Acórdão nº 26/13.4EASTR-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução18 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

* Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, .... – ..., S.A.

e BB, devidamente identificados, interpuseram recurso extraordinário de revisão da sentença que condenou AA pela prática, em autoria material, de um crime de venda, circulação ou ocultação de produtos ou artigos, previsto e punível pelo artigo 324º, do Código da Propriedade Industrial, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de € 75,00, bem como na prática de um contra-ordenação de concorrência desleal, prevista e punível pelos artigos 317º, n.º 1, alínea a), e 331º, do Código da Propriedade Industrial, na coima de € 750,00, e .... – ..., S.A. pela prática, em autoria material, de um crime de venda, circulação ou ocultação de produtos ou artigos previsto e punível pelos artigos 320º e 324º, do Código da Propriedade Industrial, conjugados com o artigo 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de € 250,00, e de uma contra-ordenação de concorrência desleal, prevista e punível pelos artigos 317º, n.º 1, alínea a), e 331º, do Código da Propriedade Industrial, por referência artigo 320º do mesmo Código, conjugados com o artigo 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, na coima de € 3.000,00.

São do seguinte teor as conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação de recurso[1]: 1. O objecto do presente recurso de revisão é a Douta Sentença proferida nos autos em 25 de Fevereiro de 2015, que condenou os arguidos pela prática do crime de venda circulação ou ocultação de produtos – na realidade, um único produto –, p.p. pelo artigo 324º do CPI, e ainda de uma contraordenação de concorrência desleal, p.p. pelos artigos 317º, nº 1, alínea a) e 331º do CPI.

  1. O presente recurso é apresentado com os fundamentos previstos nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 449º do CPP.

  2. Desde logo, saliente-se que os requerimentos que estiveram na origem do presente processo são precisamente os mesmos que desencadearam o processo nº 25/13.6EASTR, bem como nos restantes processos nº 24/13.8EASTR e nº 358/13.1ECLSB. (cfr. Docs. nºs 17, 18, 23 e 24).

  3. Ora, sucede que por decisão proferida em 20 de Abril de 2015, no âmbito do processo nº 25/13.6EASTR que correu os seus termos no J2, Instância Local, Secção Criminal, da Comarca de ...., considerou-se que tais requerimentos não eram válidos, no sentido de que não tinha sido apresentada queixa válida. (cfr. Doc. n.º 19).

  4. Por um lado, alguns dos factos que serviram de fundamento à condenação dos arguidos nos presentes autos, são inconciliáveis com os dados como provados numa outra recente sentença proferida âmbito do mesmo processo nº 25/13.6EASTR, datada de 26 de Junho de 2015. (cfr. Doc. n.º 20).

  5. Resultando dessa oposição entre sentenças, graves dúvidas sobre a Justiça da condenação dos Arguidos nestes autos.

  6. E tais novos factos ou meios de prova, só por si, ou combinados com os que foram apreciados nos autos, também suscitam graves dúvidas sobre a Justiça da condenação.

  7. São esse factos, designadamente, os seguintes: - No Processo n.º 25/13.6EASTR, que correu os seus termos no J2, Instância Local, Secção Criminal, da Comarca de ..., a questão da validade da queixa-crime foi analisada na audiência de julgamento do dia 20 de Abril de 2015, tendo sido proferido o seguinte despacho (Doc. n.º 19): “Compulsados os autos verifica-se que não constam dos mesmos qualquer queixa, nem qualquer declaração de desejo de procedimento criminal contra os arguidos relativamente aos crimes que se mostram acusados. Todo o processo se desenrola com base na exposição factual expressa, entre outras a fls. 17 a 33.

    Contudo sempre se dirá que as Ofendidas após terem solicitado na participação que apresentaram na ASAE onde requereram diligências de fiscalização com vista à apreensão de produtos onde se manifeste a violação dos direitos de exclusivo decorrentes da titularidade do desenho comunitário nº 829.668, apenas manifestara a sua intenção de apresentar queixa contra todos os que vierem a ser identificados como responsáveis pelos factos.

    Certo é que no decurso do processo apenas consta esta expressa intenção a qual nunca foi concretizada, ou seja nunca foi formalmente apresentada queixa contra os arguidos” – sublinhados nossos.

    - Assim, considerou o Mm.º Juiz que “ (…) não tendo havido queixa contra os arguidos, carece o Ministério Público de legitimidade para o procedimento criminal.” - Nestes termos, foi declarado extinto o procedimento criminal contra os arguidos, mantendo, no entanto, a acusação quanto ao procedimento contraordenacional por concorrência desleal.

    - Foi, assim, com base na falta de apresentação de queixa válida, e da consequente falta de legitimidade do Ministério Público para promover a acção penal que foi determinado o arquivamento do referido processo nº 25/13.6EASTR, nos termos do disposto nos artigos 48º e 49º, ambos do Código e Processo Penal.

    - O processo prosseguiu então para o julgamento do ilícito contraordenacional por concorrência desleal, tendo os arguidos sido absolvidos.

    - Nesta sentença que julgou o ilícito contraordenacional no âmbito do processo nº 25/13.6EASTR do Tribunal de ..., foi dado como provado que “a Ofendida não apresentou qualquer queixa, nem qualquer declaração de desejo de procedimento criminal contra os arguidos, apenas manifestou a intenção de apresentar queixa contra todos os que vierem a ser identificados como responsáveis dos facto, o que nunca se concretizou” (Cfr. Doc 20).

    - Por fim, 9. Ora, o citado despacho que julgou a invalidade da queixa é subsumível na previsão da alínea a) do n.º 1 do artigo 449º do CPP – sendo certo que, precisamente do mesmo modo, a falta de queixa-crime também se verifica no caso dos autos –, enquanto que a inclusão nos factos dados como provados que “(…) a Ofendida não apresentou qualquer queixa …” configura o fundamento de recurso previsto na alínea c) do mesmo precito legal.

  8. Deve assim ser concedida a revisão, com fundamento na não apresentação de queixa válida, que determina a alteração da decisão na parte criminal, por falta de legitimidade do Ministério Público para promover o processo, com a consequente absolvição dos arguidos do crime de venda, circulação ou ocultação de produtos ou artigos, p.p. no artigo 324º do CPI e revogação das penas de multa aplicadas aos arguidos.

  9. Mas há, ainda, outro fundamento de revisão que está relacionado com a questão da falta de dolo dos arguidos: - a declaração que consta dos requerimentos de desistência de queixa apresentados pela Ofendida BB, onde a própria Ofendida admite que “ (...) os arguidos não tinham plena consciência de que estavam a infringir os direitos de propriedade industrial titulados pela queixosa – designadamente os desenhos ou modelos identificados nos presentes autos” (cfr. Docs nºs 4, 5, 6, 7, 8 e 9) - esta factualidade é subsumível na alínea d) do n.º 1 do artigo 449 do CPP.

    - por outro lado, ainda no que concerne à questão do dolo, que também consta da referida sentença que julgou o ilícito contraordenacional de concorrência desleal no processo 25/13.6EASTR, do Tribunal de Santarém, escreve-se: “(...) não foi apurada qualquer prova dos factos constantes da acusação susceptíveis de integrar (...) quer o elemento subjectivo da contraordenação - ou seja que os arguidos tenham actuado com consciência de ilicitude ou com dolo –pelo que a cusação deve improceder por não provada e a consequente absolvição dos mesmos”.

    - existindo, ainda, um acordo celebrado entre a Ofendida BB e os arguidos que esteve na origem de tais desistências de “queixa” que também constitui um facto que está relacionado com o presente processo (cfr. Doc nº 2).

    - foi o facto de a Ofendida ter reconhecido que os arguidos agiram sem consciência de que estavam a infringir o seu modelo de sapatos, que permitiu alcançar o acordo que deu origem às desistências de “queixa”; - E existe, ainda, uma DECLARAÇÃO SUBSCRITA PELA OFENDIDA EM 6 DE JULHO DE 2015, que se dá aqui por reproduzida, na qual reitera o facto de que o Arguido AA “(…)não tinha consciência de estar a infringir os desenhos ou modelos em causa (…)” – cfr. Doc. n.º 21.

  10. Ora, todos estes factos são inconciliáveis com alguns dos factos dados como provados no presente processo, daí resultando graves dúvidas sobre a Justiça da condenação aplicada aos arguidos nos presentes autos.

  11. Em todos os referidos processos estão em causa os mesmos factos, ou seja: - os produtos que estão em causa são os mesmos em todos os processos, ou seja os factos são os mesmos: calçado (Cfr. Docs.. nºs 1 e 25); - Os requerimentos que estiveram na origem do presente processo são precisamente os mesmos que desencadearam o processo nº 25/13.6EASTR, bem como nos restantes processos nº 24/13.8EASTR e nº 358/13.1ECLSB. (cfr. Docs. nºs 17, 18, 23 e 24).

    - Assim como os requerimentos de desistência de “queixa” também são exactamente iguais, pois em todos eles consta uma declaração pela qual a própria Ofendida admite que os arguidos agiram sem consciência de que estavam a imitar o seu modelo de calçado (Cfr. Docs. nºs 4, 5, 6, 7, 8, e 9); - e, por último, o acordo celebrado com a Ofendida também abrange todos os processos (Cfr. Docs. nºs 2 e 21); - também haverá a ter em consideração que os requerimentos de desistência de queixa – incluindo os apresentados quer no processo 25/13.6EASTR, do Tribunal de ... e no processo 26/13.4EASTR, do Tribunal de ... –, foram deduzidos em data posterior à da leitura de sentença, no sentido de que estamos perante documentos não apreciados em sede de julgamento, que preenchem, assim, o conceito de factos novos.

  12. Por o requerimento de desistência de queixa, nestes autos, ter sido recusado por despacho de 5 de Março de 2015, e pelo seu próprio teor, conclui-se que o tribunal apenas se pronunciou sobre a questão da extemporaneidade do requerimento de desistência de queixa: - o Mm.º Juiz, nestes autos, não se pronunciou sobre a parte em que a Ofendida admite que “(...) os arguidos...

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