Acórdão nº 4915/04.9TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelFERNANDES DO VALE
Data da Resolução01 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. nº 4915/04.9TVLSB.L1.S1[1] (Rel. 225) Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça 1 - “AA, S. A.

” (“AA”) e “BB, S. A.

” instauraram, no Tribunal Cível da comarca de Lisboa, no decurso do ano de 2004, acção declarativa, com processo comum e sob a forma ordinária, contra “CC - Sociedade …, S. A.

” e “CC - Construções ..., S. A.

”, pedindo a condenação da 1ª R. a pagar à 1ª A. a quantia de € 354 384,09, correspondente a 20% do montante total dos prejuízos sofridos, acrescida de juros de mora, desde 01.07.04 até integral pagamento, e à 2ª A. a quantia de € 139 767,66, acrescida de juros de mora, desde 01.07.04, e a condenação da 2ª R. a pagar à A. “BB” a quantia de € 93 178,44, acrescida de juros desde 01.07.04.

Fundamentando a respetiva pretensão, invocaram, muito em resumo e essência, a celebração de diversos contratos de aquisição de ações com as RR., nos quais houve falsidade da informação que conduziu à sobreavaliação das empresas.

As RR. impugnaram os pedidos.

Percorrida a subsequente tramitação, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida decisão sobre a matéria de facto, contra a qual não houve reclamações.

Foi proferida sentença que decretou a procedência parcial da ação, tendo: / I - Absolvido a R. “CC S…” do pedido contra si deduzido por “AA, S. A.”; II - Condenado a R. “CC S…” a pagar à “BB” a quantia de € 23 076,86, acrescida de juros de mora vencidos, desde 19.04.02, e vincendos até integral pagamento, à taxa legal para as sociedades comerciais; III - Condenado a R. “CC, S. A.” a pagar à A. “BB” a quantia de 23 076,86), acrescida de juros vencidos, desde 19.04.02 e vincendos até integral pagamento, contados desde 19.04.02, à taxa legal para as sociedades comerciais.

Tendo sido interposta apelação por todas as partes, a Relação de Lisboa, por acórdão de 12.12.13, decidiu: / “Procede pois deste modo o recurso apresentado pelas RR.

Prejudicada a ampliação do recurso deduzida pelas mesmas.

Segue deliberação.

Na improcedência da apelação das AA. mantém-se a sentença apelada na parte em que julgou a acção improcedente e revoga-se esta na parte em que condenou as RR., declarando-se agora as mesmas totalmente absolvidas da pretensão deduzida nos autos”.

Daí a presente revista interposta pelas AA.

, visando a revogação do acórdão impugnado, conforme alegações culminadas com a formulação das seguintes conclusões: / / 1ª - Consideram as ora recorrentes que o douto acórdão recorrido se encontra viciado, na sua base, por um erro de direito; 2ª - O erro fundamental do Tribunal “a quo” consistiu na aplicação do regime legal da responsabilidade civil aos factos dos autos, quando as partes haviam contratual e expressamente estipulado, ao abrigo da sua autonomia privada, um específico regime para as divergências entre as qualidades do objecto do negócio declaradas pelas vendedoras, aqui recorridas, e as reais características daquele; 3ª - Verifica-se pois, designadamente, a aplicação errónea dos artigos 798.° e seguintes do Código Civil; SOBRE A CLÁUSULA DE GARANTIA 4ª - Recorrentes e recorridas estabeleceram, contratualmente, uma cláusula de garantia, segundo a qual as vendedoras, aqui recorridas, responderiam automaticamente - isto é, de forma objectiva - pelas divergências entre o que expressamente declararam quanto à situação económico-financeira das sociedades vendidas e a realidade, "haja o que houver"; 5ª - As cláusulas 4ª e 5ª dos contratos celebrados entre as recorridas e as recorrentes “AA” e “BB”, respectivamente, bem como o Anexo IV aos mesmos, consubstanciam a referida cláusula de garantia, em que as recorridas asseguraram expressa, irrevogável, incondicionalmente e sem reservas, a verificação de determinadas qualidades das sociedades objecto do negócio; 6ª - A cláusula de garantia não se reconduz a qualquer obrigação de comportamento, mas à assunção do risco da desconformidade entre a situação declarada e a real situação das sociedades objecto do negócio; 7ª - As recorridas respondem assim de forma automática, isto é, independentemente da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil - facto ilícito, culpa ou dano - por qualquer divergência entre o declarado contratualmente e a realidade, desde que abrangida pela cláusula de garantia; 8ª - Recorrentes e recorridas estabeleceram expressamente as consequências da violação da cláusula de garantia nas cláusulas 12ª, nº 1 e 7ª, nº1 do contrato - recorrida “CC S…” - recorrente “AA” e recorridas “CC S…” e “CC S. A.” - recorrente “BB”, respectivamente; 9ª - Uma vez que, com a cláusula de garantia, as recorridas não assumiram qualquer obrigação de comportamento, a violação daquela não pode qualificar-se como um incumprimento no sentido tradicional que lhe é atribuído em sede de responsabilidade civil legal; 10ª - Não existindo incumprimento em sentido clássico, a violação da cláusula de garantia não gera um dever de indemnizar na acepção do regime legal da responsabilidade civil, mas apenas um dever de prestar em sentido estrito, correspondente à diferença entre o valor económico-financeiro da sociedade garantido pelas recorridas através das contas apresentadas e o seu valor real, que teria determinado o preço do negócio; 11ª - Os significantes indemnizar e dano são utilizados no seu sentido comum e amplo, sem que importem uma definição da aplicação do regime legal da responsabilidade civil; 12ª - Nas cláusulas 12ª nº/s 1 e 3 e 7ª, nº/s 1 e 4 dos contratos, as partes estabeleceram ainda uma franquia, ou seja, determinaram contratualmente qual o valor a partir do qual as divergências entre a situação declarada e garantida pelas vendedoras e a situação real das sociedades objecto do negócio seria relevante para efeitos de responsabilização das recorridas; 13ª - No caso do contrato entre a recorrida “CC S…” e a recorrente “AA”, o valor materialmente relevante das divergências a partir do qual há lugar à responsabilização da recorrida é de Esc. 50 000 000$00 (€ 249 398,95) - cláusula 12ª, nº 3; 14ª - Já no caso do contrato celebrado entre as recorridas e a recorrente “BB”, o valor mínimo das divergências situa-se nos Esc. 2 500 000$00 (€ 12 469,95) - cláusula 7ª, nº4; 15ª - O que releva é, apenas, determinar se a soma do valor de todas as discrepâncias contabilísticas entre o declarado pelas vendedoras e a realidade é igual ou superior ao valor das franquias. Nesse caso há, automaticamente, lugar à responsabilização das vendedoras, aqui recorridas, sendo irrelevante a existência de qualquer materialidade dos valores em sentido contabilístico estrito; 16ª - Não se trata, pois, de determinar se o valor de cada uma das sociedades no seu todo era ou não, afinal, inferior ao que lhe foi atribuído pelas partes; SOBRE O VALOR DOS DANOS SOFRIDOS PELAS RECORRENTES, EM VIRTUDE DAS DIVERGÊNCIAS EXISTENTES Prejuízos sofridos pela recorrente “AA” Relativamente à “BB” 17ª - A recorrente “AA” sofreu, em virtude das divergências entre a situação patrimonial da “BB” garantida pela recorrida “CC S…” um dano total de € 431 978,95; 18ª - Considerando a franquia estabelecida na cláusula 12ª, nº 3 - € 249 398,95 -, o valor em dívida pela recorrida “CC S…” é de € 391 672,26, incluindo capital e juros de mora vencidos até dia 03 de Fevereiro de 2014; Relativamente à “DD” 19ª - A recorrente “AA” sofreu, em virtude das divergências entre a situação patrimonial da “DD” garantida pela recorrida “CC S…” e a sua situação real um dano total de € 753 918,06; 20ª - Considerando o valor de 60% de participação da “BB” na “DD” e o valor de 20% da participação da “CC S…” na “BB”, o valor total em dívida é de € 193 205,29, incluindo capital e juros de mora até 03 de Fevereiro de 2014; Relativamente à “EE” 21ª - Os prejuízos sofridos pela recorrente “AA” em consequência das divergências entre a situação patrimonial da “EE” garantida pela recorrida “CC S…” e a sua situação real é de € 702 246,52; 22ª - Tendo em consideração a participação de 50% detida pela “BB” na “EE” e o valor da participação da recorrida “CC S…” na “BB” - 20% - o valor devido é de € 149 923,41, contabilizados o capital e os juros de mora até 03 de Fevereiro de 2014; Relativamente à “FF” 23ª - Os prejuízos sofridos pela recorrente “AA” em consequência das divergências entre a situação patrimonial da “FF” garantida pela recorrida “CC S…” e a sua situação real é de € 158 009,19; 24ª - Tendo em consideração a participação de 75 % detida pela “BB” na “FF” e o valor da participação da Recorrida “CC S…” na “BB” - 20% - o valor devido é de € 50 553,60, o qual inclui o capital e os juros de mora vencidos até 03 de Fevereiro de 2014; Relativamente à “GG” 25ª - Os prejuízos sofridos pela recorrente “AA” em consequência das divergências entre a situação patrimonial da “GG” garantida pela recorrida “CC S…” e a sua situação real é de € 79 042,61; 26ª - Tendo em consideração a participação de 60% detida pela “BB” na “GG” e o valor da participação da recorrida “CC S…” na “BB” - 20% - o valor devido é de € 20 231,16; Total 27ª - O valor global do prejuízo sofrido pela “AA” no âmbito do contrato celebrado com a recorrida “CC S…”, tendo já em conta a referida franquia estabelecida na cláusula 12ª, nº3 do contrato e a participação de 20% que a recorrida “CC S…” detinha na” BB”, é de € 678 095,72; Dos prejuízos sofridos pela recorrente “BB” Relativamente à “EE” 28ª - Os prejuízos sofridos pela recorrente “BB” em consequência das divergências entre a situação patrimonial da “EE” garantida pelas recorridas “CC S…” e “CC S. A.” e a sua situação real é de € 702 246,52; 29ª - O valor da franquia estabelecido na cláusula 7ª, nº4 do contrato - € 12 469,95 - encontra-se claramente ultrapassado; 30ª - Atenta a percentagem de 50% de capital social detido pela “BB” na “EE”, está em causa um prejuízo de € 351 123,26; 31ª - A responsabilidade da recorrida “CC S…”, tendo em consideração o valor da participação que detinha na “EE” -15% -, ascende ao montante de € 112 442,57; 32ª - A responsabilidade da...

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