de impedimento.

(…) Por último, embora o princípio da imparcialidade seja transversal a todo o procedimento administrativo, o exercício dos poderes funcionais no seu decurso só adquire desvalor jurídico quando determine ou influencie a decisão administrativa num certo sentido. E a intervenção da Senhora Inspectora limitar-se-á, num exercício de natureza pericial, apresentar ao CSM os dados recolhidos e a proposta de notação que, na sua óptica os mesmos enformam, mas a deliberação classificativa cabe ao CSM. Neste enfoque da questão, só remotamente se pode falar em determinação ou influência da Senhora Inspectora no acto final.

(…) Pelo exposto, considerando não verificados os respectivos pressupostos, o Plenário do Conselho Superior da Magistratura delibera indeferir o incidente de impedimento requerido pela Exma. Dra. …”.

- A A., embora a respeite, discorda da apreciação feita pela douta deliberação impugnada, porquanto considera que a mesma padece, e salvo o devido respeito, de vício de violação de lei, por desrespeito da norma do artigo 44º, nº 1, alínea f), do (antigo) CPA, sendo, por isso, ilegal e, em consequência, anulável, nos termos do disposto no artigo 163º do CPA, aprovado pelo Decreto-Lei nº 4/2015, de 7 de Janeiro.

Da violação do disposto no artigo 44º, nº 1, alínea f), do CPA - A A. suscitou, como vimos, junto do R. um incidente de impedimento relativamente à Exma. Senhora Inspectora Judicial que foi designada para realizar a inspecção ordinária de 2014 ao seu serviço.

- Tal como resulta do requerimento onde é suscitado o incidente, o impedimento da Exma. Senhora Inspectora Judicial tem por base a existência de procedimento criminal pendente (Inquérito nº…) contra a Exma. Senhora Inspectora Judicial, como consequência da sua actuação, considerada criminalmente punível, quanto à fixação do período que se encontra sob a alçada da inspecção.

- Significa isto que o pressuposto normativo que serve de base ao impedimento da Exma...

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