Acórdão nº 294/13.1TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução03 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA instaurou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra INAC - INSTITUTO NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL, I.P., pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 108.448,91, a título de subsídio de isenção de horário de trabalho, acrescida de juros de mora e de juros compensatórios à taxa de 5%.

Para o efeito, alegou, no essencial, que em 1 de março de 2000 celebrou contrato de trabalho com o réu, e que desde 2 de março de 2000 e até 1 de setembro de 2012 exerceu funções de chefia, em regime de comissão de serviço e de isenção de horário de trabalho, não tendo o réu, até hoje, procedido ao pagamento do subsídio de isenção correspondente ao período compreendido entre 2 de março de 2000 e 31 de dezembro de 2008.

O réu contestou a ação, defendendo-se por exceção e impugnação. Por exceção, invocou a prescrição dos juros vencidos há mais de cinco anos. Por impugnação, alegou que não pagou os subsídios de isenção de horário de trabalho reclamados porquanto não foram cumpridos os requisitos formais exigidos para a atribuição daquele complemento remuneratório.

O autor respondeu, concluindo pela improcedência das exceções invocadas.

A ação foi decidida por sentença proferida em 13 de março de 2014, que integra o seguinte dispositivo: «Julgo a ação parcialmente procedente e condeno o INAC-Instituto Nacional de Aviação Civil, I.P. a pagar a AA, a quantia de €108.177,56, acrescida de juros de mora computados desde a data do vencimento de cada prestação até integral pagamento, às taxas de 7% até 30 de abril de 2003 e de 4% desde 1 de maio de 2003».

Inconformado com esta decisão, dela recorreu a R. para o Tribunal da Relação de Lisboa, «pedindo a sua revogação e substituição por acórdão que absolva o Recorrente do pagamento ao Recorrido da quantia, pelo qual vem condenado, relativa a suplemento de isenção de horário, bem como dos respetivos juros moratórios» O Tribunal da Relação, por decisão proferida pelo relator, ao abrigo do disposto no art. 652.º, n.º1, al. c) e 656.º do CPC, veio a conhecer do recurso interposto, decidindo: “(…) nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida, na parte impugnada”.

Dessa decisão singular veio a R. reclamar para a Conferência, requerendo que sobre a matéria da referida Decisão Sumária Singular, recaísse Acórdão.

Nessa sequência e por acórdão de 27 de maio de 2015 (fls. 733 a 741), decidiu o Tribunal da Relação, nos seguintes termos: «Em conformidade com os fundamentos expostos, confirma-se a decisão do relator, ou seja, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida», integrando o acórdão».

Contudo, o acórdão teve um voto de vencido, na parte em que não considerou prescritos os juros de mora vencidos cinco anos antes da citação.

Não se conformando com esta decisão, veio a Ré interpor recurso de revista para este Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1. O Acórdão da Relação é confirmativo da decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, existindo um voto de vencido circunscrito à questão da prescrição dos juros de mora.

  1. No entanto, o Acórdão contém uma fundamentação essencialmente diferente da que constava da sentença, pelo que entendemos que o presente recurso de revista deve ser admitido como recurso de revista normal, nos termos previstos no n.° 3 do art.° 671.º, do C. P. Civil.

  2. Caso assim não seja, deverá o presente recurso ser admitido como recurso de revista excecional, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 672.° do C. P. Civil, por estar em causa uma questão, cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

    4. Estamos perante uma questão jurídica complexa, cuja solução exige um difícil e detalhado exercício interpretativo e de harmonização dos diversos diplomas legais, de natureza pública e privada, que regulam esta matéria.

  3. A questão em apreço possui a necessária relevância jurídica para ser objeto de apreciação por esse douto Tribunal, quer pelo elevado número de funcionários envolvidos, quer pelos elevados montantes em causa, podendo ainda ser vista como paradigmática para outros Institutos Públicos, sujeitos, como o INAC, a uma diversidade de regimes jurídicos, de natureza pública e também privada, contraditórios entre si.

  4. Pela sua importância e relevância, esta matéria deverá obter o maior consenso jurisprudencial possível, que permita, por um lado, uniformizar as várias decisões contraditórias já proferidas, e por outro, que sirva de orientação, quer para as pessoas que têm interesse direto na sua resolução, quer para as instâncias intermédias onde se encontram pendentes diversos processos iguais ao presente.

  5. O interesse geral na boa aplicação do direito impõe que o presente recurso seja admitido, não deixando transitar em julgado uma decisão que, no nosso entender, contraria uma decisão já proferida por esse Tribunal.

  6. A boa aplicação da justiça impõe, também, a admissão deste recurso para que a mesma questão obtenha igual decisão por parte dos nossos tribunais, não sendo objeto de casos julgados contraditórios.

    9.Pelos motivos expostos, deverão V. Exas. considerar que no presente recurso de revista está em causa uma questão, cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e produzir decisão que a admita, nos termos previstos no n.º 3, do artº 672.° do C. P. Civil.

  7. O pessoal do INAC, IP e mais concretamente o seu pessoal dirigente, ficou sujeito, a partir da sua nomeação como titular de cargo de órgão de estrutura do R. e até 01.01.2009 (data em que entra em vigor o Regime de contrato de trabalho em funções públicas) a um regime especial, enquadrado e moldado, pelos seus Estatutos e Regulamentos, pelas normas de direito público de caráter imperativo, constantes, designadamente, da Lei n.º 3/2004, de 15.01. (Lei-‑Quadro dos Institutos Públicos, artigos 6.° n.ºs 1 e 2, alínea a) e 34° n.ºs 1 e 4) da Lei n.º 2/2004, de 15.01 (Estatuto do Pessoal Dirigente, cfr. artigo 1.º n.° 2 e artigos 13° a 17°, relativos ao exercício de funções pelo pessoal dirigente), da Lei n.º 23/2004, de 22 de junho (Regime jurídico do contrato individual de trabalho na administração pública cfr. art.º 6.°) e subsidiariamente, e em tudo o que não seja afastado pelo regime estatutário, regulamentar ou de direito público imperativo vigente, pelo regime do contrato individual de trabalho.

  8. Os artigos 13.º a 17.º do Estatuto do pessoal Dirigente, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15.01, consagram a sujeição normativa do pessoal dirigente ao regime de isenção de horário de trabalho, sem que, por isso, lhe seja devida qualquer remuneração por trabalho prestado fora do período normal de trabalho. 12. Embora no Regulamento de horário de trabalho se estabeleça que os Dirigentes estão isentos de horário de trabalho, nem neste Regulamento, nem no Regulamento de Carreiras e Regime Retributivo do INAC, IP se prevê o pagamento do subsídio de isenção de horário.

  9. Não prevendo tal Regulamento, nem o Regulamento que estabelece o regime retributivo dos funcionários do INAC, o pagamento de subsídio de isenção de horário, não existe fundamento legal para condenar o R. a proceder ao seu pagamento.

  10. Não pode assim, haver lugar, na situação vertente, à aplicação subsidiária do regime geral constante do Código do Trabalho, relativo à remuneração do Regime de Isenção de Horário, como considerou o Acórdão recorrido, dado não se estar perante uma situação não regulada e omissa nos Estatutos do INAC, IP e por a tal se opor o regime especial de direito público a que o pessoal do INAC, IP se encontra sujeito.

  11. Embora no caso presente o autor tenha celebrado um contrato individual de trabalho, o que não acontecia no caso apreciado no acórdão proferido por esse douto Tribunal, em 25 de março de 2015, no Proc. n.º 1315/12.0TTLSB.L1.S1, 4.ª Secção, entendemos que os fundamentos desta decisão se aplicam também ao caso sub judice, pelo que, deveria o Acórdão recorrido ter considerado improcedente o pedido de pagamento do subsídio de isenção de horário ao A.

    16. Não se vislumbra, assim, a existência de qualquer locupletamento do R. à custa do A, sendo ilegal, pelos motivos expostos, remunerar o A. pelo "regime de isenção de facto", como se de um regime de isenção válido se tratasse, como decidiu e constitui a base da fundamentação do Acordão recorrido, por a isso se oporem os diplomas legais supra enunciados que regulamentam os Institutos Públicos.

  12. Aliás, a convicção que sempre existiu foi a de que a "isenção de Horário" a que o Regulamento de horário de trabalho se referia, apenas dispensava os Dirigentes do cumprimento de um horário de trabalho diário, nunca tendo sido reconhecido pelo INAC, nem pelos Dirigentes que tal situação lhes conferia o direito a auferir tal suplemento remuneratório, que, frisa-se, não se encontra previsto no Estatuto e Tabela Remuneratória especialmente aprovada para o pessoal do INAC, IP.

  13. No que respeita ao facto de o Recorrente ter remunerado, a esse título, as trabalhadoras BB e CC, sendo certo que o fez em momento anterior à notificação pela lGF do seu Relatório Final de Auditoria e no pressuposto, erróneo, de que o podia fazer, sempre terá que se entender que não há direito à reposição da igualdade, perante uma situação de ilegalidade.

  14. A decisão recorrida efetuou, assim, incorreta interpretação e aplicação do disposto no DL n.º 133/98, de 15 de maio, Portaria n.º 543/2007, de 30 de abril, Despacho Conjunto n.º 38/2000, de 28/10/1999, do Secretário de Estado dos Transportes e do Secretário de Estado do Orçamento, da Lei n.º 3/2004, de 15.01 (Lei-Quadro dos Institutos Públicos, artigos 6° n.ºs 1 e 2, alínea a) e 34.° n.ºs 1 e 4), da Lei n.º 2/2004, de 15.01 (Estatuto do Pessoal Dirigente, Artigos 10 n.º 2 e artigos 130 a 170, relativos ao exercício de funções pelo pessoal dirigente) e...

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