Acórdão nº 1715/12.6TTPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | ANTÓNIO LEONES DANTAS |
Data da Resolução | 28 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA instaurou ação para impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra BB – HEALTH and FITNESS S.A., requerendo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do mesmo.
A empregadora veio apresentar articulado onde imputa ao trabalhador comportamentos reveladores de desrespeito, provocação repetida de conflitos, violação de direitos e garantias laborais e desobediência para com aquela e demais trabalhadores, que fundamentaram o despedimento do trabalhador com justa causa e deduziu oposição à reintegração. Concluiu pedindo que seja julgado improcedente o requerimento para declaração da ilicitude do despedimento, e caso assim não seja entendido, pede a exclusão da reintegração do trabalhador.
O Autor veio apresentar contestação, alegando a falta de poder disciplinar da aqui empregadora relativamente aos factos alegadamente ocorridos entre 03.10.2011 e 01.06.2012 e a caducidade do procedimento disciplinar. Alegou ainda que os factos imputados são falsos, distorcidos e descontextualizados pela empregadora, inexistindo justa causa para o despedimento. Pede, em via reconvencional, que se declare a ilicitude do despedimento e que a empregadora seja condenada a reintegrá-lo e a pagar-lhe todas as prestações devidas em consequência do despedimento ilícito e ainda as demais que indica no seu articulado.
A ação prosseguiu os seus termos e veio a ser decidida por sentença de 4 de agosto de 2014, que integra o seguinte dispositivo: «Pelo exposto julgo lícito o despedimento operado pela empregadora e improcedente por não provado o pedido reconvencional, absolvendo, em consequência a entidade empregadora do pedido».
Inconformado com esta decisão dela recorreu o Autor para o Tribunal da Relação do Porto, arguindo a nulidade da sentença e «pedindo a sua revogação e substituição por acórdão que julgue o despedimento ilícito e procedente o pedido reconvencional».
O Tribunal da Relação veio a conhecer do recurso interposto por acórdão de 15 de junho de 2015, nos seguintes termos: «Termos em que se julga a apelação parcialmente procedente, se revoga a sentença recorrida, se substitui a mesma pelo presente acórdão, e em consequência se julga ilícito o despedimento de AA e se condena a BB – HEALTH AND FITNESS S.A.
1. A reintegrar aquele AA no seu posto de trabalho nos termos indicados no artigo 389º, nº1, al. b) do CT/2009.
2. A pagar-lhe as retribuições [nelas se incluindo a retribuição base e os 140 litros por mês de combustível, para uso particular (cartão frota)] que deixou de auferir desde 05.11.2012 até ao trânsito em julgado do presente acórdão – artigo 390º, nº1 do CT – e sem prejuízo do disposto na al. c) do nº 2 da mesma disposição legal, a liquidar oportunamente, nomeadamente o valor da sua retribuição em espécie.
3. A pagar a sanção pecuniária compulsória no montante de € 500,00 por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de reintegração, sendo metade destinada ao aqui trabalhador e a outra metade ao Estado.
4. A pagar-lhe, sobre as quantias indicadas em 2, os juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a contar da notificação da contestação à empregadora e até ao trânsito em julgado da sentença, sendo à taxa de 5% ao ano a partir desta data e até integral pagamento.
5. Dos demais pedidos se absolve a BB.
* * * Custas em ambas as instâncias a cargo do aqui trabalhador e da aqui empregadora na proporção de metade para cada um».
Irresignada com esta decisão veio a Ré interpor recurso de revista para este Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1.ª - O douto acórdão recorrido, nas alterações que efetuou à decisão sobre a matéria de facto, deu por "não escritos" diversos pontos ali incluídos, por ter considerado que os mesmos constituíam matéria conclusiva.
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- A Recorrente discorda desta eliminação, quanto aos pontos 41 (este quanto à parte final: "quando os managers reclamavam ou discordavam das opiniões do TRABALHADOR, a resposta que lhes dava era que se demitissem se não estavam satisfeitos"), 42, 54, 81 (na parte: "mesmo com os seus pares, o TRABALHADOR, para expor as suas ideias, não hesitava em gritar e discutir") e 82 a 85, que não comportam nenhum juízo valorativo, pelo que devem manter-se na matéria assente.
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- Note-se que mesmo na justificação para a eliminação de cada um dos ditos pontos, o Tribunal da Relação não considera "conclusiva" a respetiva matéria. Foi violado, por errada interpretação, o disposto no artigo 607.°, n.º 4 do CPC, 4.ª - Na ponderação do ponto 82, o Tribunal da Relação censurou a inclusão, na sentença, dos nomes de trabalhadores, que não constavam da decisão de despedimento, mas tal contraria a posição do próprio Recorrido que no seu recurso de apelação não a pôs em causa, além de não atender ao disposto no artigo 5.°, n.º 2, al. b) do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art, 1.º, n.º 2, al. a) do Código do Processo do Trabalho, pelo que deve ser mantido na matéria assente.
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- Acresce que o douto acórdão recorrido desconsiderou ainda outros factos da matéria assente, com fundamento em os mesmos não estarem "circunstanciados/concretizados no tempo", com o que a Recorrente não pode conformar-se. Estão neste grupo os factos dos pontos 33, 34, 35, 38, 39, 60, 61, 75 e 77. Verificou-se, por parte do Tribunal a quo, uma errada interpretação do artigo 353.°, n.º 1 do Código do Trabalho.
Com efeito, 6.ª - Na decisão acerca da justa causa de despedimento não poderá deixar de se atender igualmente aos factos assentes 33, 34, 35, 38, 39, 60, 61, 75 e 77 (desconsiderados, como se disse, pelo Tribunal da Relação) porquanto, embora alguns deles não estejam circunstanciados, o Recorrido mostrou conhecê-los e pronunciou-se sobre os mesmos, pelo que pôde exercer o seu direito de defesa.
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- Sendo que a omissão do momento (exato) da prática dos mesmos não releva, não só pela circunstância referida na conclusão anterior, como pelo facto de não ter prescrito o direito a exercer o poder disciplinar, porquanto o Recorrido não tinha um ano de antiguidade no momento em que foi notificado da nota de culpa.
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- Os factos praticados pelo Recorrido constituem violações de direito de outros trabalhadores - insultos, humilhações e desrespeito pelos subordinados (factos assentes 33, 34, 38, 45, 46, 49, 56, 57, 60, 61, 63 a 65, 66, 67) - outros configuram mesmo urna situação de mobbing - sugestão para apresentar demissão feita a dois club managers (factos assentes 33, 34 e 38) - pelo que são ilícitos. Os mesmos, não só legitimam, como exigem uma atuação disciplinar por parte da Recorrente em relação do Recorrido, sob pena de com essa omissão aquela estar a violar os direitos e garantias dos trabalhadores visados.
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- Por outro lado, são factos que assumem especial gravidade pelo facto de o Recorrido ser um trabalhador altamente qualificado - Diretor -, o Responsável máximo pelo Negócio de Fitness, a quem se exige um especial cuidado na forma de relacionamento com os demais trabalhadores, desde logo um especial cuidado com a linguagem adotada e com as atitudes em relação aos demais, e em relação ao qual terá que haver um especial grau de confiança.
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- Além de os factos serem graves, as consequências dos mesmos também o são porquanto desmotivadores (factos assentes 33, 34, 38 e facto 82 que a Recorrente entende dever ser considerado assente) e criadores de um ambiente pouco saudável nas relações profissionais da Recorrente (factos assentes 47, 61), patente, desde logo, no facto de alguns trabalhadores terem expressamente manifestado a sua indignação pelos comportamentos do Recorrido (factos assentes 17,35,61).
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- Não é exigível que o empregador mantenha ao serviço um trabalhador que se dirige aos seus subordinados em termos e linguagem impróprios, chegando ao ponto de os insultar, que provoca repetida e desnecessariamente conflitos com eles, que os intimida, que os desmotiva, que duvida do seu trabalho, que viola os direitos e garantias laborais dos seus subordinados, designadamente do gozo de férias e de períodos de descanso, assumindo tais atos especial gravidade, não só pelo cargo ocupado pelo Recorrido, mas igualmente por serem praticados na presença de vários trabalhadores da Recorrente.
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- A Recorrente não pode pactuar com situações como as descritas nos presentes autos, sob pena de criar um estado de insegurança e receio dos demais trabalhadores. Na verdade, se a Recorrente permitisse estes comportamentos (insultos, ameaças, humilhações e desrespeito pelos descanso dos trabalhadores) e não os sancionasse disciplinarmente, não estaria a proporcionar aos outros trabalhadores, nomeadamente aos Club Managers, boas condições de trabalho.
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- A violação reiterada dos direitos e garantias dos trabalhadores da empresa, a provocação de conflitos com outros trabalhadores da empresa e a prática, no âmbito da empresa, de injúrias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhador da empresa constituem justa causa de despedimento (artigo 351.º n.º 1 e 2, alíneas b), c) e i) do Código do Trabalho).
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- O exercício das funções de Diretor de Operações, responsável máximo do negócio de fitness da Recorrente, requer confiança absoluta do empregador no trabalhador.
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- Esta confiança foi abalada de forma irremediável pelos comportamentos do Recorrido.
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- O próprio Tribunal da Relação do Porto deu como assente que "O cargo ocupado pelo trabalhador pressupõe confiança absoluta na pessoa que o ocupa" (facto assente 86) e que "A imputação ao TRABALHADOR dos factos que determinaram o seu despedimento fez cessar a confiança inerente à sua contratação" (facto assente 93), pelo que não pode deixar de se concluir pe1a licitude do despedimento do Recorrido.
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- O despedimento do Recorrido foi lícito, porque com justa causa, pelo que a decisão a que chegou o tribunal a quo deverá ser revogada, concluindo-se pela licitude do despedimento do Recorrido.
Sem prescindir, e a título subsidiário 18.ª - A...
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